Carta de Rui Vilão publicada no Expresso de sábado, onde se denuncia a tentativa de regresso passado de António Coutinho (sublinhado meu no final):
"Uma das características da ciência mais difíceis de entender é a do primado dos factos. Como aceitar que aquilo que observamos no mundo, aquilo que fazemos com as nossas mãos, que medimos desajeitadamente tenha mais valor do que as epifanias que visitam os nossos brilhantes e potentes cérebros? Como aceitar a primazia do artesão sobre o filósofo? não é por isso de estranhar que a ciência floresça em liberdade e alimente essa liberdade. O trinómio liberdade - ciência - democracia é extraordinariamente fecundo. Não é por isso também de estranhar que o período de maior desenvolvimento científico em Portugal coincida com o período de liberdade e democracia pós - 25 de Abril, conforme atestam todos os indicadores. É um facto, medido, verificado e, naturalmente, interpretável. O extraordinário crescimento quantitativo e qualitativo, factualmente conhecido e reconhecido, da ciência na democracia portuguesa é mérito inegável da comunidade científica portuguesa, mas também da comunidade política, que acertadamente identificou a ciência como motor de desenvolvimento, não apenas económico mas também da própria qualidade da democracia. A democracia sai inegavelmente fortalecida quando a investigação científica e a consequente abordagem crítica ao conhecimento é assumida como o primeiros dos deveres dos docentes universitários. Assim o consagra o actual estatuto da carreira docente universitária, em detrimento de redações passadas em que era dada primazia à lecionação e à transmissão de conhecimentos. Torna-se assim difícil de perceber em que "factos alternativos" se baseia António Coutinho (Expresso, 1 de Abril de 2017) para apregoar a falta de maturidade da comunidade científica e da comunidade política nacional. Em contraponto ao inegável sucesso dos últimos 40 anos propõe antes uma estranha "excelência" que mais não é do que a reencarnação de um modelo de (sub)desenvolvimento em que Maria Callas canta em São Carlos e o resto do país é entretido com ranchos folclóricos."
Rui Vilão
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