quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

NOS 119 ANOS DA FÍSICA QUÂNTICA

Meu artigo saído por ocasião dos 100 anos do jornal O Figueirense, da Figueira da Foz:


O jornal O Figueirense é antigo (muitos parabéns pelos cem anos!), mas a Física Quântica é ainda mais antiga. Nasceu em 1900 quando o físico alemão Max Planck propôs, para interpretar as medidas da radiação vinda de uma fonte de luz, que a luz de um certo comprimento de onda (no caso da luz visível, de uma só cor) só podia ser emitida ou absorvida em certas quantidades ou pacotes de energia, a que chamou quanta recorrendo à raiz latina da palavra “quantidade”.  A proposta era revolucionária pois até então julgava-se que a luz podia ser emitida ou absorvida de um modo contínuo. Passados cinco anos, o suíço Albert Einstein, acrescentou que a luz não só é emitida e absorvida em certas quantidades como também só existe em certas quantidades, os fotões ou “grãos de luz”. Desde então o avanço da Física Quântica foi imparável: em 1913 o dinamarquês Niels Bohr formulou o primeiro modelo quântico do átomo. Ele percebeu que os fotões eram emitidos ou absorvidos por um átomo quando um electrão passava de um certo estado energético para outro, fazendo “saltos quânticos”. Quando O Figueirense nasceu a aceitação do modelo atómico alargava-se, tendo sido por essa altura que chegou a Portugal. O modelo de Bohr foi melhorado por volta de 1926 por três jovens físicos, o alemão Werner Heisenberg, o austríaco Erwin Schroedinger e o inglês Paul Dirac, que calcularam os níveis de energia de um átomo, a começar pelo mais simples de todos que é o de hidrogénio (que consiste de um único electrão, que orbita em torno do núcleo, constituído por um só protão). Não tardou até se alcançar a compreensão do arranjo dos elementos químicos na Tabela Periódica, que tinha sido criada pelo químico russo Dmitri Mendeleiev, em 1869, há 150 anos.
A teoria quântica revelou-se de uma eficácia extraordinária para explicar não só as propriedades dos átomos, mas também as propriedades das combinações de átomos, as moléculas - explica as ligações químicas. Explica, por isso, as propriedades de gases, líquidos e sólidos. Mas não se fica por aí: explica ainda as propriedades dos núcleos atómicos e das partículas que formam esses núcleos. A física quântica permite-nos descrever o mundo do muito pequeno, o mundo que não vemos, mas que está na base de tudo aquilo que vemos. 

Uma das suas aplicações mais importantes foi, em 1947, a invenção do transístor, um pequeno interruptor que funciona com base num fenómeno quântico que ocorre em elementos ou compostos químicos chamados semicondutores. O desenvolvimento extraordinário dos computadores desde então deve-se, portanto, ao nosso conhecimento de física quântica. 

A Física Quântica tem particularidades difíceis de entender por nós, que somos feitos de muitos átomos. Por exemplo, os sistemas quânticos podem existir num estado, ou noutro, ou numa sobreposição de estados. Schroedinger imaginou um gato, que ficou famoso com o nome de “gato de Schroedinger,” que podia estar meio vivo e meio morto, por a sua vida depender de um dispositivo quântico. Porém, quando se observava o gato, ele era visto vivo ou morto. A Física Quântica permite afirmar que, se tivermos mil caixas com mil gatos de Schroedinger, estar meio vivo e meio morto significa que, se abrirmos as caixas, encontraremos um gato vivo em cerca de metade dos casos e um gato morto na outra metade, sem que possamos saber antecipadamente qual é o estado do gato em cada caixa. Como tudo isso é muito estranho, muitos físicos, incluindo Einstein e Schroedinger, recusaram-se a acreditar nalgumas das consequências da teoria que eles próprios tinham criado. Passou-se a falar de bizarrias quânticas, a do gato e outras, e procuraram-se alternativas à teoria quântica convencional.

A busca não deu, porém, resultados. A Física Quântica, por muito estranha que pareça, descreve bem o que se passa no mundo natural. Está bem e recomenda-se. Apesar de já ter mais de cem anos, está como nova, continuando a fornecer novos resultados. Nos últimos anos passaram a ser intensamente procuradas aplicações tecnológicas baseadas nas bizarrias quântica. Uma dá pelo nome de “computação quântica”. Com efeito, estão a ser construídos novos computadores, ditos quânticos (de facto, os actuais, como o que estou a usar para escrever este texto, já são quânticos por usarem transístores…), que prometem revolucionar o mundo, por terem o potencial de ser muito mais rápidos do que os actuais. Os componentes em que se baseiam existem numa sobreposição de estados quânticos, tal como o gato de Schroedinger. Várias questões permanecem por resolver, mas os protótipos já acessíveis, como por exemplo a Q-Experience da IBM, um computador quântico na “nuvem” que pode ser programado por quaisquer interessados, revelam-se promissores. Computadores muito mais potentes permitirão resolver problemas muito difíceis, que hoje nos desafiam. Utilidades fantásticas como a concepção de novos medicamentos ou de novos materiais estão no horizonte.  Vem aí o admirável mundo novo!

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