Faleceu David Lodge, o polifacetado escritor britânico que manteve na ficção uma ironia finíssima e absolutamente corrosiva. A diversidade humana é irmanada nas fraquezas e nas safadezas, no que esconde e no que revela, nos pensamentos inconfessáveis e nos comportamentos desconcertantes. A sua vasta galeria de retratos que desenhou oferece-nos possibilidades inesperadas para encaixarmos as nossas pequenas e grandes misérias.
E isso só nos faz bem! Põe-nos na linha! Ou, pelo menos, devia...
Sobretudo se formos do tipo de nos levarmos muito a sério, de nos acharmos criaturas bem sucedidas, de nos vermos no topo do mundo. A passagem pela universidade, como professor, ajudou Lodge a "captar" este tipo e a dissecá-lo.
Pessoas que, como ele, remexem na consciência humana, trazendo à luz o que queremos enfiar à força na cave escura, são muito precisas para, através de uma substancial irracionalidade, dar alguma racionalidade ao real.
Sobre a consciência, disse Lodge a Luís Faria, jornalista do Expresso em 2016 (ver aqui):
"Escreveu um romance inteiro sobre a questão da consciência. Na altura, estava a estudar o assunto.
Sim, a inteligência artificial. Pareceu-me bom material para ficção. Usei-o de modo a que houvesse um debate, entre um romancista e um cientista cognitivo, sobre se era possível descrever a consciência. Foi muito instrutivo para mim. Quando comecei, não sabia nada sobre inteligência artificial. Aprendi um pouco. Mas não acho que a ciência cognitiva alguma vez explique por completo o fenómeno da consciência. Há filósofos que dizem taxativamente que não. É como a existência do Universo".