sábado, 11 de fevereiro de 2023

É PRECISO DEIXAR DE ENGANAR OS ALUNOS

Em Dezembro passado, Daniel Arias Aranda, professor da Universidade de Granada, publicou uma carta ao estilo de "carta aberta" - primeiro, numa rede social e, depois, num jornal online (ver aqui e aqui) - com o título provocador: ‘Querido alumno universitario de grado: Te estamos engañando’. Dada a sua grande divulgação na comunidade universitária e fora dela, foi de novo entrevistado (ver aqui). Destaco, desta entrevista, as seguintes ideias:
A mudança a que temos assistido na universidade não pode ser atribuída a um único factor. No entanto, entre os factores mais relevantes estarão os seguintes: distracção nas aulas provocada pela generalização dos dispositivos electrónicos; constante mudança das leis educativas; burocratização do ensino, que influencia a frustração dos professores; descida de nível dos conhecimentos nos ciclos de escolaridade pré-universitários. 
No respeitante a este último é de notar que os alunos chegam à universidade e pensam que é mais do mesmo. Os professores tendem a moldar-se ao seu nível, até porque há exigências de êxito académico.

Também se deve ter em conta a crescente protecção por parte dos pais, de que o fenómeno dos grupos de whatsapp de mães é um exemplo. Nascidos no pós-guerra, não ensinam aos filhos o valor do esforço nem os formam para serem independentes, contribuindo para que se tornem adultos amargados e manipuláveis.

Face a este diagnóstico, que se me afigura bastante realista, há que perguntar: o que deveremos e poderemos fazer para deixar de enganar os alunos?

4 comentários:

Alberto disse...

No caso particular de Portugal, a referida "descida de nível dos conhecimentos nos ciclos de escolaridade pré-universitários" tem raízes profundas na institucionalização da carreira única dos professores dos ensinos básico e secundário e dos educadores de infância. Neste ponto, convém usar a perspetiva correta: os educadores de infância e os professores primários viram valorizadas as suas profissões e o seu prestígio social, mas os professores do liceu baixaram o seu nível socioeconómico e deixaram mesmo de ser respeitados pela sociedade. Atualmente, nas escolas EB 1,2,3 +S + JI são tratados como uns paus mandados que se devem praticamente limitar a tomar conta dos alunos, não podendo ensinar nada que vá para além do senso comum do homem da rua e, depois de preencherem inumeráveis grelhas digitais, e em papel, com autênticas radiografias e TAC do perfil de cidadão, cognitivo e emocional, de cada um dos alunos, são obrigados, no fim do da linha, a lançar sempre o veredicto do sucesso escolar absoluto.
Há dias, ouvi, na televisão, o Professor Doutor Domingos Fernandes, um dos maiores teóricos da educação em Portugal, dizer que uma das principais causas do mal-estar que afeta os professores é a sua incapacidade de perceberem que na escola atual a função de ensinar perdeu a importância que tinha quando havia liceus e escolas industriais!
Sendo assim, apelo a todos os professores, propriamente ditos, que não se deixem enganar por propostas de cariz cosmético, que o ministério da educação tem apresentado aos sindicatos, e apontem no seu caderno reivindicativo as principais causas do seu mal-estar:
- Baixos salários;
- Perda de autonomia técnica e pedagógica, com a consequente infantilização, promovida pelo Estado, do ensino secundário;
- Indisciplina e violência impunes nas escolas.

Helena Damião disse...

Prezado Leitor, independentemente de ser um político, um especialista, ou, até, um professor a afirmar que o ensino pode ser dispensado, isso nao é verdade. Para que os alunos aprendam o que a escola deve ensinar, precisam de ser ensinados. Isto porque aquilo que a escola deve ensinar é conhecimento secundário com vista ao desenvolvimento de capacidades que constituem a inteligência. É lamentável que muitos professores reneguem a sua "nobre funçao de ensinar", como é dito em letra de lei, declarando-se guias, mentores, orientadores, etc. Cordialmente, MHD

Alberto disse...

É o ensino atrofiado, imposto aos professores e alunos por todo um escol de guias, mentores, orientadores, supervisores, etc, a soldo do Estado, mas ao arrepio da leis vigentes, que consagram a autonomia técnica e pedagógica dos professores, sacrificado no altar do ídolo falso, passe a redundância, do sucesso escolar secundário e universitário para todas e todos, grandes e pequenos, ricos ou pobres!
O Paraíso na Terra!

Carlos Ricardo Soares disse...

Aprende-se a agir, a pensar e a sentir. Não obstante, não há causas do que não acontece.
Por que é que não é necessário fazer nada para que os alunos se enganem, embora nem tudo desabe estrepitosamente? Por que é que não é necessário empurrar um náufrago para que ele se afogue? Por que é necessário que o náufrago perceba que o é? Que o ignorante perceba que o é? Que Deus não tem que fazer nada para ser adorado?
Por outro lado, por que é preciso trabalhar muito para que tudo continue na mesma, e não se consegue? Por que temos a sensação de que o mundo se está constantemente a desmoronar, mas é sempre em redor?
Os humanos têm uma desenvolvida aptidão para agirem, reagirem e aprenderem a agir e a reagir; para pensarem e aprenderem a pensar; para sentirem e aprenderem a sentir; para chorarem e aprenderem a chorar e a não chorar; para rirem e aprenderem a rir e a não rir...
Aprende-se a agir, aprende-se a pensar, aprende-se a sentir, mas é necessário ser bem ensinado e ser bem orientado. O contrário, pode ter efeito contrário.
Essa aptidão tem sido aproveitada, inúmeras vezes, de modo abusivo, para treinar e ensinar a ter determinados comportamentos, ou desenvolver trabalhos.
É possível, através da instrução, das letras, dos desafios, da discussão de problemas, levar o ser humano a essa capacidade de colocar problemas e tentar equacionar soluções, desenvolvendo práticas e métodos de análise e de reflexão sistemática.
Aparentemente, cada um sente o que tem de sentir, porque sente e nada mais. Mas quantos dos sentimentos são ensinados e incutidos?
É possível ensinar e treinar, por exemplo, para a tolerância, para o respeito, para o amor e para o ódio.
A função e o papel da Família, da Escola e dos meios de comunicação social, enquanto divulgadores dos atores políticos, religiosos, desportivos, policiais, artísticos, no desenvolvimento e orientação destas aptidões podem ser mais ou menos eficazes consoante o grau de coerência e o nível de satisfação que permitirem, em termos de compensações intrínsecas e extrínsecas, uma vez que toda a ação tem em vista uma satisfação.

NO AUGE DA CRISE

Por A. Galopim de Carvalho Julgo ser evidente que Portugal atravessa uma deplorável crise, não do foro económico, financeiro ou social, mas...