Novo post de Nuno Pereira (psiquiatra):
Em tempo de pandemia, o ensino a distância
(EAD), baseado sobretudo em aulas expositivas virtuais e nos clássicos
trabalhos para casa (TPC), pôs a descoberto a falta de autonomia no estudo de
muitos alunos, com a consequente desmotivação destes, apesar do empenhamento
redobrado dos pais. As tecnologias da informação e da comunicação (TIC),
ferramentas muito úteis de ensino e aprendizagem, não determinam o modelo
pedagógico. A capacidade de autoaprendizagem constitui um pré-requisito do
ensino com intermediação tecnológica e, independentemente de o sistema
educativo ser presencial, digital ou híbrido, assume importância decisiva no
êxito escolar e na atualização contínua. Ora, o etéreo “Perfil dos alunos à saída
da escolaridade obrigatória” aprovado pelo Ministério da Educação parece não
contribuir para a criação de estratégias concretas de desenvolvimento do estudo
autónomo.
A falsa dicotomia, há muitos anos
ultrapassada, entre a escola antiga centrada no professor e a escola nova centrada
no aluno pode fazer desfocar o objetivo primordial que é tornar o estudante
capaz de transformar a informação em conhecimento e de o colocar em prática. Sendo
a pessoa objeto e sujeito, aspetos polares inabordáveis em simultâneo,
justifica-se uma metodologia aberta, em que o professor oscila entre transmissor
e facilitador e o aluno, entre recetor e construtor. Perante a massa
avassaladora de informações no mundo atual, o aluno que não sabe estudar com autonomia
fica com fraca preparação académica e seriamente limitado para continuar a aprender
de forma consistente. Claro que a formação integral da pessoa se realiza
aprendendo a conhecer, a fazer, a conviver e a ser, em diferentes ambientes não
só formais, como não formais e informais.
Para melhorar os resultados escolares, quer
o Ministério da Educação quer os professores e os encarregados de Educação
adotam estratégias distintas. O primeiro tende a condicionar a escola para
baixar a fasquia da exigência. Os segundos encorajam o aumento do esforço dos
alunos e do número de aulas, sem contar com as explicações privadas, o que pode
explicar que Portugal tenha uma das maiores cargas de aulas e de trabalhos para
casa (TPC) da Europa. Nem abdicar da excelência nem investir na quantidade de
esforço e de aulas representam boas soluções. Só uma prática pedagógica que
envolva o ensino do conteúdo curricular e do modo de o aprender.
Potenciar as capacidades naturais dos
alunos para estudarem eficientemente, isto é, com eficácia e menor despêndio de
energia, eleva a autoestima e a motivação e garante mais tempo para dedicarem a
outras atividades extracurriculares e estarem com a família e os amigos. Assim,
integrar, no âmbito de cada disciplina, a partir do 2º Ciclo de escolaridade, o
método de estudo autónomo não só promove o sucesso escolar, como otimiza a aprendizagem
ao longo da vida.
Nuno Pereira (psiquiatra)
1 comentário:
"Perante a massa avassaladora de informações no mundo atual, o aluno que não sabe estudar com autonomia fica com fraca preparação académica e seriamente limitado para continuar a aprender de forma consistente"
Nuno Pereira
Contrariamente ao que possa pensar o Doutor Nuno Pereira, apesar da "massa avassaladora de informação no mundo atual", nas escolas secundárias, pelo menos no que se refere às disciplinas "clássicas", as estratégias de ensino vão cada vez mais no sentido de reduzir ao mínimo dos mínimos as matérias abordadas, de tal maneira que certas áreas do conhecimento estão em sério risco de desaparecerem dos programas e das salas de aula. As matérias perigosas, que para o ministério da educação são todas as matérias que alguns alunos acham difíceis, devem ser rapidamente banidas dos recintos escolares. Eu, por exemplo, ainda sou do tempo em que, na disciplina de física, se estudava o movimento relativo de Galileu e Einstein! Hoje, tudo é diferente e pequenino: já não é preciso estudar o momento angular, fundamental para entender o movimento de rotação, nem a estática, onde se aprendia o equilíbrio dos corpos, ou a conservação do momento linear em sistemas físicos que não sejam unidimensionais... Parece que, no mundo físico, só ocorrem colisões e explosões em linha reta!
O que interessa é que os alunos se preparem bem para os exames, que só têm um peso de 30 % na nota final, repetindo, ad nauseam, os exercícios que saíram nos anos anteriores.
Com estes tristes pressupostos, resta-nos a esperança de que a boa qualidade do ensino em Portugal possa vir a ser resgatada por umas consistentes “recuperações das aprendizagens”, a aplicar aos alunos dos primeiros anos dos cursos universitários, duplicando assim o procedimento de “recuperação das aprendizagens” previsto para os próximos meses de aulas dos alunos, do básico e secundário, que tão prejudicados foram, no seu percurso normal de “melhoria das aprendizagens”, quando os mandaram para o ensino a distância, devido à pandemia da covid-19.
Enviar um comentário