Quando, nas minhas aulas, refiro a "atitude educativa de Sócrates" e o "método socrático", muitos dos meus alunos, de diversas licenciaturas que aprendem Educação, dizem-me que mal estudaram Sócrates no ensino secundário, que não leram a "Alegoria da Caverna" de Platão.
Na verdade este texto não consta no "Programa de Filosofia dos 10.º e 11.º anos", nem no documento curricular mais recente "Aprendizagens Essenciais", mas nada impede um professor de Filosofia de apresentar às suas turmas um texto que é, pelo menos, fundador do pensamento filosófico e educativo. Conheço quem o faça e se recuse a deixar de o fazer. Isto porque reconhecem aos textos clássicos uma potencialidade cognitiva que se mantém viva e inultrapassada.
Surgiu-me esta nota a propósito de um texto publicado no jornal "Observador", assinado por Orlindo Farinha, professor do Ensino Secundário. Diz ele, presumo que surpreendido como eu:
Na verdade este texto não consta no "Programa de Filosofia dos 10.º e 11.º anos", nem no documento curricular mais recente "Aprendizagens Essenciais", mas nada impede um professor de Filosofia de apresentar às suas turmas um texto que é, pelo menos, fundador do pensamento filosófico e educativo. Conheço quem o faça e se recuse a deixar de o fazer. Isto porque reconhecem aos textos clássicos uma potencialidade cognitiva que se mantém viva e inultrapassada.
Surgiu-me esta nota a propósito de um texto publicado no jornal "Observador", assinado por Orlindo Farinha, professor do Ensino Secundário. Diz ele, presumo que surpreendido como eu:
(...) supunha que a Filosofia envolvia a capacidade de compreensão de textos complexos, como são os produzidos por algumas das mentes mais profundas e interessantes que a civilização ocidental criou e colaboraram para a definir tal como ela é; o confronto estimulante entre as teses que esses textos exibem; o entendimento dos argumentos e das razões que as sustentam; e, finalmente, o que tudo isto pode contribuir para a formação de pessoas que querem ter a audácia de pensar pela sua própria cabeça.
Este último ponto sempre me pareceu o escopo final de todos os outros.
(...) a compreensão das teses, o domínio dos argumentos e a capacidade de elaboração autónoma de um pensamento (...) está sempre marcado pela linguagem e pelo seu domínio próprio.
Por isso, a Filosofia é linguagem e discurso escrito (malgré Sócrates) e é neles que tudo se resolve.
O ensino da Filosofia tem sido, assim, confronto com discursos e produção de discursos ou, pelo menos e no caso que aqui nos ocupa, tentativa de neste sentido formar os alunos.
Nem vale a pena mencionar o sentido universal e transversal que o ensino da Filosofia poderia, nesta concepção, suscitar, qualquer que seja o domínio em que se possa pensar. Nomeadamente, e sobretudo, o da formação de uma personalidade integral e crítica e livre.
Mais uma vez, parece que estava errado.
Tenho usado até aqui o tempo passado. Isto porque o domínio “escolar” da Filosofia tem vindo a ser tomado por umas soi disantes mentes analíticas, mas que são, sobretudo, tristemente dogmáticas e que se manifestam agora em apoteose no exame deste ano e respectivos critérios de correcção (...).
Podem esconder-se por detrás das tais “Aprendizagens Essenciais”, do sentido analítico do pensamento filosófico, encher a boca com palavras mágicas como formação para a cidadania, sentido crítico e promoção da autonomia…
Para mim, tudo isto não passa de mais uma triste fraude a acrescentar a muitas outras na área da Educação, algumas até bem mais graves, mas quase todas elas cobertas com o silêncio de uns e a cumplicidade de outros (...).
5 comentários:
Os processos de aprendizagem não são menos complexos do que os processos de ensino e não existe grande correspondência entre uns e outros. Todas as disciplinas se perfilam na linha do pensamento crítico, do domínio da linguagem e de algum modo ou tipo de conhecimento funcional. Mesmo que os resultados não sejam imediatos, podem aparecer dezenas de anos mais tarde, vale sempre a pena apostar e investir na provisão de dados e de informações sobre a realidade, individual, social, física...
Promover nos estudantes hábitos de pensamento científico é fundamental, mas muitos têm dificuldade em integrar o método científico nos seus processos de abordagem e análise da realidade. As coisas não são simples quando tudo se passa num plano de linguagem, que é preciso dominar. As várias disciplinas, no modo como são enquadradas e posicionadas, induzem logo a considerar diferenças que perturbam no único e fundamental objectivo de todas elas, qual seja, o de proporcionarem o acesso mais adequado e fecundo possível ao conhecimento, seja de que matéria for.
A escola e as suas disciplinas não devem estar estruturadas por forma que sejam o processo pior (mais difícil, complexificador) possível de chegar ao conhecimento, seja de que matéria for.
Por exemplo, nós usamos os métodos de conhecimento, muito antes de nos dizerem que esses métodos são dedutivos, ou indutivos, científicos, empíricos, racionais, etc..
Por outro lado, nas ciências físicas, não raro, ficamos com a sensação de que nos querem dizer que foram os cientistas que criaram o sistema solar, a gravidade, ou a eletricidade, etc..
Ainda há imenso pensamento encriptado, reverencial, sacerdotal e esotérico dentro das capelas de muitas disciplinas.
Senhora Professora Helena Damião, a "atitude educativa de Sócrates" e o "método socrático" que nos fala no ensino já deveriam estar ultrapassados como já reclamava o Professor Sebastião e Silva, e que no entanto, se lamentava por em Portugal nem o método socrático nós tinhamos compreendido, encontravamo-nos ainda numa fase pré-socrática.
É assim que estamos?!
Nota: Como alguns comentários meus que envio aos post do Professor A. Galopim de Carvalho não são publicados deixo aqui o meu protesto, pois são respeitosos e cordiais, mas são críticos, conforme as regras definidas. Com isto certamente que a censura voltará a funcionar, se sim, vou tentar enviar-lhe o meu comentário por e-mail.
Senhora Professora Helena Damião, a "atitude educativa de Sócrates" e o "método socrático" que nos fala no ensino já deveriam estar ultrapassados como já reclamava o Professor Sebastião e Silva, o que lamentava era por em Portugal nem o mérito do método socrático nós tinhamos compreendido e atingido, encontravamo-nos tristemente ainda numa fase pré-socrática.
É assim que ainda estamos?!
Nota: Como alguns comentários meus que envio aos post do Professor A. Galopim de Carvalho não são publicados deixo aqui o meu protesto, pois são respeitosos e cordiais, mas são críticos, conforme as regras definidas. Com isto certamente a censura voltará a funcionar, se sim, vou tentar enviar-lhe o meu comentário por e-mail.
Cordialmente,
Parece ser cada vez mais necessário investir na formação inicial de professores do ensino básico e secundário. Ninguém ensina o que não sabe.
É o triunfo do pensamento mágico.
Basta um abracadabra, que agora se diz melhoria das aprendizagens essenciais e flexíveis que os professores e educadores de infância têm de começar a recuperar já em setembro, para que o mundo, de obscurantismo e pobreza envergonhada, em que vivem muitos dos nossos jovens, se transforme num El Dorado, onde o leite e o mel jorram de todos os lados.
Eles e elas não querem acabar apenas com a Filosofia. A própria Física, a ciência mais essencial das ciências experimentais, também já só existe nos curricula do 12.º ano, onde é uma mera disciplina opcional.
Desde que os pobrezinhos melhorem as suas aprendizagens, e com isso obtenham diplomas, que lhes abram as portas de bons empregos, essas histórias, de ir à escola para aprender filosofia, ciência ou línguas, são o que menos interessa.
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