quinta-feira, 23 de julho de 2020

CRER OU NÃO CRER


No jornal I de hoje encontra-se uma minha  recensão ao livro "Em que crêem os que não crêem", do escritor e crítico Umberto Eco e do cardeal e teólogo jesuíta Carlo Maria Martini:

3 comentários:

Eco disse...

O que é crer?
Qualquer humano quando nasce é laico – menino selvagem.
Invocando Umberto, mas sem Umberto:
suponhamos que nasço e me olho a um espelho. Sou eu, sem conteúdo, refletido no espelho, tal e qual, não interpretável. A educação torna o espelho deformante, transforma-o “numa prótese com funções alucinatórias”. O menino selvagem não sabe o que é um espelho, que o espelho deforma e acredita no engano perceptivo e, nesse jogo com o espelho, aprende a mentir a verdade e, por isso, continua inocente. Acredita. A imagem especular fantasia, absorve as anomalias do canal, deforma pelo grotesto ou pelo estranhamente belo a imagem inicial, sem signo, nem símbolo. Em que acreditar, então? No espelho? Afinal, depois de refletido, quem és tu, no espelho? Tendo a percepção de que o espelho mente, o que resta? O que sou sem a virtualidade do contexto, sem a minha aparição e a dos outros? Outra vez, selvagem. Natureza. Ao fundo do medo instintivo, a ética, essa verdade natural de não fazer aos outros o que não queremos que nos façam, essa base em estado puro da matéria projetada na matéria, esse respeito que caracteriza a imagem especular movida para o outro. Profundamente éticos os mecanismos da sobrevivência individual e da espécie.
Justificar a natureza... os atos da natureza... a divina natureza... Aceitação do sagrado descalço, do cheiro da terra, da noite da lua, do calor do sol, do alimento fresco e da água que sacia e limpa. A interpretação corrói e destitui a possibilidade de Deus, que é o menino, o referente, não o espelho.

Carlos Ricardo Soares disse...

Não acredito que Deus tenha comunicado com aqueles que disseram que "sim, subimos ao monte e ele falou connosco, porque somos especiais, mais ninguém tem esse privilégio..." e que, com base nisso, falaram e/ou escreveram em nome de Deus.
As religiões que tiveram um grande sucesso, com base nisso, são uma ousadia política que funcionou, apesar de tudo, mas isso é colateral ao facto de serem falsas.
Se acredito que existe Deus, sem saber o que isso seja, é no que está por detrás, oculto, que manobra, o relojoeiro que fez o relógio.
Mas não compreendo por que é que ele não diz nada e nunca se manifesta a favor de nada, ou contra nada.
E, assim, não acredito no Deus das religiões, não acredito que a palavra que dizem ser de Deus seja a palavra de Deus.
Deus não tem palavra. E não me venham com a Arca da Aliança.
Acredito num Deus que não conheço e que não comunica com a humanidade, mas que tem todo o poder e todo o saber, ignorando nós porque não os usa da forma que nós compreenderíamos.
É estranho, tão estranho, que não acho racional crer que exista.

Creio disse...

Deus é a elite económica e o pluralismo tendencioso, uma vez que a democracia se encontra em pleno declínio. Depois, os intelectuais notáveis já morreram e os que os imitam não têm força suficiente para ascender a super-homens ficando nas trincheiras de uma ideologia semi-anárquica, sem produto direto social ou com um produto esvaziado (isto falando de intelectuais que se debatem por justiça e liberdade, não de intelectuais tecnocratas de orientação política, que esses assumem a cor do dinheiro do sítio onde poisam). Tudo são lojas falidas, alterações climáticas descontroladas, covid, insurgências radicais onde têm voz a demagogia, a marginalidade, a exclusão e a violência e o Relógio do Juízo Final está quase, quase, a bater a meia-noite.
O paraíso mais próximo talvez seja Marte ou outro desgraçado planeta para uns quantos privilegiados e Deus, o Verdadeiro, que se prepare porque, quando lá chegarmos, será expulso novamente. Não há Quem aguente!

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Face ao que diz ser a «normalização da indecência», a jornalista Mafalda Anjos publicou um livro com o título: Carta a um jovem decente .  N...