Transcrevo aqui o prefácio, assinado em conjunto por dois autores deste blogue, da obra que irei apresentar no próximo sábado na Feira do Livro:
Carl Sagan, grande astrofísico e divulgador científico foi um dos muitos autores que escreveu na revista Skeptical Inquirer, uma das mais conhecidas publicações norte-americanas dedicadas ao cepticismo científico. Outra é a Skeptic Magazine, dirigida pelo famoso psicólogo e historiador da ciência Michael Shermer. Ambas são editadas por sociedades cépticas, o Committee for Skeptical Inquiry e a Skeptics Society, respectivamente. Também os quatro autores desta obra são membros fundadores de uma sociedade céptica, a COMCEPT - Comunidade Céptica Portuguesa. O cepticismo, que não deve ser confundido com negacionismo, significa procurar provas e fundamentos para questionar as verdades fáceis que nos oferecem a cada passo. O negacionismo é outra coisa, completamente diferente: é negar os factos em face de toda e qualquer prova. O cepticismo é uma marca da ciência. O negacionismo é uma marca da anti-ciência.
O cepticismo serve para desconfiarmos da banha da cobra disfarçada de ciência. Esta máscara não é nova, uma vez que é tão antiga quanto a ciência. Tem assumido roupagens diferentes, de acordo com aquilo que os seus adeptos consideram ser a ciência da época. Se no século XIX o magnetismo animal se apropriava, indevidamente, de conceitos relacionados com o campo magnético, mais recentemente a física quântica e as neurociências foram eleitas como embrulhos de eleição para as mesmas banhas da cobra de sempre. Invariavelmente, conceitos pré-científicos são disfarçados com ideias e palavras da ciência, usadas sem qualquer significado, só para impressionar os incautos. Por isso é importante questionar e tentar saber para além do que nos dizem os gurús que surgem em cada esquina como uma proposta mirabolante para qualquer um dos nossos problemas. Essa atitude inscreve-se numa cultura céptica, que é imprescindível à ciência e ao pensamento racional. Ser céptico obriga a a ter uma base científica: é necessário ter um conhecimento básico da ciência para conseguir navegar no mar de informação contraditória com que nos deparamos acerca de qualquer assunto de interesse social. E não, nem todas as opiniões são igualmente válidas só porque há pessoas a acreditar nelas. Há aquelas que têm um fundamento científico e há outras que não têm. A afirmação de que a Terra é plana não é tão válida como a de que é esférica, ligeiramente achatada nos polos. A primeira é uma opinião sem fundamento. A segunda é um facto. E também não podemos socorrer-nos da ciência do futuro, no fundo ficção científica, em prol das nossas ideias do presente. Nem as falhas do processo científico, que consiste em grande medida em encontrar e corrigir falhas, podem com honestidade ser invocadas para fazer uma razia horizontal a todo o conhecimento. Nem tudo está em pé de igualdade. Como já alguém disse, não devemos abrir tanto a nossa mente que os miolos caiam.
O presente livro, como obra céptica, ajuda-nos a pensar nalguns temas com uma perspectiva diferente da dos seus proponentes. Algumas questões globais são trazidas à nossa proximidade com exemplos concretos ocorridos na sociedade portuguesa. No final de cada capítulo é apresentado um resumo, uma lista ponto por ponto, para que fique absolutamente claro aquilo que os autores procuram fundamentar nas páginas anteriores. E porque devemos acreditar neles? Logo no início dizem-nos que não devemos e instam o leitor a procurar a verdade autonomamente. No último capítulo, mostram como é fácil criar a sua própria treta com um ar científico. Na realidade o procedimento é sempre o mesmo, como uma pizza: uma base que é sempre igual (em geral calão científico e figuras de autoridade) e uma selecção de ingredientes conhecidos (testemunhos de clientes satisfeitos ou uma alegada origem na civilização Maia, por exemplo). “O que eu não posso criar, eu não entendo”, dizia o Nobel da física Richard Feynman, que em 2018 faria cem anos se estivesse vivo. Talvez sabendo como é fácil criar uma treta com ar científico seja mais fácil reconhecer as muitas outras, com que nos confrontamos com frequência.
Mas o que é que tudo isto interessa? Na realidade interessa muito. A ciência e o pensamento racional são pilares essenciais da nossa vida em sociedade, que nos permitem vivem mais e melhor, assim como antecipar um futuro melhor. As alterações climáticas e as vacinas, por exemplo, são questões de interesse social que mostram bem que não é indiferente prevalecerem umas ou outras ideias na opinião pública. E é por isso que, neste era Trump, é tão importante o activismo em prol da ciência e do pensamento racional. Ciência e liberdade estão próximas uma da outra. Mais: a ciência e a liberdade são duas faces da mesma moeda. Se a ciência necessita da liberdade de pensamento para poder existir, a ciência é um desafio intrínseco aos regimes autoritários, porque para a ciência não tem razão que está acima na hierarquia, mas quem apresenta provas. Einstein disse que a ciência é “a coisa mais preciosa que temos”. A defesa da ciência, perante as suas várias e sedutoras ameaças, é a defesa do melhor da humanidade. É isso que é feito neste livro. E é isso aliás o que os autores tem feito no quadro da COMCEPT, ao longo dos últimos anos.
A COMCEPT organiza regularmente eventos abertos ao público, acerca de temas relevantes e sempre com espaço aberto para discussão. Oferece no seu sítio (http://comcept.org) um conjunto de textos que complementam bem este livro e que vão sendo publicados, por vezes como reacção rápida a questões da actualidade. Atribui também todos os anos os Prémios Unicórnio Voador, “uma distinção satírica que, por sugestão dos internautas, é concedida anualmente pela COMCEPT às personalidades ou entidades que tenham contribuído, consciente ou inadvertidamente, para a disseminação de pseudociência, superstição e outras formas de desinformação”. A COMCETP tem tido uma actividade consistente e persistente ao longo dos anos na defesa da ciência e do pensamento racional, que tem neste livro um excelente corolário.
Carlos Fiolhais
David Marçal
5 comentários:
Vocês são gurus de uma ciência cristalizada. Vocês é que se tornaram em negacionistas, ao levarem ao exagero, o proselitismo céptico. As alterações climáticas? Quais alterações? As antropogénicas? Tenham paciência e vergonha!!!
Professor Ivar Giaever, the 1973 Nobel Prizewinner for Physics trashes the global warming/climate change/extreme weather pseudoscientific clap-trap
Nobel Laureate in Physics; "Global Warming is Pseudoscience"
https://www.youtube.com/watch?v=SXxHfb66ZgM
Enquanto as provas contra as alterações climáticas forem vídeos de Youtube, perde automaticamente valor o insulto de que quem as defende é um "negacionista". Você encaixa que nem uma luva neste livro. Devia comprá-lo.
Para coisas do conhecimento público, dispensam-se até referências bibliográficas. Isto não era suposto ser um insulto, mas a sua posição transforma qualquer comentário num insulto, pois não é suposto questionarmos a religião do Aquecimento. Tenha paciência! Mas se o insulto é o vídeo, ainda vai ter de comer muita bolota para chegar aos calcanhares do Professor Ivar Giaever. É criminoso continuar a promover pseudociência e junk science. Não é preciso um canudo académico para o ridicularizar.
Continua a mostrar o quão bom este livro é para si. Vídeos de Youtube não são, nunca foram, e nunca serão provas científicas, senão também podemos argumentar que a Terra é plana, que a Lua eé um holograma e que a Finlândia não existe. Quando aprender o que são provas científicas, vai o queão ridículo é chamar de "negacionista" a quem defende as alterações climáticas.
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