É de conhecimento
geral que o Cirurgião Geral, desde tempos imemoriais de Barbeiro Cirurgião, se
move no meio dos humores: necessariamente pús, necrose e excrementos. Ainda há
quem se disponha a fazê-lo com orgulho.
Sempre que necessário, estes médicos operários
(operadores segundo doentes e ou colegas com menos escolaridade) realizam
horário extraordinário no Serviço de Urgência e em outras valências (bloco
operatório, consulta, internamento). São daqueles Médicos antiquados que operam
os doentes e desejam acompanhá-los, observá-los no internamento, avaliar com as
mãos, saber como se sentem, perceber o seu sofrimento, estar lá, falar a mesma
linguagem. Olham mais para o doente do que para o relógio. Não ouvem o seu estomago
roncar, não atendem impreterivelmente o telefone ao conjugue que o espera do
outro lado. São estes seres sem limites, praticantes do desporto radical que é
ser médico no SNS no século XXI.
Estes médicos ensinam e estão rodeados de aprendizes
que raramente se preocupam excessivamente com o excesso incomensurável de horas
extraordinárias realizadas. As horas extraordinárias são encaradas como
solidariedade para com os colegas, com intuito formativo, e mesmo como dever devido
a constrangimentos organizacionais tais como – a “impossibilidade” em
dimensionar um Serviço de Cirurgia para garantir o número de médicos necessários
para assegurar a qualidade de um serviço de urgência.
Estes médicos vão cumprindo com vontade e dedicação as
tarefas que lhes são propostas, dedicam-se, como a generalidade dos colegas,
com abnegação. Até que um dia param! Param para pensar, fazer contas às horas
dedicadas para lá do humanamente aceitável e tecnicamente aconselhável. Param
refletem e juntam-se ao movimento Médicos em Luta, sindicalizados ou não. Decidem
entregar, em pleno exercício da sua liberdade, a recusa em realizar
horas extra, em conformidade com o limite legal de 150 horas anuais, sob a
forma de um documento escrito. As 150 horas anuais são rapidamente realizadas
em cerca de três ou quatro meses. Um turno de urgência, para um Interno (em
formação) é de 12h, contudo é habitual a partir do do 4.º de 6 anos fazer 24h;
um cirurgião especialista tem em contrato 18h ou 24h normais, sendo que a
jornada de trabalho na urgência é de 24h, ninguém faz 18h, por uma questão
pragmática. A esta jornada desenfreada segue-se (não há muito tempo – foi um
“direito” recente) de um descanso de 6 a 8h. Os blocos são de 6 a 12 horas de
jornada contínua e numa tarde de consulta observam-se, na melhor das hipóteses,
20 doentes com consultas teoricamente de 15 minutos. Será legítimo pedir o mesmo
a um senhor jornalista? A um carpinteiro? A um operário fabril? A um piloto? São
estes os Médicos que no SNS recebem os acidentes de viação, às 5h da manhã, e
que nesse momento com 22h acumuladas estão como equivalente a uma taxa rime de
alcoolémia. Deseja isso par asi, para os seus familiares? Eu não!
Aqui começa o odor…. algum bafio mas que a generalidade
de nós desconhece. É um cheiro que não se entranha nem nos pára, pois grande
parte de nós nasce após 1974. Ingenuamente, democracia, liberdade, igualdade de
género são dados adquiridos por esta geração de médicos obreiros, com grande
reverência para com as gerações prévias que lutaram por estes direitos. Portanto,
nós somos aqueles que sempre que encontramos um desvio a estes princípios -
para connosco, um colega ou para a classe inteira – consideramos ter o dever de
o denunciar e garantir que não se repita. Os desvios a estes princípios têm
sido inúmeros e sinuosos, merecedores de queixas a entidades para tal
indigitadas. Por vezes ocorre-nos se seria mais simples continuar a trabalhar todas
estas horas, numa espécie de alienação coletiva: era mais prático, mais útil,
meter a cabeça debaixo do jugo do carro de bois, mas paramos para pensar. Estamos
exaustos, muito! Esta é a nossa vida, a nossa profissão a nossa luta. Vários
Serviços de Cirurgia Geral estarão fechados à Urgência. Até quando? Não
saberemos…
Talvez até deixarmos de ouvir um “SIM, MAS…” Uma ameaça velada a quem diz SIM diariamente, com orgulho e abnegação, a quem paga do seu (parco) bolso para publicar em revistas indexadas, a quem paga do seu (mediano) bolso cursos que custam milhares de euros (por vezes um salário inteiro), a que diz que sim, dando a cara e o seu esforço incondicional por todos os portugueses.
Isabel Marques
9 comentários:
Só não lê, com o coração apertado, o texto da Dra. Isabel Marques (que não conheço), quem não tenha coração. O salário e as condições de trabalho a que se sujeitam os nossos médicos é uma vergonha nacional. Governos que acham muito bem pagar salários estratosféricos a administradores de empresas estatais, praticantes da mais duvidosa das ciências - a economia - a fruírem pepitas de ouro tão capitosas, que acham o salário de ministro coisa pouca que só se aufere, por "sacrifício", em face de tudo isto e o mais que não digo, o salário miserável que se paga a médicos - uma das profissões mais duramente qualificadas que conheço - é um verdadeiro escarro. É do conhecimento geral que nenhum governo gosta de gastar dinheiro nem com a educação nem com a saúde. Mais cedo ou mais tarde os governantes deixam-se deslumbrar com o dinheiro, com os ricos e com os poderosos. E é assim que as democracias apodrecem: por dentro. Depois, os bárbaros só têm de fazer uma entrada triunfal.
Já, por três vezes, estive nas mãos de médicos e enfermeiros, entregue aos seus cuidados, empenho e competência. A minha gratidão só é igual à minha indignação, pelo modo como são tratados por quem nos governa. Chega de deslumbramentos provincianos com o que não presta, porque já é tempo de ver onde está a verdadeira valia, o saber, a devoção ao trabalho e o preço da qualificação. Não há nada de deslumbrante na esperteza dos que roubam, para terem nas suas garagens trinta carros topo de gama e mansões sumptuárias em tudo quanto é sítio.. Já se esticou a corda do despudor, muito para além do admissível. Lembrem-se qo que dizia o velho Hipócrates: ""Onde quer que a arte da medicina é amada, é também aí que existe amor pela humanidade."
Eugénio Lisboa
E vergonhoso para todos nós, que uns burgessos quaisquer, uns seres repelentes possam enriquecer astronomicamente roubando e destruindo algumas das nossas melhores empresas, e que o sistema judicial os não faça pagar pelo que fizeram. É isto que corrói as democracias e abre a porta aos vândalos.
Há complacência para com os corruptos, empatam-se os meios de efetivamente os combater e depois não há dinheiro para nada, nem para um Sistema Nacional de Saúde, como deve ser, nem para financiar a investigação científica que nos pode salvar da miséria.
Um Governo que não faz nada para inverter esta situação não merece a nossa consideração.
Olá João!
@Lisboa e @Boavida;
O Partido Comunista Português é o único partido que se elevou com autenticidade dos Humilhados e Ofendidos, para usar as palavras da obra de Dostoievski. E ao seu lado sempre se manteve e mantém.
É na intervenção política e institucional do PCP, e em particular na atividade direta com o povo, e desenvolvida com os sindicatos, que todos os trabalhadores, homens e mulheres, humilhados e ofendidos se sentem genuinamente representados.
Lembrar aos senhores que, do SNS também fazem parte, além dos Médicos e Enfermeiros, muitos outros profissionais, dedicados, imprescindíveis, com salários que humilham e ofendem, mas não são de classe.
Lembrar ainda que os senhores são anti-comunistas e atacam ferozmente aqueles que mais defendem, genuinamente, TODOS os trabalhadores, que é o PCP.
"uns burgessos quaisquer" esses são a Alta Finança, sr. Boavida, é o capitalismo, não é o povo, ainda não percebeu isso?
Este Senhor, que usa o anonimato para sistematicamente fazer baixa política partidária, nunca reconhecendo mérito nenhum a ninguém que não participe da "boa doutrina", não merece qualquer consideração de ninguém decente. Ser contra um partido que louva tiranos genocidas e nunca levanta a voz a não ser para a carnificina do lado oposto, é um dever de mínima integridade. Nunca este senhor louvou nada que este signatário dissesse, usando os mesmos métodos de sistemática perseguição bufa que usava a nunca assaz falecida PIDE. A estes senhores, não incomoda nada que um ex-KGB seja hoje Presidente da Rússia, mas gostaria de ver como reagiriam se Rosa Casaco fosse hoje Presidente de Portugal. Não, não é nada diferente, é aflitivamente a mesma coisa. A maneira como os trabalhadores foram "protegidos" e afagados, nos regimes comunistas, onde as greves não eram, sequer, permitidas, e os refilões eram "afastados", não pode deixar de me vir à memória, quando leio as hipócritas e enviesadas palavras deste anónimo, que come ideologia ao pequeno almoço, ao almoço, ao jantar e à ceia, evidenciando sempre uma compacta obtusidade intelectual. NUNCA o vi criticar fosse o que fosse que faça o seu partido, o que é só por si uma clamorosa demonstração de subserviência e de total falta de espírito democrático. É por essas e outras, que o seu partido está em vias de extinção, o que poderá possivelmente acontecer nas próximas legislativas. Requiescat in Pace.
Este anónimo, que tem vergonha de dizer o seu nome - Ildef onso Dias - talvez por ter recebido recomendações nesse sentido, em vez de vir apoiar as intervenções, minha e do Prof. João Boavida, aproveitou para vir fazer guerrilha partidária, como se essa luta pela classe médica fosse feudo do PCP! Isto, só por si, revela o metal de que é feito este Senhor. No fundo, só lhe interessa o problema da classe médica, para valorizar o seu Partido. Faça-lhe bom proveito! Sabe uma coisa? O Sr. nunca me desilude: é sempre, imbecilmente, igual a si próprio.
Sr. Eugénio, mas eu disse alguma mentira?
Porque é que a Verdade o coloca nesse estado?
Senão vejamos:
Está claro que o senhor é um fervoroso anti-comunista, disso ninguém duvida. Não é mentira.
Toda a gente sabe que no SNS trabalham milhares de tarefeiros, auxiliares, e ainda outros técnicos altamente qualificados e especializados que ganham uma miséria. Não é mentira.
Que o Partido Comunista está sempre ao lado da classe trabalhadora, dos jovens e dos idosos está à vista de todos, sem contestação possível, é um dado objetivo, que se verifica pelas propostas que apresenta e pela luta que trava nas ruas junto dos trabalhadores e do povo. Não é mentira.
"uns burgessos quaisquer" esses são a Alta Finança, veja lá aquilo que os bancos fazem, se no passado recente o povo pagou-lhe as dividas agora o roubam descaradamente o povo outra vez. Não é mentira nenhuma.
Então o que é que o incomodou? Foi a Verdade? Dá-se mal com ela?
Tratava mal os seus subalternos?
O senhor tem toda a aragem de quem pisoteava os outros.
Continuo a dizer: quem quer desconversar, desconversa! O que tem a intervenção interlocutor anónimo com o texto publicado?
@ Anónimo das 22:36 a sua baixeza de carácter é confrangedora... nenhum comentário se aplica o seu critério míope.
Mas ainda assim, analisando pela sua lente estranha, caŕegada de miopia, será de perguntar poque é que deixa de fora o comentário do João Boavida. Tem tudo daquilo que se queixa.
Tenha vergonha de si mesmo.
Olhe-se ao espelho e reflita se é esse seu carácter seletivo, de duplos padrões, a roçar a delinquência se é esse os valores que transmite aos seus.
E em nome de quem? Da continuidade da miséria nos outros e em nome dos seus privilégio.
@ Anónimo das 22:36 perceba lá a posição em que coloca o João Boavida ao criticar um anónimo e deixá-lo a ele incólume pelas mesmas razões... tudo aquilo que este este Homem nao merece é ter a mediocridade ao seu lado. Seja mais inteligente aqui como na vida.
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