quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Contra o politicamente correcto 1. "Polícias da palavra com alma de censores"

Procurei não dar atenção a diversas ameaças (seriíssimas) à liberdade de expressão que ressurgiram neste Agosto, pela mão (cada vez mais presente) do "politicamente correcto" (os livros "para meninos e meninas" é apenas uma delas).

Incomoda-me que o seu raio de acção se alargue e torne cada vez mais incisivo e asfixiante. Tudo pode cair na sua mira: a história, a filosofia, a literatura, a arte... Vários meios de comunicação social, dão-lhe voz e ampliam-na acriticamente, pois isso é garantia de audiências. Até porque, no caso de Portugal, os fogos reais acalmaram e é preciso encontrar outros.

Acabo por abrir o último Expresso... lá está a questão e em vários sítios. Detenho-me numa notícia em que vejo Chico Buarque de Hollanda na dita mira. 

Mas, porquê!? Vejo o que escreveu o jornalista Nicolau Santos: 
"Chico, herói da minha geração, durante anos e anos foi considerado o cantor que melhores músicas fazia sobre os sentimentos das mulheres. Agora está a ser acusado de machista por causa de uma faixa do seu novo álbum Caravelas. Não há paciência para os guardiães do politicamente correto, polícias da palavra com alma de censores."
O que podemos fazer contra este policiamento censório? No caso, ler e ouvir a canção, uma belíssima canção, aliás, nem outra coisa seria de esperar de Chico Buarque de Hollanda.

[Nota: sobre o assunto, saíram no Público três artigos de opinião com interesse. Dois (Chico Buarque, o perigoso Machista e De Chico Buarque a Charlottesville) de João Miguel Tavares e um (Chico no país das caravanas) de Nuno Pacheco].

Tua cantiga 
Quando te der saudade de mim
Quando tua garganta apertar
Basta dar um suspiro
Que eu vou ligeiro
Te consolar 
Se o teu vigia se alvoroçar
E estrada afora te conduzir
Basta soprar meu nome
Com teu perfume
Pra me atrair 
Se as tuas noites não têm mais fim
Se um desalmado te faz chorar
Deixa cair um lenço
Que eu te alcanço
Em qualquer lugar  
Quando teu coração suplicar
Ou quando teu capricho exigir
Largo mulher e filhos
E de joelhos
Vou te seguir  
Na nossa casa
Serás rainha
Serás cruel, talvez
Vais fazer manha
Me aperrear
E eu, sempre mais feliz 
Silentemente
Vou te deitar
Na cama que arrumei
Pisando em plumas
Toda manhã
Eu te despertarei 
Quando te der saudade de mim
Quando tua garganta apertar
Basta dar um suspiro
Que eu vou ligeiro
Te consolar 
Se o teu vigia se alvoroçar
E estrada afora te conduzir
Basta soprar meu nome
Com teu perfume
Pra me atrair 
Entre suspiros
Pode outro nome
Dos lábios te escapar
Terei ciúme
Até de mim
No espelho a te abraçar 
Mas teu amante
Sempre serei
Mais do que hoje sou
Ou estas rimas
Não escrevi
Nem ninguém nunca amou 
Se as tuas noites não têm mais fim
Se um desalmado te faz chorar
Deixa cair um lenço
Que eu te alcanço
Em qualquer lugar 
E quando o nosso tempo passar
Quando eu não estiver mais aqui
Lembra-te, minha nega
Desta cantiga
Que fiz pra ti

1 comentário:

Anónimo disse...

Curioso, também, que criticar alguma coisa hoje em dia seja logo uma forma de censura / ditadura / opressão em nome dessa categoria intelectual mal-definida e preguiçosa que é o "politicamente correcto".

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