terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Mitos de ciência e saúde


Hoje a Sàbado traz uma reportagem com chamada de capa sobre mitos de ciência e saúde da autoria da jornalista Lucília Galha. Eis declarações que fiz aquela revista

A exposição solar é perigosa

A exposição solar é, em geral, benéfica: por exemplo estimula a produção de vitamina D, essencial para o nosso metabolismo. Mas a exposição solar pode ser perigosa se for prolongada e não se tomarem os cuidados necessários. À Terra chega, proveniente do Sol, além de luz visível, alguma luz invisível, principalmente infravermelha e ultravioleta. Chega alguma radiação infravermelha, que aquece, mas chega também, embora em menor quantidade, alguma radiação ultravioleta, que é mais energética do que a luz infravermelha e que a luz visível e que, por isso, penetra mais na nossa pele. Essa forma de luz representa o maior perigo, apesar de ser em parte filtrada pela camada de ozono na alta atmosfera. Em grandes quantidades pode avermelhar a pele e ser até fonte de melanomas (cancros da pele). As crianças são particularmente vulneráveis e devem ser protegidas pelos adultos, cobrindo a pele (em especial cabeça e pescoço, mas também o tronco e as pernas) nas horas de maior intensidade dos raios solares entre as 11 h e as 16 h. Os dermatologistas alertam com razão para os perigos da demasiada exposição à luz solar. Protectores solares adequados ajudam. Há uma grande variedade e não é. em geral, fácil escolher os mais adequados a cada caso: a publicidade por vezes não ajuda.

 As ondas electromagnéticas são perigosas. O uso dos telemóveis provoca cancro cerebral

Vivemos no meio de ondas electromagnéticas. A luz, toda a luz, é constituída por ondas elctromagnéticas. A luz visível, incluída, e não é nada perigoso ver. Não são perigosas, excepto em certas circunstâncias extremas, a radiação infravermelha, microondas e ondas de rádio, que são menos energéticas do que a luz visível. O comando de televisão trabalha com infravermelhos e não é perigoso. Não são perigosos os telemóveis nem os pórticos de portagens, que funcionam com microondas (se o fossem não eram usados!). Nem são perigosas as ondas de rádio, que estão por todo o lado uma vez que a atmosfera é permeável a ela, tal como o é às microondas. Não há nada na vida que seja absolutamente isento de perigo mas têm sido, por vezes, muito exagerados os perigos dos telemóveis: o certo e que não há qualquer provas que provoquem cancros cerebrais. Esses cancros, raros, acontecem a quem usa telemóvel, mas nos nossos dias praticamente toda a gente usa telemóvel. Não está estabelecida uma correlação e muito menos uma relação de causa e e efeito. No livro “Pipocas com telemóvel” que publiquei com David Marçal (Gradiva) discuto os enganos que a Internet propaga a respeito da excessiva radiação dos telemóveis: não, as ondas com que eles trabalham são microondas, que não servem para fazer pipocas (os comprimentos de onda são diferentes, tal como a intensidade das ondas). Alguns fabricantes de sistema bluetooth, que também é uma forma de radiação (microondas, tal com  o wifi), levantaram suspeitas de perigos da proximidade do telemóvel da cabeça para melhor venderem os seus sistemas. Por uma questão de precaução, o uso de telemóvel é desaconselhado a crianças pequenas, nas quais o cérebro ainda está em desenvolvimento. Também por uma questão de precaução é desaconselhada a habitação muito perto de antenas de retransmissão de dados de telemóvel, dada não só a continuidade como a maior intensidade da radiação. Como os estudos disponíveis não são conclusivos, são precisos mais estudos sobre estas matérias e eles estão a ser realizados. Qualquer afirmação que se faça hoje é sempre com base nos conhecimentos actuais pois ninguém pode fazer afirmações com base em conhecimentos que não existem.

Os pneus dos carros protegem dos relâmpagos. Um raio nunca cai duas vezes no mesmo lugar

Um carro é um bom sítio para se estar durante uma trovoada, porque as eventuais descargas eléctricas serão absorvidas pelo invólucro metálico sem ameaçar quem está lá dentro. Não são os pneus que protegem, mas sim a estrutura metálica que funciona como escudo. Aliás, os pneus podem servir para descarregar a electricidade para o solo: se a electricidade consegue atravessar o ar, que é isolador, poderá também atravessar pneus. É aconselhável manter as janelas fechadas e não tocar nas partes metálicas nessas situações! Portanto, em trovoadas intensas, o melhor será permanecer dentro da viatura. Durante uma grande tempestade aconselha-se aos automobilistas permanecer parados fora da estrada (evitar árvores e postes de alta tensão) com o motor desligado já que, se o relâmpago incidir em andamento, os pneus poderão derreter, perdendo o condutor  o controlo do veículo. O carro poderá ficar bastante danificado se for atingido. E o mesmo acontecerá ao passageiro se não tiver isolamento suficiente, mas de qualquer forma é preferível estar dentro do carro do que fora
.  Um raio pode cair duas vezes no mesmo lugar, embora a probabilidade disso acontecer seja extremamente pequena. É como o Euromilhões sair duas vezes ao mesmo indivíduo!

 Só usamos 10% do nosso cérebro ´

É um mito. Apesar de não ser uma questão de física, é atribuída erradamente a Einstein. Não faz qualquer sentido. Embora não se conheça muita coisa sobre o cérebro humano, sabe-se que todas as partes do cérebro são activadas, embora de forma diferente e em circunstâncias diferentes. As várias partes do cérebro estão ligadas. Os defensores do mito defendem que o cérebro tem poderes desconhecidos, mas, se eles são desconhecidos, eles não podem conhecê-los e e muito menos medi-los. Entre outros, o neurologista Barry Gordon explica a total falsidade do mito: "Do People Only Use 10 Percent Of Their Brains". Scientific American. 7/February /2008,  33.

 A lua cheia afecta o comportamento humano

 A lua cheia aumenta a visão nocturna e isso tem um efeito trivial no comportamento. A questão é se haverá outros efeitos para além da maior luminosidade. Foram feitos vários estudos e a conclusão é que não existe qualquer efeito: O mito é, portanto, falso. Não há, em particular, qualquer correlação com a fertilidade ou a taxa de nascimentos. Parece haver um efeito em níveis hormonais de alguns peixes e insectos, mas não há efeitos visíveis em animais superiores como répteis, aves e mamíferos.

Assistir a um eclipse sem protecção nos olhos pode causar cegueira

Olhar directamente para o sol é decerto perigoso e pode causar, em casos extremos, cegueira (raramente essa cegueira é total). Por isso se recomenda o uso de óculos especiais para observar eclipses, que filtram a luz solar. O dano na retina chama-se retinopatia solar pois o dano da luz intensa é feito na retina. O efeito pode não ser doloroso, pelo que não será imediatamente perceptível.

 Ler com pouca luz faz mal aos olhos

É preciso evidentemente haver suficiente luz para se poder ler. Os nossos olhos ajustam-se relativamente bem à luz disponível. De facto não faz mal aos olhos ler com pouca luz, mas pode causar fadiga ocular, um cansaço semelhante ao que se tem quando se guia ou se olha para um ecrã durante muito tempo seguido. Pode ser desconfortável, mas não há prova científica de que este efeito seja irreversível. Em geral, passa com o repouso.

 Os microondas emitem radiações que provocam cancro

 Os aparelhos de microondas só aquecem a comida, usando radiação de microondas. Esta luz causa a agitação das moléculas de água. Qualquer aparelho deste à venda é perfeitamente seguro para os fins a que se destina, isto é, se usado correctamente não causa qualquer prejuízo: existe um número enorme de aparelhos a funcionar em todo o mundo sem quaisquer problemas. A radiação está confinada ao forno e não só não causa cancro como não causa qualquer outra doença. Pode ser até mais saudável a ingestão de alimentos cozinhados no microondas do que noutro forno ou fogão pois basta uma pequena quantidade de água para eles serem aquecidos. De qualquer modo nunca se devem sobreaquecer os alimentos e há o risco de sobreaquecer se houver pouca água. Um cancro pode ser causado por radiação ionizante (que transforma átomos em iões) e a radiação de microondas, além de se localizar dentro da cavidade, não é ionizante. Foram feitos muitos estudos e não há qualquer prova do risco cancerígeno do uso de microondas na cozinha.

 Os testes de QI são o melhor indicador para medir a inteligência

 Não se trata de uma questão de física,  embora alguns físicos tenham alto QI. Por exemplo, o Nobel da Física Richard Feynman tinha o QI de 126 (pessoas “normais” têm entre 85 e 115). De facto, o teste de QI pode ser considerado um método de avaliação de capacidades cognitivas (vulgo inteligência), que têm uma componente genética e outra ambiental. Os testes de QI têm sido bastante discutidos, pelo que não são uma maneira indiscutível de medir a inteligência. Mas medem decerto certas capacidades cognitivas com algum grau de segurança (isto é, com um erro pequeno): em média os doutorados têm um QI superior que o resto da população e os “dropouts” do ensino básico têm um QI mais baixo.

2 comentários:

Anónimo disse...

Querem saber a verdade... então ouçam este médico em:
A PESTE (uma peste para cada população)
https://www.youtube.com/watch?v=OGDVki2CAqI

Anónimo disse...

*sigh* ...

A sério? Nada melhor que um vídeo? Um dia hei-de compreender esta gente. Está mesmo a sugerir que as vacinas são alguma "conspiração"?

"A escola pública está em apuros"

Por Isaltina Martins e Maria Helena Damião   Cristiana Gaspar, Professora de História no sistema de ensino público e doutoranda em educação,...