“Estamos a formar não um país de analfabetos,
como até aqui, mas um país de burros diplomados”.
Francisco Sousa Tavares
Costumo dizer (não sei se da minha lavra ou colhido em escaninhos que a minha memória cansada não alcança) que quando se é novo olha-se para o futuro, quando na meia-idade para o presente e na velhice para o passado.
Perspectivando a sua acção pedagógica no âmbito da Educação (os seus escritos assim o atestam), não posso deixar de me alistar como simples soldado numa campanha em que o meu distinto Amigo ostenta valorosos galões.
Malgé tout, gostaria que me desculpasse o arrojo de octogenário que olha para um passado recente e desastroso de um sistema educativo que deseduca com o facilitismo em querer nivelar por baixo tornando os educandos todos iguais no esquecimento, como escreveu Gustave Le Bom, de que “o verdadeiro progresso democrático não é baixar a elite ao nível do povo, mas elevar o povo ao nível da elite”.
E nesta verdadeira loucura que se apossou anos atrás, do Ministério da Educação - com duas vestais do Templo do “Eduquês”: Ana Benavente, secretária de Estado da Educação (1995-2001) e Maria de Lurdes Rodrigues, ministra da Educação (2005-2009) - subjugado por manifestações da Fenprof em benefício de docentes de menores habilitações literárias em nome de uma carreira docente única para os docentes dos diversos graus de ensino não superior (antigos ensino primário e liceal, crismados de 1.º ciclo do básico e secundário), com vencimentos idênticos e que não encontra paralelo em nenhum país europeu, justo será pôr em destaque, ou mesmo louvar a acção (ou tentativa) do ex-ministro da Educação Nuno Crato que em atitude corajosa invalidou a licenciatura de Miguel Relvas, figura grada do Partido Social Democrata (partido político então no Governo).
E isto é tanto mais de louvar, porquanto o exame de inglês de José Sócrates, com perguntas e respostas via Net, conheceu destinos filosóficos com a chancela da Sorbonne. Já para não repisar (porque por si já abordado) ter havido alturas, denunciadas no próprio Conselho Nacional de Educação, em que os alunos saíam do 1.º ciclo do básico sem saberem ler nem escrever! E porque o próprio L(er), E(scrver) pressupõe, outrossim, C(ontar) será de trazer à colação o desalento do então Primeiro-Ministro António Guterres, quando em entrevista à RTP (23/10/96), declara haver alunos do 1.º ciclo do ensino básico que saem sem saber fazer contas.
Abstaindo o “pós-modernismo” destas situações, aliás nihil novi sub sole, já Platão, em era A.C., confrontado com a incapacidade das crianças contarem ou distinguirem os números pares dos ímpares manifestava o seu profundo repúdio, da forma seguinte: “Quanto a mim, parecemo-nos mais com porcos do que com homens, e sinto-me envergonhado não só de mim mas de todos os gregos!” E o que dizer, ainda, do (ab)uso dos computadores desde a “primária” que podem levar (se é que já não levam!) os respectivos alunos (e não só!) quando interrogados sobre quem foi o primeiro rei de Portugal, a responder: “Um momento, vou ver ao Google!”.
Pobre criancinhas que no final deste ciclo ao serem confrontadas com a possibilidade de um simples exame de avaliação de conhecimentos, logo se viram apoiadas por coros de indignação dos políticos, dos pais, dos professores! Avaliar não é medir? Ou será medir a olho nu como quem tenta perscrutar, no dealbar deste milénio, o Universo com uma simples lupa de auxílio a uma vista cansada? Last but not least, ou seja tão mau como isso, programas escolares, quais cantinas de refeições para alunos, sem a suculenta sopa das obras dos nossos maiores literatos substituída pela mousse de chocolate de textos sobre, por exemplo, o Bigbrother.
Nada disto é ficção… Assim, tomando por base o facilitismo que se apossou do nosso ensino, e tendo como paralelo o que escreveu Arthur Schopennauer (1776-1880), detenha-se o leitor nesta sua contundente crítica (Aforismos para a Sabedoria da Vida): “O que em sociedade desagrada aos grandes espíritos é a igualdade de direitos e, portanto, de pretensões, em face da desigualdade de capacidades, de realizações (sociais) dos outros. A chamada boa sociedade admite méritos de todo o tipo, menos os intelectuais: estes chegam a ser contrabando. Ela obriga-nos a demonstrar uma paciência sem limites com qualquer insensatez, loucura, absurdo, obtusidade. Por outro lado, os méritos pessoais devem mendigar perdão ou ocultar-se, pois a superioridade intelectual, sem interferência nenhuma da vontade, fere pela sua mera existência. Eis porque a sociedade, chamada boa, não tem só a desvantagem de pôr-nos em contacto com homens que não podemos louvar nem amar, mas também a de não permitir que sejamos nós mesmos, tal qual é conveniente à nossa natureza. Antes nos obriga, por conta do uníssono com os demais, a encolhermo-nos ou mesmo a desfigurarmo-nos”.
Poderá o meu querido Amigo, perante tanta e tamanha desesperança minha, perguntar-me se não há esperança em melhores dias numa vindoura, e renovada, tutela do Ministério da Educação do Partido Socialista. É bem possível, até porque como nos ensina o povo “a esperança é a última coisa a morrer”. Todavia, perante uma esperança que mora em mim quase moribunda receio ter de comungar do desalento de Vergílio Ferreira: “A esperança é só a certeza que vem nela quando o não vir nos dá muita dor”.
Cumprimentos amigos do seu dedicado,
Rui Baptista
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