quinta-feira, 1 de abril de 2021

Esqueça-se a Finlândia e tome-se Portugal como exemplo para a educação. Ou, talvez não...

Estando Espanha no espaço OCDE, iniciou uma nova reforma educativa conforme o mais recente modelo da OCDE.

Aprovada em Dezembro de 2020, a lei que firma essa reforma (Lei Celaá) tem agitado o país vizinho: enquanto uns se ocupam com a sua concretização, outros discutem-na. Uns e outros põem os olhos em Portugal: muitos políticos académicos e jornalistas estão de acordo em que estamos a fazer um milagre. Em condições socio-económicas, à partida, menos favoráveis, subimos mais do que Espanha na bitola que é o PISA. Portugal é a nova Finlândia! Há que seguir-nos...

Jornais como o El País e o El Mundo vão dando conta das movimentações reformistas: um perfil do aluno, autonomia e flexibilidade curricular, redução dos conteúdos, desenvolver competências, menos memorização e mais criatividade... Ao seguir-nos, a Espanha está a seguir exactamente... o que a OCDE preceitua!

Mas sendo mencionando Portugal nas notícias, certos elementos da equipa que habita o Ministério da Educação, pressupondo que desconhecemos as políticas internacionais, omitem esse "pormenor" e reafirmam que somos uma inspiração para os nossos vizinhos.

Foi o que aconteceu no final da passada semana: um desses elementos não evitou comentar uma notícia e repetiu o que já havia dito antes, quando visitava uma escola: “em Portugal existem muitas Finlândias” (ver aqui). 

Passados dois ou três dias após este empolgante comentário, saíam os resultados dos testes diagnósticos realizados, em Janeiro, aos alunos portugueses do Ensino Básico, segundo a mesma bitola do PISA: "maus resultados", noticiaram os jornais.

Problemas pontuais derivados da pandemia? Sim, por certo, mas não só: o mesmo elemento do governo admitiu a existência de "debilidades estruturais dos alunos". E com esta afirmação se aproximou da realidade.
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Ver aqui um artigo de grande interesse do jornalista Samuel Silva do Público.

3 comentários:

Rui Ferreira disse...

Somente a ignorância é capaz de promover o ridículo a bizarro. Isto de fazer do nosso débil sistema educativo um exemplo para os outros não tem outro nome. Que diria Maquiavel! Ingenuidade é que não há nenhuma. Mais parece que ninguém pensa. Quem sabe cala-se e quem não sabe dita regras. Acossados de todos os lados os professores ficaram sem reação e os economistas tomaram-lhes o lugar. Percebo-lhes o interesse. Temo que não ficará pedra sobre pedra. Só lamento que a irresponsabilidade que se comete hoje junto das nossas crianças e dos nossos jovens venha a ser paga apenas eleitoralmente. É grave demais para se ficar por aqui.

Anónimo disse...

O atual sistema de ensino secundário português vem na continuidade do sistema de Marcelo Caetano, muito desfigurado pelo esvaziamento dos currículos das matérias que os alunos acham mais difíceis, nomeadamente as de caráter científico e as de caráter literário, e pela extinção, na prática, das provas de exame, verificando-se assim uma descida com aceleração constante da qualidade da educação desde o ponto mais alto, no dia 25 de abril de 1974, que trouxe as passagens administrativas, até ao ponto mais baixo, com as atuais "recuperações das aprendizagens essenciais".
Os comunistas acham, ou achavam, que não, mas, de facto, somos um dos países mais pobres da Europa Ocidental. Somos pobres porque temos pouco dinheiro, a agricultura e as pescas são pouco desenvolvidas, há pouca indústria e o sistema educativo é baseado no princípio abstruso de que se os professores ensinarem o mínimo possível o sucesso escolar dos alunos será máximo!

Helena Damião disse...

Lamentavelmente, caro leitor anónimo, o princípio que refere (se os professores ensinarem o mínimo o sucesso escolar dos alunos será máximo) aplica-se à educação PÚBLICA global. E nota bem: independentemente da tendência dos regimes (ditatorial ou democrática) o princípio vai ganhando terreno, o esvaziamento dos currículos, em termos de conhecimentos estruturantes, avança até... ao esvaziamento total?
MHDamião

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