Meu artigo no mais recente número de "As Artes entre as Letras":
Sir Martin Rees, com 75 anos, um dos mais prestigiados
astrofísicos contemporâneos, esteve no Porto em 17 de Novembro passado, para
proferir uma conferência, no âmbito do Mês da Educação e da Ciência da Fundação
Francisco Manuel dos Santos, na qual resumiu os principais conteúdos do seu
livro Para o Infinito. Horizontes da
ciência lançado na mesma altura (tradução
portuguesa do original de 2011, From here
to infinity: Scientific Horizons, n.º 223 da colecção “Ciência Aberta” da
Gradiva). Comentaram a conferência, realizada na Galeria da Biodiversidade do
Museu de História Natural e da Ciência da Universidade do Porto, os cientistas
portugueses Alexandre Quintanilha, Professor de Ciências da Vida emérito da
Universidade do Porto, e Nuno Santos, Professor no Departamento de Física e
Astronomia da mesma Universidade e investigador no Instituto de Astrofísico e
Ciências do Espaço.
O Professor Rees, professor emérito da Universidade de
Cambridge e detentor do título de barão de Ludlow e membro da Câmara dos
Lordes, é desde 1995 Astrónomo Real da Grã-Bretanha (um título hoje largamente
honorífico mas que remonta à segunda metade do século XVII), foi entre 2005 e
2010 Presidente da Royal Society de Londres, a mais antiga sociedade científica
do mundo em funcionamento ininterrupto, e foi Master do Trinity College de Cambridge, entre 2004 e 2012. Recebeu
vários prémios e distinções pelo seu trabalho científico entre os quais a
medalha de ouro da Sociedade Real de Astronomia (1987), o Albert Einstein World
Award of Science (2003), o Prémio Michael Faraday (2004), o Prémio Crafoord
(2005), e a medalha Isaac Newton (2012). Entre os seus livros, além de Para o Infinito, merecem saliência Just six
numbers – the deep forces that shape the universo (de 1999, traduzido em português
do Brasil: Apenas Seis Números: As forças
profundas que controlam o universo, saído na Editora Rocco), Our Cosmic Habitat (de
2001, traduzido em português europeu:
O Nosso Habitat Cósmico, n.º 117 a
referida colecção “Ciência Aberta”), Our Final Century: Will the Human Race Survive the Twenty-first Century?
(de 2003, publicado nos Estados Unidos com o título de Our Final
Hour - A Scientist's Warning: How Terror, Error, and Environmental Disaster
Threaten Humankind's Future In This Century — On Earth and Beyond e traduzido
em português do Brasil: Hora Final: Alerta de Cientista: O desastre
ambiental ameaça o futuro da Humanidade, saído na Companhia das Letras). Actualmente está a completar um
manuscrito intitulado What we still Don’t
Know, sobre as actuais fronteiras da ciência.
Em claro contraste com
o título de ressonância astronómica, Para
o Infinito é um pequeno volume que se lê breve e agradavelmente. Nasceu de
um conjunto de quatro conferências que o autor difundiu aos microfones da BBC,
a rádio e televisão pública britânica. O objectivo do autor foi o de apresentar
a ciência, tal como ela é hoje, de um modo que fosse compreensível pelo grande
público. Discute as possibilidades da ciência mas também as suas limitações.
Nas possibilidades inclui a resolução de um sem número de problemas relativos à
vida humana na Terra e nas limitações enfatiza o facto de existirem questões
sociais, económicas, éticas e políticas, que claramente excedem as competências
da ciência e dos cientistas. Por exemplo, a ciência pode descrever e fazer
previsões sobre as alterações climáticas globais, mas a resolução do problema
está longe de ser um simples problema científico. Uma das maiores preocupações
do autor consiste precisamente na prevenção de riscos para o futuro da
Humanidade, como aqueles que vêm do aquecimento global, hoje uma questão bastante
premente, que se somam a outros, uns da responsabilidade humana, como o da
eventual utilização de armas nucleares ou o do desenvolvimento da inteligência
artificial a um ponto que leve à substituição dos humanos por máquinas, e
outros sem responsabilidade humana, como por exemplo a queda de um asteroide ou
de um cometa na Terra. Para conhecer melhor os riscos que nos ameaçam e para “realizar a tarefa de assegurar que a nossa
espécie tenha um futuro a longo prazo” Rees criou em 2012 com dois colegas
seus das áreas da Filosofia e das Ciências da Computação um centro na sua Universidade
de Cambridge com o nome de Centre for the Study of Existential Risk.(Stephen
Hawking, o famoso astrofísico também professor de Cambridge e crítico da
inteligência artificial, é conselheiro desse centro). Há quem pense que Rees é
um pouco pessimista sobre o nosso futuro, mas ele considera que, mesmo que a
probabilidade de a Humanidade terminar seja pequena, vale a apena considerar
seriamente essa hipótese porque essa probabilidade não é zero. E, temos todos
de concordar, o assunto é muito importante. Membro, entre outros da Academia de
Ciências do Vaticano, que aconselha o papa em assuntos de ciência, Martin Rees
propõe-nos a todos que pensemos no nosso futuro colectivo.
O Astrofísico Real
britânico conhece bem o que é a ciência, não apenas pelo seu longo trabalho de investigação
mas também pelos seus trabalhos de gestão e de comunicação da ciência. Para ele
é indispensável aproximar a ciência do público. Não se trata apenas de fornecer
uma base social sólida à ciência. Trata-se também e talvez sobretudo da
partilha dos cientistas com a sociedade dos conhecimentos e dos métodos
científico. Escreve a certa altura de Para
o Infinito (tradução muito boa de Fátima Carmo):
«É
uma lacuna cultural não
apreciar o panorama oferecido pela cosmologia moderna e pela evolução darwiniana
— a cadeia de complexidade crescente que leva de um qualquer início ainda
misterioso aos átomos, estrelas e planetas — e o modo como, no nosso planeta,
surgiu a vida, e se desenvolveu numa biosfera que contém criaturas com cérebros
capazes de reflectir sobre o assombro que é tudo isto. Uma tal compreensão
comum deveria estar acima de todas as diferenças nacionais — e também de todos
os credos religiosos.»
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