Texto enviado para a Conferência Parlamentar sobre a temática O futuro da Ciência em Portugal, que decorreu no dia 24 de Junho. Os restantes documentos, registo áudio e video, podem ser encontrados na página do evento.
1. Quantas bolsas de doutoramento e pós-doutoramento serão atribuídas no concurso de 2014?
De 2012 para 2013 verificou-se uma redução muito significativa do número de bolsas de doutoramento e pós-doutoramento financiadas pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), que passaram de 1878 para 962. Após o resultado do concurso, e na sequência de uma mobilização expressiva da comunidade científica e da sociedade civil, o governo anunciou um reforço de 350 bolsas. Mesmo com esse reforço, mantém-se uma redução de 30% em relação ao números bolsas atribuídas em 2012. Tendo em conta o planeamento e as expectativas dos investigadores é importante saber atempadamente, ou seja, no momento da abertura do concurso, quantas bolsas de doutoramento e pós-doutoramento serão atribuídas no concurso de bolsas individuais de 2014.
2. Bolsas de programas doutorais não são comparáveis às bolsas individuais
Em 2013 ocorreu uma grande alteração no modo como as bolsas de doutoramento são atribuídas. O número de bolsas individuais atribuídas em concurso nacional caiu abruptamente, tendo sido apenas concedidas 415 (contando com o reforço anunciado pelo governo), face às 1198 atribuídas em 2012. Em 2013 a maior parte das bolsas (431) foram concedidas no âmbito de programas doutorais financiados pela FCT. Esta substituição (parcelar, porque o número total de bolsas é bastante inferior ao de 2012) apresenta vários inconvenientes:
- Apenas 96 programas doutorais são financiados pela FCT, e estes correspondem a uma gama reduzida dos 809 programas de doutoramento aprovados pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior em Portugal (A3ES). Em vez de seleccionar os melhores candidatos num concurso nacional, a FCT seleccionou programas de doutoramento.
- Os candidatos seleccionados no âmbito de programas doutorais financiados pela FCT são escolhidos por júris locais, de cada instituição. Tendo o nosso país, tradicionalmente, níveis muito elevados de endogamia nas universidades, parece pouco adequado realizar concursos a nível institucional. Tanto mais, que esta opção é oposta à solução adoptada no caso do concurso Investigador-FCT, que é um concurso nacional.
A aposta da FCT nos programas doutorais não pode ser feita em detrimento do número de bolsas atribuídas no concurso individual de bolsas, pois estas não são equivalentes, nem nas áreas de investigação nem na consistência da selecção dos candidatos.
3. Desvalorização do candidato nos concursos de bolsas
Várias alterações na avaliação de bolsas de doutoramento e pós-doutoramento têm contribuído para a desvalorização do mérito do candidato e do respectivo plano de trabalhos. Entre esses, a penalização dos candidatos cujo plano de trabalhos não se enquadre num projecto de investigação financiado em concurso competitivo. Por outro lado, a direcção da FCT tem veiculado a ideia de que as bolsas de pós-doutoramento deverão ser integradas em projectos de investigação financiados (sem que para isso reforce as verbas dos mesmos) em detrimento de bolsas individuais. Estas duas opções revelam uma visão dos jovens investigadores como meros recursos dos projectos de investigação, tal como equipamento ou reagentes. Os concursos de bolsas da FCT devem selecionar os futuros cientistas portugueses e não faz sentido desvalorizar o mérito dos candidatos e do respectivo plano de trabalhos, face a factores circunstanciais.
4. Para quando a integração dos bolseiros no Regime Geral de Segurança Social?
Paradoxalmente, essa visão dos bolseiros como mão de obra não é levada ao ponto de permitir a sua inclusão no Regime Geral da Segurança Social. Actualmente os bolseiros estão integrados no regime do Seguro Social Voluntário, tendo direito ao reembolso das contribuições pelo valor do Indexante dos Apoios Sociais. Esta situação é extremamente penalizadora para a carreira contributiva dos bolseiros. Além disso, não lhes confere o direito a subsídio de desemprego. Que sentido faz integrar os bolseiros de investigação, nomeadamente os de pós-doutoramento, no regime de segurança social de quem não tem rendimentos? E de negar o acesso ao subsidio de desemprego a investigadores que trabalham num regime de precariedade absoluta?
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