domingo, 15 de dezembro de 2024

AS FÉRIAS ESCOLARES DOS ALUNOS SERÃO PARA... APRENDER IA!

Quando, em Agosto deste ano, o actual Ministério da Educação anunciou que ia avaliar o impacto dos manuais digitais suspendendo, entretanto, o alargamento a mais turmas do ensino básico e secundário (ver aqui) e, logo depois, em Setembro, fez recomendações às escolas sobre uso de smartphones em contexto escolar (ver aqui, cujos desenvolvimentos podem ser vistos aqui) devo dizer que vi a possibilidade de se estar a iniciar uma mudança positiva na educação pública em Portugal. Ou seja, uma mudança compatível com aquilo que a investigação científica digna desse nome tem evidenciado, e que o próprio Ministério da Educação invocou, sobretudo nas ditas recomendações.
 
E isto mesmo sem perceber a razão de se fazer mais um estudo de avaliação do impacto dos manuais digitais quando há muitos estudos recentes de elevadíssima qualidade e que vão no mesmo sentido: os manuais em papel são, a diversos títulos, preferíveis em termos de aprendizagem. E há estudos que apresentam meta-análises que deixam poucas dúvidas a este respeito.

Recorte obtido aqui
Ora, em Novembro, em nome da inclusão, o Governo anunciou que será dado "a cada aluno um tutor educativo de inteligência artificial adaptado aos nossos currículos para o ajudar a compreender o mundo” (ver aqui) e agora lançou um projecto-piloto para ensinar inteligência artificial aos alunos durante as férias (ver aqui).

Convenhamos que a intenção de dar um "tutor educativo de inteligência artificial (...) para ajudar a compreender o mundo”, não soa propriamente bem a quem tem algum conhecimento e reflexão sobre o que é educar. "Tutor" é uma palavra que não poderá aplicar a um recurso digital e "compreender o mundo" tem que se lhe diga, mesmo quando tentado por pessoas (bem) formadas para tal tarefa.
 
E a intenção de ocupar as férias dos alunos com tarefas escolares não soa melhor. Há que perguntar se voltamos à figura de "escola a tempo inteiro"? É que, tal como a expressão indica, as férias escolares servem (ou deveriam servir) para descansar das tarefas escolares, devendo as crianças e jovens ser orientados (pelos adultos) para sair do mundo digital em que passam horas infinitas, como mostram inúmeros estudos, nomeadamente um em cuja apresentação esteve o Ministro da Educação (ver aqui).

Não tive mais notícias do tal "tutor", mas o dito projecto parece ir em frente pois faz parte da Estratégia Digital Nacional, aprovada há poucos dias em Conselho de Ministros (ver aqui), tendo sido envolvidos municípios que criarão as condições para ensinar "programação, robótica e conteúdos relacionados com a inteligência artificial", nas férias, bem se vê!

Em suma, o designado plano de transição digital está em boa marcha na educação pública no nosso país, pois, além do que acima disse, foram recentemente alocadas verbas, que eu diria significativas, para arranjo e substituição de computadores nas escolas com vista à realização de provas de avaliação nacionais.

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