O artigo do Público que me alertou para tal é assinado por António Sarmento e remete para um outro saído em 2011, sinal de que o problema está identificado há anos neste campo, tal como no da educação.
Em ambas as áreas, as expressões que se impõem em primeiro lugar vêm do mundo empresarial e são muitas delas iguais.
Diz-se logo no resumo desse artigo, saído numa revista de medicina:
"Na nova linguagem da medicina, os pacientes são clientes ou consumidores; médicos e enfermeiros são provedores.
No campo da educação, tal como mostrámos em textos anteriores (por exemplo aqui, aqui, aqui, aqui), os alunos e famílias são clientes ou consumidores, os professores ou agentes similares são provedores ou fornecedores, as escolas são substituídas por ecossistemas...
Mais se diz nesse resumo:
"As palavras que usamos para explicar os nossos papéis definem expectativas e moldam o comportamento. Esta mudança na linguagem da medicina tem consequências importantes e destrutivas."
O mesmo se aplica à educação: a imposição da "narrativa" da educação do futuro / do século XXI (1) foi um passo fundamental na estratégia de corrosão da sua essência, para impor outra coisa, evidentemente.
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(1) Assim mesmo designada pelas entidades económico-financeiras que insistem em determinar os desígnios do mundo.
2 comentários:
O poder das novas linguagens é imenso. Todos conhecem a bonita terra de Tormes que Eça de Queirós implantou no Douro. A Boa Nova dos Santos Evangelhos inaugurou uma nova era de prosperidade-e de paz! - por toda a Terra.Quanto à nova linguagem na educação, dou um exemplo simples: já ninguém trata os professores do liceu por doutores; agora são senhores ou senhoras, na melhor das hipóteses, ou sectores, na pior! Estes pormenores de linguagem revelam a pouca consideração que a sociedade atual tem pelos professores enquanto agentes imprescindíveis ao funcionamento das escolas públicas, que já foram espaços de educação e sabedoria e que são atualmente lugares de acantonamento obrigatório de crianças e jovens pobres.
Esta linguagem gongórica da educação, usada sobretudo para esconder e enganar, tolhe a autonomia científica e pedagógica dos professores, sem os quais a escola se vê transformada numa fraude. Já não há escolas - só há mega-agrupamentos de EB 1, 2, 3 + JI + S!
Não sei se vai no contexto, mas tenho estranhado mui que a Ordem dos Médicos, sempre ciosa, não se tenha pronunciado sobre a seguinte situação:
"Alguém entra numa Urgência dum Hospital Privado com uma maleita, julgando-a coberta pelo seu Seguro de Saúde.
Analisada pela equipa médica, chegam à conclusão que a maleita de que realmente padece, não está incluída nesse seguro e/ou excede o plafond do mesmo.
Na sequência desta situação, é elaborado um Orçamento para o Tratamento pelos serviços Administrativos/Financeiros do Hospital, com os custos Estimados, para ver se o Tratamento prossegue.
Ora isto não é uma questão Médica, pelo que quem devia tratar com o doente este assunto, incluindo coloca-lo na Porta das Urgências, caso ele não consiga garantir o pagamento do tratamento, deviam ser os gestores destes serviços Financeiros, e nunca os Médicos".
Ou será que a Ordem aceita que devem ser os Médicos que também devem tratar estes assuntos monetários?
Não será isto uma cedência ao Mercantilismo e funcionalismo(?) da Medicina e dos Médicos?
Se sim, onde ficam os Juramentos de Hipócrates, as objecções (que, sendo pessoais, acho legítimas) relativamente ao Aborto, Eutanásia (compreendo, mas é terreno escorregadio...) etc. sempre tão evocados?
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