quinta-feira, 28 de novembro de 2024

GALOPIMITES

Por A. Galopim de Carvalho

Em Inícios de 2006, José Teixeira, da empresa Minermós, um dos comerciantes habituais na Feira de Minerais Gemas e Fósseis, no Museu Nacional de História Natural, telefonou-me de Porto de Mós, onde reside, solicitando-me que o recebesse, pois tinha algo que achara e lhe parecia único no contexto da grande diversidade de espécimens que conhecia nas muitas feiras internacionais que frequenta. 

Passados alguns dias, trouxe-me uma concreção de areia cuja forma faz lembrar as bem conhecidas Lössdols (bonecas de loess) resultantes da aglutinação de materiais detríticos muito mais finos (silte ou limo), arrastados e acumulados pelo vento.

Com este exemplar nas mãos, configurando um arenito pouco consolidado, notei que, friccionando-o com os dedos, libertava grãos de areia que, logo ali, observada à lupa, me pareceu idêntica à das nossas praias. Interessado em conhecer melhor este capricho da natureza, a que dei o nome de “bonecas-de-areia”, procedi ao seu estudo no campo, em Pedreira, um local na vertente ocidental da Serra dos Candeeiros, no interior de uma caverna, explorada no passado como areeiro, e solicitei ao investigador do Museu, João Cascalho, meu ex-aluno, que as analisasse no laboratório. O resultado deste trabalho foi apresentado em Setembro desse ano, ao VIII Congresso Nacional de Geologia, em Estremoz.
A história geológica destas concreções é simples e recente. Há uns escassos milhões de anos o mar cobria uma imensa faixa aplanada, hoje situada a cerca de 200m de altitude (plataforma pliocénica de Aljubarrota), mantendo aí um litoral arenoso. O vento, soprando de Oeste, varreu parte destas areias para o interior, criando depósitos do tipo das dunas que esbarraram de encontro à base da serra, invadindo quaisquer reentrâncias nela existentes, como é o caso da caverna em questão. 

Aí, as águas enriquecidas em carbonato e bicarbonato de cálcio, após o percurso no interior do maciço calcário, do Jurássico médio (Dogger), acabaram por cimentar parcialmente (cimento dito drúsico) a areia, gerando as ditas bonecas. José Teixeira, o seu achador, baptizou-as de “galopimites”, e é com este nome, ainda não homologado pela comunidade dos geólogos, que surgem agora nas feiras, à disposição dos coleccionadores e demais curiosos. 

O estudo microscópico, à lupa binocular, destas areias, depois de libertadas da referida película carbonatada, põe em evidencia a sua origem numa praia seguida de transporte pelo vento, para este local.

Essencialmente quártzicas, os seus grãos variam entre redondos e subarredondados, estando os maiores visivelmente marcados por picotado eólico, em resultado dos choques sofridos durante o transporte pelo vento. Além do quartzo, contêm algum feldspato e raros minerais acessórios.

Nota: Loess – internacionalização do termo alemão Löss, refere um depósito silto-argilo-calcário, não coeso, de origem eólica, depositado em regime periglaciário, com capacidade agrícola reconhecida. Descrito, pela primeira vez, na Europa central, em 1823, mas é no noroeste da china que tem o maior desenvolvimento. O termo Löss radica no germânico lösch, que significa solto, móvel.

1 comentário:

Anónimo disse...

Geralmente, vai para a China e outras partes do mundo quem é excluído no seu próprio país, pequenino, sem horizontes de futuro, a não ser o do marasmo da rotina diária que leva ao alto do outeiro de Sartre. Pobrezinhos, mas orgulhosos na sua pobreza de espírito…
Fernando Pessoa tinha de ser português para ser um grande poeta. Cansaço de ser nada, nostalgia do que poderia ter sido, inverno todo o ano, mediocridade granítica e secular e mesquinhez. Os bolores da alma fragmentam-nos e validam-nos como musgo de presépio sem presépio.

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