domingo, 2 de setembro de 2018

As "Aprendizagens Essenciais", agora homologadas, não são nem podem ser o único referencial de ensino e de aprendizagem


Mesmo no final de Agosto, na passada sexta-feira, dia 31, o Ministério da Educação homologou um novo conjunto de documento curriculares a que atribuiu a designação de "Aprendizagens Essenciais" para o Ensino Secundário, destinado aos Cursos Científico-Humanísticos, de Ciências e Tecnologias, Ciências Socioeconómicas, Línguas e Humanidades e Artes Visuais, que haviam estado em discussão pública no final do ano lectivo (cf. Despacho n.º 8476-A/2018).

É importante lembrar que nem os "Programas" nem as "Metas Curriculares" foram revogadas, pelo que continuam em vigor. Assim, este é o terceiro grupo de documentos que os professores terão de ter em conta para leccionarem as suas disciplinas. 

Em concreto, terão de ter em conta um triplo referencial para planificar, ensinar e avaliar: o "Programa", as "Metas Curriculares" e as "Aprendizagens Essenciais".

No mencionado despacho, na única alusão que se faz aos dois primeiros, não é isso que se dá a entender, mas sim que este último é "o" documento curricular de referência. Mais, que supera os problemas levantados pelos dois que o precedem (os quais, repito, se mantêm em vigor):
"A concretização destes objetivos partiu do reconhecimento da extensão dos documentos curriculares (programas e metas)"
Na página da Direcção-Geral da Educação é também isso que se afirma:
"Estes documentos curriculares [as "Aprendizagens Essenciais"] correspondem a um conjunto comum de conhecimentos a adquirir, identificados como os conteúdos de conhecimento disciplinar estruturado, indispensáveis, articulados conceptualmente, relevantes e significativos, bem como de capacidades e atitudes a desenvolver obrigatoriamente por todos os alunos em cada componente do currículo ou disciplina, tendo, em regra, por referência o ano de escolaridade ou de formação. As AE apresentam, ainda, o racional específico de cada disciplina, bem como as ações estratégicas de ensino orientadas para o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, visando o desenvolvimento das áreas de competências nele inscritas. As Aprendizagens Essenciais, em conjunto com o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, constituem-se como referencial de base para o planeamento e a realização do ensino e da aprendizagem, bem como para a avaliação interna e externa das aprendizagens dos alunos.
Ainda que no texto que sublinhei não conste a expressão "único referencial" (consta "referencial de base"), alguém menos avisado, mesmo sendo professor, poderá entender que a leccionação das disciplinas devem ter apenas em conta as "Aprendizagens Essenciais" (apoiadas, como o Ministério tem recorrentemente afirmado, num outro documento de âmbito geral designado por "Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória").

Reduzir o ensino às "Aprendizagens Essenciais", circunscrever-se a elas, não ir além delas, descuidando os "Programas", por princípio mais amplos, constitui um lamentável empobrecimento da aprendizagem que a Escola deve proporcionar. Isto porque a sua função é levar os alunos o mais longe possível em termos de desenvolvimento das suas capacidades, mas com base em conhecimento, o qual deve ser progressivamente ampliado e aprofundamento. É um erro afirma-se, como o Ministério faz, reproduzindo a "narrativa" curricular supra nacional, ditada por organismos poderosos mas não credenciados em Educação, que o aprofundamento implica redução.

Desta vez as entidades chamadas a participar na construção do currículo foram as associações de professores; algumas delas (poucas) conseguiram, presumo que com enorme esforço, manter e aperfeiçoar o constante nos Programas, mas a maioria seguiu o critério que a tutela estabeleceu de "reduzir para aprofundar". 

Esperemos que os seus colegas, nas escolas, tenham bem presentes finalidades últimas da educação, decidindo em função do que beneficia, de facto, directamente, os alunos e, indirectamente, a sociedade, entendida nas suas mais diversas acepções. Esperemos que não se confinem ao "essencial" nem se conformem com ele, que tentem chegar mais longe. Sei que muitos o farão, são os que assumem, muitas vezes em contra-corrente, a enorme responsabilidade que é ensinar para que os alunos possam aprender.

3 comentários:

Anónimo disse...

Através de palavras obscuras usadas em documentos oficiais, os pedagogos do Aprender a Aprender valem-se de muitas artimanhas para que os professores e educadores de infância cumpram diligentemente o seu objetivo principal, publicamente inconfessável, que é acabar com o ensino na escola, propalando aos quatro ventos que é preciso acabar com as dificuldades de aprendizagem dos alunos!
Sem subterfúgios retóricos, Aprendizagens Essenciais quer dizer a matéria que pode sair no teste, ou no exame que vale 30 %. O resto não interessa, logo não é preciso estudar. Quanto menos melhor! Até quanto?

Carlos Ricardo Soares disse...

Se essencial for o que eu quero aprender e não o que me querem ensinar as coisas complicam-se imenso. A maior parte das vezes aprendo no confronto entre o que me querem ensinar e o que quero aprender. Neste confronto penoso entra o músculo e o desconforto e a autoridade odiosa.
Conheço sistemas em que o ensino e a aprendizagem não significam sacrifício (palavra maldita).
Aprender e ensinar não devem, não podem, nem têm de ser um inferno de tortura e ranger de dentes.
Proponho que os defensores do sacrifício sejam integrados no sistema de ensino que preconizam (ainda não disseram qual é).

Anónimo disse...

A escola é um fruto que nasce e cresce a partir da necessidade de ensinar os ignorantes. Se o aluno não quer aprender o que o professor lhe quer ensinar, devia levar uma raposa para casa no fim do ano. No nosso sistema de ensino inclusivo, o aluno tem de suportar, por força da lei, o suplício de frequentar a escola até perfazer 18 anos de idade! Felizmente que ainda há juízes, sensatos e justos, com discernimento suficiente para libertarem cidadãos - que já sabem ler escrever e contar, mas não querem ser doutores à força -, da obrigação legal de frequentarem a Escola das Aprendizagens Essenciais, onde, de qualquer maneira, pouco ou nada se aprende, abrindo-lhes as portas para uma vida de maior felicidade!

CARTA A UM JOVEM DECENTE

Face ao que diz ser a «normalização da indecência», a jornalista Mafalda Anjos publicou um livro com o título: Carta a um jovem decente .  N...