Nascido em 1809, Charles Darwin tornou-se uma
das mais proeminentes referências científicas de todos os tempos; hoje seria o
seu 208º aniversário.
Contrariamente ao que é geralmente pensado, o
tópico da «transmutação» dos organismos já andava nos círculos científicos da
época. O avô do famoso Darwin, Erasmus Darwin, membro da «Lunar Society» (um
dos mais famosos ciclos de discussão científica do século XVIII) retrata este
controverso tópico na sua obra “The Botanical Garden”. Entre outras figuras
mais ou menos esquecidas pela história destaca-se o curador de invertebrados do
Muséum National d'Histoire Naturelle de Paris, também conhecido por cunhar o
termo «biologia», o famoso Jean-Baptiste Pierre Antoine de Monet, ou Chavelier
de Lamark. O feito que destaca os nomes de Charles Darwin e Alfred Russel
Wallace, este último co-descobridor da teoria da selecção natural, na história
é a sugestão de um mecanismo para a «transmutação» – a selecção natural.
Darwin e Wallace sugeriram que os organismos
melhor adaptados reproduzir-se-iam mais, passando assim as suas características
à próxima geração. Em contrapartida, organismos pouco adaptados reproduzir-se-iam
menos (morrendo em idades mais juvenis ou esforçando-se e gastando mais
recursos em actividades básicas) e as suas características seriam purgadas das
espécies com o passar do tempo. A ideia para este mecanismo parece ter surgido
independente a ambos os investigadores – a Darwin como resultado da sua viagem
(e leituras durante ela) pelo globo a bordo do HMS Beagle; e a Wallace através
de um delírio febril no meio de uma floresta tropical (nota: Wallace enviou o seu
manuscrito a Darwin antes de publicar e alguns historiadores sugerem a
possibilidade de Darwin se ter aproveitado de algumas ideias). No dia 1 de Junho de
1858 ambos leem um manuscrito conjunto numa reunião da Linnean Society “On the Tendency of Species to form
Varieties; and on the Perpetuation of Varieties and Species by Natural Means of
Selection”. Quis a história reconhecer Darwin pela publicação da “On
the Origin of Species by Means of
Natural Selection, or the Preservation of Favoured Races in the Struggle for
Life” (título completo). Esta obra reúne, num argumento
de mais de 500 páginas, uma argumentação estruturada a favor da ideia de
selecção natural, descrevendo de experiências conduzidas por Darwin ao longo de
20 anos e ideias suas em torno dos fósseis, selecção artificial, deriva de
continentes, ocorrência de subespécies e variedades, padrão de desenvolvimento,
hibridização de espécies, entre outros tópicos. Em 1870 Darwin escreve a
Wallace que poucas coisas o deixaram mais satisfeito do que a amizade entre os
dois, pois nunca nenhum havia sentido inveja, apesar de um certo sentido de
rivalidade.
Mas se hoje a teoria da selecção natural é uma
pedra basilar na biologia e tenha feito Darwin e Wallace dos cientistas mais
reconhecidos dos seus tempos, esta acabou por perder fulgor nas décadas finais
do século XIX. Por um lado, muitos cientistas tinham ideias sobre “mecanismos
de acção internos” que mantinham as espécies como entidades separadas e
«perfeitas» e não aceitavam sequer a ideia de evolução como opção válida. Por
outro lado, uma crítica mais construtiva referia-se ao facto de Darwin não
conseguir explicar os mecanismos de hereditariedade e criação de diversidade
entre espécies. Numa metáfora comum que expressa o pensamento da época dizia-se
que “ao misturarmos tintas de várias cores, acabamos sempre com um acinzentado passado
um certo número de misturas”. Darwin, na tentativa de lutar contra esta
dificuldade desenvolve a teoria da “pangénese”, onde defende que a passagem de
informação dos progenitores para as crias se dava por partículas pequenas
presentes nos órgãos reprodutivos a que designou de “gémulas”. Apenas com o
virar do século, já por 1920, a descoberta dos manuscritos de hereditariedade de
Gregor Mendel relançam a selecção natural. A inclusão da selecção natural e dos
princípios de hereditariedade mendelianos dão origem à “síntese moderna da
biologia evolutiva” cujos princípios têm sido estendidos, reinterpretados e são
hoje centrais para a biologia evolutiva.
Curiosidade final: A «famosa» revista Nature foi
fundada em 1869, 10 anos depois da publicação da origem das espécies por, entre
outros, Thomas Huxley. Huxley, também conhecido como o «Bulldogue de Darwin»
pela sua ferocidade na defesa da teoria da evolução, funda esta revista para
destacar e evidenciar manuscritos que discutem conceitos de selecção natural e
evolução!
Leituras sugeridas:
Evolution: The Remarkable History of a Scientific Theory; Edward J. Larson
José Cerca de Oliveira (Biólogo)
3 comentários:
A teoria de Darwin na sua forma pura e dura pretende explicar a origem das espécies, desde as formas mais simples até às formas mais complexas de vida. A verdade é que não consegue explicar. É uma teoria. Em oposição também o criacionismo mais duro levando à letra o relato bíblico do Genesis, não consegue impor-se racionalmente perante os conhecimentos científicos hoje existentes. Como surgiu a vida? Muito para descobrir ainda. Já dizia o Filósofo "só sei que nada sei". E digo eu: quanto mais sei, mais sei que sei muito pouco.
Francisco Correia
Meu caro CisFranco. Pois é verdade, todas as explicações em ciência assentam em teorias. Sem as teorias (científicas) não há explicações. Mas, depois, com base nas teorias (científicas), conseguimos fazer previsões de um detalhe e precisão que são imbatíveis. E sabe porquê? Porque essas teorias foram testadas milhões de vezes, directa ou indirectamente, e os resultados mostraram-se de acordo com elas. Está neste momento, provavelmente a usar wireless e isso é possível por causa de teorias sobre a radiação electromagnética. Nós sabemos que a multi-resistência aos antobióticos por estirpes de bactérias vai aumentar, por causa da teoria de evolução de Darwin. E esse vai ser um problema terrivelmente complicado, porque a indústria alimentar fornece antibióticos aos animais 'como protecção' ignorando estupidamente o que a teoria da evolução nos explica.
O criacionismo não é uma teoria, nem filosófica nem de outro tipo. É apenas uma tentativa de vender uma ideia que não está conforme a nenhuma evidência factual e científica.
Caro Paulo, concordo com quase tudo o que diz. Quanto aos antibióticos dos animais não sei se conhece bem o que se faz nesse campo. Há falhas, como em tudo, mas às vezes são mais as vozes do que as nozes... Certos objectivos são difíceis de cumprir a 100%.Quanto ao criacionismo, não pretende vender nada e embora na
sua forma mais dura já poucos o defendam, não deixa de ser uma explicação (noutras formas mais elaboradas) e portanto uma teoria. Bem sei que os não teistas dirão que tudo isto é treta, mas isso sempre foi assim e há-de ser: há crentes e não crentes.
Francisco Correia
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