"O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer diretrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas". Constituição da República Portuguesa (Artigo 43.º - Liberdade de aprender e ensinar)
"O Estado não pode atribuir-se o direito de programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas" Lei de Bases do Sistema Educativo (Artigo 2.º - Princípios gerais).
Nas leis fundamentais acima citadas, determina-se que o Estado não pode ir além das suas atribuições, as quais são de ordem pública, não de ordem privada e, muito menos, íntima. Em matéria educativa, o Estado não pode dirigir escolhas ou comportamentos nesta dupla ordem - privada e íntima -, que cabem - ou caberão um dia - aos que, no momento, são crianças e jovens. E também não as pode sugerir seja de que maneira for.
Isto é assim, mesmo que o faça em nome de (aparentes) bons princípios.
No respeitante a opções religiosas, político-partidárias, financeiras, sexuais... que se encontram legitimadas sob o ponto de vista jurídico e axiológico, o Estado democrático, de direito, deve manter-se escrupulosamente neutro. É sobre este Estado que me pronuncio, deixo de fora os que não são democráticos nem de direito.
Não pode, esse Estado, em que nos situamos, de modo expresso ou oculto, passar, na Escola, a ideia de que uma opção religiosa, político-partidária, financeira, sexual... é preferível a outra.
Deve, evidentemente, procurar que, ao longo da escolaridade, seja robustecida, em cada um, a capacidade para discernir, por si mesmo, o que está bem, o que está certo, à luz dos valores éticos, que são universais, e de valores morais, mais localizados (desde que estes não contrariem os éticos).
No robustecimento desta capacidade, que a todos diz respeito, que estrutura a vida pública, que consubstancia o bem-comum, o Estado não pode ser neutro. Nas palavras do filósofo Fernando Savater:
"Não pode nem deve haver neutralidade, por exemplo, no que corresponde à recusa da tortura, do racismo, do terrorismo, da pena de morte, da prevaricação dos juízes ou da impunidade da corrupção em cargos públicos, nem tão-pouco na defesa das protecções sociais da saúde ou da educação, da velhice ou da infância, nem no ideal de uma sociedade que corrija o mais possível o abismo entre opulência e miséria. Porquê? Porque não se trata de simples opções partidárias mas sim de benefícios da civilização humanizadora." (in O valor de educar)
A partidarização da inclusão do tema no currículo leva-o imediatamente para o campo da ideologia, que não pode entrar nas escolas.
É a liberdade, o direito inalienável à liberdade no respeito por princípios legais e éticos que a escola tem de ensinar e, evidentemente, de assegurar nos seus espaços, na esperança de que o aprendido seja transposto para a sociedade.
Termino com palavras retiradas de um artigo assinado por Valentim Alferes, investigador da Universidade de Coimbra (ver aqui).
"...desliza-se “suavemente” dos objectivos pedagógicos (...) para a inculcação de modelos ideológicos (...). Não importa que tais modelos possam ser ditos conservadores, reformistas ou progressistas, mas simplesmente registar que a pretensa neutralidade axiológica, frequentemente afirmada em nome de objectivos educativos generosos, constitui um elemento central no dispositivo de controlo (...) dos jovens pelos grupos e actores sociais que estão em condições de definir e concretizar as finalidades da acção educativa."
2 comentários:
Como professora quero o direito à neutralidade. Acho que a escola não se deve imiscuir em ideologias sexuais e de género. Essa educação deve ser dada pelos pais, segundo os seus padrões éticos e morais. Retiraria isso do currículo, por demais extenso.
Concordo que não haja neutralidade relativamente a qualquer ato de violência, verbal ou físico, o qual deve ser vigorosamente repudiado e até punido.
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