sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

35.º (E ÚLTIMO) POSTAL DE NATAL DE JORGE PAIVA: "AMBIENTE E DESILUSÃO"

Sem mais, reproduzo as fotografias e as palavras que compõem o último postal de Natal do Biólogo Jorge Paiva, Professor e Investigador na Universidade de Coimbra.
 
 
"Após mais de meio século de atividade cívica pelo Ambiente e pela Natureza, tenho plena consciência de ter sido uma luta improfícua. Proferi cerca de 2500 palestras de educação ambiental, na sua maioria em escolas. 
 
Os alunos sensibilizados e despertos para o desastre ambiental do Planeta Terra, a Gaiola que habitamos. No entanto, os jovens são de tal modo estimulados para o consumismo que, ao chegarem a adultos, esqueceram tudo o que ouviram. 
 
Reflexo disso, são os atuais políticos e governantes, mesmo aqueles que foram alertados para os problemas ambientais que nada fazem para tentar travar ou minimizar o desastre ambiental corrente e cujas primeiras consequências são bem visíveis.

Estamos a comemorar o 5.º Centenário do nascimento de Camões, sendo Os Lusíadas a sua obra poética mais estudada pelos alunos. Mas além do poema épico, Camões legou-nos abundante poesia lírica. Camões foi, pois, também um poeta lírico. Na minha atividade cívica pelo Ambiente e pela Natureza também fui um ´lírico`, por ter sonhado e acreditado conseguir sensibilizar e consciencializar os jovens. 

Camões é um valoroso e verdadeiro lírico, enquanto eu fui um ´lírico` irrealista. É penoso chegar ao limiar da vida com a consciência de não ter conseguido resultados nenhuns e de que a Gaiola em que vivemos está imunda, plena de poluição gasosa, líquida e sólida, muito quente, com frequentes incêndios, o nível médio oceânico a subir, as calotes de gelos polares e das altas montanhas a desaparecerem, tempestades com inundações devastadoras, grandes lagos a secarem e regiões do Globo a desertificarem, como, por exemplo, o Centro e Norte de Portugal montanhoso, já transformado num deserto rochoso.

O meu desalento é enorme. Por isso, este cartão que é o 35.º da série que distribui anualmente, é o último. Deixei de ser um ´lírico` e percebi que não vale a pena continuar com a atividade cívica de educação ambiental.

Apesar disso, não posso deixar de fazer os meus votos para que os nossos governantes se capacitem que é fundamental estabelecer e incrementar o rápido ordenamento florestal do país e humanizar novamente as nossas montanhas, para acabarmos com os piroverões, com consequente aumento da área do deserto rochoso das nossas montanhas."

Jorge Paiva, 2024

4 comentários:

Anónimo disse...

A culpa é de todos nós. A desilusão também.

Anónimo disse...

Estou desconfiada de que nós temos a paciência de esperarmos 20 ou 30 anos para nos desiludirmos e conseguimos! Portugal no seu melhor!

Anónimo disse...

Não hiperbolizemos!
A influência do Estado Português, no estabelecimento e aplicação de políticas conducentes a uma mitigação dos efeitos nefastos do aquecimento global, é menor do que a influência residual que tem na definição e execução das políticas educativas portuguesas, sendo estas forjadas, por defeito, por organizações internacionais e estados estrangeiros. Assim, o papel desempenhado por Jorge Paiva, no combate ao aquecimento global e aos fogos florestais em Portugal, assemelha-se ao consulado de Durão Barroso na governação da Europa e ao desempenho de António Guterres, enquanto secretário-geral da ONU, na condução dos destinos do mundo.

Álvaro Folhas disse...

Há momentos de desalento, mas esta é uma causa que se impõe, mesmo que seja uma batalha de David contra os Golias dos mercados e dos interesses económicos. Não podemos ter a ambição de conquistar todos, mas temos que ter esperanças nos que ficam do nosso lado.

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