Meu artigo no As Artes entre as Letras:
Ao Romper da Aurora, expressão que me lembra o início da letras de uma canção popular da Brigada Victor Jara (“Ao romper da bela aurora, vem o pastor da choupana…»), é o mais recente título de um livro do Professor António Marcos Galopim de Carvalho (n. Évora, 1931), que saiu, tal como a maioria dos outros seus livros, na Âncora, em Lisboa, a editora dirigida por António Baptista Lopes.
Todos já ouviram falar do Prof. Galopim de Carvalho, por vezes tratado
apenas por Prof. Galopim, ou, com carinho, por «avô dos dinossauros». O seu
nome ficou indelevelmente ligado a uma grande exposição de dinossauros
realizada em 1993 no Museu Nacional de História Natural, quando ele era director
dessa instituição. Há até uma escola que ostenta com orgulho o seu nome. Mas
menos pessoas terão lido os seus livros. Não sabem o que perdem.
Encontrei 134 títulos de obras da sua autoria no catálogo da Biblioteca
Nacional (alguns naturalmente reedições). O mais antigo são as Notas de Mineralogia
e Petrografia Portuguesa, escritas a meias com Maria de Lurdes Ubaldo e Ricardo
Quadrado, saído no Porto no já recuado ano de 1954 (ainda eu não tinha
nascido!). O mesmo catálogo permitiu-me saber que, no presente ano, já saiu,
para além do livro mencionado logo a abrir, a 3.ª edição de Com Coentros e Conversas
à Mistura, a 4.ª edição de O Avô e os Netos Falam de Geologia, e o
livro de Ligório Manuel Silva, Praias – Maravilhas de Portugal (no Centro
Atlântico), que tem um prólogo seu. O professor, com 93 anos, jubilado em 2001
do seu lugar de catedrático na Faculdade de Ciências na Universidade de Lisboa,
continua em grande forma a aumentar a sua lista bibliográfica. E continua a
fazer palestras. O El Corte Inglês de Lisboa, no Âmbito Cultural, anunciou um conjunto
de lições suas para breve. Tenho tido o gosto de acompanhar a sua extraordinária
actividade de divulgação científica: ele é, salvo erro, o decano dessa actividade
em Portugal. Devido à grande admiração e estima que tenho por ele, não hesito
quando me pede prefácios. Já fiz quatro: Conversas com os Reis de Portugal
(2013),
As Pedras e as Palavras. Mestre das Pedras e das Palavras (2015), Geologia e Geografia na Toponímia de
Portugal (2022), e Como
Bola Colorida: a Terra, Património da Humanidade», publicado originalmente em
2007 e reeditado em 2024, que contém um outro prefácio do saudoso José Mariano Gago.
A obra de Galopim de Carvalho é, além de muito numerosa., muito variada,
desde obras estritamente científicas, até obras sobre dinossauros (Dinosáurios:
uma Nova Visão, 2002), livros de divulgação da Ciências da Terra, como aqueles
para os quais escrevi os prefácios, livros infanto-juvenis (Contos da Dona
Terra, em co-autoria, Planeta Tangerina, 2008, traduzido para castelhano), manuais
escolares, um Dicionário de Geologia, livros de historias de base
auto-biográfica (O Cheiro da Madeira, 3.ª edição, 2002; Fora de
Portas: Memórias e Reflexões, 2008; O Preço da Borrega, 2.ª ed.,
2010; Évora, Anos 30 e 40, 2021) e até livros de cozinha, pois o
Professor gosta de preparar pitéus (Açordas, Migas e Conversas, 1.ª edição,
2018; Com Poejos e Outras Ervas, 2.ª edição, 2022).
O seu livro mais recente tem dois prefácios dos seus dois filhos: o jornalista especializado em música Nuno Galopim de Carvalho e o gemólogo (uma profissão mais aparentada à do pai) Rui Galopim de Carvalho. O primeiro prefácio intitula-se «Acordar com letras a saírem» e o segundo «É do meu pai que vou falar». O autor escreveu uma nota de abertura, que intitulou «À guisa de introdução», que sumaria a sua vida e explica o seu objectivo com os escritos agora reunidos.
Os
textos do Prof. Galopim estão dividas em capítulos: «Em família», «Um mar de experiências»,
«Pessoas», «Sociedade», «Filosofia, religião e arte, e «Escola pública». Os textos,
em geral pequenos, que ele escreveu de madrugada, como ele próprio afirma e os
filhos testemunham, pois gosta de se levantar da cama muito cedo e ir para o
computador ler e escrever, foram publicados no Facebook ou noutros sítios da
Internet (o livro é, aliás, dedicado aos leitores do Facebook e dos blogues) e
tratam dos mais variados assuntos, como os nomes dos capítulos sugerem. Tratam
da ciência e da vida, sempre numa prosa clara. Antes estavam apenas on-line,
mas agora ficaram fixados em papel à disposição dos felizes possuidores do
livro, entre os quais me incluo.
Não resistindo a dar um sabor da pena do Prof. Galopim, transcrevo o início
do último texto, «Escola Pública», exprimindo uma opinião que é relevante
salientar no regresso às aulas que as escolas estão a viver:
«Começo por reafirmar, o que já aqui escrevi muitas vezes, que considero os
professores, incluindo educadores, entre os mais importantes pilares da
sociedade e, uma vez mais, que é necessário e urgente conferir-lhes o estatuto,
a atenção e a dignidade compatível com essa importância.»
O Professor mantém participação das redes sociais, prolongando a sua
acção muito para além da escola. Ele tem feito o que pode para alargar o seu
raio de acção. Em particular, tem alimentado o blogue, que mantenho há muitos
anos, em colaboração com outros colegas (em especial, a Helena Damião, professora
de Ciências de Educação da Universidade de Coimbra), que se intitula De Rerum
Natura («Sobre a Natureza das Coisas»), tomado do célebre poema latino de
Lucrécio do século I. O Professor está sempre a mandar-nos textos. Agradeço-lhe
por isso. Continua, por favor, a mandar-nos a sua prosa, pois será sinal de que
a sua inteligência continua não apenas ao seu serviço, mas também ao nosso.
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