terça-feira, 17 de setembro de 2024

AO ROMPER DA AURORA

 Meu artigo no As Artes entre as Letras:

 Ao Romper da Aurora, expressão que me lembra o início da letras de uma canção popular da Brigada Victor Jara (“Ao romper da bela aurora, vem o pastor da choupana…»), é o mais recente título de um livro do Professor António Marcos Galopim de Carvalho (n. Évora, 1931), que saiu, tal como a maioria dos outros seus livros, na Âncora, em Lisboa, a editora dirigida por António Baptista Lopes.

Todos já ouviram falar do Prof. Galopim de Carvalho, por vezes tratado apenas por Prof. Galopim, ou, com carinho, por «avô dos dinossauros». O seu nome ficou indelevelmente ligado a uma grande exposição de dinossauros realizada em 1993 no Museu Nacional de História Natural, quando ele era director dessa instituição. Há até uma escola que ostenta com orgulho o seu nome. Mas menos pessoas terão lido os seus livros. Não sabem o que perdem.

Encontrei 134 títulos de obras da sua autoria no catálogo da Biblioteca Nacional (alguns naturalmente reedições). O mais antigo são as Notas de Mineralogia e Petrografia Portuguesa, escritas a meias com Maria de Lurdes Ubaldo e Ricardo Quadrado, saído no Porto no já recuado ano de 1954 (ainda eu não tinha nascido!). O mesmo catálogo permitiu-me saber que, no presente ano, já saiu, para além do livro mencionado logo a abrir, a 3.ª edição de Com Coentros e Conversas à Mistura, a 4.ª edição de O Avô e os Netos Falam de Geologia, e o livro de Ligório Manuel Silva, Praias – Maravilhas de Portugal (no Centro Atlântico), que tem um prólogo seu. O professor, com 93 anos, jubilado em 2001 do seu lugar de catedrático na Faculdade de Ciências na Universidade de Lisboa, continua em grande forma a aumentar a sua lista bibliográfica. E continua a fazer palestras. O El Corte Inglês de Lisboa, no Âmbito Cultural, anunciou um conjunto de lições suas para breve. Tenho tido o gosto de acompanhar a sua extraordinária actividade de divulgação científica: ele é, salvo erro, o decano dessa actividade em Portugal. Devido à grande admiração e estima que tenho por ele, não hesito quando me pede prefácios. Já fiz quatro: Conversas com os Reis de Portugal (2013), As Pedras e as Palavras. Mestre das Pedras e das Palavras (2015),  Geologia e Geografia na Toponímia de Portugal (2022), e Como Bola Colorida: a Terra, Património da Humanidade», publicado originalmente em 2007 e reeditado em 2024, que contém um outro prefácio do saudoso José Mariano Gago.

A obra de Galopim de Carvalho é, além de muito numerosa., muito variada, desde obras estritamente científicas, até obras sobre dinossauros (Dinosáurios: uma Nova Visão, 2002), livros de divulgação da Ciências da Terra, como aqueles para os quais escrevi os prefácios, livros infanto-juvenis (Contos da Dona Terra, em co-autoria, Planeta Tangerina, 2008, traduzido para castelhano), manuais escolares, um Dicionário de Geologia, livros de historias de base auto-biográfica (O Cheiro da Madeira, 3.ª edição, 2002; Fora de Portas: Memórias e Reflexões, 2008; O Preço da Borrega, 2.ª ed., 2010; Évora, Anos 30 e 40, 2021) e até livros de cozinha, pois o Professor gosta de preparar pitéus (Açordas, Migas e Conversas, 1.ª edição, 2018; Com Poejos e Outras Ervas, 2.ª edição, 2022). 

O seu livro mais recente tem dois prefácios dos seus dois filhos: o jornalista especializado em música Nuno Galopim de Carvalho e o gemólogo (uma profissão mais aparentada à do pai) Rui Galopim de Carvalho. O primeiro prefácio intitula-se «Acordar com letras a saírem»  e o segundo «É do meu pai que vou falar». O autor escreveu uma nota de abertura, que intitulou «À guisa de introdução», que sumaria a sua vida e explica o seu objectivo com os escritos agora reunidos. 

Os textos do Prof. Galopim estão dividas em capítulos: «Em família», «Um mar de experiências», «Pessoas», «Sociedade», «Filosofia, religião e arte, e «Escola pública». Os textos, em geral pequenos, que ele escreveu de madrugada, como ele próprio afirma e os filhos testemunham, pois gosta de se levantar da cama muito cedo e ir para o computador ler e escrever, foram publicados no Facebook ou noutros sítios da Internet (o livro é, aliás, dedicado aos leitores do Facebook e dos blogues) e tratam dos mais variados assuntos, como os nomes dos capítulos sugerem. Tratam da ciência e da vida, sempre numa prosa clara. Antes estavam apenas on-line, mas agora ficaram fixados em papel à disposição dos felizes possuidores do livro, entre os quais me incluo.

Não resistindo a dar um sabor da pena do Prof. Galopim, transcrevo o início do último texto, «Escola Pública», exprimindo uma opinião que é relevante salientar no regresso às aulas que as escolas estão a viver:

«Começo por reafirmar, o que já aqui escrevi muitas vezes, que considero os professores, incluindo educadores, entre os mais importantes pilares da sociedade e, uma vez mais, que é necessário e urgente conferir-lhes o estatuto, a atenção e a dignidade compatível com essa importância.»

O Professor mantém participação das redes sociais, prolongando a sua acção muito para além da escola. Ele tem feito o que pode para alargar o seu raio de acção. Em particular, tem alimentado o blogue, que mantenho há muitos anos, em colaboração com outros colegas (em especial, a Helena Damião, professora de Ciências de Educação da Universidade de Coimbra), que se intitula De Rerum Natura («Sobre a Natureza das Coisas»), tomado do célebre poema latino de Lucrécio do século I. O Professor está sempre a mandar-nos textos. Agradeço-lhe por isso. Continua, por favor, a mandar-nos a sua prosa, pois será sinal de que a sua inteligência continua não apenas ao seu serviço, mas também ao nosso.

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