Meu depoimento no número de aniversário da revista «As Artes entre as Letras»:
O tempo é um grande mistério. Passa inexoravelmente e nós com ele. Sempre
do passado para o futuro: fazemos história com o passado e não podemos fazer
história do futuro (o padre António Vieira foi a excepção que confirmou a
regra). A fundação da revista «As Artes entre as Letras» pela jornalista
Nassalete Miranda no ano de 2009 já faz parte da nossa história cultura e, pese
embora todas as incertezas, está-lhe destinado um bom futuro. Desaparecidos os
suplementos literários dos jornais, fazia e faz falta uma revista no Norte que plasmasse
a riqueza e variedade cultura que abunda nessa região do país.
Orgulho-me de ter estado desde o início do empreendimento, participando em
tudo o que me foi pedido. Hoje e desde há já algum tempo (nem me lembra quando)
participo com uma coluna mensal em que falo de livros e temas de ciência – e
não só, porque a ciência não é uma ilha e comunica com imensos territórios. Colaborei
sempre com o maior gosto. Sinto-me parte de uma comunidade que aprecia e
defende as artes e as letras (e também, como mostra a minha coluna, a ciência,
pois esta, sendo parte da cultura, gosta de estar no meio das artes e as
letras). É-me grato verificar que existe um público interessado na cultura, que
amiúde colabora na revista com as suas próprias produções. A cultura – na forma
de letras, artes ou ciências - é um bem comum.
2009 foi ontem, mas parece que foi há muito tempo. Foi o ano em que Barack
Obama começou o seu primeiro mandato de presidente dos Estados Unidos (nesse
mesmo ano ganhou o Prémio Nobel da Paz). Foi o ano em que ainda se sentia no
mundo a grave crise económica de 2008 (em Portugal chegaria de forma violenta
em 2011). Foi o ano em que a Rússia cortou o fornecimento e gás natural à
Europa através da Ucrânia. Foi o ano em
que entrou formalmente em vigor o tratado e Lisboa. Foi o ano da gripe suína, uma
pandemia global que assustou muita gente. Foi o Ano Internacional da
Astronomia, comemorando os 400 anos das primeiras observações com o telescópio
realizadas por Galileu. Foi o ano em que um piloto americano fez uma bem-sucedida
aterragem de emergência no rio Hudson, em Nova Iorque. Foi o ano em que foi
reparado o telescópio Hubble. Foi o ano em que o filme mais popular – e um dos
mais populares de sempre – foi o «Avatar», de James Cameron (que tem formação em
Física). Foi o ano em que morreu Michael
Jackson. Ainda se lembram?
Em Portugal, o ano de 2009 foi dominado por eleições europeias ganhas com
alguma surpresa pelo PSD e pela vitória muito clara nas eleições legislativas do PS, encabeçado por José Sócrates,
embora perdendo a maioria absoluta que tinha ganho quatro anos antes (o CDS de
Paulo Portas teve 10,4% dos votos…).
Em 2022, no fim de uma pandemia, estamos a assistir a uma guerra
assustadora entre a Rússia e a Ucrânia. Na economia internacional cresce a inflação.
E estamos confrontados com um dos maiores problemas da humanidade - as alterações climáticas – que nos desafiam a
todos. Em Portugal começou o seu mandato de um governo de maioria absoluta, que dispõe de mundos e
fundos vindos da União Europeia.
Não é apenas a cultura, incluindo nela a ciência, que nos vai valer,
abrindo-nos as luzes do futuro. É preciso, nestes tempos incertos, encontrar em
nós a esperança necessária. A esperança é, de resto, um dos alicerces da cultura.
Longa vida ao «As Artes entre as Letras»!
Carlos Fiolhais
1 comentário:
Sempre brilhante nas suas análises. É um dos blogs que mais procuro todas as semanas. Tenho saudades das conferencias organizadas por si através do zoom onde periodicamente nos ia dando a conhecer vultos ligados às várias áreas do conhecimento.
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