quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Até ver, Manuel Heitor não é melhor do que Crato

Artigo de opinião de Daniel Oliveira no Expresso:

Se há áreas onde se sente uma vontade reformista (sim, as reformas não passam obrigatoriamente por destruir os serviços públicos) neste governo, como na educação, outras não só não mudaram quase nada do que herdaram como até pioraram o que de mal tinha sido feito. Um exemplo disso é o da Ciência e Tecnologia. Podia dizer-se que Manuel Heitor herdou bom trabalho feito e, por isso, só teve de continuar sem grandes alterações. Não é o caso. Manuel Heitor herdou o mesmo que Tiago Brandão: quatro anos de uma clamorosa incompetência de Nuno Crato. Mas se na educação se está a tentar corrigir o rasto de destruição deixado – este foi um dos primeiros inícios de ano letivo sem grandes polémicas ou problemas –, na Ciência e Tecnologia tudo parece estar na mesma.

Há muita coisa que se pode dizer sobre a herança deixada por Mariano Gago a Crato e Heitor. Até porque ela é contraditória. Se é verdade que foi ele que criou uma verdadeira política de ciência em Portugal, é impossível negar que o preço disso, até por causa da origem e natureza do financiamento, foi uma cultura de precariedade extrema. Nas contratações de pessoal já quase tudo parece ser possível: chegámos ao ponto de se utilizarem bolsas de gestão de ciência e tecnologia (BGCT) para colmatar a carência de funcionários nas instituições públicas, como contratar eletricistas e pessoal de secretariado (não é anedota, aconteceu e continua a acontecer) e técnicos para análise estatística, em violação do Estatuto do Bolseiro. Mas mesmo quem trabalha realmente na produção de conhecimento científico e tecnológico parece viver no mundo das empresas de trabalho temporário. Na investigação e na ciência paga-se para talvez um dia conseguir trabalhar, sempre sem qualquer perspetiva de futuro.


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