Filamentos e tubos de microfósseis encontrados no Canadá - Matthew Dodd
É atribuída ao filósofo
alemão Martin Heidegger a frase “as origens escondem-se sob os começos”! Esta
citação adequa-se à questão de sabermos quando é que a vida terá surgido no
nosso planeta. É uma questão ainda sem resposta definitiva e assim poderá continuar
por muito tempo. É que para sabermos quando é que as primeiras formas de vida
unicelulares surgiram, é preciso encontrar registos fósseis dessa ocorrência. E
isso é muito pouco provável. É muito difícil identificar e encontrar em rochas,
com milhares de milhões de anos, fósseis de células delimitadas só por uma
membrana lipídica. A vida primordial dificilmente deixou assinaturas directas
da sua existência. A procura tem, assim, de ser indirecta.
Apesar dessa dificuldade,
têm vindo a ser descobertas estruturas minerais designadas por estromatólitos,
encontradas na Austrália Ocidental, na África do Sul e na Gronelândia, em rochas muito antigas com idades
estimadas entre 3500 milhões e 3700 milhões de anos. Os cientistas propõem que
esses estromatólitos são o resultado da actividade microbiana que acumulou
grãos de metais como o ferro. Diga-se, apropriadamente, que estas estruturas
são actualmente também encontradas em fontes hidrotermais ricas naquele metal,
no fundo dos oceanos, resultado da actividade de bactérias conhecidas que usam
ferro no seu metabolismo energético.
Afinal, a vida microbiana
deixa uma impressão mineral da sua existência. Eis um caminho para a descoberta
das primeiras formas de vida unicelular!
Na revista Nature desta
semana foi publicado um artigo cujo primeiro autor é o biogeoquímico
Matthew Dodd, da University College de Londres, que apresenta a descoberta de microfósseis em rochas
cuja idade é estimada entre 3770 milhões e 4280 milhões de anos!
Estes microfósseis, só visíveis ao microscópio, que estavam aprisionados entre
camadas de quartzo, são formados por pequenos filamentos e tubos compostos por
óxidos de ferro. Os microfósseis foram encontrados em rochas que se encontram
mais precisamente na costa da Baía de Hudson a Nordeste do Quebeque, no Canadá. Os autores do artigo
propõem que terão sido formados por microorganismos, pois não encontraram
alguma explicação geológica para a sua formação.
Assim sendo, estes microfósseis constituem a evidência
mais antiga até agora descoberta da existência de vida na Terra. O espantoso, é
que isto implica que a vida terá surgido no nosso planeta só algumas centenas
de milhões de anos depois da sua formação, há cerca de 4500 milhões de
anos!
Outro aspecto, muito interessante e surpreendente desta descoberta, é o de
que a presença de óxidos de ferro implica que nessa época remota já existisse
suficiente oxigénio molecular livre para reagir com o ferro. É tentadora a
hipótese de a origem desse oxigénio molecular ser produto da actividade dessas
formas primevas de vida.
Contudo, a
associação descrita neste artigo de vida microbiana a estas estruturas minerais
precisa de ser comprovada por outros cientistas, de forma independente. É assim
que a ciência funciona. E opiniões contrárias já foram emitidas por alguns
cientistas que não participaram na descoberta. Por exemplo, Nicola
McLoughlin, uma especialista em paleontobiologia da Universidade Rhodes, na
África do Sul, que não participou do estudo, referiu à BBC News que "a
morfologia desses supostos filamentos de ferro oxidado no norte do Canadá não é
convincente” e não descarta propostas alternativas de origem geológica para a
sua formação.
A ciência acende-se sob a luz da origem da vida!
António
Piedade
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