sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

O ERRO DE EINSTEIN


Minha crónica no "Público" de hoje (na foto do Congresso Solvay de 1911, Madame Curie, sentada no meio, é a única mulher; Paul Langevin está de pé na extrema direita, ao lado de Albert Einstein):

As Nações Unidas decidiram que 2011 seria o Ano Internacional da Química, pretendendo celebrar os extraordinários resultados obtidos por essa ciência e as suas contribuições para o bem estar da Humanidade. Para essa decisão pesou o facto de passar um século desde que foi atribuído o Prémio Nobel da Química a Madame Curie. Foi o segundo Nobel que ela recebeu, desta vez sozinha, depois de oito anos antes ter partilhado o Nobel da Física com o seu marido Pierre Curie e com Antoine Henri Becquerel. Até hoje, a francesa de origem polaca é a única pessoa que recebeu dois prémios Nobel de disciplinas científicas diferentes. Não é, por isso, de estranhar que este ano se celebre também a contribuição das mulheres para a ciência.

A ascensão das mulheres na ciência foi prodigiosa no último século. Numa famosa fotografia do Congresso Solvay em 1911, Madame Curie é a única presença feminina em 24 retratados. Hoje, em muitos congressos de física ou de química, há uma representação quase paritária dos dois géneros.

Em Portugal, esse progresso foi particularmente nítido. Em 1911 começou a dar aulas na Universidade de Coimbra a primeira professora do ensino superior português: a filóloga de origem alemã Carolina Michaelis de Vasconcelos, que, no ano seguinte, entrou, não sem discussão interna, na Academia de Ciências de Lisboa. No meu livro Breve História da Ciência em Portugal (com Décio Martins, Gradiva e Imprensa da Universidade de Coimbra, 2010), que fala da ciência até 1974, apenas é referida uma mulher, Matilde Bensaúde, pioneira da genética entre nós no início do século passado. Actualmente o país pode orgulhar-se não só da quantidade como da qualidade das nossas mulheres cientistas (parabéns, Maria do Carmo Fonseca, pelo Prémio Pessoa!). Temos uma das percentagens mais elevadas de mulheres na ciência na Europa e até no mundo: Portugal, nas estatísticas europeias de 2008, aparece em quinto lugar na percentagem de investigadoras, com 45 por cento, quando a média da União Europeia não chega a 30 por cento.

Apesar de ter sido premonitória da chegada maciça das mulheres à ciência, a notícia da atribuição do Nobel a Marie Curie há cem anos foi ofuscada, na imprensa francesa e internacional, por um escândalo, irrompido pouco antes, sobre uma sua ligação amorosa com o físico Paul Langevin, que era seu colega e tinha sido discípulo de Pierre Curie (Madame Curie era viúva há cinco anos, mas Langevin era casado). Por obra e graça de um wikileaks doméstico, um jornal francês publicou cartas de amor entre os dois, facto que motivou um duelo à pistola entre Langevin e um jornalista (nenhum dos dois chegou a disparar). Não faltou quem denegrisse a ilustre físico-química chamando-lhe uma estrangeira perigosa para os lares franceses. E, por causa desse affaire, alguns membros da academia sueca tentaram que ela não fosse receber o prémio a Estocolmo. Mas Marie Curie não hesitou em ir, alegando que o motivo do prémio - a descoberta de dois novos elementos químicos, o rádio e o polónio - nada tinha que ver com a sua vida privada. Madame Langevin conseguiu logo a seguir o divórcio com a custódia dos seus filhos sem que o tribunal tivesse mencionado o nome da dupla laureada Nobel. Esta e Langevin (os dois a uma distância prudente na fotografia do Congresso Solvay, pois na altura o caso era escaldante) acabaram por se afastar, seguindo destinos diferentes. Mas, por uma daquelas ironias em que o acaso é fértil, os genes de um e de outro viriam a cruzar-se mais tarde, quando uma neta de Curie se casou com um neto de Langevin...

E Einstein? Qual foi, afinal, o erro de Einstein? Einstein achava que as mulheres não tinham aptidão para a ciência por não serem criativas. Apesar disso, nutria sincera admiração por Madame Curie, considerando-a uma excepção à regra. Tal não o impediu de comentar a um amigo que ela “não era suficientemente atraente para ser perigosa para quem quer que seja”. Einstein cometeu erros. Mas a depreciação que fez das mulheres foi, decerto, o seu maior erro.

O que explica os resultados PISA?

Pergunta de Pedro S. Martins, professor de Economia em Londres, aqui.

O jogo dos economistas


Habitual destaque para a crónica de J.L. Pio Abreu no "Destak":

"Depois de se meterem no buraco no início de uma crise que não souberam prever, eis que se levantam, de novo, os economistas de palco cheios de receitas para os nossos males. Não os suporto. A satisfação arrogante com que nos propõem o mais miserável destino e as mais contraditórias soluções, põe-me os cabelos em pé.

Senhores da fortuna e da desgraça, todos se armam em deuses, sabendo que são deuses menores porque tudo depende dos políticos que neles delegaram as responsabilidades. Mas que fazem eles, os economistas?

Nos negócios e empregos que têm, eles são os actores e os principais beneficiários do jogo económico. Nas Universidades, ditam as regras desse jogo. Nos Governos ou na influência que têm, eles apoderam-se também do campo de jogo onde, por suposto, jogam todos os cidadãos.

Usam palavras esotéricas, estrangeiradas, com que disfarçam os lances que executam. Nenhum deles aprendeu Matemática, e apenas lida com contas simplórias, feitas de percentagens, somas e subtracções, ao alcance de um computador ou de qualquer contabilista que conheça o significado das palavras. Mas é um jogo onde são jogadores, árbitros, donos do campo e ainda ditam as regras. Assim, qualquer um ganhava.

Todo o seu discurso, no fim de contas, se destina a ocultar uma verdade que, incluindo eles, todos conhecem: a única coisa que produz riqueza é o trabalho humano. A contabilidade serve apenas para a distribuir. E mal."

J. L. Pio de Abreu

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Carlos Queiroz vítima de autêntica chacina pública

“Os bons vi sempre passar/No mundo graves tormentos;/E para mais me espantar/ Os maus vi sempre nadar/ Em mar de contentamentos” - Luíz Vaz de Camões.


Neste blogue, vezes várias, na altura que sobre ele recaíam severas e injustas críticas durante e depois do último "Campeonato do Mundo de Futebol", fui defensor público de Carlos Queiroz, seleccionador nacional de futebol, licenciado em Educação Física e professor da disciplina de Futebol no ISEF/Faculdade de Motricidade Humana (UTL). Foi, por isso, com agrado e mesmo júbilo que vi publicada num jornal desportivo a notícia que a seguir transcrevo, sem grandes comentários havidos por mim desnecessários:

“O antigo campeão do Mundo em Riade, em 1989, Amaral, considera que foi «uma autêntica chacina pública» o tratamento dado a Carlos Queiroz no seu regresso à Federação Portuguesa de Futebol.

«Só tenho pena que não tenha tido a noção que estava bem no Manchester e que não tinha nada que regressar, mas isso foram opções do professor», adiantou hoje à margem da Gala dos Campeões de Riade.

O também antigo jogador do Sporting e Benfica adiantou que a tentativa de voltar a mudar o futebol português por parte de Queiroz não foi entendida pela grande maioria das pessoas.

«Não sou defendor de Queiroz, apenas tenho olhos na cara para ver o que fez pelo futebol nacional. O seu regresso foi um sonho para ele, para tentar fazer pela equipa principal o que fez pelas selecções jovens e foi incompreendido, atacado, acabando por prejudicá-lo e prejudicar o futebol português.»

Amaral chegou ainda a traçar algumas diferenças entre as duas gerações (a de 1989 e 1991 que alcançaram os títulos de campeões do Mundo sub-21)

'Conseguimos alcançar o que nunca ninguém imaginaria ser possível. Temos que ter a noção e assumirmos que fomos responsáveis pela maior mudança do futebol português e estamos cientes que é bastante difícil voltar a haver uma geração como a nossa, o que não significa que não venha a acontecer. O que tivemos que falta agora? Fomos fortes a nível de grupo. Éramos muito amigos e coesos e, acima de tudo, fomos jogadores inteligentes que conseguimos entender as palavras e a mensagem do professor Carlos Queiroz', remata.

As declarações foram feitas à margem da apresentação da Gala dos Campeões, que vai precisamente juntar as duas gerações de campeões do Mundo, que se vão defrontar no próximo sábado, às 14.30 horas, no estádio do Cova da Piedade, não só para marcar a reunião dos antigos campeões como para ajudar a instituição de solidariedade 'Janela Aberta', para a qual irão reverter as receitas do encontro”
(in “A Bola”, o6/01/2011).

Recordo que ninguém é profeta na sua própria terra, apesar dos elogios que lhe teceu Sir Alex Ferguson, o conceituadíssimo treinador do Manchester United, de quem foi adjunto durante vários anos, que se deslocou a Portugal para servir de testemunha abonatória no processo que lhe foi movido pela Federação Portuguesa de Futebol. Abstenho-me de adjectivar, esse processo em respeitoem primeiro lugar para comigo próprio e depois para não ferir a susceptibilidade de pessoas responsáveis por ele, que tomaram atitudes persecutórias nada abonatórias do espírito dos agentes do mundo do Desporto.

Na fotografia: A equipa de futebol portuguesa, campeã do mundo em Riade/89. Carlos Queiroz, numa altura em que era "bestial" para a Federação Portuguesa de Futebol, é o 4.º a contar da esquerda na fila do meio. "Ó tempore, ó mores!"

O mal-estar na profissão docente

A partir dos anos de 1970, a investigação do ensino começou a dar atenção especial à pessoa que o professor é, e ao contexto escolar em que ele está integrado. Isto para melhor se perceber o seu trabalho.

De entre as diversas linhas de estudo que se organizaram, uma das mais produtivas é a que se tem dedicado ao mal/bem-estar na profissão, sendo que a maior parte dos trabalhos publicados incidem no primeiro aspecto.

Em Portugal, nesta matéria, têm-se por incontornáveis os trabalhos de José Esteve, professor da Universidade de Málaga, onde se esclarece que o mal-estar docente é um conjunto de reacções dos professores à mudança social, as quais se traduzem no sentimento de desajustamento em relação à profissão e na impotência para a exercer de modo correcto.

As pesquisas de carácter empírico que realizou permitiram-lhe apurar dois grupos de factores que contribuem para a formação de tais reacções:
- factores de primeira ordem “que incidem directamente sobre a acção do professor na sala de aula, modificando as condições em que desempenha o seu trabalho” e
- factores de segunda ordem que se referem “às condições ambientais, ao contexto em se exerce a docência” e sobre os quais o professor não tem controlo directo.
Além disso, identificou várias fontes de mal estar:
1) aumento das exigências sobretudo devido ao desempenho de novas tarefas que não são acompanhadas pela formação adequada;
2) inibição educativa de outros agentes de socialização. Por exemplo, ensinar certas atitudes, que tradicionalmente eram da competência da família;
3) desenvolvimento de fontes de informação alternativas à escola, o que implica uma revisão do papel do professor;
4) ruptura do consenso social sobre o que deve ser a educação escolar: de um certo acordo tradicional passou-se para uma pluralidade de opiniões;
5) aumento das contradições no exercício da docência: o professor desempenha papéis que não são de fácil conciliação, por exemplo, prestar apoio afectivo e classificar;
6) mudanças de expectativas em relação ao sistema educativo: de um ensino de elite, baseado na selecção e competência passou-se para um ensino de massas mais incapaz de assegurar um trabalho adequado dos alunos;
7) modificação do apoio da sociedade ao sistema educativo: parece existir a ideia de que os professores são os únicos culpados do funcionamento escolar;
8) menor valorização social do professor, sendo o aspecto económico um revelador desta situação;
9) mudança dos conteúdos curriculares, devido ao extraordinário avanço das ciências e à transformação das exigências sociais;
10) escassez de recursos materiais e deficientes condições de trabalho;
11) mudança das relações professor-aluno: o grande número de alunos, as características particulares de alguns, a falta de autoridade do professor são exemplos de aspectos que contribuem para tal;
12) fragmentação do trabalho, dado que o professor é chamado a desempenhar múltiplos funções o que além de provocar dispersão é impeditivo de um desempenho adequado.
Batem certos, portanto, os resultados da investigação de Esteve com a espontaneidade patente no texto Querem que eu dê aulas!?
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Referências:
ESTEVE, J. (1991). Mudanças sociais e função docente. A. NÓVOA (dir.) (1991). Profissão professor. Porto: Porto Editora, 93 e seg.
ESTEVE, J. (1992). O mal estar docente. Lisboa: Escher.

GRANDES ERROS: PERCEPÇÃO EXTRA SENSORIAL DE IMAGENS ERÓTICAS





















Um amigo chamou-me a atenção para a notícia do "New York Times" de 5 de Janeiro, segundo a qual está prestes a ser publicado num prestigiado jornal de psicologia um artigo da autoria de um prestigiado psicólogo experimental (professor jubilado na Universidade de Cornell, nos EUA) que indicia a existência de um certo tipo de percepção extra-sensorial.

Numa das experiências relatadas os estudantes universitários, habituais cobaias deste tipo de testes (há quem diga que se sabe muito sobre a psicologia dos estudantes e pouco sobre a psicologia das outras pessoas!), conseguiriam adivinhar (53 por cento), mais do que seria dado pelo simples acaso (50 por cento), em qual dos lados, direito ou esquerdo, de um ecrã vai aparecer uma imagem erótica. A colocação da imagem é escolhida ao acaso por um computador depois da escolha humana ter sido efectuada. Quer dizer, antes de se saber onde está o nu já a maioria dos estudantes sabe onde vai estar. A mim o que mais me intriga é isso só funcionar para esse tipo de imagens...

O artigo, apesar de aprovado por refereeing anónimo, está sob severo escrutínio. A experiência será repetida por outros. De qualquer modo três por cento é uma margem pequena e especialistas dizem que a análise estatística está a ser mal feita. A estatística, como se sabe, consegue, bem torcida e retorcida, dar para tudo. Um dito bem conhecido assegura que "a estatística é como o biquini: o que mostra é sugestivo, mas o que esconde é essencial." Neste como noutros casos talvez seja um dito apropriado...

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Querem que eu dê aulas!?...

Retrato fiel da tragicomédia do ensino acabado de chegar à minha caixa de correio.

Faço projectos, planos, planificações;
Sou membro de assembleias, conselhos, reuniões;
Escrevo actas, relatórios e relações;
Faço inventários, requerimentos e requisições;
Escrevo actas, faço contactos e comunicações;
Consulto ordens de serviço, circulares, normativos e legislações;
Preencho impressos, grelhas, fichas e observações;
Faço regimentos, regulamentos, projectos, planos, planificações;
Faço cópias de tudo, dossiers, arquivos e encadernações;
Participo em actividades, eventos, festividades e acções;
Faço balanços, balancetes e tiro conclusões;
Apresento, relato, critico e envolvo-me em auto-avaliações;
Defino estratégias, critérios, objectivos e consecuções;
Leio, corrijo, aprovo, releio múltiplas redacções;
Informo-me, investigo, estudo, frequento formações;
Redijo ordens, participações e autorizações;
Lavro actas, escrevo, participo em reuniões;
E mais actas, planos, projectos e avaliações;
E reuniões e reuniões e mais reuniões!...
E depois ouço, alunos, pais, coordenadores, directores, inspectores, observadores, secretários de estado, a ministra e, como se não bastasse, outros professores, e a ministra!...
Elaboro, verifico, analiso, avalio, aprovo;
Assino, rubrico, sumario, sintetizo, informo;
Averiguo, estudo, consulto, concluo,
Coisas curriculares, disciplinares, departamentais,
Educativas, pedagógicas, comportamentais,
De comunidade, de grupo, de turma, individuais,
Particulares, sigilosas, públicas, gerais,
Internas, externas, locais, nacionais,
Anuais, mensais, semanais, diárias e ainda querem mais?
Que eu dê aulas!?...

Power Unbalance, novo episódio

É certo que numa sociedade moderna e democrática todos temos a liberdade de acreditar no que quisermos, bem como a liberdade de tornar públicas as nossas crenças. Também somos livres de doar parte da nossa força de trabalho ou do nosso património a uma qualquer entidade do nosso agrado.

No entanto, no que respeita às pulseiras Power Balance, não se trata de uma questão de fé. Trata-se da comercialização de um produto a que se atribui um certo número de propriedades e efeitos. É certo que quem o comercializa não é obrigado a garantir a sua eficácia junto de 100% da população. Por exemplo, a esmagadora maioria dos medicamentos pode, em situações raras e devidamente quantificadas, agravar os sintomas que supostamente combatem. Quem comercializa estas pulseiras deve no entanto demonstrar que aquilo que afirma tem algum suporte e legitimidade.

Talvez o problema não resida tanto no facto de o público em geral não saber que uma frase como "o holograma quântico reequilibra as energias electromagnéticas naturais do organismo" revela um óbvio e deliberado charlatanismo. Em rigor, eu também não sei avaliar a frase "O modo de acção da alfa-amilase no edema inflamatório caracteriza-se por hidrólise com os polissacáridos de exsudado inflamatório", que encontrei no folheto do medicamento Maxilase. O problema está na aparente falta de interesse pelas declarações de centenas de cientistas competentes que em todo o mundo têm denunciado esta fraude. Aparentemente essas declarações não têm grande impacto nas vendas da Power Balance. Devemos infelizmente concluir que as enormes conquistas da ciência não foram ainda suficientes para merecer uma maior confiança por parte do grande público, e que um produto com estas características pode ainda tornar-se num enorme sucesso de vendas a nível mundial.

Mas ainda bem que nalguns países existe uma regulação séria da actividade comercial. Depois do caso espanhol, foi a vez da Australian Competition and Consumer Comission (ACCC) enconstar a Power Balance à parede. A Power Balance foi obrigada a admitir que incorreu em publicidade enganosa e em "misleading and deceptive conduct". A Power Balance ficou também obrigada a publicitar a não-existência de estudos científicos que comprovem o efeito das pulseiras e a reembolsar os seus clientes insatisfeitos. A ACCC emitiu ainda um aviso dirigido aos revendedores de retalho, que poderão igualmente vir a ser alvo de sanções. Em Portugal vinha mesmo a calhar, confesso que estou um pouco cansado de ver estas pulseiras à venda em...farmácias.

O leitor poderá consultar aqui o sítio da ACCC e aqui a notícia do Público-Online.

(≈) 2400 ANOS DE ATOMISMO!



Breve apontamento saído no "Diário de Coimbra".

Demócrito de Abdera (cerca 460 a.C. a 370 a.C.), filósofo grego, foi o principal expoente da escola atomista da cultura helenista. Segundo ele, o cosmos que nos rodeia é formado por um número incontável de átomos, partículas finitas e indivisíveis. O movimento dessas partículas fundamentais, de que todas as coisas seriam feitas, tem implícito a ideia da existência de vazio. Sem este vazio o movimento das partículas não seria possível, terá deduzido Demócrito. Este atomista explicava ainda a diversidade e o estado da matéria através da sua constituição por diferentes associações de átomos.

Cerca de 2400 anos depois, Rutherford coordenou a experiência científica que aprofundou a ideia sobre os átomos de Demócrito: os átomos não são partículas fundamentais mas têm núcleo e electrões que se movem num enorme “vazio”. Rutherford acrescentou substância qualitativa e quantitativa ao átomo através do seu modelo atómico.

Se hoje celebramos este avanço no conhecimento científico, fruto do método experimental, não podemos de deixar de referir a ideia antiga sobre a constituição do Universo. Até porque o atomismo de Demócrito "fertilizou" todo o novo pensamento científico moderno, pelo menos a partir de Galileu Galilei.

António Piedade

Ano Internacional da Química



Apontamento publicado no "Diário de Coimbra".
(na figura, Marie Curie)

O ano de 2011 foi proclamado Ano Internacional da Química na Assembleia Geral das Nações Unidas ocorrida em Glasgow, Escócia, no verão passado. Sob o lema “Química – a nossa vida, o nosso futuro”, os diversos eventos que decorrerão sob a égide desta atribuição serão coordenados e organizados pela União Internacional de Química Pura e Aplicada (IUPAC) e pela UNESCO.

Com o objectivo de “celebrar as contribuições da química para o bem-estar da humanidade”, a simultaneidade deste ano com as efemérides dos 100 anos do modelo atómico de Ernest Rutherford e do centenário da atribuição do Prémio Nobel da Química a Marie Sklodowska Curie (primeira mulher galardoada com um Nobel) pela sua descoberta dos elementos rádio (Ra) e polónio (Po) oferece-nos imediatamente dois pontos de reflexão.

Por um lado, a ubíqua difusão da Química em tudo o que nos rodeia, desde alimentos a medicamentos, desde plásticos aos satélites artificiais que procuram existência de vida em sistemas planetários nos confins do universo, analisando os espectros de luz irradiada ou reflectida por corpos celestes e que são interpretados com base no modelo atómico. Em particular, o "século do plástico" foi-o por causa dos avanços na Química dos Polímeros.

Por outro lado, reflectir sobre a incontornável contribuição das mulheres para o desenvolvimento científico, pelo menos ao longo do último século.

O Departamento de Química da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra vai promover um programa de eventos durante este ano (QUI365), o que, pela sua regularidade para além de ser uma iniciativa louvável , é também uma demonstração do modo como o conhecimento químico deve e tem de estar cada vez mais próximo dos cidadãos para que estes entendam melhor as transformações do mundo em que vivem, a partir dos átomos de que é feito.

António Piedade

Matemática Sem Limites


É na Faculdade de Ciências de Lisboa, sob a organização de Jorge Buescu et al. Ver programa aqui. Abre já a 13 de Janeiro com Henrique Leitão: "Sem ponta por onde se lhe pegue: a esfera".

Exposição sobre a Sociedade Real de Londres na Biblioteca Joanina

Na Biblioteca Joanina em Coimbra continua patente ao público até final de Fevereiro a exposição "Membros Portugueses da Sociedade Real de Londres". A TVI, no seu "Jornal da Uma" de domingo passado, deu a notícia ao minuto 46.50 deste vídeo.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Um país à deriva...


Recupero este post sobre o BPN.

Agora vão ter de meter 500 milhões no BPN, em mais um aumento de capital que se vai realizar nos próximos dias. O buraco do banco, para diluir em 10 anos, é de 2000 milhões de euros, a somar aos 500 milhões de aumento de capital e aos 4,8 mil milhões que a CGD já emprestou ao BPN. Emprestou com o aval do Estado, isto é, se o BPN deixar de pagar quem paga é o Estado, ou seja, os contribuintes.

Isto é uma vergonha imensa. Não pode ficar por esclarecer e o dinheiro tem de ser recuperado. Caso contrário está tudo em causa.

Os números são astronómicos. A sério: isto não pode ficar assim.

Se as perdas fossem assumidas hoje, o custo directo para o Estado era de 2,5 mil milhões de euros. Se o BPN deixar de pagar o empréstimo à CGD temos de somar mais 4,8 mil milhões de euros, o que dá algo da ordem dos 7,3 mil milhões de euros. É um número astronómico.

Para terem uma ideia, com esse dinheiro era possível:
1. Construir 70 hospitais pediátricos como o de Coimbra (cada um custa 104 milhões de euros);
2. Comprar 486 mil FIAT 500 (cada um custa 15 mil euros);
3. Comprar 30 Airbus A380 (cada um custa 253,3 milhões de euros);
4. Pagar o funcionamento de todas as universidades portuguesas durante 10.4 anos (custam ~700 milhões de euros por ano);
5. Pagar 500 euros por mês a cada desempregado (600 mil actualmente) durante 24,3 meses (custaria 300 milhões por mês);
6. Construir o TGV com ligação ao Porto (5 mil milhões) e a Madrid (2,2 mil milhões) sem precisar de ajuda da UE;
7. Construir o novo aeroporto em Alcochete (5 mil milhões) e ainda sobravam 2,3 mil milhões para fazer hospitais, escolas, etc.
8. Fazer cerca de 141 obras iguais ao Metro Mondego (o custo da 1ª fase é de ~52 milhões de euros) que beneficiaria várias centenas de milhares de pessoas da zona centro de Portugal.

:-(

Bolas, haja vergonha!

ÁTOMO CENTENÁRIO



Crónica publicada no "Diário de Coimbra":

(Na figura mostra-se uma imagem de uma monocamada de ouro, sobre uma superfície de mica, obtida por AFM. microscópio de força atómica).

Comemora-se neste ano de 2011 o centenário do modelo atómico proposto pelo físico Ernest Rutherford (1871-1937), prémio Nobel da Química em 1908. O seu modelo sobre a unidade fundamental da matéria propunha um átomo constituído por um núcleo central, pequeno e denso, carregado positivamente, ao redor do qual “orbitavam” electrões, partículas carregadas negativamente. Cem anos depois, este modelo continua a ser uma boa aproximação à natureza do átomo. De certa forma tal como a teoria da gravidade de Newton continua a ser suficiente para os cálculos que nos permitem enviar um satélite até à Lua.

O "modelo planetário” do átomo foi uma das manifestações da aparente semelhança entre a organização do microcosmos, o átomo, e os sistemas planetários cósmicos, espalhados pelo Universo e dos quais o nosso sistema solar é o exemplo mais imediato. Indicou que há muito espaço vazio entre os núcleos e os electrões na matéria comum, assim como o há entre as estrelas e os planetas que as gravitam. E deixou espaço para a descoberta...

Rutherford construiu o seu modelo a partir da seguinte experiência: Hans Geiger e Ernest Marsden, sob a orientação de Rutherford, fizeram colidir um feixe de partículas alfa (Rutherford tinha mostrado tratarem-se de núcleos de hélio) contra finas camadas de folhas de ouro, com a espessura de apenas alguns átomos. Os resultados mostravam que a quase totalidade das partículas alfa atravessavam as folhas de ouro sem sofrer qualquer desvio na sua trajectória. Contudo, cerca de uma partícula alfa em cada 8000 sofria um desvio com um ângulo superior a 90 graus. Ou seja algumas invertiam o sentido da sua trajectória. Este desvio é compreendido se se considerar que ele resulta da repulsão electrostática entre a partícula alfa e um núcleo atómico carregado positivamente. A percentagem muito baixa de partículas desviadas sustentava a hipótese de os núcleos positivos ocuparem um volume muito pequeno em cada átomo na rede cristalina da folha de ouro. Com quase toda a massa e toda a carga positiva concentrada num núcleo muito pequeno (em relação ao volume total do átomo), quase todas as partículas alfa atravessam a folha de ouro sem sofrerem grandes desvios na sua trajectória.

O modelo atómico de Rutherford foi o marco fundador da Química e da Física Nuclear. Com ele deu-se uma revolução do nosso entendimento da estrutura da matéria. A tecnologia que derivou desse modelo atómico alterou a nossa forma de viver no século XX e permitiu, por exemplo, a invenção de computadores que hoje utilizamos para nos ligarmos em rede global através da internet.

António Piedade

Porquê escrever?


Os escritores podem escrever por diversas razões. Podem, por exemplo, escrever porque um jornal lhes pede para explicar ao público as razões porque escrevem. O "El País Semanal" perguntou, no primeiro número deste ano, a vários escritores porque é que escreviam. E que ficou o público a saber?

Umberto Eco é sucinto:
"Porque gosto".
O mesmo com Carlos Fuentes, que responde com outra pergunta:
"Porque respiro?"
Achei interessante a resposta de John Banville, autor de várias novelas relacionadas com a ciência, que remete para outros escritores:
"Escrevo porque não sei escrever. Um jornalista perguntou uma vez a Gore Vidal porque escreveu Myra Breckinridge, e ele respondeu: "Porque não existe". Foi uma boa resposta. Pôr algo de novo no mundo é um privilégio que não é concedido a muita gente. E, mais a mais, a realidade não é real para mim até que tenha passado pela peneira das palavras. Por isso, suponho que escrevo com o fim de imaginar a realidade totalmente real. A arte cria a vida, disse Henry James, e assim é de facto".
Por seu lado, Javier Marías é o que se pode chamar um homem prático:
"Como já disse de outras vezes, escrevo para não ter um chefe nem ter que me levantar cedo.

Também porque não há muito mais coisas que saiba fazer e prefiro escrever - diverte-me muito mais - do que traduzir ou dar aulas, que ao que parece também sei fazer. Ou sabia, são actividades do passado.

Também escrevo para não dever quase nada a quase ninguém e não ter que cumprimentar quem não quero.

Porque penso melhor quando estou diante da máquina de escrever do que em qualquer outro lugar e circunstância.

Escrevo romances porque a ficção tem a faculdade de nos ensinar o que não conhecemos e o que não acontece, como diz um personagem do romance que acabo de escrever. E porque imaginar ajuda muito a compreender o que, de facto, nos acontece, isso a que se chama "real".

O que não faço é escrever por necessidade. Podia passar anos muito tranquilo, sem escrever uma única linha. Mas é preciso ocupar o tempo nalguma coisa e é preciso ganhar algum dinheiro. Também escrevo por isso."

Ainda os Esqueletos no Armário dos Ensinos Básico e Secundário

“Onde Sancho vê moinhos, / D. Quixote vê gigantes. / Vê moinhos? São moinhos! / Vê gigantes? São gigantes! " (António Gedeão, 1906-1997).

Em consideração ao direito ao contraditório que lhe assiste (e só por esse facto), respondo ao comentário do anónimo (3 Jan.; 17h30) ao meu post “Os Esqueletos do Armário dos Ensinos Básico e Secundário”.

Para não pôr foice em seara alheia, desde já declaro que excluo neste meu texto factos reportados à extensa notícia do jornal "I”, para, como escrevi no 2.º parágrafo desse meu meu post, não "entrar em pormenores, mais ou menos polémicos, sobre as hossanas cantadas pela 5 de Outubro sobre as melhorias no PISA/2009”.

Passo, portanto, aquilo que tenho como a substância do comentário em causa: “O Ensino só pode estar mal, por isso só valem os estudos que dizem mal. Isto no fundo é só para dizer mal dos professores, pois são esses que ensinam os alunos, não são os Ministros da Educação. Os resultados só podem ser maus porque os professores são maus, andaram pelas Escolas Superiores de Educação... até a actual Ministra...”

Começo por recordar ao referido comentador que, como proclamou Luís de Camões, “um fraco rei faz fraca a forte gente" . Ora, atribuindo eu ao Ministério da Educação (ME) a fraca regência do sistema educativo não superior, o ensino padecerá, forçosamente, de várias maleitas por melhores, mais esforçados e dedicados que sejam os professores, apesar de não comungar de forma alguma da ideia da bondade de todos os professores, como o sistema de avaliação em vigor até bem poucos anos atrás quis fazer crer com a atribuição da classificação mínima de bom quer eles ensinassem bem ou mal, quer faltassem ou não (abro um parêntesis para lamentar novamente o facto do ME e os sindicatos docentes, sempre tão pressurosos em fazerem ouvir as suas "razões", nunca terem satisfeito o meu pedido mil vezes repetido de dar a conhecer publicamente a percentagem de professores avaliados negativamente).

Passando adiante, aponto como causas possíveis do descalabro do sistema educativo, a depreciação da Filosofia, base de todo o pensamento lógico, que deixou de estar submetida a exames nacionais, e a exclusão de grandes obras de autores portugueses consagrados, v.g., Eça, Garrett, Aquilino, que foram substituídas por resumos de duvidosa qualidade. Ademais, registo exames nacionais da Língua Portuguesa com respostas de cruzinhas tipo totobola e os maus resultados nas resoluções de problemas matemáticos, por vezes, pela não compreensão do respectivo enunciado, etc. Em resumo, a qualidade dos verdadeiros professores nada pode fazer contra programas desarticulados entre os ensinos básico e secundário porque, como escreveu Saint-Exupéry, “se cada tijolo não estiver no seu lugar não haverá construção”.

Mas passo ao cerne da questão em que o comentário em causa julga estar como peixe na água: a formação de professores. Aceito o repto que me é dirigido (pedindo desculpa para a importância que julgo ser-me atribuída na crítica que fiz a parte dessa formação), entrando no campo da regra abstraindo possíveis excepções que apenas servem para a confirmam. Dificilmente qualquer pessoa de bom senso e não menor consciência, sem fazer ruir as estruturas de uma sociedade que deve louvar o mérito e condenar o demérito, concebe que a formação de um licenciado universitário (antes de Bolonha: a.B.), por exemplo, para ministrar apenas Matemática no 2.º ciclo do ensino básico possa ser considerada de igual qualidade (como o é face a textos legais) à de um licenciado (a.B.) pelas escolas superiores de educação, ainda para mais, para ministrar simultaneamente Matemática e Ciências da Natureza. Mas, pelos vistos, há quem pretenda meter na estreita Rua da Betesga da competência diplomados oriundos do amplo Rossio da incompetência.

Depois, é um ver se te avias de alunos que chegam ao 3.º ciclo do básico sem serem capazes de resolver problemas para os quais os antigos diplomas da antiga 4.ª classe da instrução primária capacitavam, e bem! Como costuma dizer o povo, “depois da casa roubada trancas na porta”, com cursos de complemento de formação feitos à pressão para tentar minorar o pecado original de uma deficiente formação anterior desses docentes.

Isto já para não falar do caso de escolas privadas que concederam, a antigos professores do ensino primário, de posse de uma habilitação de ensino médio, diplomas de licenciatura para o ensino do 2.º ciclo do básico com a duração de escassos meses. Ninguém, como soe dizer-se, com dois dedos de testa, ou um mínimo de isenção, pode encontrar coerência e seriedade num sistema educativo permissivo, para uns e draconiano para outros, que com meras finalidades estatísticas (para consumo da Comunidade Europeia e aumento do ego dos nossos governantes) passa diplomas de licenciatura como quem passa moeda falsa.

Quanto à Ministra da Educação, como escreve, “ter andado” pelas Escolas Superiores de Educação, como disse alguém, “uma boa linguagem é a própria essência do pensamento”, convém esclarecer que apenas foi docente da ESE de Lisboa, estando habilitada com uma licenciatura e um mestrado universitários (a.B.). Em ocasião alguma me atreveria a pôr em cheque a boa fé das medidas por si tomadas, até porque as medidas sobre a formação de professores tiveram génese em consulados anteriores que a salvaguardam, em parte, da crítica de Silva Lopes, antigo professor catedrático de Economia, quando acerca da Educação escreveu: “É um desastre completo. Nem daqui a 30 ou 40 anos nos livramos dos erros que andamos a fazer hoje” (Público, 10/11/2004). E esta constatação pública muito se agrava quando, passados meia dúzia de anos, pouco, ou nada, se fez para emendar os erros do passado prosseguindo, pelo contrário, na desastrada senda de a erros antigos acumular novos erros!

Last but not least, se algumas incorrecções devem ser apontadas ao artigo do “I”, o competente pedido de rectificações deve ser aí apresentado e não aos seus citadores por se tratar de um periódico de referência não susceptível de prestar favores a quem critica, como eu e em boa consciência, o estado actual do sistema educativo português. De forma alguma, como diria Eça, "de pena ao vento".

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

VEM AÍ UM ECLIPSE


Informação recebida do Observatório Astronómico de Lisboa, Centro de Astronomia e Astrofísica da Universidade de Lisboa:

O primeiro Eclipse Solar de 2011 ocorre na próxima terça-feira de manhã, quando a Lua passa no nodo ascendente em Sagitário. Será visível a partir de Portugal, numa boa parte da Europa, do Norte de África, do Médio Oriente, e da Ásia Ocidental.

Em Portugal o Sol nasce com o eclipse a decorrer. Às 7h 57m, em Lisboa, atinge o máximo (menos de 50% da superfície encoberta) e deixará de ser visível às 8h 54m.

Na Madeira, a visibilidade do eclipse será breve, entre as 8h 10m(quando o Sol nasce), e as 8h 29m, quando termina o eclipse. Infelizmente, não será visível na Região Autónoma dos Açores.

Em Lisboa, o Sol nasce, no dia 4, às 7h 55m e a Lua nasce às 7h 54m.

Eclipse parcial do Sol é um fenómeno astronómico, em que somente uma parte do Sol é ocultada pelo disco lunar. Isto sucede quando a Lua, em fase de Lua Nova, passa nos seus nodos ou na proximidade destes.

Água na fervura

Texto recebido, a propósito do PISA 2009, do nosso leitor Manuel Salgueiro:

Após os resultados do último estudo PISA, em que os alunos portugueses mostraram ao mundo que a (des)Educação da Nação estava, finalmente, a endireitar-se, fruto da “domesticação” e da avaliação docente “made in Chile by Sócrates & Rodrigues”, eis que um relatório de um organismo do Ministério da Educação vem pôr alguma água na fervura, contrariando a tão famigerada evolução, de que, aliás, muito boa gente desconfiava (aqui ou aqui).

Pois, menos de um mês após a evolução impressionante dos alunos portugueses que participaram no dito PISA, vem agora um relatório do Gabinete de Avaliação Educacional (GAVE), a partir dos dados de exames em 1700 escolas, concluir, e citando, que os alunos portugueses são “incapazes de estruturar um texto ou de explicar um raciocínio básico”. Mais, o que ajuda a corroborar a ideia cada mais consistente da “marosca” e da manipulação, para não dizer fraude, que houve a propósito do último PISA, o relatório avaliou conhecimentos e competências nas disciplinas de Matemática, Língua Portuguesa, Matemática A, Física, Química A, Biologia e Geologia, domínios curiosamente também avaliados no último PISA. E, com alguma sorte, até os alunos que participaram no dito PISA também entraram nesta amostra de 1700 escolas...

Quem anda no terreno sabe perfeitamente do estado da (des)Educação da Nação, sabe também que em Educação é difícil aprender e é difícil ensinar, que não é possível haver aprendizagens sem um ensino que privilegie as aprendizagens e o conhecimento, algo que não é possível com o estado actual da coisa. Também é mais do que elementar (e aqui o erro de “casting” por parte dos profissionais da (des)Educação da Nação é demasiado básico) que a “coisa” (leia-se, aprendizagens e afins) em Educação demora tempo, geralmente anos quando não décadas, não é de um momento para o outro que a “coisa” ocorre, como alguns parecem crer. Não é bem semear hoje e colher amanhã, sendo amanhã 24 horas mais tarde. Isto é mais do que elementar. Perante tantas e tamanhas aselhices, a coisa só podia dar nisto. O pior é que, por muito que alguns queiram branquear a coisa com relatórios a mostrar falso serviço e a reivindicar méritos que não têm, a coisa está mesmo negra e vai demorar muitos anos a ir minimamente ao sítio, com custos para o País bem altos, uma crise bem pior do que a que já temos!

Tendo em conta algumas conclusões como, e novamente citando, “Na Matemática do terceiro ciclo resolver problemas é a maior barreira, tal como enfrentar exercícios com mais de duas etapas”, “Construir textos explicativos com frases que tenham lógica e coerência”, “Articular a informação fornecida em suportes e os conhecimentos necessários para elaborar uma resposta”, só conseguir “completar correctamente exercícios quando o desafio passa por resolver cálculos elementares” e, sabendo-se da importância destas competências até para o dia-a-dia, está-se mesmo a ver o futuro brilhante que nos espera!

Ou será que as ditas 1700 escolas também foram escolhidas (aleatoriamente, só pode...), tal como os alunos do PISA, para o (des)Governo da Nação voltar a "malhar" nos professores?

Manuel Salgueiro

Transições Maravilhosas


em final de ano e início de década, eis a minha crónica semanal no jornal i sobre uma das mais fascinantes transições no mundo da Física.

Se astronomicamente o dia 1 de Janeiro nada tem de interessante, humanamente damos a essa data uma vestimenta de renovação, de novos mundos e um quebra de fronteira temporal! Falemos então de barreiras e de outros mundos, de domínios intimamente físicos. Em "Alice no País das Maravilhas", Lewis Carroll seduz-nos com um mundo em que tudo e todos desafiam a nossa lógica: temos animais e cartas falantes, bolos que nos fazem crescer nove metros, lagos de lágrimas e dimensões que se perdem no absurdo! O País das Maravilhas está do outro lado de uma pequena porta. No mundo da física há algo parecido; para além da "razoabilidade" do quotidiano a que nos acostumamos e das regras físicas a que estamos mais habituados, existe um outro país, igualmente maravilhoso, mas dominado pela poderosa mecânica quântica, que poderá mesmo vergar a relatividade e a gravidade. A porta por onde se entra no país quântico tem apenas alguns nanometros, a milionésima parte do milímetro. A porta que separa o mundo da mecânica quântica de um mundo ainda desconhecido, reino de teorias unificadas, chama-se "comprimento de Planck", e é ainda mais pequena: 0,16 trilionésimos de trilionésimo de metro, ou seja, zero vírgula trinta e quatro zeros seguidos de 16 centímetro. No mundo da mecânica quântica, as certezas transformam-se em probabilidades ("Deus não joga aos dados", indignou-se Einstein), o ser mistura-se com o não-ser e há estranhas cumplicidades entre partículas. De uma maneira fascinante, estes eventos do microcosmos também nos ajudam a compreender o gigantesco Universo e complexas teorias cosmológicas. Que o seu 2011 seja igualmente maravilhoso ou quântico. Ou que não seja, já não sei!

domingo, 2 de janeiro de 2011

Os Esqueletos no Armário dos Ensinos Básico e Secundário

“A verdadeira generosidade para com o futuro consiste em dar tudo ao presente” (Albert Camus, 1913-1960).

No início de cada ano civil, é uso as casas comerciais fazerem o balanço da mercadoria existente e avaliar o stock para prover as necessidades futuras. Desgraçadamente, o sistema educativo nacional tem prescindido deste útil balanço, apesar de ter sido confrontado, no derradeiro mês de 1996, com estudos internacionais denunciantes do seu descalabro. Ou melhor, da sua vergonha: “Portugal, o pior da Europa”, Público, 21/11/96.

Mesmo sem entrar em pormenores, mais ou menos polémicos, sobre as hossanas cantadas pela 5 de Outubro sobre as melhorias no PISA/2009, estudos emanados, em 2010, do próprio do Ministério da Educação e relatados na primeira página do jornal "I” (31/12/2010), dão-nos conta de que:

1. “Estudantes não sabem raciocinar nem escrever”.
2. “Relatório demolidor: Alunos do 8.º ano ao 12.º ano de 1700 escolas não conseguem estruturar um texto encadeado, explicar um raciocínio com lógica, utilizar linguagem rigorosa ou articular conceitos”.


Passando ao miolo da notícia (pp. 28-29), detenho-me numa coluna intitulada “o melhor e o pior”, referenciando umas tantas disciplinas curriculares dos diferentes anos dos ensinos básico e secundário. Assim:

“Língua Portuguesa – 9.º ano:

- Só 11% dos alunos conseguiram transformar uma frase passiva numa frase activa e apenas 26% identificaram a que classe pertencia determinada palavra.
- Leitura e escrita de textos informativos são os domínios em que os alunos tiveram melhores resultados, com uma média em relação à cotação final de 74%. A leitura de um texto poético não foi tão bem sucedida.

Matemática – 8.º e 9.ºanos:

- As grandes fragilidades são detectadas nos exercícios que implicam percorrer sucessivas etapas até à resolução final ou então nos exercícios que exigem leitura, interpretação e definição de uma estratégia.

Biologia/Geologia – 10.º, 11.º:

- Dificuldade em construir textos com rigor científico, em usar linguagem adequada ou em articular informação fornecida nos textos com os próprios conhecimentos.

Física – Química A – 10.º, 11.º:

- Usar e interpretar informação contida nas provas (textos, gráficos ou tabelas); expressar por escrito os conhecimentos; usar a calculadora para resolver problemas simples foram os embaraços dos alunos “.

De forma utópica, determinou, em tempos recentes, em anúncio jubiloso "urbi et orbi", o Ministério da Educação que o 12.º ano se tornasse obrigatório. Desta forma, transformou, do dia para a noite, como escreveu Francisco de Sousa Tavares, "Portugal não num país de analfabetos, como até aqui, mas num país de burros diplomados”. Ou seja, em genuflexão perante a diplomocracia”, assim havida, por José António Saraiva (Diário de Notícias, 31/08/1979), a profusão de diplomas atribuídos a torto e a direito. O Ministério da Educação, com pós de perlimpimpim em retortas de alquimia, não tardará muito em caminhar na vanguarda de um mundo alfabetizado com a maior percentagem de população escolar com estudos secundários completos ou equivalentes. Um ensino profissional mal clonado e as Novas Oportunidades darão uma mãozinha “preciosa” para que essa percentagem nada ou pouco acrescente para a melhoria profissional de quem as frequenta, desiderato louvável se fosse essa a sua intenção. Ou seja, não contribuindo para o descrédito do esforço daqueles que muito suaram para obter, sem ser por vielas esconsas e mal iluminadas, o diploma do 12.º ano. Torna-se necessário, portanto, em prosa pessoana, “violentar todo o sentimento de igualdade que sob o aspecto de justiça ideal tem paralisado tantas vontades e tantos génios, e que, aparentando salvaguardar a liberdade, é a maior das injustiças e a pior das tiranias”.

Desta forma, que distância abissal nos separa de um antigo ensino-técnico que, para além de uma formação essencialmente profissional, se preocupava em dar bases científicas e uma louvável cultura humanística aos seus alunos documentada por este naco de prosa biográfica de José Saramago:

“As visitas e estadias à aldeia natal foram frequentes durante vários anos enquanto, em Lisboa, começava a estudar. ‘Fui bom aluno na escola primária. A terceira e a quarta classes foram feiras num só ano’, afirmou Saramago. Mas, dois anos depois e já no liceu, as dificuldades económicas da família levaram-no a abandonar a escola. O curso de serralheiro mecânico surgiu como alternativa e, apesar de ser um curso profissional, o plano de estudos da escola incluía uma disciplina de Literatura. E foi através dos livros escolares que José Saramago descobriu o prazer de ler. Para quem não tinha um único livro seu em casa, aquela foi uma experiência marcante: ‘Ainda hoje posso recitar poesias aprendidas naquela época distante’, afirmou muitos anos depois”.

Julgo ter algum conhecimento de causa sobre a matéria por ter iniciado a minha carreira docente na Escola Industrial Mouzinho de Albuquerque, da então Lourenço Marques, e ter-me deparado, décadas volvidas, com um site que homenageia, de forma comovente, o respectivo corpo docente em agradecimento dos seus alunos pela “formação recebida, quer como estudantes, quer como pessoas”. Reza essa homenagem:

“Naturalmente que, como em tudo, no respeitável corpo docente que ao longo dos anos leccionou na nossa escola, nem todos conseguiram ser populares, mas todos contribuíram, de uma forma ou de outra, para a nossa formação, quer como estudantes, quer como pessoas. Alguns deixaram a sua marca. (…) Ainda hoje, e eu faço notar isso aos meus filhos, eu sei o nome dos meus professores, e faço questão de realçar a sua competência. Pena que nem todos eles possam já tomar conhecimento de que também fazem parte da nossa saudade académica”.

Ouve-se frequentemente a frase: “Ano Novo, Vida Nova”. Mas será que o acumular de verdadeiras e dolorosas, ou mesmo dolosas, asneiras que se têm cometido no sistema educativo português, e que se querem perpetuadas, a ponto de se correr o risco de se tornar uma espécie de máxima nacional: Ano Novo, Vida Velha? A propósito, transcrevo versos de autor que não sei referenciar: “Início de um novo ano./ Traço novos planos./ Novos projectos./ O que não deu certo,/ ficou no passado./ Já é cinza./ O importante é o que virá./ Aqui posso determinar./ O que quero ou não”.

Mas será que os detentores das rédeas da 5 de Outubro, pressionados por fortes forças sindicais que pretendem proletarizar a função docente em manifestações ruidosas de rua, ainda se não deram conta (ou se deram, fingem que não deram) que, como afirmou Erasmo de Roterdão (1446-1536), “a principal esperança de uma Nação reside na educação da sua juventude”? É tempo de acabar com uma nação desesperançada do seu futuro por culpa, total ou parcial, dos seus timoneiros navegando com terra à vista em diversos sectores da vida nacional, sejam eles de natureza económica, educativa ou social!

Doug and Dave

De tempos a tempos, mais do que a especulação, a afirmação da existência de extraterrestres-que-comunicam-com-os-humanos volta a estar na moda.

É o que me parece, mas posso estar enganada. E também me parece que a “receita” se sofistica à medida que os "consumidores" se tornam mais exigentes (e esclarecidos?): documentários e notícias (com ou sem aspas?) mais recentes que, ocasionalmente, tenho visto e lido em nada se distinguem, sob o ponto de vista da forma, dos correspondentes de carácter inequivocamente científico.

Na verdade, os seus autores não se limitam as colher depoimentos de observadores involuntários, a quem o fenómeno alien se impõe, dispondo apenas como prova a sua descrição, necessariamente subjectiva; apresentam provas colhidas com apoio de sofisticados instrumentos de registo por entidades de aviação civis e militares credíveis, incluem o depoimento de investigadores que nos gabinetes das universidades a que pertencem apresentam teorias, a que se segue a argumentação ou o teste empírico e, em sequência, a interpretação delas decorrentes. Tudo, como disse, numa configuração que costumamos atribuir ao modo de pensar e de funcionar da ciência e da sua divulgação.

Isto a propósito do texto de Miguel Gonçalves É desta: eles vêm aí!?, publicado ontem no De Rerum Natura, e de um bocado de programa que, também ontem, vi no canal de televisão Zone Reality.

Detenho-me neste programa, de realização recente, que incidia num dos mais deliciosos casos de "evidências" de extraterrestres: o caso dos Crop Circle ou, em tradução para português, da cereologia, que começou a ser falado há mais de trinta anos e que há vinte anos deu brados na comunicação social.

Em 1991, Rui de Carvalho, num artigo intitulado As mentiras da ciência, publicado no jornal Expresso de 19 de Outubro de 1991, comentava o assunto da seguinte maneira:

"Um dos mistérios mais populares dos últimos tempos, especialmente na Grã-Bretanha, foi recentemente desfeito quando dois pacatos ingleses, David Chorley e Douglas Bower, ambos já entrados na casa dos 60, confessaram que se tinham entretido, nos últimos treze anos, a abrir os célebres círculos nas searas.
O «fenómeno» deu origem a todo um conjunto de trabalhos científicos a que se dedicaram de boa ou má-fé, nomes conhecidos das ciências. «Nenhum ser humano podia ter feito isto», dizia não há muito tempo o engenheiro Pat Delgado, que fez fortuna a escrever livros acerca dos círculos. A sua última obra, escrita em colaboração com Colin Andrews, vendeu 50 mil exemplares.
A brincadeira dos dois reformados ingleses, cujo exemplo foi seguido em diversos países, deu origem à criação de uma nova ciência, a cereologia. Para tal contribuiu a intensa actividade da Unidade de Investigação do Efeito dos Círculos, um grupo fundado pelo físico Terence Meaden. Nem a circunspecta revista Nature escapou ao publicar o artigo do físico japonês Yoshi-Hiko Otsuki, que atribuía a formação dos círculos a uma esfera relampejante gerada por micro-ondas na atmosfera. Como o artigo fora publicado pela Nature, cujos apertados critérios de avaliação são bem conhecidos, muitas outras publicações consideraram que o problema dos círculos estava resolvido."

Ora, segundo entendi nesse programa de televisão a que me refiro, o caso foi retomado, com novas, diversificadas e muito sérias contribuições científicas (tudo isto com ou sem aspas?)...
.
Sobre este assunto, de entre os muitos vídeos disponíveis na internet sobre o assunto, vale a pena ver um que se centra na explicação e demonstração da brincadeira de Doug (Douglas Bower) e Dave (David Chorley), onde eles próprios contam as muitas noites em que se entretiveram a inventar o mistério dos círculos em plantações extensas, esperando depois pelo impacto que teriam: aqui.
.
Vale a pena também ver algumas dissertações de Patrick Delgado, o cientista, entretanto falecido, que fez nome e fortuna com a explicação sobrenatural do mistério (em virtudo, sobretudo, dos vários livros que escreveu e que se venderam muitíssimo bem): aqui.

E, por último, vale a pena ver como se trata de um mistério (inexistente?) que muitos parecem estar apostados em perpetuar: aqui.

Ano Novo: Poesia

Selecção de poesia em português sobre o imaginário que envolve o Ano Novo, e que amavelmente nos foi enviada por João Boaventura.

De Luís Vaz de Camões

Jamais haverá ano novo,
se continuar a copiar os erros dos anos velhos.

De Carlos Drummond de Andrade

Receita de Ano Novo
Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)
Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

De Miguel Torga
Recomeça…
Se puderes
Sem angústia
E sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.
E, nunca saciado,
Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças…

De Fernando Pessoa

Tudo o que já não é
A dor que já não me dói
A antiga e errónea fé
O ontem que a dor deixou
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje é já outro dia.

Também de Fernando Pessoa

Há um tempo em que é preciso
abandonar as roupas usadas,
que já tem a forma do nosso corpo,
e esquecer os nossos caminhos,
que nos levam sempre aos mesmos lugares.
É o tempo da travessia: e,
se não ousarmos fazê-la,
teremos ficado, para sempre,
à margem de nós mesmos.
.
Ainda de Fernando Pessoa
.
Ano Novo
De tudo, ficaram três coisas:
A certeza de que estamos sempre começando...
A certeza de que precisamos continuar...
A certeza de que seremos interrompidos antes de terminar...
Portanto devemos:
Fazer da interrupção um caminho novo...
Da queda um passo de dança...
Do medo, uma escada...
Do sonho, uma ponte...
Da procura, um encontro...

É desta: eles vêm aí!?


ET phoned Obama?

Classificado como boato (algo que não agradou ao próprio jornalista, ver caixa de comentários), o Examiner, um media que já teve melhores tempos, não hesitou em "pegar" na fantasia de Alfred Lambremont Webre, uma conhecida personalidade no campo da ovniologia e da chamada "exopolítica" (whatever that is!).

Segunda nos conta Webre, Obama terá recebido luz verde por parte dos militares e dos próprios extraterrestres para anunciar ao mundo que: 1. sim, eles existem e 2. que comunicam connosco há já algum tempo!

E a estória até mete os serviços de inteligência espanhóis e a inevitável e tão new age mensagem ecológica: "The NATO-Spanish intelligence agent also stated that he was told the galactic governance council would be sending communications to the U.S. government in December 2010 urging them to join in the extraterrestrial intervention and ecology-cleaning process."

Porquê esta urgência, porquê esta revelação pública em 2011? Deixo-vos descobrir isso neste pequeno pedaço de humor (a meu ver) .

Desejo-vos uma belíssima nova década!

Cirurgiões e atletas

A leitura do texto do escritor Cristovão de Aguiar, aqui publicado, sobre um problema de (sua) saúde que se arrasta e os correlativos contornos do atendimento profissional que finamente descreve, coincidiu com a segunda leitura que faço, mais atenta do que a primeira, do livro Ser bom não chega, da autoria de Atul Gawande, professor catedrático de cirurgia em Harvard (Lua de Papel, 2009). Conduzida pelo texto do escritor, destaco as seguintes passagens do livro do médico cirurgião (páginas 16-22), que condensam o essencial do que nele se trata (sublinhados meus):

“O que é preciso para se ser bom numa coisa onde o erro pode acontecer com tanta facilidade? Quando era estudante e depois interno, a minha preocupação mais profunda era ser competente. Mas o que aquele interno sénior revelara naquele dia era mais do que competência – compreendera não só a forma como uma pneumonia normalmente evolui e deve ser tratada, mas também a maneira de a detectar e combater naquela paciente específica, naquele momento específico, com os recursos e os auxiliares específicos que tinha ao seu dispor.

Muitas vezes as pessoas procuram nos grandes atletas lições de desempenho. E, para um cirurgião como eu, os atletas têm realmente lições a dar – acerca do valor de perseverança, do trabalho árduo e da prática, acerca da precisão. Mas o êxito em medicina tem dimensões que não podem ser encontradas num campo de jogos. Para começar, há vidas em risco. As nossas decisões e omissões, consequentemente, são de natureza moral. Também enfrentamos expectativas assustadoras. Em medicina, a nossa tarefa é lidar com a doença e possibilitar que cada ser humano tenha uma vida tanto mais longa e liberta de fragilidades quanto a ciência permitir. Os passos são muitas vezes incertos. Os conhecimentos que é necessário dominar são simultaneamente vastos e incompletos. No entanto, espera-se que sejamos céleres e firmes (…). Também se espera que façamos o nosso trabalho de forma humana, com carinho e preocupação. Não é só aquilo que está em jogo numa situação concreta, mas também a complexidade do exercício da medicina que torna as coisas tão interessantes e, ao mesmo tempo, tão perturbadoras (…).

Como médicos, assumimos este trabalho pensando que é tudo uma questão de diagnósticos cuidados, competência técnica e alguma capacidade para criar empatia com as pessoas. Mas não é, como rapidamente descobrimos. Em medicina, como em qualquer profissão, temos de lutar contra sistemas, recursos, circunstâncias, pessoas – e também contra as nossas limitações. Enfrentamos obstáculos de uma variedade aparentemente interminável. E, contudo, temos de andar para a frente, melhorar, aperfeiçoar (…).

Os capítulos deste livro analisam três condições essenciais para o êxito em medicina – ou de qualquer esforço que envolva riscos e responsabilidade.

O primeiro é a diligência, a necessidade de prestar atenção suficiente ao pormenor, para evitar erros e ultrapassar os obstáculos. A diligência parece uma virtude fácil e de menor importância (basta prestar atenção, não é?). Mas não é nenhuma das duas coisas. A diligência é ao mesmo tempo fundamental e cruelmente difícil para o exercício da medicina (…)

O segundo desafio é fazer bem. A medicina é uma profissão profundamente humana. Como consequência, está sempre a ser perturbada por falhas humanas, falhas como a avareza, a arrogância, a insegurança, o equívoco (…)

A terceira condição para o sucesso é o engenho – pensar de novo. O engenho é muitas vezes incompreendido. Não é uma questão de inteligência superior, mas de carácter. Exige, acima de tudo, a vontade de reconhecer o fracasso, de não tapar o sol com a peneira – e de mudar. Resulta de uma reflexão deliberada, quase obsessiva sobre fracasso e de uma procura constante de novas soluções. Estes são comportamentos difíceis de cultivar – mas estão longe de ser impossíveis (…)

Melhorar é um trabalho constante. O mundo é caótico, desorganizado e incómodo e a medicina não escapa, de modo nenhum, a essa realidade. Para complicar as coisas, nós, na medicina, também somos humanos. Somos distraídos, fracos e estamos imersos nas nossas próprias preocupações. Mesmo assim, a vida de médico está ligada à vida de outras pessoas, à ciência, e nós vivemos no ponto de união desordenado e complicado entre as duas. Temos uma visão de responsabilidade. A questão, então, não é saber se aceitamos a responsabilidade. Pelo simples facto de fazermos este trabalho, já aceitámos. A questão é, uma vez aceite essa responsabilidade, como fazer bem este trabalho.”

Nota: Da obra referida e de outra o De Rerum Natura deu notícia aqui e aqui.

POR ESTE ANOITECER…

Poema de Jorge de Sena, enviado por Paulo Rato, que devia ter sido publicado no De Rerum Natura no dia 31 de Dezembro… Apesar do atraso, não poderíamos deixar de o partilhar com os leitores.

POR ESTE ANOITECER…

Por este anoitecer, o ano acaba.
Cinzento e azul no céu por entre as árvores,
acaba o calendário. Muitos crimes dele
serão futuras efemérides nos outros
que, folha a folha, acabarão também.

Como anoitece igual este ano às noites
com que, dia por dia, o ano foi passando
gregorianamente. O mundo ocidental,
cesáreo, atlântico, ex-mediterrânico,
conta do Cristo. Mas os outros mundos

também contarão dele, quando este ocidente
deixar de fingir dele — os deuses morrem —
para funções de calendário laico.
O tempo passa, os calendários mudam,
na vida e morte as horas se sepultam.

E, no entanto, o tempo vai connosco;
é desta terra só, e só por haver outros
que de outros astros são por haver este
diverso tanto a cada movimento.
Por este anoitecer, o ano acaba.


Jorge de Sena

sábado, 1 de janeiro de 2011

Ainda os pretensos perigos dos telemóveis

Habitual destaque semanal para a coluna "What's New" do físico Robert Park:

"PHOTONS: WHAT ALBERT EINSTEIN KNEW ABOUT CELL-PHONE RADIATION.

Maybe I missed it, but I have seen nothing from major media sources refuting the preposterous claim that radiation from cell phones and other wireless devices is linked to human health problems. We are bathed in microwave radiation. Most of it is as natural as sunshine, but wireless communication, including cell phone radiation, is not. What do we know about the effect of this stuff on the human body, and how long ago did we know it? The starting point is 1905, sometimes called "Albert Einstein's miracle year." One of the four "miracle" papers he published that year dealt with the photoelectric effect. He treated the light striking an object as particles called quanta, having energy equal to the frequency times the Planck constant. This predicted a photoelectron threshold at the extreme blue end of the visible spectrum, below which there would be no photoemission. Almost nobody believed him, including Robert Millikan, perhaps the world's greatest experimentalist. The photoelectric effect had already been explained with Maxwell’s wave theory, but experimental confirmation was lacking. Einstein wasn't bothered; he had other great things to do while waiting for confirmation. Millikan did the experiment in 1917; it agreed perfectly with Einstein's theory. The 1921 Nobel Prize in Physics was awarded to Einstein for his theory of the photoelectric effect. Millikan won the Prize two years later. Their results show that microwaves are great for warming pizza and they don't cause cancer."

Robert Park

OBJECTOS FRACTAIS


Minha apresentação em vídeo do livro "Objectos Fractais" de Benoît Mandelbrot nas "Escolhas de Livros" filmada no Centro Ciência Viva Rómulo de Carvbalho, em Coimbra: aqui.

FELIZ ANO PRIMO

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Feliz Ano Primo! O próximo será só daqui a seis anos...

O MINISTRO DA EDUCAÇÃO QUE ENSINA LITERACIA FINANCEIRA

A notícia é do Diário de Coimbra de hoje (ver aqui ): o Ministro da Educação, Ciência e Inovação regressou à escola secundária onde foi alun...