Publicado em 2010, mantém inteira actualidade na análise crítica que faz à orientação política que é dada aos mais diversos sistemas educativos do mundo. Não se aplica, portanto, só à realidade brasileira.
Do 1.º Capítulo (O legado do século XX para a formação de professores, de Lígia Mácia Martins, pp. 13-31) retirei as notas que se seguem (entre aspas as palavras da autora, sem aspas as minhas palavras baseadas nas da autora):
Todo o trabalho educativo que acontece na escola deve ser guiado por um "ideal humano superior": levar cada ser humano, em particular, a alcançar as "máximas capacidades já conquistadas pelo género humano". Trata-se de contribuir de modo significativo e muito específico para a humanização dos alunos o que requer a mediação da própria humanidade dos professores.
É isso que os sistemas educativos prevêem? Não.
Sob a égide do modelo económico-social no qual se instalou uma "lógica mercantilista" baseada "no critério da lucratividade e da sociabilidade adaptativa".
[Em virtude da] "particularização e individualização do ensino como expressão de respeito às singularidades do aluno, tanto em relação às suas possibilidades cognitivas quanto em relação à sua pertença cultural (...) os conhecimentos sincréticos, empíricos fortuitos, heterogéneos e de senso-comum substituem a sistematização de relações explicativas causais já conquistadas pela humanidade e, assim, (re)significa-se a realidade, identificada, então, com o compartilhamento de interpretações (...) [emergentes] na vida quotidiana e com intensas e rápidas transformações."
"Em nome dessas transformações, caberá à educação escolar preparar os indivíduos para o seu enfrentamento. Diante de um mundo em constantes transformações, mais importante que adquirir conhecimentos, posto sua transitoriedade, será o desenvolvimento de competências" (...).
"Apela-se, pois, à formação de personalidades flexíveis, criativas, autónomas, que saibam trabalhar em grupos e comunicar-se habilmente e, sobretudo, estejam aptas para os domínios de complexidade do mundo real."
"Tendo em vista esta preparação, a resolução de problemas erige-se como exigência básica (...) de tal forma que a aprendizagem baseada em problemas se converte na estratégia azada para a formação de indivíduos participativos."
"Caberá à escolarização oportunizar os meios pelos quais o aluno se coloque como sujeito da sua aprendizagem, entendendo-se que, assim, consequentemente, ocupará seu lugar na sociedade de modo crítico e cidadão."
"Aliando-se a esses objectivos, a ênfase recai nas aprendizagens que o aluno realiza a partir de si mesmo, no respeito às suas necessidades e motivações e nos limites daquilo que identifica como problema a partir de um diálogo com o seu contexto. Identifica-se, pois, a formação escolar com o desenvolvimento da capacidade para resolver problemas" (...).
"Tornou-se cada vez mais recorrente (...) o apelo à necessidade de recriar tanto a escola quanto a formação de professores. Para esta nova formação, os destaques centrais recaíram sobre a trajectória de construção da identidade pessoal-profissional, primando pelo objectivo da promoção da reflexão e, preferencialmente da reflexão crítica acerca da própria prática."
"Consequentemente, a linha distintiva entre escola como locus de exercício profissional e a escola como locus que deva preparar filosófica, teórica e metodologicamente o professor para esse exercício vai-se diluindo de modo cada vez mais rápido e mais cedo na formação inicial dos professores."
"As dimensões técnicas da prática de ensino passam a ocupar um lugar central, em detrimento dos seus próprios fundamentos. Privilegia-se a forma mutilada de conteúdo."
"Essa diluição, todavia, também ocorre sob um forte argumento, qual seja a necessária articulação entre teoria e prática. Uma articulação, porém, centrada na resolução de problemas práticos, imediatos e o manejo de situações concretas do cotidiano escolar, enfim, que privilegie a forma em detrimento do conteúdo."
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