quinta-feira, 31 de outubro de 2024

A SOMBRA DA CENSURA REQUER UMA ESPECIAL ATENÇÃO DOS EDUCADORES

Disponibilizo aqui a ligação para o mais recente texto que escrevi para o Ponto SJ - Portal dos Jesuítas Portugueses. 
O tema é de sempre, agora com novas configurações. Quem educa precisa de estar atento a formas subtis (e outras não tanto) de afastamento do horizonte dos mais jovens de escritos com poder formativo. São muitas e por vezes (aparentemente) bondosas as razões invocadas para afastar alguns dos escritos mais precisos que a humanidade produziu da escola.

O PROBLEMA DA VIOLÊNCIA NA LIVRARIA ALMEDINA ESTÁDIO DE COIMBRA

quarta-feira, 30 de outubro de 2024

A MATANÇA DO PORCO

Por A. Galopim de Carvalho
 
Quando comecei a ter consciência do mundo à minha volta, já se não matava o porco em nossa casa. Isto porque havíamos mudado de residência e deixáramos de ter instalações adequadas, entre as quais a grande chaminé da cozinha para fumar os enchidos. Vivendo na cidade, tínhamos o talho onde a carne fresca e de salgadeira, chouriços, linguiças e farinheiras, estavam diariamente à nossa disposição. Não matar o porco em casa não impediu que assistisse, muitas vezes, a este ritual de Inverno, vindo da Antiguidade, através de sucessivas civilizações, em que o animal era oferecido, em sacrifício, aos deuses. 
 
Esta tradição é hoje, desgraçada e estupidamente, interdita por uma legislação fabricada em Bruxelas, no seio da União Europeia, pelos mesmos citadinos que assistem, indiferentes, à expansão dos fast food e de muitos outros alimentos ditos de plástico. Para salvaguarda desse património cultural, há sempre por essas aldeias, felizmente, quem prevarique, aproveitando uma mais prolongada e providencial ausência da patrulha da Guarda (*)
Depois de morto, chamuscado, raspado e lavado, havia que pendurá-lo, de cabeça para baixo, num chambaril suspenso de uma trave do tecto. O chambaril é uma espécie de cruzeta onde se prendiam os fortíssimos tendões das patas traseiras do animal. Aberto e esventrado de tripas e demais entranhas, aguardava-se que a carcaça secasse e arrefecesse depois de lhe passar uma noite por cima. Só ao outro dia, manhã cedo, o mesmo magarefe que o sangrara, armado de facas de vários usos, um cutelo e um serrote, vinha desmanchá-lo e dividi-lo em porções, cada qual com seu destino, que ia separando em alguidares de barro.

Com parte do sangue recolhido, de mistura com vinagre, para não coalhar, confeccionava-se a rechina, no que se consumiam as fressuras. Bem aromatizada com cominhos, servia-se logo nesse dia, ao almoço, com sopas de pão cortadas às fatias finas e rodelas de laranja, para desenjoar, constituindo o festim dos que sempre apareciam para ajudar e, também, para comer. O sangue restante era cozido e, depois de frio, cortado às fatias e temperado com azeite, vinagre e alho.

Das lides da matança, competia às mulheres cortar as carnes para os enchidos e temperá-las de acordo com os destinos a dar-lhes, seleccionando-as para os paios, as linguiças, os chouriços e as farinheiras. Só não se ocupavam desse trabalho as que, na ocasião, estivessem menstruadas, uma crença, como muitas outras, que ninguém explicava mas que todas respeitavam.

Mantas de toucinho alto de uma mão-travessa, chispes inteiros, faceiras, orelhas e ossos eram acondicionados na salgadeira. Esvaziada do sal e dos restos amarelecidos da conserva do ano anterior, este baú de madeira, a ressumar salmoura antiga, era raspado e lavado para receber o sal novo, cristalino e branco de neve, para conservar, por mais um ano, a nova provisão. Havia sempre quem aproveitasse o toucinho velho que, embora com um leve pico de ranço, sempre dava jeito àqueles que o levavam. Uma lasquinha deste toucinho, bem raspado do sal, e uma rodela de cebola, dentro de duas grossas fatias de pão, faziam a ceia de um pobre, dizia-se.

sexta-feira, 25 de outubro de 2024

PASSADO O DESLUMBRAMENTO, É PRECISO DECIDIR

Por Cátia Delgado
 
Vemos chegada a hora de avaliar o impacto dos telemóveis na vida escolar de crianças e jovens para tomar decisões: permitir ou não o seu uso. E Portugal não é excepção. 
 
Foi notícia recente no Diário de Coimbra que, no seguimento de recomendações do Governo, só uma escola da cidade restringiu o uso do telemóvel e só nos espaços de refeição. Os diretores entrevistados alegam estar em processo de auscultação da comunidade escolar; não discordando da retirada dos aparelhos do recinto escolar, não arriscam decidir a restrição e a proibição. Dão a entender que isso seria ir longe demais e que do Ministério vieram apenas recomendações, não normas ou leis. Colocam a responsabilidade do lado das famílias, argumentando ser dever dos pais limitar o uso dos dispositivos. Assim se vai protelando a tomada de uma posição clara por parte destas escolas.
 
Mas é isto mesmo que uma encarregada de educação, também professora, que foi entrevistada, entende ser necessário: é inequivocamente a favor da proibição do telemóvel no recreio, alegando que:
"(...) os pais gostam de estar em constante contacto com os filhos, o que nem os deixa crescer. (...) Todos se queixam que o uso é exagerado, contudo, do que me apercebo é que não há grande controlo parental.

(...) nos intervalos os alunos estão mais ocupados a jogar do que a falar e quando entram na sala sentem a necessidade de conversar o que não conversaram no tempo disponível no exterior.

Deixariam de ter bengalas sociais e teriam de olhar uns para os outros, comunicar, exprimir o que sentem.

Em caso de necessidade, haverá sempre forma de comunicação com os pais.

É de todo errado que os professores utilizem o telemóvel como ferramenta de pesquisa ou testes (...) até porque todos os alunos têm acesso a computadores."
Em suma, como é notado pela jornalista, Margarida Alvarinhas, além de uma divergência de opiniões, há também uma considerável “falta de coragem no assumir de posição”, mal do seguidismo do século XXI, que leva a crer que ter uma opinião condizente com a realidade do século passado é andar para trás ou ser resistente à mudança. Pois, nem tudo o que é “inovador” favorece o desenvolvimento humano, fim último da educação escolar, nem tudo o que é “tradicional” nos atrasa. 
 
Sendo a escola, por natureza e por excelência, um contexto de ensino, importa mantê-lo alheado de tudo o que prejudique a sua finalidade última: a aprendizagem. E, sim, temos evidências científicas suficientes para saber que os telemóveis a prejudicam.

quarta-feira, 23 de outubro de 2024

MOLUSCOS, ALGAS E OUTROS SERES MARINHOS, NA ORIGEM DA GRANDE MAIORIA DOS CALCÁRIOS.

Por Galopim de Carvalho

No que respeita a origem orgânica destes calcários, ditos biogénicos ou organogénicos, a pergunta que se coloca à partida é: - Como é que os seres vivos marinhos e, à semelhança destes, os lacustres e outros aquáticos, sintetizam o carbonato de cálcio com que edificam os respectivos esqueletos?

Num esquema muito geral, especialmente simplificado para o efeito, a resposta é simples de abarcar. Recuemos, então, por exemplo, uns 170 milhões de anos, ao Jurássico médio, muito bem representado em Portugal, nos calcários das Serras do Sicó, Aires e Candeeiros, num tempo em que o território a que corresponde a Península Ibérica se encontrava numa latitude intertropical, sob um clima de tipo tropical húmido, com temperaturas sempre superiores aos 20.ºC e acentuada pluviosidade anual, à semelhança do que acontece nos dias de hoje nesta zona da Terra.

Nestas condições climáticas, a alteração dos minerais de muitas rochas das terras emersas é imensa, quer nos continentes (granitos calcoalcalinos, granodioritos, dioritos e gabros, entre ouros), quer nas ilhas vulcânicas (sobretudo, andesitos e e basaltos). Muitos minerais dessas rochas (plagioclases, horneblenda e augite, entre outros) contêm cálcio nas respectivas composições.

Por um processo químico conhecido por hidrólise, aqui apresentado, como se disse, de forma muito esquemática, (essencial à compreensão do mesmo), a água no estado líquido, morna e abundante, como é próprio destas latitudes, dissocia os iões destes minerais (mais intensamente do que em qualquer outra zona climática), entre eles o catião cálcio, bivalente positivo (Ca2+) que transporta, através dos rios, a caminho do mar e dos lagos. 

Também a calcite (carbonato de cálcio) dos calcários e a dolomite (carbonato de cálcio e magnésio) dos dolomitos, existentes nas terras emersas se deixam dissolver pelas águas gasocarbónicas da chuva, que, como é sabido, contêm dióxido de carbono em solução, libertando o dito catião. Recorde-se aqui que, juntamente com a água, o dióxido de carbono comporta-se como um ácido. Para que os seres vivos “fabriquem” o carbonato de cálcio dos respectivos esqueletos, têm de juntar o catião Ca2+ ao anião carbonato (CO32-) sempre presente e abundante na água do mar, uma vez que esta dissolve o dióxido de carbono (CO2) do ar, no imenso contacto que tem com a atmosfera. Uma vez na água, o dióxido de carbono dá origem ao referido anião. O carbonato de cálcio surge então da combinação:
Ca2++ CO32- → CaCO3

Quando atacamos o calcário com um ácido, como, por exemplo, o ácido clorídrico diluído em água (a 10%) a efervescência, ou seja, o borbulhar gasoso que se produz corresponde à libertação, sob a forma de dióxido de carbono, do oxigénio e do carbono da atmosfera contemporânea da sua formação. O cálcio envolvido nesta reacção química fica dissolvido na água sob a forma de cloreto de cálcio, segundo o esquema:
2HCl + CaCO3 → CaCl2 + H2O + CO2

Representando a imensa maioria dos calcários, os classificados de biogénicos resultam directa ou indirectamente da actividade de seres vivos, em águas litorais pouco profundas e mornas, mais precisamente, nas zonzas neríticas (do grego nerítes, alusivo a conchas, moluscos), das regiões intertropicais. Referidos por alguns como calcários neríticos, uns são o produto da acumulação seguida da diagénese (petrificação ou litificação) de restos esqueléticos ricos em carbonato de cálcio, acumulados mecanicamente, por gravidade e, nesta medida, são ditos bioacumulados. Outros resultaram da actividade de certos organismos fixos, construtores de recifes, sendo, por isso, referidos como bioconstruídos ou bioedificados.

A EDUCAÇÃO NÃO PODE SER UM PRODUTO COMERCIALIZÁVEL

A conferência e a entrevista que indico de seguida aconteceram há alguns meses mas vale a pena revê-la/relê-la (e guardá-las) pela orientação que nelas se vê da educação escolar: suportada na Declaração Universal dos Direitos Humanos, é afirmada como bem público e comum, sublinhando-se a responsabilidade dos Estados na sua concretização.

O contexto foi uma das Conferências Futuros da Educação realizadas no Instituto de Educação da Universidade de Lisboa e a conferencista foi Farida Shaheed, relatora especial para o direito à educação das Nações Unidas.
 
O discurso desta organização é, na matéria em causa, substancialmente diferente do discurso da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), sendo que é esta que mais protagonismo tem nos sistemas de ensino.

Eis um extrato da entrevista realizada pelo jornalista Jorge Andrade do Diário de Notícias:

Teme que os sistemas educacionais se estejam a tornar produtos e serviços comercializáveis? Estou profundamente preocupada com o facto de a educação parecer ter um objetivo cada vez mais restrito de desenvolver pessoas que possuam competências comercializáveis, em vez de nutrir a criatividade humana, proporcionando oportunidades e um ambiente de aprendizagem para pensar de forma crítica e diferente, para questionar, para explorar e realizar ao longo da vida o potencial de aprendizagem. Estou também preocupada com a redução do financiamento para a educação, ou para certas disciplinas não consideradas “dignas de mercado”, o que restringe a criatividade humana. A redução do financiamento também obriga as instituições educativas a procurarem fundos noutros locais, abrindo a porta a uma influência crescente de intervenientes empresariais que têm agendas específicas, bem como de instituições educativas privadas com fins lucrativos que atendem a grupos demográficos específicos, excluindo ainda mais os marginalizados.

Referiu a questão das tecnologias digitais. Como as vê enquanto ferramenta ao dispor da educação? Alarma-me a opinião generalizada de que a digitalização é uma panaceia para o fracasso educativo. Primeiro, a tecnologia digital é apenas isso: uma tecnologia, e o que importa é como ela é utilizada. Em segundo lugar, a chamada digitalização “gratuita” disponibilizada durante a covid-19 não era gratuita, os estudantes, os seus amigos e familiares pagaram o preço através da invasão da sua privacidade e da recolha de dados. Terceiro, a digitalização provavelmente aumentará a divisão entre pessoas, comunidades e países que possuem boa conectividade e dispositivos e aqueles que não os possuem. Em quarto lugar, na urgência para se tornar digital, não é dada atenção suficiente aos efeitos que isto pode ter no bem-estar psicológico e nos sentimentos de isolamento dos alunos, bem como na saúde física e no desenvolvimento. A inteligência artificial (IA), especialmente a IA generativa, traz novos desafios. Embora existam muitos aspetos positivos na IA, o perigo surge quando confiamos nela para a tomada de decisões ou para a normalização de, por exemplo, testes. A utilização de IA generativa pelos alunos levanta a questão de como avaliar se a aprendizagem ocorreu. Em termos de utilização da IA para padronização, um problema sério é que os metadados, nos quais os algoritmos se baseiam, excluem as realidades dos marginalizados. Os algoritmos em que confiamos cada vez mais são, portanto, tendenciosos e discriminam os já marginalizados, que podem então ser penalizados. 

Estas e outras ideias são desenvolvidas no vídeo (a partir do 25 minuto - aqui)

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

A NOVA PAISAGEM ALENTEJANA

Por A. Galopim de Carvalho
 
Relativamente ao clima, excepção feita à grande irregularidade verificada nos últimos anos, o Alentejo (e também o Algarve) tem um clima de características marcadamente mediterrâneas, onde a seara de trigo, o olival, a vinha e o porco alentejano, a “tetralogia mediterrânea”, no dizer de Alfredo Saramago, foram base de uma economia rudimentar, limitada ao todo nacional. Nas últimas décadas, desta tetralogia” apenas o azeite e o vinho têm alcançado desenvolvimentos, com importância considerável na economia nacional e expressão no mercado externo. O porco alentejano, de que falaremos mais tarde, tem uma importância bem mais modesta e a seara de trigo está em via de extinção.
 
É do domínio comum que a produção cerealífera no Alentejo, tem vindo decrescer substancialmente. Vivemos hoje de trigo importado, na ordem de mais de um milhão de toneladas/ano.

Em contrapartida, o olival, a vinha e, também, o amendoal (uma inovação no panorama agrícola local) ganharam lugares cimeiros na economia desta vasta região do país.

“Uma açorda comida por estes dias dificilmente será confecionada com pão de trigo alentejano. Em contrapartida, a possibilidade de ser temperada com azeite da região aumentou, e muito, nos últimos anos”. Esta expressiva e feliz frase do jornalista Aníbal Fernandes, do Diário do Alentejo, tem o aroma dos poejos e diz, com palavras a condizer, uma realidade que estamos a viver.

Em aproveitamento da água da barragem do Alqueva, o maior lago artificial da Europa Ocidental, assegurando, em 2022, cerca de 120 mil hectares de regadio”, em crescimento, temos assistido, nos últimos anos, à substituição da “seara de pão”, não só pelo olival (ocupando mais de 70 mil hectares e em crescimento), como também por outras culturas de regadio, como o amendoal (com cerca de 20 mil hectares), o girassol, o milho, as pastagens e as forragens (azevém, luzerna e sorgo). 

Falemos agora do olival.

O olival de que falam Orlando Ribeiro e Alfredo Saramago é o que hoje chamamos de olival antigo. Antigo, porque há um novo, dito moderno. Em uma trintena de anos, passou-se de um trabalho tradicional, duro, da colheita manual no chão, feita no inverno, para uma colheita mecanizada, onde a azeitona é colhida em verde, sem ser batida, nem cair ao chão, permitindo a produção de azeites de alta qualidade.

Introduzido, na Península, por gregos e fenícios e alargado pelos invasores romano e árabe, o olival a que se referiram os citados autores, resiste, meio disperso na paisagem, com oliveiras, muitas vezes, centenárias e, algumas, milenárias. Foi durante séculos base de uma exploração de sequeiro, tradicional, e de uma indústria meio artesanal, incapazes de prover às necessidades de consumo nacional. Durante as três últimas décadas, o olival português transformou-se num olival de regadio, de exploração intensiva, elevando o Alentejo à região do país com maior produção de azeitona, na ordem das 10 a 12 toneladas por hectare. De país importador, Portugal passou a país exportador de azeite de qualidade superior que ganha prémios no estrangeiro.
 

 
Fala-se hoje deste olival moderno, como uma autêntica revolução no panorama agrícola nacional, graças ao “milagre” da água da Barragem do Alqueva. Vastas áreas do Alentejo são hoje um tapete verde, devido ao plantio superintensivo (no dizer dos ambientalistas) do olival de regadio. Os opositores a esta “revolução” falam de destruição de biodiversidade, de esgotamento de recursos hídricos e de poluição atmosférica. Do outro lado de interesses, os agricultores contrapõem que o olival moderno é responsável por mais de 85% do total da produção de azeite nacional, um valor em crescimento, uma vez que a área de plantio tem vindo a aumentar. Contrapõem, ainda, que é uma cultura com baixas exigências hídricas, que degrada menos o solo e que, pelo contrário, lhe aumenta a quantidade de matéria orgânica, que sequestra mais CO2 da atmosfera (presentemente estimada em cerca de 540 mil toneladas/ano), sendo, portanto, mais sustentável, havendo quem o defenda como o expoente máximo da tecnologia ao serviço da qualidade do azeite e da sustentabilidade ambiental.

Inclino-me para o lado dos ambientalista e duvido sempre das boas intenções destes superemprendimentos.

O Homem: questão para si mesmo. 11 - Máquinas com consciência?

 Parte final do artigo de Anselmo Borges no DN de sábado, que me cita:

«Neste domínio, nestes tempos de debates fundamentais à volta da Inteligência Artificial, a questão decisiva é se algum dia teremos uma explicação científica da consciência. Mais: se haverá máquinas com consciência.

O físico Carlos Fiolhais, apresentou recentemente num dos seus escritos semanais no Correio da Manhã, precisamente à volta da Inteligência Artificial.uma famosa aposta precisamente sobre a consciência: “Em 1994, em Tucson, nos Estados Unidos, realizou-se uma conferência intitulada ‘Em direcção a uma base científica da consciência’.” O neurocientista Christof Koch defendeu aí que a consciência tinha uma base física: dar-se-iam disparos síncronos de neurónios 40 vezes por segundo. O filósofo David Chalmers retorquiu, dizendo que era impossível descrever a consciência por um fenómeno físico. Chamou ao entendimento da consciência ‘o problema difícil’.”

Passados quatro anos, os dois reencontraram-se e, mantendo as suas posições, fizeram uma aposta: o primeiro apostou com o segundo uma caixa de garrafas de vinho que, nos próximos 25 anos, os cientistas iam descobrir um comportamento neuronal claramente responsável pela noção do “eu”.

Numa reunião da Associação para o Estudo Científico da Consciência realizada em Nova Iorque, em fins de Junho passado, os dois voltaram a encontrar-se. O antigo modelo de Koch estava ultrapassado, havendo outros em contenda. Mas nenhum deles era claro, dando uma resposta inequívoca, disse Chalmers.

O neurologista teve de admitir: “É claro que as coisas não são claras.” E foi buscar uma caixa de garrafas de vinho português, no qual se destacava uma de Madeira antigo.

O perdedor, pretendendo desforrar-se, propôs que repetissem a aposta: “Apostou que daqui a mais 25 anos o assunto estará finalmente claro. Chalmers aceitou com um sorriso.”

E Carlos Fiolhais, com o seu humor: “Os cientistas gostam de fazer apostas. Mas é por saber que os cientistas perdem apostas que sigo um precioso conselho da minha avó: ‘Teima, teima, mas nunca apostes’.” E acrescenta: “Estou em crer que as máquinas só terão consciência no Dia de São Nunca.”

Tenho a mesma opinião.»

Anselmo Borges

Entrevista Professor Carlos Fiolhais à revista Contextual, da Associação de Solidariedae Social dos Professores

 A ASSP preocupa-se com muitas das vertentes da nossa vida pública, com destaque para o seu cruzamento com as questões da Ciência e da Educação. É neste terreno que privilegiamos a sua opinião sobre os seguintes pontos:

1.    Ciência e Tecnologia sempre desempenharam um papel fundamental no desenvolvimento das sociedades. Qual a influência que a divulgação da Ciência, através de todos os meios disponíveis, pode ter na promoção do interesse pelo conhecimento destas áreas?

CF- Não pode haver criação e aplicação da ciência e tecnologia se a sociedade não reconhecer a relevância desses processos. Estou em crer que, em todo o mundo, mais nuns sítios do que noutros, o papel da ciência e da tecnologia é reconhecido: é graças a estas que vivemos hoje mais e melhor. Mas há muito espaço para progresso: muita gente não tem ainda suficiente consciência do valor da ciência. E a maioria das pessoas que a têm podem ter mais. Somando-se ao papel imprescindível da escola, a divulgação da ciência desempenha um papel essencial na compreensão da ciência pelo público.  Onde há mais ciência é também onde há mais divulgação científica, alimentando-se as duas uma à outra.  Chama-se cultura científica a essa penetração da ciência da sociedade. Melhores índices de cultura científica significam a melhoria do conhecimento do mundo, incluindo o conhecimento de nós próprios.

2.    Que papel pode o ensino da Ciência desempenhar nas questões ambientais?

Sem ensino das ciências, feito a seu tempo na escola, não pode haver cultura científica. Sem acabar nela, a ciência deve começar na escola, e começar o mais cedo possível, logo no jardim de infância, quando as crianças alargam o seu contacto com o mundo. Hoje vivemos grandes desafios ambientais, derivados do sobreaquecimento do planeta causado pelas nossas emissões de dióxido de carbono para a atmosfera. Do ponto de vista científico compreendemos bem a questão e também desenvolvemos algumas soluções, designadamente substituir as energias provenientes de combustíveis fósseis por energias ditas alternativas. Tudo isso deve ser ensinado e discutido nas escolas, porque estas servem para preparar para a vida. Deve ser transmitido não só o estado do planeta, mas também os métodos que usámos e usamos para conhecer esse estado, porque a ciência, mais do que um corpo de conhecimentos, é um método para os obter. Contudo, o referido desafio ambiental não tem solução fácil, porque, para além da ciência, há questões sociais, económicas e políticas, que dividem os países. A escola também devia transmitir essa realidade humana, para além da realidade da Natureza, ligando as ciências exactas e naturais com as ciências sociais e as humanidades. E a consciência ambiental não pode acabar na escola, desempenhando os media um papel fulcral, para que os cidadãos possam fazer escolhas quando fazem intervenções políticas.

3.    Que avaliação faz da situação atual da Educação em Portugal?

Temos grandes problemas nessa área. À partida e desde logo a progressiva desconsideração dos professores, cujo papel importa valorizar. Cheios de trabalho, não apenas pedagógico, mas infelizmente também burocrático, e mal pagos, os professores estão desmotivados. Muitos querem reformar-se o mais cedo possível. E foram cometidos erros de planeamento (ou houve falta dele…), descurando a formação de professores para ocupar vagas em aberto ou que vão abrir. É preciso que o corpo docente volte a ter estímulos, sendo o maior o reconhecimento pela sociedade da sua nobre tarefa de educar. Depois, há questões organizativas – como os currículos, o espaço escolar, os meios pedagógicos (incluindo os computadores)), etc. – que nem sempre têm sido bem tratadas. Vários governos têm tentado conduzir políticas que por vezes se «atropelam» umas às outras, confundindo quem está na escola e fora dela.

4.    O ensino das Ciências está a cumprir a sua função de estimular conhecimento, curiosidade e sentido crítico na Educação básica?

A educação básica é básica: nela assenta todo o edifício escolar. Respondendo de forma sumária, sim, está, mas pode fazer melhor.  Os educadores e professores dão todos os dias o seu melhor para estimular a curiosidade natural dos mais novos. Mas as distrações são muitas – incluindo as distrações dos telemóveis e da Internet – e o seu trabalho não é fácil.  Fez-se já um grande caminho de integração de elementos de ciência no ensino básico, mas pode-se fazer melhor: por exemplo, as boas práticas do ensino experimental deviam ser mais conhecidas e os bons exemplos deviam ser premiados.

5.    Considera que atualmente há uma boa ligação entre a Ciência, a Tecnologia e as Empresas?

A actividade da maioria das empresas assenta hoje, de uma forma ou de outra, na ciência e na tecnologia. Estas empregam os jovens que o ensino superior forma. As instituições de ensino superior têm tentado aprofundar a sua ligação às empresas. Mas há aqui um amplo espaço para melhoria: ainda há alguma desconfiança mútua e alguns entraves burocráticos a projectos conjuntos. As estatísticas dizem que a maior parte da investigação científica e tecnológica é feita no sector privado, nas empresas, mas julgo que esses dados estão um pouco inflacionados. As empresas podem e devem, para seu próprio benefício, investir mais em ciência e tecnologia e devem fazê-lo em boa integração com os centros de investigação, que na sua grande maioria estão ligados ao ensino superior. Isto é, há que multiplicar os contactos entre as instituições de ensino superior e as empresas. Têm objectivos diferentes (por exemplo, as instituições de ensino superior não têm de ter lucro), mas complementares.

6.    Se não, o que falta fazer? Qual o papel dos dois subsistemas do ensino superior neste processo?

O ensino superior está, pelo menos desde os tempos do ministro Veiga Simão, no regime anterior, articulado em ensino universitário e politécnico (uma divisão que existe tanto no sector público como no sector privado). Falamos, por isso, de um sistema dual. Mas o certo é que essa divisão não é nítida - por exemplo há universidades com ensino politécnico e politécnicos com ensino universitário. E, além disso, cada vez mais os politécnicos reclamam uma parte do q1ue era apenas  estatuto universitário. A referida dualidade, que, num país muito desigual, liga muito à questão do desenvolvimento regional, devia ser debatida. E não deveria haver medo de fazer mudanças se estas forem julgadas necessárias. 

7.    Qual a avaliação que faz do incremento que a Inteligência Artificial está a ter nas sociedades em geral?

A Inteligência Artificial está em explosão por via do desenvolvimento da sua modalidade generativa: isto é, programas como o ChatGPT, permitem criar obras que parecem humanas. A sociedade tem aqui também um grande desafio. Haverá mudanças que não sabemos ainda bem quais são – alguns trabalhos humanos passarão a ser automatizados, por exemplo, como de outros modos já aconteceu no passado. Mas há, claramente, alguns perigos, designadamente a capacidade de fazer e espalhar concepções virtuais que muitos podem confundir com reiais. O real e o virtual estão cada vez mais difíceis de distinguir e isso acarreta perigos sociais. È cada vez mais fácil sermos enganados.

8.    Qual o papel que a Inteligência Artificial pode ter no Ensino Básico/Secundário e nas Universidades e Politécnicos?

Sei que há algumas tentativas em curso do seu uso e a experiência devem ser avaliadas. O papel dessa Inteligência será maior nas Universidades e Politécnicos do que no básico e secundário. Há mudanças que se antecipam: por exemplo, a avaliação por escrito terá de ser feita com mais critério. Sendo a favor da inovação, não posso deixar de chamar a atenção para a cautela que é sempre preciso quando se introduzem novidades no ambiente educativo. A escola pode e deve ser inovadora, mas tem também de ser conservadora. Não pode trocar o certo pelo duvidoso. E vejo muitos estudos hoje que põem em causa o excessivo uso de ecrãs na escola. A pandemia mostrou-nos que, se os ecrãs são uteis, a presença pessoal tem componentes insubstituíveis. Estou em crer que os professores nunca serão substituídos por máquinas, porque a escola é acima de tudo um lugar de promoção da humanidade.

9.    Os manuais escolares estão a ser substituídos pelo digital. Considera essa substituição positiva do ponto de vista dos protagonistas da Educação?

O digital tem o seu papel, se me é permitido o trocadilho. Mas eu sou, por formação, um leitor e autor do papel. Aprendi por manuais em papel e acho que este tem enormes vantagens. Sou autor de vários manuais, dos quais há versões digitais, que terão uma vantagem ou outra, por exemplo a leveza ou a procura rápida de texto. Ensaios feitos em países mais desenvolvidos estão a desfazer uma «ilusão tecnológica» que foi criada apregoando a total superioridade do digital. Para os governos há a tentação de supor que os problemas da educação se curam com tecnologia. Mas não: a educação é um problema humano, que se cura, ou melhor que temos de procurar curar, com mais humanidade, em especial formando melhor os nossos professores e confiando mais neles.

NOVOS CLASSICA DIGITALIA

Os Classica Digitalia têm o gosto de anunciar 2 novas publicações com chancela editorial da Imprensa da Universidade de Coimbra. Os volumes dos Classica Digitalia são editados em formato de papel e também na biblioteca digital, em Acesso Aberto.

Série “Humanitas - Supplementum” [estudos]

 

Maria Aparecida Oliveira Silva & Maria de Fátima Silva (Coords.), Heródoto e a invenção do outro: confrontos e conflitos culturais (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2024). 264 p.

DOI: https://doi.org/10.14195/978-989-26-2601-7

  

[Este título reúne um conjunto de textos agrupados em duas secções: uma Parte 1, nas questões suscitadas pela narrativa de Heródoto, e uma Parte 2, sobre a receção que o autor conheceu na própria Antiguidade. Suscita, assim, as linhas de força numa discussão hermenêutica que foi somando leituras ao longo dos séculos, a que o texto de Heródoto – essencialmente focado nas relações entre Oriente e Ocidente, Ásia e Europa – sempre traz um inesgotável contributo.]


- Alberto Jesús Quiroga Puertas & Ángeles Jiménez-Higueras (Coords.), En busca del tiempo y del espacio: ucronías y utopías desde la Antigüedad hasta la actualidad (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2024). 208 p.

DOI: https://doi.org/10.14195/978-989-26-2629-1

  

[Esta propuesta aborda cómo las categorías “tiempo” y “espacio”, entendidas en su dimensión física, han sido manipuladas para crear otras realidades, otros mundos en los que distintos autores y artistas han proyectado sus ideologías, miedos y esperanzas desde el mundo antiguo hasta nuestros días. Al amparo de la cada vez más recurrente pregunta “qué hubiera pasado si…”, este proyecto persigue sondear los mecanismos literarios y los mundos paralelos creados cuando nos imaginamos otros mundos así como unos futuros y unos pasados alternativos.]

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PROGRAMA DA ESTAÇÃO ELEVATÓRIA DE COIMBRA / BIBLIOTECA CARLOS FIOLHAIS

- 9/10/2024, 18h  Diálogo entre Religiões: a guerra e a paz, com João Gouveia Monteiro,e P. Nuno Santos, moderação de Carlos Fiolhais, no Seminário Maior de Coimbra

- 11/10, 14h30 Gravação do «Prova Oral» com Fernando Alvim e Carlos Fiolhais

https://www.facebook.com/watch/live/?ref=watch_permalink&v=489106564115581

- 24/10, 14h30 Apresentação para uma turma do ensino básico do livro «Toda a Física Divertida» (Gradiva) de Carlos Fiolhais, por David Marçal, com apresentação por Carlos Fiolhais de «Históerias que metem água e chumbo», e 15h30, apresentação para o público em geral.

- 5/11, 18h  Diálogos sobre Ética: Ética na ciência e tecnologia, com   Luís Adriano Oliveira, autor de «Responsabilidade ética e profissional em ciência e Engenharia» (Lidel), com moderação de Carlos Fiolhais.

- 6/11, 14 h, Apresentação para uma turma do jardim-escola do livro  “As peças mais pequenas. Tudo o que vemos é feito do que não vemos” (Planeta Tangerina) , com Miriam Alves e  Yara Kono. Carlos Fiolhais falará sobre «O que há num copo de água»?

- 12/11, 18 h, Apresentação do livro «História Global da Literatura em Portugal» (Temas e Debates), dirs. Annabela Rita, Isabel Ponce de Leão, José Eduardo Franco e Miguel Real, com Francisco Manuel Viegas.

- 13/11,14h, Apresentação para uma turma do ensino básico do livro infantil «No Mundo dos Porquês» (Canto das Cores) de Daniel Completo, Luísa Ducla Soares e Carlos Fiolhais, com actuação musical de Daniel Completo.

- 16/11, 16h  Abertura da exposição e apresentação do livro « Ver na Terra o Paraíso: nos 500 anos de Camões» (edição da autora), de Katia Andrade, com apresentação de Rita Marnoto e actuação musical de Bruno Costa (guitarra de Coimbra)

- 19/11, 18h  Apresentação do vol. I das «Obras Completas do Marquês de Pombal», dirs. José Eduardo Franco , Pedro Calafate e Viriato Soromenho Marques, coord. do vol. de  Ana Leal Faria (Imprensa da Universidade de Coimbra)

- 10/12, 18h  Apresentação de “Os Lusíadas,” de Luís de Camões (edição anotada por António José Saraiva,  Gradiva) por Regina Rocha

- 18/12, 18h  Diálogos sobre Educação: apresentação do livro «Diálogos Cruzados» (Edições Esgotadas), de Luísa Paolinelli e outros, com a presença dos autores.

SERÁ POSSÍVEL UMA EDUCAÇÃO PARA A CIDADANIA À MARGEM DAS MUITAS IDEOLOGIAS QUE A CERCEIAM?

O Primeiro-Ministro anunciou hoje o que se esperava: (mais) uma mudança do currículo do ensino obrigatório (não de "programas", como disse, pois faz tempo que eles foram revogados, passando as disciplinas a ser guiadas por documentos designados por "Aprendizagens Essenciais").
 
E colocou a tónica na componente de Cidadania (não "disciplina" de Cidadania, como disse, pois a agora designada Cidadania e Desenvolvimento pode ou não ser concretizada numa disciplina, consoante se trate do ensino básico ou secundário, admitindo também o enquadramento em projectos).
 
O argumento para justificar a mudança nesta componente é que ela está cativa da ideologia. Infiro que isto queira dizer "por uma certa ideologia", aquela que, em termos sociais, se entende como tal. Se não, veja-se a notícia do jornal Público de hoje:
"Em 2020, [a educação para a cidadania] tornou-se mesmo motivo de polémica depois de dois alunos de Vila Nova de Famalicão terem faltado à disciplina durante um ano lectivo por decisão dos pais, que alegaram objecção de consciência aos temas que ali são leccionados e se envolveram numa disputa judicial com o Ministério da Educação".

Ora, os temas de cidadania são, no momento, 17 (ou, feitas bem as contas, 18, havendo escolas que lhe acrescentam outros) e os temas no caso aqui invocado seriam talvez os de "igualdade de género" ou "sexualidade". É muito neles que a discordância entre esquerdas e direitas se concentram. E fazem-no por razões ideológicas. Porque uns "acham" isto e outros "acham" aquilo. Expurgar a ideologia por razões ideológicas é um contrassenso.

Acontece que noutras áreas que não estas (mas talvez não em todas) a ideologia está lá; será distinta, mas está: é a ideologia do empreendedorismo, da gestão financeira, do sucesso... que produz o perfil desejável de produtor-consumidor, funcional no mercado de trabalho. E isto sob influência e presença de múltiplos  stakeholders, sobretudo de representantes de marcas comerciais que entram na escola pública por via da dita "cidadania". Presumo que seja esta que vai manter-se travestida, evidentemente, de neutralidade ideológica.

Vemos que a escola, desde os seus primórdios (quando assume a sua expressão educativa, o que nem sempre aconteceu/acontece), se preocupou com a cidadania, com a preparação das novas gerações para (bem) viver no espaço comum. E isto tem de continuar a ser um dos seus desígnios. 

Ou seja, a escola pública não pode abdicar de educar as novas gerações num quadro de cidadania, segundo valores éticos (universais e universalizantes), que têm de ser conhecidos, preservados e tidos como guias de acção. Mas para benefício do mundo.

De modo mais claro: é preciso entender que educar para a cidadania é um dever da escola pública, proporcionada pelo Estado, destinada a todos, não doutrinal. Tem de ser guiado por princípios que concorrem para a formação do ser humano, na esperança de que isso constitua uma mais valia para a humanidade. Orientações político-partidárias, religiosas, comerciais e congéneres não podem ter lugar, nessa escola. Isso mesmo está consagrado na Constituição da República Portuguesa e na Lei de Bases do Sistema Educativo.

sexta-feira, 18 de outubro de 2024

PREFÁCIO AO LIVRO "APRENDER A GOSTAR DE SABER", DE A. GALOPIM DE CARVALHO

Dentro de um mês, nas bancas
 
O livro de alguém que continuará a existir depois de todos partirmos Este prefácio arrisca-se, e logo ao primeiro parágrafo, a ser profundamente redundante, mas ainda assim arrisco: António Galopim de Carvalho é um farol, um dos poucos que nos consegue iluminar com uma sabedoria feita de procura da simplicidade, de encontro diário com um mundo que continua a valer a pena nos seus olhos ávidos e inquietos, esperançosos e otimistas – mesmo quando escreve palavras tristes ou cansadas é sempre a esperança que nos ocorre.

“Aprender a Gostar de Saber” é um livro obrigatório. Pode ser lido hoje ou amanhã, mas pode também ser lido numa qualquer eternidade pelos netos dos nossos netos. Há memória, mas o passado em tudo o que faz é sempre futuro. Quando nos escreve sobre o que lhe sabia a comida na infância, conseguimos sentir o cheiro do que nos faz falta; quando nos conta de episódios que só a ele importariam, são os nossos episódios que vamos buscar; quando nos fala de ser professor, ambicionamos uma escola que não existe; quando nos exalta com a geologia, navegamos num sonho mais largo; quando nos confessa detalhes familiares da sua relação com Isabel, ou dos seus dois filhos, é ternura e compromisso e amor; quando nos diz do Alentejo, e dos seus cismas, percebemos tudo o que é aquele lugar e as suas sombras.
António Galopim de Carvalho deixa-nos estes textos quando acaba de completar 93 anos. 
 
Nasceu em 1931, antes de Hitler se apresentar a mundo, antes até da Guerra Civil Espanhola. Os seus olhos viram muito sobre a história e a condição humana. Nasceu num lugar agreste e isolado e nunca foi bom aluno até ser um grande aluno na universidade. Quem seria capaz de dizer em Évora que aquele menino, irmão de Francisco José, estrela da música portuguesa, um dia viria a tornar-se um dos melhores portugueses, um dos cientistas mais reconhecidos, um dos professores mais aplaudidos, um dos defensores da nossa identidade histórica, mais apaixonados, e o diretor do Museu de História Natural mais emblemático e popular? Quem adivinharia?

Bastaria estar atento às suas fotografias de criança e adolescente. Aqueles olhos cheios de curiosidade e espanto, aquela vontade de saber, de se encontrar, de partir à conquista de um mundo maior, mais largo, menos aprisionado a um destino que nos obriga a desistir de sonhar. Bastaria isso para termos percebido que o pequeno António um dia poderia ser o que quisesse ser. E ele foi o que quis ser. Com Isabel, sua companheira de sempre, navegou para fora de pé sem ter garantias de nada, apenas a sua curiosidade o poderia ajudar na tentação do acomodamento.

“Aprender a Gostar de Saber” é um livro para pais com crianças na escola. Um livro para os mais velhos e mais novos. Uns encontrarão o que são ou poderiam ter sido. Outros, ensinamentos que são puro ouro para quem caminha sem bússolas visíveis. Um livro também para os que gostam de viver e para os que têm dúvidas. Uns por perceberem o quanto a sua intuição estava certa, os outros pela constatação de que perderam um tempo que agora podem recuperar.

António Galopim de Carvalho é um dinossáurio. Não é o avô ou o pai dos dinossáurios, ele é um deles. Há 65 milhões de anos resistiu à extinção quando não se esperava que o fizesse. E hoje, tantas dezenas de milhões de anos depois, há quem não acredite que conseguiremos resistir à turbulência que causámos ao planeta. Oiçamo-lo então. Passemos pelos seus textos sem pressa, aprendamos com quem sabe do que está a falar. Afinal, ele é eterno e veio para nos contar estórias que fiquem antes do sono. Estórias que nos impeçam de adormecermos para a necessidade de não desistirmos, de continuarmos a combater por uma ideia de bem. Eis é um livro obrigatório de um homem que continuará a existir depois de todos partirmos. Um farol que ilumina quem o lê com a luz dos sábios.

Luís Osório

domingo, 13 de outubro de 2024

DOIS NOBEL PARA A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

 


Viva a Inteligência Artificial!

Este ano a Academia das Ciências Sueca premiou-a na Física e na Química. Depois de o Prémio Nobel da Física ter sido anunciado o premio para as redes neuronais, para o físico John Hopfield e e para o cientista de computação Geoffrey Hinton, por trabalhos usando redes neuronais, o Nobel da Química foi para o seu uso para prever a estrutura das proteínas a partir dos seus constituintes, os aminoácidos. A lista dos ingredientes está nos nossos genes, no nosso ADN, em cada uma das nossas células. Dois dos premiados. Demis Hassabis e John Jumper, lideram a DeepMind, a empresa da grupo da Google (Alphabet), que a seguir a ganhar no jogo do Go a um campeão sul-coreano, um jogo mais difícil que o xadrez, com o programa AlphaGo criou o Alphafold, programa que resolveu o problema do enrolamento das proteínas, dados seus constituintes. Uma proeza inacessível aos humanos foi, em 2020, realizada por uma máquina! As aplicações já existem: novos fármacos estão a ser desenhados por ferramentas de IA. Nas moléculas, a forma serve a função: é indispensável saber a forma para conhecer melhor a função.

A empresa Clarivate , que possui bases de dados de artigos científicos (Web of Knowledge) adivinhou este Nobel da Química, os três premiados estão na lista de nomeados deste ano, assim como adivinhou o Nobel da Medicina, dado por trabalhos de descoberta do microRNA. A revista Science tinha nomeado a proeza da DeepMind como a «descoberta do ano» em 2021. Era previsível, embora a atribuição tenha sido rápida: os cientistas dessas empresa sabiam da boa probabilidade de serem premiados (é interessante, embora não inédito, os laureados serem cientistas de um laboratório privado), assim como decerto o seu co-laureado, David Baker, que inventou novas proteínas com a ajuda de um programa de computador, mas sem usar IA, abrindo caminho ao AlphaFold. Quanto ao Nobel da Física os nomes eram imprevisíveis: julgo que Hopfield foi apanhado desprevenido e que Hinton, que já tinha o prémio Turing de Ciências de Computação não contava com a distinção, nem nos seus sonhos mais remotos. Mas, ao contrário de alguns comentários, importa realçar que os trabalhos premiados são da Física, designadamente da Física Estatística. As actuais redes neuronais estão, porém, que estão longe desses modelos da física.

Nas minhas palestras sobre IA tenho mencionado as proezas da DeepMind e os trabalhos de Hinton que culminaram em bem-sucedidos algoritmos de reconhecimento de imagens. Portanto, não fiquei muito surpreendido. Vou reforçar as menções a esses cientistas. A IA tem agora a benção de dois Nobel, não é coisa pequena. A ciência continua a mudar o mundo, agora a um ritmo maior, a um ritmo que alguns dizem alucinante.

NOVIDADES DA GRADIVA

 


«ESTE É O LIVRO INDISPENSÁVEL
PARA COMPREENDER O MUNDO DE HOJE.»
Walter Isaacson


 BESTSELLER  DO NEW YORK TIMES

  

«Fareed Zakaria está de parabéns por este seu livro deslumbrante.
Dei por mim a assinalar passagem após passagem, facto após facto.
O nosso QI aumen­ta 10 pontos apenas com a leitura deste livro.»
 Nicholas Kristof, Colunista do New York Times via X

 

O aclamado apresentador da CNN explora nesta sua obra as revoluções passadas e presentes que definem a era em que vivemos. A fúria populista, a fractura ideológica, os choques económicos e tecnológicos, a guerra e um sistema internacional repleto de risco.

Neste seu novo livro, Fareed Zakaria investiga com mestria as épocas e os movimentos que abalaram as normas e ao mesmo tempo moldaram o mundo moderno.
Como poucos intelectuais contemporâneos conseguem fazer, Zakaria combina o alcance intelectual, com uma profunda visão histórica e uma intuição certeira que contribuem para a compreensão do nosso presente turbulento.

Os seus argumentos ousados e convincentes fazem deste livro uma leitura essencial na nossa era de revoluções.

Lançamento a 22 de Outubro: "O Excêntrico Mr Churchill", de Jacob F. Field. De €15,50 por €13,95. Pré-venda, clique aqui!

SENTE-SE CONFORTAVELMENTE NO SOFÁ E DELEITE-SE COM ESTA CURIOSA COLECÇÃO DE HISTÓRIAS, ANEDOTAS E PORMENORES POUCO CONHECIDOS DA VIDA DE WINSTON CHURCHILL.


Os seus hobbies favoritos como a alvenaria ou a caça às borboletas; o «ovo» de Churchill: uma engenhoca que lhe permitia fumar charutos em aviões sem ter de usar a máscara de oxigénio de que necessitava por causa dos seus problemas cardíacos; e o seu constante entusiasmo por banhos, que o fazia acompanhar-se de um aparato portátil que lhe possibilitava não abdicar deles mesmo enquanto viajava.
Entregue-se ao prazer da descoberta das excentricidades e factos menos conhecidos de um dos nomes que mudou o curso da história do século XX, num livro que não quererá parar de ler e de reler.

Lançamento a 22 de Outubro: "Inventor de Esquecimentos", de António Canteiro. De €14,50 por €13,05. Pré-venda, clique aqui!

ROMANCE VENCEDOR DO
PRÉMIO LITERÁRIO JOAQUIM MESTRE, 2024


Eduardo, filho do feitor da Quinta do Pinheiro, em pleno Alto Alentejo, cresce num espaço rural onde a economia familiar gira em torno das rotinas da horta, da represa e do lagar. Uma infância livre em intera­cção constante com a natureza. Mas será em Évora, durante os estudos liceais que Eduardo Francisco Varela Pècurto se torna fotógrafo, tirando retratos aos colegas, que  troca por dinheiro. Guiado por grandes mestres da fotografia, já em Coimbra, o seu talento fotográfico cruza-se os textos de Miguel Torga, Afonso Duarte e Carlos de Oliveira.
Saudado com prémios de foto­grafia nacionais e internacionais tornar-se-ia num dos grandes nomes da fotografia do século XX português.

O romance Inventor de Esquecimentos de António Cantei­ro inspira-se na vida de Varela Pècurto.
A chegar aos 100 anos, os relatos do fotógrafo sustentam a investigação do autor que, com este romance, presta homenagem a uma das grandes figuras da história de fotografia em Portugal.

Lançamento a 22 de Outubro: "Reset Hormonal", de Ana Carvalhas. De €16,50 por €14,85. Pré-venda, clique aqui!

Já alguma vez se questionou acerca do impacto que as suas escolhas alimentares têm no seu corpo?
 
O Reset Hormonal é a chave para transformar a sua saúde de dentro para fora. Neste livro, vai descobrir como reprogramar o seu corpo em apenas 21 dias, adoptando uma estratégia alimentar que revitaliza as suas hormonas, proporcionando um emagrecimento saudável e duradouro.
Com base nos estudos mais recentes e na sua prática clínica, o Programa de Reset Hormonal de Ana Carvalhas vai muito além das dietas convencionais. Este método inovador foca-se na regulação de hormonas-chave, como a insulina e o cortisol, reduzindo a fome e a compulsão alimentar e aumentando os níveis de energia. Complementada com um plano de exercícios físicos e de práticas de relaxamento, esta nova abordagem permitir-lhe-á manter o equilíbrio hormonal e alcançar o seu peso ideal.
Com mais de 80 receitas saudáveis, cuidadosamente escolhidas para o apoiar, encontrará nesta obra as orientações que procura para alcançar os seus objectivos de saúde e bem-estar.
 
Comece hoje mesmo a sua jornada.

O BRASIL JUNTA-SE AOS PAÍSES QUE PROÍBEM OU RESTRINGEM OS TELEMÓVEIS NA SALA DE AULA E NA ESCOLA

A notícia é da Agência Lusa. Encontrei-a no jornal Expresso (ver aqui ). É, felizmente, quase igual a outras que temos registado no De Rerum...