segunda-feira, 2 de dezembro de 2024

MANIFESTO PARA O ENSINO E APRENDIZAGEM EM TEMPO DE GenAI

 Por Maria Helena Damião e Cátia Delgado

Assinado por académicos de diversos países do mundo, foi publicado no passado dia 29 de Novembro, na revista Open Praxis, o seguinte Manifesto com foco no ensino superior (aqui):

No RESUMO, os seus muitos autores explicam o espírito que os moveu: 

No manifesto examina-se criticamente o desenvolvimento da integração da IA Generativa (GenAI), chatbots e algoritmos no ensino superior (...). A GenAI, apesar de lhe serem imputadas vantagens na personalização da aprendizagem e na eficiência das acessibilidades, está longe de ser uma ferramenta neutra. Os algoritmos moldam a interacção humana, a comunicação e a criação de conteúdos, levantando questões profundas sobre o que é o ser humano, sobre a sua acção e sobre os preconceitos que veicula. A evolução da GenAI coloca-nos desafios na manutenção da ideia do humano, no que respeita à salvaguarda da equidade e de experiências de aprendizagem significativas. Neste manifesto destaca-se que a GenAI não é ideológica e culturalmente neutra. Em vez disso, reflecte visões de mundo que podem reforçar os preconceitos existentes e marginalizar diversas vozes. Como o uso da GenAI remodela a educação, faz correr o risco de desgastar elementos humanos essenciais - criatividade, pensamento crítico e empatia - e pode substituir interações com soluções algorítmicas. Este manifesto apela a medidas robustas e baseadas em evidências para uma tomada de decisão consciente no sentido de garantir que o GenAI melhore, em vez de diminuir, a capacidade humana de agir, bem como relembrar a responsabilidade ética na educação.

Em concreto, explicam PORQUÊ UM MANIFESTO? 

(...) o aparecimento público [da GenAI] no final de 2022 gerou, sem dúvida, especulações substanciais, exagero e até esperança. Em tempos tão incertos e especulativos, é crucial adoptar uma abordagem colectiva para navegar efectivamente no futuro, objectivo que os autores procuram alcançar com este trabalho colectivo. Com este manifesto, resistimos à aceitação acrítica da GenAI; em vez disso, procuramos uma perspectiva equilibrada analisando criticamente tanto os seus desafios como as suas possibilidades. Um manifesto, por definição, serve tanto como aviso como chamada de atenção, instando-nos a reconsiderar abordagens anteriores, à medida que avançamos (Latour, 2010) (...). Em vez de se repetirem slogans que compõem a narrativa educacional, aprofunda-se a compreensão da GenAI, procurando-se aumentar uma consciencialização que nos ajude a navegar na formação do futuro. [ver no manifesto dois quadros que sistematizam os aspectos considerados mais negativos e mais positivos da da GenAI, bem como a sua explicação]

E fazem, "humildemente", um AGRADECIMENTO "aos pioneiros que sonharam a inteligência além do pensamento humano". Dizem:

"O seu brilho iluminou o nosso caminho e seus legados permanecem em cada linha de pensamento e cada pergunta ainda sem resposta. Por isso, somos-lhes eternamente gratos"

Destacamos dois deles:

• Para Isaac Asimov, cujas Três Leis da Robótica sussurraram possibilidades através da ficção, despertando a imaginação e inspirando os dilemas éticos de um futuro que ainda está por vir.
• E Alan Turing, cuja pergunta atemporal (As máquinas podem pensar?) ainda ecoa, permitindo-nos explorar as profundezas da cognição e da criatividade. O (...) Teste de Turing, continua a ser um farol que nos guia através do labirinto do que significa conhecer, sentir, ser.

Vale muito a pena pelo menos passar os olhos por este Manifesto.

APRENDER A GOSTAR DE SABER

É com o maior gosto que o De Rerum Natura deixa aqui nota da apresentação do mais recente livro do Professor António Galopim de Carvalho. Agradecemos ao autor ter-nos facultado o índice e o texto do Prefácio.

ÍNDICE

ARTE
Modernismo ao alcance de todos
Arte Nova de Art Déco
O Surrealismo e a barrística de Rosa Ramalho
FICÇÃO
As férias da Inês
O fim do trabalho “de sol a sol”
Presbiopia na Feira de São João
Os “filhos da curta”
Apocalipse
FILOSOFIA
Pensar sobre o pensamento
Espreitar para dentro da filosofia
O berço da civilização ocidental
2200 anos antes da Tabela Periódica
GEOGRAFIA
Um saber nascido na Grécia antiga
Grande mestre e grande humanista
A “Planície” alentejana
A nova “Tetralogia mediterrânea”
Desertos e desertificação
Montes Hermínios
O Würm em Portugal
Arquivos da Natureza
Tagus, amnis hiberus maximus
O pré-Tejo e a sua foz
GEOLOGIA
O renascer da geologia clássica em Portugal
O pai da Tectónica de Placas em Portugal
Um grande professor e um cidadão de excelência
Primórdios da Geologia
Rochas, um conhecimento ao alcance de todos
Galopimito
Lapis philosophorum
As Pedras as palavras
Solo, a fronteira entre a roca e a vida
Geologia do vinho
Petrificados
Catastrofismo, Criacionismo e Uniformitarismo
A subalternização da Geologia no nosso país
É preciso elevar a cultura geológica dos portugueses
Reflexão sobre o ensino da Geologia
Açores, um laboratório de Geologia vulcanológica desperdiçado
HISTÓRIA
Transmutação, uma metáfora da purificação espiritual
Feudalismo para gente com pressa
Nos primórdios da grande epopeia
LITERATURA
O soneto em José Caniné
Decameron, obra-prima pioneira da literatura realista mundial
François Rabelais, o mais notável fundador da moderna literatura francesa
MEMÓRIAS
À margem das regras
Alfredo Cadeireiro, pintor de mobília alentejana
Literatura à mesa, depois do jantar
Os magalas
À luz do acetileno
A minha primeira crónica
A vénia pela matemática
O repentista
REFLEXÕES
Sobre o ensino da Geologia em Portugal
Os profissionais da comunicação social e nós
Uma vida em 366 palavras
Um esclarecimento
As mochilas escolares

PREFÁCIO

"O livro de alguém que continuará a existir depois de todos partirmos. Este prefácio arrisca-se, e logo ao primeiro parágrafo, a ser profundamente redundante, mas ainda assim arrisco: António Galopim de Carvalho é um farol, um dos poucos que nos consegue iluminar com uma sabedoria feita de procura da simplicidade, de encontro diário com um mundo que continua a valer a pena nos seus olhos ávidos e inquietos, esperançosos e otimistas – mesmo quando escreve palavras tristes ou cansadas é sempre a esperança que nos ocorre.
“Aprender a Gostar de Saber” é um livro obrigatório. Pode ser lido hoje ou amanhã, mas pode também ser lido numa qualquer eternidade pelos netos dos nossos netos. Há memória, mas o passado em tudo o que faz é sempre futuro. Quando nos escreve sobre o que lhe sabia a comida na infância, conseguimos sentir o cheiro do que nos faz falta; quando nos conta de episódios que só a ele importariam, são os nossos episódios que vamos buscar; quando nos fala de ser professor, ambicionamos uma escola que não existe; quando nos exalta com a geologia, navegamos num sonho mais largo; quando nos confessa detalhes familiares da sua relação com Isabel, ou dos seus dois filhos, é ternura e compromisso e amor; quando nos diz do Alentejo, e dos seus cismas, percebemos tudo o que é aquele lugar e as suas sombras.

António Galopim de Carvalho deixa-nos estes textos quando acaba de completar 93 anos. Nasceu em 1931, antes de Hitler se apresentar a mundo, antes até da Guerra Civil Espanhola. Os seus olhos viram muito sobre a história e a condição humana. Nasceu num lugar agreste e isolado e nunca foi bom aluno até ser um grande aluno na universidade. Quem seria capaz de dizer em Évora que aquele menino, irmão de Francisco José, estrela da música portuguesa, um dia viria a tornar-se um dos melhores portugueses, um dos cientistas mais reconhecidos, um dos professores mais aplaudidos, um dos defensores da nossa identidade histórica mais apaixonados e o diretor do Museu de História Natural mais emblemático e popular? Quem adivinharia? Bastaria estar atento às suas fotografias de criança e adolescente. Aqueles olhos cheios de curiosidade e espanto, aquela vontade de saber, de se encontrar, de partir à conquista de um mundo maior, mais largo, menos aprisionado a um destino que nos obriga a desistir de sonhar. Bastaria isso para termos percebido que o pequeno António um dia poderia ser o que quisesse ser. E ele foi o que quis ser. Com Isabel, sua companheira de sempre, navegou para fora de pé sem ter garantias de nada, apenas a sua curiosidade o poderia ajudar na tentação do acomodamento.

“Aprender a Gostar de Saber” é um livro para pais com crianças na escola. Um livro para os mais velhos e mais novos. Uns encontrarão o que são ou poderiam ter sido. Outros, ensinamentos que são puro ouro para quem caminha sem bússolas visíveis. Um livro também para os que gostam de viver e para os que têm dúvidas. Uns por perceberem o quanto a sua intuição estava certa, os outros pela constatação de que perderam um tempo que agora podem recuperar.

António Galopim de Carvalho é um dinossáurio. Não é o avô ou o pai dos dinossáurios, ele é um deles. Há 65 milhões de anos resistiu à extinção quando não se esperava que o fizesse. E hoje, tantas dezenas de milhões de anos depois, há quem não acredite que conseguiremos resistir à turbulência que causámos ao planeta. Oiçamo-lo então. Passemos pelos seus textos sem pressa, aprendamos com quem sabe do que está a falar. Afinal, ele é eterno e veio para nos contar estórias que fiquem antes do sono. Estórias que nos impeçam de adormecermos para a necessidade de não desistirmos, de continuarmos a combater por uma ideia de bem. Eis é um livro obrigatório de um homem que continuará a existir depois de todos partirmos. Um farol que ilumina quem o lê com a luz dos sábios."

Outubro 2024
Luís Osório

sábado, 30 de novembro de 2024

NO PRINCÍPIO ERA O MAGMA

Por A. Galopim de Carvalho
 
Após a acreção do protoplaneta que antecedeu a formação deste maravilhoso corpo planetário que nos deu berço, e na sequência dos processos que determinaram a sua diferenciação como planeta (nomeadamente e em especial, a contracção gravítica e a formação núcleo), a Terra acumulou uma quantidade de calor tal que se converteu numa imensa “bola” incandescente.
 
Durante as primeiras centenas de milhões de anos, este nosso hoje “Planeta Azul” esteve envolvido num “oceano” de magma, em resultado da fusão da sua parte mais externa, “oceano” cuja profundidade teria sido da ordem de algumas centenas de quilómetros. Foi a partir da capa mais superficial deste invólucro ígneo que, por arrefecimento posterior, se formou a primitiva crosta terrestre (com mais de 4000 milhões de anos, praticamente desaparecida na sequência da contínua renovação da crosta determinada pela chamada tectónica de placas), separada de uma outra entidade, que se lhe segue em profundidade, também ela já parcialmente arrefecida, a que foi dado o nome de manto.

Entendendo por magmatismo o processo natural através do qual um material fundido, a que se convencionou chamar magma, conduz à formação das rochas (ditas magmáticas), temos de concluir que este processo geológico é uma constante na história do nosso planeta (e do Sistema Solar) e que está na origem de todos os tipos de rochas (petrogénese). Com efeito, não haveria rochas sedimentares sem as magmáticas preexistentes, nem rochas metamórficas sem que, pelo menos, tivesse existido um destes dois tipos de rochas. É, assim, lícito pensar que o mesmo acontece nos planetas telúricos, nossos vizinhos, e noutros de outros sistemas planetários da nossa e de outras galáxias.

O magmatismo é, pois, uma das fases da evolução da matéria no quadro universal da sua história, como são, entre outras:
- a nucleossíntese que dá nascimento aos elementos químicos, em grande parte no interior das estrelas e na sequência das explosões (supernovas) que lhes ditam o fim; e
- a quimiossíntese que, por junção dos elementos químicos, dá origem aos compostos, entre os quais os minerais, fase esta que inclui o magmatismo e os restantes processos petrogenéticos, para além de outros, como são os biogénicos.

Foi através do magmatismo que a Terra, em formação, libertou uma atmosfera primitiva, rica (entre outros componentes) em vapor de água e dióxido de carbono. Foi a partir deste vapor de água que se formou, por condensação, grande parte da hidrosfera. E, na medida em que a vida foi gerada nas águas, torna-se evidente a sua dependência do processo magmático. Assim, é lícito pensar que, sem magmatismo, a biodiversidade, tal como a conhecemos, não teria existido.

Também os seres das profundidades oceânicas associadas a fontes hidrotermais e a chaminés negras (um ecossistema muito particular que só há mais de três décadas foi conhecido) dependem absolutamente da actividade magmática, neste caso, submarina.

Do mesmo modo, a atmosfera actual (a que hoje respiramos e que diariamente poluímos em nome do chamado desenvolvimento), na qual o oxigénio resulta da actividade biológica das plantas com clorofila, é uma consequência, embora indirecta, do magmatismo.

Os magmas que, desde a existência de uma litosfera (conjunto da crosta e da capa rochosa do manto nascidas da diferenciação do planeta) geraram e continuam a gerar as rochas que, por isso, apelidamos de magmáticas, nasceram e continuam a nascer da fusão de rochas da crosta ou do manto superior, a temperaturas que variam entre cerca de 850°C, num xisto argiloso, em profundidade, na crosta continental, e em presença de água, e cerca de 1300°C num peridotito do manto, na ausência de água. No que se refere às pressões, o fenómeno pode verificar-se entre cerca de 3 a 4 atmosferas, a 10 km de profundidade, e várias dezenas de atmosferas, 100 km mais abaixo.

Ao nível da crosta a fusão dos materiais rochosos, isto é, a geração de um magma acontece associada ao metamorfismo de grau mais elevado, no decurso da formação de uma cadeia montanhosa (orogénese). No manto, a fusão é praticamente anorogénica, isto é, não envolve compressões tangenciais. Está, sim, relacionada com movimentos verticais e diminuição de pressão ou com penetração de fluidos aquosos.

A comparação frequente do magma com a lava incandescente ou ígnea saída dos vulcões, embora sugestiva, não é correcta. Deve acentuar-se que a lava já não é, exactamente, um magma, dado que, ao descomprimir-se na saída para o exterior, perde parte dos seus componentes gasosos (vapor de água, dióxido de carbono, entre outros) e, ao arrefecer, permite a cristalização (solidificação) prematura de alguns minerais (como é o caso dos cristais de olivina ou de augite em alguns basaltos) que, por acção gravítica, decantam no fundo da câmara magmática, saindo também desse fundido, empobrecendo-o. Um material assim, como o que se vê transbordar do vulcão e fluir à superfície, em que coexistem grãos cristalinos (sólidos), material ainda fundido e apenas parte dos gases que inicialmente o formavam, já não deve ser considerado um verdadeiro magma embora tenha mobilidade.

É curioso assinalar que, na origem, a palavra “magma significa” “massa empedernida”. Não obstante este significado, a petrologia adoptou essa mesma palavra para designar o material ainda em fusão (na totalidade ou em parte) que, por arrefecimento, consolida e, só então, se torna pedra.

Do ponto de vista composicional, o magma pode ser então definido como um fundido de substâncias químicas, na grande maioria silicatos, existente em zonas mais ou menos profundas do planeta que, em virtude da temperatura e da pressão a que está sujeito, se mantém, pelo menos em parte, no estado líquido e, como tal, flui, ou seja, tem mobilidade. Neste banho e com uma representação muitíssimo inferior à dos silicatos, podem existir óxidos, em particular os de ferro, de titânio e de crómio, sulfuretos, fosfatos e carbonatos.

Como numa sopa quente, além do caldo, que nesta imagem exemplifica a parte fundida, podem coexistir no magma fases sólidas, representadas pelos minerais, e gasosas (vapor de água, dióxido de carbono, gás sulfídrico e outros) que lhe são próprios, de que podemos ter uma ideia através das manifestações secundárias do vulcanismo, como são as mofetas e as sulfataras. As fases sólidas, quando presentes no magma, estão expressas pelos minerais que, por serem mais refractários (isto é, com um ponto de fusão mais elevado), cristalizaram prematuramente no seio do líquido magmático, o que não impede a mobilidade do conjunto, que poderá fluir enquanto houver uma fase fluida, ainda que residual, a assegurar-lhe essa característica implícita na própria definição de magma. É o que acontece, como se disse atrás, com os cristais de olivina e ou de augite em certas lavas de natureza basáltica. Como ingredientes fundamentais do magma figuram quase sempre pouco mais de uma dezena de elementos químicos, os mais abundantes na crosta terrestre, e, por isso, ditos principais ou maiores (do inglês “major elements”), cujas percentagens, respectivamente, em peso e em volume são:
Oxigénio (O): 46,6% peso; 93,8 % volume
Silício (Si): 27,7% peso; 0,8 % volume
Alumínio (Al): 8,1% peso; 0,5 % volume
Ferro (Fe): 5,0% peso%; 0,4% volume
Cálcio (Ca): 3,6% peso%; 1,0% volume
Sódio (Na): 2,8% peso; 1,3% volume
Potássio (K): 2,7% peso; 1,8 % volume
Magnésio (Mg): 2,1% peso; 0,3 % volume
São estes, pois, os principais constituintes dos minerais das rochas magmáticas, entre os quais, como se disse, os silicatos que, por si só, representam cerca de 99% da crosta terrestre. A análise química destas rochas revela, ainda, manganês, fósforo, titânio, carbono, enxofre e hidrogénio praticamente sempre presentes, embora em muito menores percentagens.

Parte da água inicialmente contida no magma entra na composição de certos minerais, outra perde-se, quer em profundidade, no interior da crosta, indo alimentar outros processos petrogenéticos, quer à superfície, no vulcanismo. É esta água no estado de vapor que, com o dióxido de carbono e outros gases de menor representatividade igualmente libertados do magma, se evola nas erupções vulcânicas, originando os espessos “fumos” brancos que se dispersam no ar, acompanhando quer as projecções sólidas de piroclastos, quer a saída e progressão da lava.

Para além dos já referidos elementos principais ou maiores (por definição, aqueles cujas percentagens, em peso, nas rochas é superior a 1%), há ainda a considerar os elementos menores (do inglês, “minor elements”), entre os quais bário, chumbo, cobre cobalto, níquel, ouro, prata e muitos mais, cuja presença nas rochas se situa, em termos percentuais, abaixo de 1%. Nestes há que distinguir elementos secundários (entre 1% e 0,1%) e elementos vestigiais ou elementos-traço (do inglês, “trace-elements”) que, como o nome indica, estão representados em quantidades ínfimas. A presença de elementos-traço na composição dos minerais e das rochas é hoje fácil e rotineiramente pesquisada nos estudos petrológicos e geoquímicos. Consoante o rigor exigido pelas análises ou possibilitado pelos equipamentos disponíveis, a sua quantificação é expressa em ppm (partes por milhão) ou em cifras ainda menores, em ppb (partes por milhar de milhões). O termo oligoelemento (do grego, “oligós”, ínfimo), usado por alguns autores, é ambíguo, pois tem sido usado quer como sinónimo de elemento menor quer como de elemento-traço.

No que se refere ao nosso planeta, o magmatismo foi e é uma constante na respectiva dinâmica global, quer sob a forma de vulcanismo e subvulcanismo (ascensão de magma que acaba por arrefecer e solidificar a pequena profundidade, antes de atingir a superfície, como aconteceu com os maciços de Sintra, Sines e Monchique), quer de plutonismo (arrefecimento e solidificação em profundidade). Pelo que conhecemos da história da Terra, temos de admitir que o magmatismo sempre antecedeu e antecede os outros dois processos petrogenéticos (a sedimentogénese e o metamorfismo). Com efeito, só depois das primeiras rochas (magmáticas) formadas à superfície da Terra estarem expostas aos agentes externos é que pôde ocorrer a sua erosão seguida de sedimentação e/ou a sua transformação em rochas metamórficas

Teresa Barata - Fotografias do Sol

sexta-feira, 29 de novembro de 2024

UMA ESTRATÉGIA DE MARKETING EM ASCENSÃO: ESTUDOS DE EMPRESAS E FUNDAÇÕES SOBRE EDUCAÇÃO

Atente o leitor nos seguintes títulos do Público (aqui) e do Diário de Notícias (aqui)

  

Abstraindo-se da alusão à importância do brincar na infância, algo lhe causa estranheza?

Talvez sim...

Talvez tenha notado como estranho o mesmo que eu noto sempre que vejo títulos congéneres, aludindo a estudos científicos (aqui seriam precisas aspas) sobre temas educativos realizados por empresas e  fundações ligadas a empresas. Em Portugal começam a abundar.

Acontece que, por muito neutros que esses estudos se apresentem, a verdade é que não podem deixar de estar vinculados à "filosofia" das entidades que os financiam, mesmo que elas confiram a maior liberdade aos investigadores (que, tacitamente, saberão até onde podem ir). Além disso, a sua realização e (amplíssima) divulgação estão, como é natural, incluídas nas estratégias de marketing das ditas entidades. Não será, em primeiro lugar, o velho amor desinteressado ao conhecimento que as move.

Não me parece, pois, que se possam considerar estudos científicos, no sentido mais nobre que esta expressão tem. Com isto não quero dizer que os estudos produzidos nas academias e centros de investigação públicos estejam acima de qualquer suspeita, até porque a relação entre empresas/fundações e academias/centros de investigação vê-se progressivamente reforçada, além de que as lógicas comerciais não estão apenas à porta destas últimas entidades, já entraram.

E devo dizer que há estudos e... estudos promovidos por empresas/fundações. Se uns apresentam dados que, muito em função de quem os assina, poderemos considerar confiáveis, outros são obviamente para afastar.

Quanto a este que mobilizou a imprensa internacional (verifiquei e assim é), valerá a pena passar os olhos pelo relatório (aqui e aqui). As imagens (confesso que não dei muita atenção ao texto) são... tão óbvias!


quinta-feira, 28 de novembro de 2024

MINERAIS E CRISTAIS, MINERALOGIA E CRISTALOGRAFIA

Por A. Galopim de Carvalho 

Os minerais estão no nosso quotidiano. Nas pedras das calçadas, na areia com que se faz o vidro, nas matérias-primas de todos os metais que nos asseguram a sociedade industrial, nas joias de quem as pode usar e no sal de que nós, portugueses, abusamos.

Todos falamos de minerais com base num conhecimento vulgar, empírico, ligado à experiência do dia-a-dia. Minas, minérios e mineiros fazem parte do vocabulário popular por razões óbvias ligadas a um vasto e velho sector primário da economia. Não há sítio onde não se fale de minas, nem que seja de minas de água. “Mina”, nome que recebemos através do francês “mine”, significa escavação na terra e parece radicar na cultura céltica, vivida por um povo ao qual se deve a metalurgia do ferro.

O conceito mais divulgado de mineral diz que, além de natural, tem de ser sólido, ter uma composição composição química variável dentro de limites bem estabelecidos e ter uma estrutura cristalina bem definida, caracterizada por uma disposição geométrica dos seus átomos, segundo redes tridimensionais, próprias de cada espécie. 
 
Diz-se, então que os minerais têm estrutura cristalina. Um outro conceito, mais simples e mais abrangente, diz, simplesmente, que mineral é todo o elemento ou composto químico, geralmente cristalino, gerado por um processo geológico.

Desde a Antiguidade e até, pelo menos, ao século XVIII, acreditou-se que os cristais de quartzo hialino, isto é, incolor e transparente, eram ocorrências de água no estado sólido, num grau de congelação tão intenso que era impossível fazê-los voltar ao estado líquido.

Aristóteles (384-322 a.C.) chamava “cristal” ao gelo (krystallos, em grego) e foi sob este nome que esta espécie mineral passou aos domínios da alquimia, primeiro, e da mineralogia, depois. Um seu aluno, Theophrastus (372-287 a.C.), distinguia o cristal-água (o gelo) do cristal-pedra (o quartzo hialino). Os romanos mantiveram este entendimento, latinizando o nome para cristallus, como se pode ler num dos 38 volumes da História Natural, de Plínio, o Velho, (23-79 d. C.).

Foi o carácter transparente e incolor do cristal-pedra que acabou por dar o nome ao vidro industrial de alta qualidade, a que hoje chamamos simplesmente cristal. A expressão cristal-de-rocha, aplicada ao quartzo hialino, surgiu muito mais tarde (no século XIX) para distinguir o mineral do produto manufacturado. A palavra cristal acabou, depois, por se generalizar aos corpos poliédricos minerais ou orgânicos, naturais e artificiais, tendo sido, por isso, usada como étimo do nome da disciplina que os estuda – a Cristalografia – afirmada como ciência no início do século XIX com René-Just Haüy, em França. 
 
Minerais e cristais são, pois, duas realidades indissociáveis. Por tradição, o conceito de cristal implicava o carácter poliédrico (facetado) do sólido, fosse ele uma substância mineral ou orgânica, natural ou produzida artificialmente. Tal concepção foi abandonada a partir do momento em que se tornou conhecida a estrutura íntima, à escala atómica, dos corpos no estado sólido.

Assim, cristal é hoje entendido como uma porção uniforme de matéria cristalina, matéria que, como se disse atrás, é caracterizada por uma disposição geométrica dos seus átomos, segundo redes tridimensionais, próprias de cada espécie.

Um tal arranjo geométrico é posto em evidência, entre outras manifestações, pelas faces do cristal. Mas nem sempre a matéria cristalina se manifesta com a configuração de um cristal, no sentido vulgar do termo, isto é, no de um corpo poliédrico, total ou parcialmente limitado por faces planas. Um grão de quartzo, no seio do granito ou solto e na areia da praia, não tem forma poliédrica, mas é matéria cristalina.

Com a mesma composição química do quartzo, a opala, uma variedade de sílica amorfa, isto é, não cristalina. Amorfo é também o vidro vulcânico, principal constituinte de rochas como a pedra-pomes ou a obsidiana. Ainda que cristalinas, não são consideradas minerais as substâncias inorgânicas produzidas artificialmente (bicarbonato de sódio, sulfato de magnésio, etc., à venda nas farmácias) e as orgânicas (açúcar), sejam elas naturais ou artificiais. 
 
Hoje em dia, são muitos os chamados sintéticos, isto é, substâncias química e estruturalmente semelhantes a determinadas espécies minerais, produzidas (sintetizadas) em laboratório e/ou industrialmente. O quartzo o diamante, o rubi e muitas outras gemas sintéticas não são, pois, minerais. A sua produção com fins tecnológicos, gemológicos ou outros, é hoje uma rotina.

A Mineralogia é a ciência que estuda os minerais, nela se separando uma Mineralogia Pura, interessada nos aspectos científicos fundamentais, do saber pelo saber, e uma Mineralogia Aplicada, visando a utilização dos minerais como matérias-primas nas mais variadas indústrias e utilizações. Vinda da Antiguidade, com destaque para as civilizações chinesa, babilónica, hindu e egípcia, através da tradição e dos textos eruditos dos clássicos gregos e latinos, recuperados pelos árabes, a Mineralogia percorreu a Idade Média de mãos dadas com a Alquimia, tendo aí crescido, deixando para trás muitas das concepções fantasiosas e místicas dos escolásticos. 
 
A Mineralogia afirmou-se e desenvolveu-se como Ciência, juntamente com a Química, ao longo dos séculos XVIII e XIX, fazendo-a progredir e tirando dela o essencial do seu desenvolvimento com acentuada organização sistemática.

A Mineralogia fez nascer, deu corpo e aprofundou uma nova disciplina científica, de cariz geométrico e matemático - a Cristalografia Morfológica - que usou como complemento até às primeiras décadas do século XX. Alargou-se, depois, ainda mais, com a Cristaloquímica, numa abordagem à organização espacial das redes cristalinas em função da natureza dos elementos químicos que as constituem para, a partir daí, se irmanar com a Física do Estado Sólido, com recurso às modernas tecnologias de análise.
 
A Mineralogia acompanha hoje o caminho da Cristalografia Estrutural, nova disciplina de âmbito alargado a todos os sólidos cristalinos, sejam eles inorgânicos ou orgânicos, naturais e artificiais ou sintéticos.

GALOPIMITES

Por A. Galopim de Carvalho

Em Inícios de 2006, José Teixeira, da empresa Minermós, um dos comerciantes habituais na Feira de Minerais Gemas e Fósseis, no Museu Nacional de História Natural, telefonou-me de Porto de Mós, onde reside, solicitando-me que o recebesse, pois tinha algo que achara e lhe parecia único no contexto da grande diversidade de espécimens que conhecia nas muitas feiras internacionais que frequenta. 

Passados alguns dias, trouxe-me uma concreção de areia cuja forma faz lembrar as bem conhecidas Lössdols (bonecas de loess) resultantes da aglutinação de materiais detríticos muito mais finos (silte ou limo), arrastados e acumulados pelo vento.

Com este exemplar nas mãos, configurando um arenito pouco consolidado, notei que, friccionando-o com os dedos, libertava grãos de areia que, logo ali, observada à lupa, me pareceu idêntica à das nossas praias. Interessado em conhecer melhor este capricho da natureza, a que dei o nome de “bonecas-de-areia”, procedi ao seu estudo no campo, em Pedreira, um local na vertente ocidental da Serra dos Candeeiros, no interior de uma caverna, explorada no passado como areeiro, e solicitei ao investigador do Museu, João Cascalho, meu ex-aluno, que as analisasse no laboratório. O resultado deste trabalho foi apresentado em Setembro desse ano, ao VIII Congresso Nacional de Geologia, em Estremoz.
A história geológica destas concreções é simples e recente. Há uns escassos milhões de anos o mar cobria uma imensa faixa aplanada, hoje situada a cerca de 200m de altitude (plataforma pliocénica de Aljubarrota), mantendo aí um litoral arenoso. O vento, soprando de Oeste, varreu parte destas areias para o interior, criando depósitos do tipo das dunas que esbarraram de encontro à base da serra, invadindo quaisquer reentrâncias nela existentes, como é o caso da caverna em questão. 

Aí, as águas enriquecidas em carbonato e bicarbonato de cálcio, após o percurso no interior do maciço calcário, do Jurássico médio (Dogger), acabaram por cimentar parcialmente (cimento dito drúsico) a areia, gerando as ditas bonecas. José Teixeira, o seu achador, baptizou-as de “galopimites”, e é com este nome, ainda não homologado pela comunidade dos geólogos, que surgem agora nas feiras, à disposição dos coleccionadores e demais curiosos. 

O estudo microscópico, à lupa binocular, destas areias, depois de libertadas da referida película carbonatada, põe em evidencia a sua origem numa praia seguida de transporte pelo vento, para este local.

Essencialmente quártzicas, os seus grãos variam entre redondos e subarredondados, estando os maiores visivelmente marcados por picotado eólico, em resultado dos choques sofridos durante o transporte pelo vento. Além do quartzo, contêm algum feldspato e raros minerais acessórios.

Nota: Loess – internacionalização do termo alemão Löss, refere um depósito silto-argilo-calcário, não coeso, de origem eólica, depositado em regime periglaciário, com capacidade agrícola reconhecida. Descrito, pela primeira vez, na Europa central, em 1823, mas é no noroeste da china que tem o maior desenvolvimento. O termo Löss radica no germânico lösch, que significa solto, móvel.

domingo, 24 de novembro de 2024

"A escola pública está em apuros"

Por Isaltina Martins e Maria Helena Damião
 
Cristiana Gaspar, Professora de História no sistema de ensino público e doutoranda em educação, escreveu um artigo sobre a condição docente para o jornal Público que saiu ontem
 

Em título destacou:
"O professor é um trabalhador por conta de outrem: o encarregado de educação". 
O que se estranha na declaração não é o professor ser "um trabalhador por conta de outrem" - na verdade, é-o -, mas ser "um trabalhador por conta do encarregado de educação". E nós aproveitamos para acrescentar, por conta;
  • de organizações supranacionais que "ditam" orientações para o ensino, a aprendizagem e a formação de professores,
  • dos milhares de plataformas para "apoio ao ensino", muitas delas disponibilizadas por editoras de manuais escolares,
  • das empresas de materiais tecnológicos, que os concebem como verdadeiros "fins" educativos,
  • de fundações que dizem querer "transformar" o mundo através da educação e entendem que têm de "ajudar" os professores a envolver-se nessa missão,
  • dos muitos gurús que têm visões transcendentes para a educação e oferecem a "salvação" aos professores,
  • de jornalistas que, com raras excepções, tudo difundem sem critério ou pergunta e, sobretudo, sem contraditório,
  • até de académicos que entendem que o ensino deve ser lido através das suas grelhas que dizem ser apuradas pelos métodos de investigação mais refinados,
  • etc.
Ora, diz esta professora:
(...) a minha especialidade é o ensino. Estudei, apliquei o que aprendi e fui avaliada até me tornar profissional, certificada por uma universidade e, por conseguinte, pelo Ministério da Educação (...) Devo eu exercer a minha profissão em função das críticas dos leigos em ensino, grupo no qual se encontram a maioria dos encarregados de educação? 
E, acrescentamos nós, mais aqueles que referimos. Este acrescento cai como uma luva ao que a articulista diz de seguida:
Entendem, certamente, onde quero chegar: a certa altura, os professores começaram a trabalhar para os pais. E vieram os papéis, e vieram os emails, e tudo é dito, demonstrado, explicado, repetido, assinado.
Para que se entenda melhor, dá um exemplo muito concreto:
Um dos grandes desassossegos são as chamadas “Medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão”, segundo o DL 54/2018 “as medidas universais são mobilizadas para todos os alunos”. São passe livre que dá ao professor uma autonomia verdadeiramente útil. Posso adaptar processos, ferramentas de ensino-aprendizagem e a avaliação conforme as exigências de cada aluno (...). Mas muitos professores ainda têm receio do questionamento dos pais. Estes, por vezes, reclamam por não entenderem a avaliação, quando dificilmente irão entender, pois a sua especialidade não é ensino, avaliação, pedagogia ou didáctica. E quando reclamam os professores e direcções ouvem, cedem, acalmam os ânimos, passando a explicar por A mais B a cada pai o que fazem em sala de aula. 
Quando os professores têm de se justificar aos seus "clientes" e afins, o tempo falta para o essencial:
(...) não preparei as aulas da semana que vem. Passei a tarde (...), a preencher uns papéis e a fazer cruzes noutros, a registar textos explicativos no programa informático e a preencher tabelas, tudo para ensinar aos pais como ensino e, sobretudo, como avalio. Esta cultura de permanente justificação do professor ganhou uma dimensão tremenda, ocupando grande parte das nossas horas laborais. A desconfiança no professor (...) coloca interesses e preocupações que deveriam ser residuais à frente das querelas verdadeiramente importantes no ensino. 
No final, reafirma o que disse antes:
(...) o professor deixou de trabalhar para os alunos, para a escola, para o Ministério.

Logo:

A escola pública está em apuros.

É também a nossa convicção!

DIREITO DAS CRIANÇAS À SEGURANÇA EM AMBIENTES DIGITAIS NA NOVA DECLARAÇÃO DE GENEBRA

Por Cátia Delgado

Foi na passada quarta-feira, 20 de novembro, no dia em que se assinalaram 35 anos da aprovação da Convenção dos Direitos das Crianças e no ano em que se celebra o centenário da 1.ª Declaração sobre os Direitos das Crianças (Declaração de Genebra), que a Organização das Nações Unidas decidiu incluir na lista de perigos e ameaças a que as crianças estão sujeitas e das quais devem ser protegidas, os “decorrentes da transição digital e dos desenvolvimentos tecnológicos”, como noticia o Expresso.

Isto, numa altura em que, nitidamente, os discursos de deslumbramento sobre as potencialidades das “novas” tecnologias digitais para o desenvolvimento de crianças e jovens têm dado lugar a reservas sustentadas por sucessivos estudos e relatórios credíveis nos quais se vê prevalecer os seus riscos em detrimento dos benefícios que “continuam por explorar”

Ver, por exemplo OCDE, 2024, Fewer books and more educational software How have home learning environments changed since 2015? e UNESCO, 2023: A tecnologia na educação: uma ferramenta a serviço de quem?.

Espera-se, assim, que o contributo da ONU incite os Estados a investir de forma mais veemente na regulamentação e reavaliação dos procedimentos educativos em curso, com claro impacto na formação de crianças e jovens.

Eis os pontos da Nova Declaração :

NOVA DECLARAÇÃO DE GENEBRA SOBRE OS DIREITOS DAS CRIANÇAS

Os subscritores da Declaração de 2024 assumem como prioridade o compromisso de garantir que todas as crianças de hoje e das futuras gerações:
1. vivam em condições de dignidade e bem-estar, livres de pobreza e com o mais alto padrão de saúde possível;
2. cresçam em comunidades não afetadas por conflitos armados;
3. sejam ouvidas e tenham as suas opiniões consideradas em todas as decisões que as afetem, reconhecendo, assim, o seu direito fundamental de participar na construção das comunidades em que vivem;
4. floresçam num ambiente seguro, saudável e sustentável, propício à sua sobrevivência, desenvolvimento e ao gozo de todos os seus direitos;
5. beneficiem de uma experiência segura e inspiradora num ambiente digital em rápida evolução no qual possam manter a sua capacidade de intervenção e desenvolver a literacia digital para utilizarem a tecnologia de forma segura;
6. sejam protegidas de todas as formas de violência (física, psicológica e sexual) em todos os contextos, incluindo no ambiente familiar;
7. tenham o seu superior interesse respeitado em todos os desenvolvimentos biotecnológicos atuais e futuros;
8. acedam a sistemas de justiça adaptados às crianças e a recursos adequados em caso de violação dos seus direitos;
9. tenham acesso a educação gratuita e inclusiva nos níveis pré-escolar, primário, secundário e vocacional, sem discriminação;
10. vivenciem a singularidade e a riqueza da infância que todas as pessoas poderiam desejar para si mesmas.

sábado, 23 de novembro de 2024

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho
 
Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim.

Quando dou uma aula, ainda dou muitas, o entusiasmo e a energia que ponho na voz situam-me nos meus anos de docência, mas o facto de ter de a dar sentado, coisa que outrora nunca fiz, diz-me que esse tempo já passou há muito.

Quando olho para dentro de mim, tanto posso ser a criança ou adolescente, como o activo adulto que fui, mas, na rua, as irregularidades da calçada, ao fazerem-me procurar, na bengala, a segurança e o equilíbrio que perdi, dizem-me a mesma desconfortável verdade.
 
Comodamente instalado, aqui, frente ao monitor do computador, vivo a despreocupação e a alegria de uma crónica de tempos idos, volto a ser o que fui nos anos de maior pujança da minha vida, mas mal me levanto da cadeira, os joelhos e as pernas trazem-me ao presente.

Bem sentado no autocarro, tenho a idade daquele ou daquela que vai ao meu lado e, se acontece falarmos, irmano-me com ele ou com ela e só me dou conta da idade que carrego sobre os ombros, ao descer do dito, naquele degrau que nunca me pareceu tão alto.
 
Muitas outras realidades me dizem, todos os dias, que sou mais um entre os muitos velhos deste belo e, desde sempre, mal governado país. São os meus antigos alunos, agora de cabelos brancos, muitos deles pensionistas como eu. São os meus netos, já adultos e com barba, são as consultas médicas, as idas frequentes ao Hospital e aos Centros de Saúde e o exagerado número de fármacos diários ao pequeno-almoço, almoço e jantar.
 
Diz-se que os velhos só têm o presente, o que não está longe da verdade. Não têm passado nem futuro. O passado perderam-no, sem darem por isso. Uns mais do que outros, podem guardá-lo na memória e é tudo o que dele lhes resta. Quanto ao futuro, esse foge-lhes por entre os dedos, como a areia. A diminuição progressiva das suas capacidades rouba-lhes a ideia de futuro. Não lhes permite fazer planos. Vivem, como se ouve dizer, “um dia de cada vez”. Preparar uma palestra e proferi-la, fazer uma conversa, onde quer que seja, e escrever algo sobre o que me parecer dever fazer, cabem dentro deste horizonte de vida.
 
É nesta tranquila certeza que, nos meus 93 anos já vividos, organizo as 24 horas do dia, de todos os dias. 
 
Proferi ontem a última de cinco conversas de um minicurso de Geologia, Como Bola Colorida, numa perfeita organização do Âmbito Cultural, do El Corte Inglés. Casa cheia todos os dias. Eram só idosos, da primeira à última fila de cadeiras, e eu era o mais idoso de todos eles. 

É nesta tranquila certeza que me dou conta da exiguidade do meu horizonte de vida, face ao muito que ainda tenho em mente e gostaria de fazer, e nesse muito está, por um lado, escrevendo e falando, deixar aos meus concidadãos o que a vida e a profissão me ensinaram e, por outro, continuar a exercer o que entendo ser o meu dever de cidadania. 
 
Neste dever estão as lutas (lutas, sim, porque é de lutas que se trata, sempre morosas e difíceis de vencer) que continuo a travar com os governantes e outros decisores, pela valorização e salvaguarda do nosso património geológico.

A. Galopim de Carvalho

quinta-feira, 21 de novembro de 2024

CARTA A UM JOVEM DECENTE

Face ao que diz ser a «normalização da indecência», a jornalista Mafalda Anjos publicou um livro com o título: Carta a um jovem decenteNuno Dias da Silva entrevistou-a para a revista Ensino MagazineEis o essencial da mesma, do ponto de vista educativo (sublinhados meus).

"As redes sociais (...) em nome da liberdade de expressão, tornaram-se um autêntico faroeste, onde tudo é permitido e inclusive amplificado por causa dos algoritmos. Este ambiente acaba por ser transferido para o mundo real, nomeadamente nas conversas entre as pessoas e até nos painéis de comentários televisivos

Escrevi recentemente um ensaio no Expresso sobre a história da decência em que falo da Janela de Overton. De acordo com a descrição deste politólogo, na década de 90, a sua janela incluía uma gama de ideias consideradas politicamente aceitáveis no clima atual da opinião pública (...). O espetro da aceitação das ideias variava nas seguintes dimensões: impensável, radical, aceitável, sensível, popular e politicamente implementada (...). a proliferação da internet permitiu o escancarar da Janela de Overton. Determinadas ideias que há uns anos se admitiam como impensáveis ou ultraradicais hoje em dia vêmo-las em todo o lado (...).

Em 2014, estive na sede do Facebook em Silicon Valley – um dos trabalhos que mais me marcou na carreira –, onde conheci a unidade que trabalha com o algorimo base do Facebook. As pessoas não têm a noção do quão importante pode ser o algoritmo, com a criação das tais bolhas virtuais, para a forma como as pessoas formam a sua visão da realidade concreta. E isto torna-se ainda mais preocupante quando é certo e sabido que a maior parte das pessoas procura informar-se através das redes sociais.

Churchill dizia que «uma mentira dá uma volta inteira ao mundo antes mesmo de a verdade ter oportunidade de se vestir.». Com a internet, e a velocidade de propagação planetária que existe, a mentira já deu a volta ao mundo, mesmo antes de a verdade abrir a pestana (...).

Sempre existiram ideias consideradas indecentes na sociedade. A diferença é que a vergonha era um fenómeno de regulação social. Existia uma censura social perante uma ideia considerada chocante ou ofensiva. Nesse sentido as redes sociais marcam uma nova era: a vergonha como regulador social esvaiu-se muito porque as pessoas encontram bolhas onde as suas ideias – por mais chocantes que sejam – acabam por ser respaldadas (...).

A política da lógica e da razão faz parte do passado e hoje o que impera é a política das emoções.

Interpelada pelo entrevistador sobre o que diria se fosse a uma escola falar do livro disse:

A mensagem fundamental a passar aos jovens é fazerem o exercício, tão simples e tão complexo, de procurarem colocar-se no lugar do outro, sentirem os problemas dos outros. (...) A tolerância é o óleo do motor da sociedade e da democracia.

FOI PUBLICADO O ÚLTIMO LIVRO DE EUGÉNIO LISBOA

Otília Pires Martins teve a amabilidade de me enviar notícia da publicação, a título póstumo, do último livro de Eugénio Lisboa, Manual Prático de Gatos para Uso Diário e Intenso.
 
A obra, composta por trinta e um sonetos, inclui uma nota introdutória de Onésimo Teotónio de Almeida e fotografias legendadas de Otília Pires Martins.

Na recente apresentação pública destaco o belíssimo texto de Manuel S. Fonseca, editor da Guerra e Paz, e o Última Edição de Luís Caetano, que lhe é dedicado. Aqui podemos ouvir Eugénio Lisboa, a ler poesia e a falar sobre ela.
 
Alguns dos sonetos que constam no Manual foram partilhados pelo seu autor com os leitores do De Rerum Natura. Ficamos-lhe eternamente gratos.

terça-feira, 19 de novembro de 2024

O QUE É FEITO DA CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS?

Passaram mil dias - mil dias! - sobre o início de uma das maiores guerras que conferem ao presente esta tonalidade sinistra de que é impossível alhearmo-nos, outra vai em quatrocentos dias e há que lhes somar algumas de menor escala e dezenas de conflitos armados por todo o mundo. 
 
Devemos perguntar: o que é feito do pacto das nações para "preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra", para "praticar a tolerância e viver em paz"? O que é feito dos valores éticos que tínhamos por estabelecidos? Pensávamos: aqui chegados, aqui estamos e será para sempre. 
 
Não foi. Enganámo-nos: um a um, esses valores esboroaram-se, deixámos que isso acontecesse. A privacidade, a tolerância, a igualdade, a liberdade, a fraternidade (uma das bandeiras do Iluminismo, quem fala dela?) a democracia... a paz e, acima de tudo, a dignidade humana voltaram a ser palavras apenas. 
 
E isto tudo é humano. Todo o esforço de compreensão que possamos - e devamos - fazer tem de partir desta assumpção.

Preâmbulo (aqui).
NÓS, OS POVOS DAS NAÇÕES UNIDAS, RESOLVIDOS a preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que por duas vezes, no espaço da nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade, e a reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direito dos homens e das mulheres, assim como das nações grandes e pequenas, e a estabelecer condições sob as quais a justiça e o respeito às obrigações decorrentes de tratados e de outras fontes do direito internacional possam ser mantidos, e a promover o progresso social e melhores condições de vida dentro de uma liberdade ampla. 
 
E PARA TAIS FINS, praticar a tolerância e viver em paz, uns com os outros, como bons vizinhos, e unir as nossas forças para manter a paz e a segurança internacionais, e a garantir, pela aceitação de princípios e a instituição dos métodos, que a força armada não será usada a não ser no interesse comum, a empregar um mecanismo internacional para promover o progresso económico e social de todos os povos.

A NOVA LINGUAGEM DA EDUCAÇÃO E... DA MEDICINA!

Soube há poucos dias que não é só a linguagem educativa que tem perdido expressões que lhe são (ou eram) específicas, que lhe conferem (ou conferiam) identidade; parece que o mesmo acontece na medicina.

O artigo do Público que me alertou para tal é assinado por António Sarmento e  remete para um outro saído em 2011, sinal de que o problema está identificado há anos neste campo, tal como no da educação. 

Em ambas as áreas, as expressões que se impõem em primeiro lugar vêm do mundo empresarial e são muitas delas iguais.

Diz-se logo no resumo desse artigo, saído numa revista de medicina:

"Na nova linguagem da medicina, os pacientes são clientes ou consumidores; médicos e enfermeiros são provedores.

No campo da educação, tal como mostrámos em textos anteriores (por exemplo aqui, aqui, aqui, aqui), os alunos e famílias são clientes ou consumidores, os professores ou agentes similares são provedores ou fornecedores, as escolas são substituídas por ecossistemas...

Mais se diz nesse resumo:

"As palavras que usamos para explicar os nossos papéis definem expectativas e moldam o comportamento. Esta mudança na linguagem da medicina tem consequências importantes e destrutivas."

O mesmo se aplica à educação: a imposição da "narrativa" da educação do futuro / do século XXI (1) foi um passo fundamental na estratégia de corrosão da sua essência, para impor outra coisa, evidentemente.
__________________
(1) Assim mesmo designada pelas entidades económico-financeiras que insistem em determinar os desígnios do mundo.

segunda-feira, 18 de novembro de 2024

"Crise da transmissão e febre da inovação"

Vale a pena ler o artigo de que se reproduz a identificação ao lado.
 
O seu autor, o francês François-Xavier Bellamy, professor de Filosofia e deputado no Parlamento Europeu, assina vários livros que tocam  a educação escolar, entre os quais está um com significativa divulgação em Espanha e em Portugal: Os deserdados.

O texto é resultado de uma conversa conduzida por Tania Alonso-Sainz, traduzida por Bianca Thoillieze e transcrita por Laura Suárez Gil. Essa conversa, que aconteceu à distânci, em 20 de novembro de 2020, inscreve-se nos Diálogos sobre educación organizados pela revista Teoría de Educación. Revista Interuniversitaria.
 
Bellamy não é propriamente inovador ao recordar por exemplo que:
aquilo que se apresenta como novo se tornou sinónimo de melhor do que aquilo que existiu ou existe;
não é por algo ser novo que é necessariamente bom, como não é por algo ser antigo que é necessariamente  mau;
a construção do futuro precisa do conhecimento relevante que vem do passado;
a criatividade e a liberdade dependem substancialmente desse conhecimento que nos foi legado;
a oposição entre progressistas e conservadores redunda numa falácia;
a inovação é... antiga, sempre existiu e é nada menos do que fundamental
...

Não é propriamente inovador, mas é importante repetir o que certos discursos parecem querer fazer esquecer. Assim, se me é permitido, recomendo a leitura desta conversa que aconteceu entre... jovens!
_________________
Referência do artigo: Bellamy, F.-X. (2021). Crisis de la transmisión y fiebre de la innovación. Teoría de la Educación. Revista Interuniversitaria, 33(2), 169-178. https:// doi.org/10.14201/teri.25407

terça-feira, 12 de novembro de 2024

Sociedade Civil

Sociedade Civil: Físicos - A Física pode ser divertida... é uma ciência focada no estudo de fenómenos naturais, com base em teorias, através da observação e ex

segunda-feira, 11 de novembro de 2024

EGAS MONIZ E JÚLIO DINIS

Meu artigo saído no As Artes entre as Letras:

No ano da celebração dos 150 anos do neurologista António Egas Moniz (1874-1955) e os 75 anos do seu Prémio Nobel de Fisiologia ou Medicina (1949), o único até agora obtido por um português em áreas das ciências, convém lembrar que ele era um homem das «duas culturas», ainda que esta expressão só tenha surgido em 1955 (foi cunhada pelo escritor inglês Charles P. Snow numa famosa conferência em Cambridge).

Falando apenas de literatura (nas artes plásticas, abordou as obras do pintor António da Silva Porto e do escultor Maurício de Almeida), Egas Moniz foi não só biógrafo e crítico do escritor Júlio Dinis, pseudónimo de Joaquim Gomes Coelho (1839-1871), como prefaciador de uma boa parte da sua obra. Além disso, tratou nas suas conferências e escritos de autores como Gil Vicente (c. 1465 – c. 1536), Padre António Vieira (1608–1697), Camilo Castelo Branco (1825–1890), João de Deus (1830–1896), Abílio Guerra Junqueiro (1850–1923), Teixeira de Pascoaes, pseudónimo de Joaquim Teixeira de Vasconcelos (1877–1952), e Júlio Dantas (1876–1962). Um padrão que ressalta é o apego do laureado Nobel a autores clássicos. E os estilos dos dois nomes seus contemporâneos eram de algum modo tradicionais. Na primeira metade do século XX, quando a arte fervilhava de novas correntes, Egas Moniz não mostrou grande gosto pelas novidades, não se aventurando na apreciação e divulgação de autores mais revolucionárias. É certo que conheceu pessoalmente Fernando Pessoa (1888–1935) e Mário de Sá-Carneiro (1890–1916), mas isso aconteceu no seu consultório, sendo eles pacientes. É paradoxal que um autor de inovações na ciência médica (a arteriografia cerebral e a leucotomia pré-frontal, esta última conducente ao Nobel) tenha primado por escolhas estéticas conservadoras. Mas o mesmo aconteceu com cientistas seus contemporâneos, dos quais o maior, Albert Einstein (1879–1955), tinha gostos musicais que não iam, na linha do tempo, muito além de Schubert. 

Mas, mais do que este desajuste relativamente à evolução da arte no seu tempo, importa realçar o facto de Egas Moniz ter sido, além de médico e investigador, arguto crítico literário, e o facto de ter uma escrita elegante – basta ler A Nossa Casa, de 1950, o seu livro com reminiscências da juventude, passada em boa parte em Avanca, Estarreja. Nunca foi, porém, um ficcionista. O escritor Alexandre Cabral, pseudónimo de José dos Santos Cabral (1888 – 1935), especialista na obra de Camilo, numa conferência que deu em 1950, portanto logo após o Nobel de Moniz, intitulada Aspecto literário da obra do Professor Egas Moniz, n’A Voz do Operário em Lisboa, publicada pela Portugália, refere textos do laureado onde descortina recursos estilísticos que são mais próprios da ficção do que do ensaio. Escreveu: «Surpreende verificar como o Prof. Egas Moniz tem encontrado, fora das suas ocupações de médico e de investigador, o tempo suficiente para se dedicar à literatura e à crítica de arte, o que de resto tem feito com imenso brilho.» Egas Moniz, além de veia científica, também tinha veia literária.

Sabendo que estou bem longe de ser o primeiro, interessa-me realçar aqui o valor que Egas Moniz acrescentou ao legado de Júlio Dinis, o médico-escritor portuense que morreu de tuberculose aos 31 anos. Egas Moniz terá encontrado afinidades com ele por ambos serem médicos e por Júlio Dinis ter vivido em Ovar, terra próxima de Avanca (foi em Ovar que Júlio Dinis escreveu As Pupilas do Senhor Reitor), embora não tenham convivido: o escritor morreu três anos antes de Egas Moniz nascer.

Há poucas semanas, nos alfarrabistas que gosto de frequentar, veio ter às minhas mãos o volume de Egas Moniz Júlio Dinis e a sua Obra (Livraria Civilização, do Porto), na 6.ª edição, revista e actualizada pelo autor, que, embora sem indicação de data pela editora, tem uma «advertência» inicial do autor que data de 1946. Esta obra é abrilhantada por uma carta-prefácio de Ricardo Jorge (1858–1939), onde este médico (do Porto como Júlio Dinis) exibe a sua extraordinária qualidade literária. Escreve Ricardo Jorge: «A Medicina e os médicos têm invadido em onda crescente o âmbito da crítica histórica, artística e literária – volta-se aos tempos da Renascença em que letras e ciências, humanismo e hipocratismo, se irmanavam como filhos do mesmo Apolo.» Em particular, ele chama a atenção para a leitura psicanalítica que Egas Moniz fez de parte da obra de Júlio Dinis (o cap. XVIII é sobre «Júlio Dinis e a Psicanálise», tema de uma conferência que Egas Moniz deu em 1924, ano da 1.ª edição de Júlio Dinis e a sua Obra, na Casa Ventura Abrantes, de Lisboa). De facto, Egas Moniz foi pioneiro na recepção de Sigmund Freud (1856-1939) em Portugal. Júlio Dinis e a sua Obra, ao mesmo tempo biografia e análise crítica, está enriquecido com textos inéditos do romancista. Com efeito, Egas Moniz procurou junto de familiares e amigos do médico-escritor o espólio não publicado. 

Na badana direita deste livro, a editora Livraria Civilização, dirigida por Américo Fraga Lamares, filho do fundador, lista as Obras Completas de Júlio Dinis. Depois das obras saídas em vida, bem conhecidas (As Pupilas do Senhor Reitor, Os Fidalgos da Casa Mourisca, A Morgadinha dos Canaviais, Uma Família Inglesa, e o primeiro volume dos Serões da Província), a editora elenca os outros volumes de Júlio Dinis, todos eles apresentados e organizados por Egas Moniz. A saber: Serões da Província (2.º volume, contendo as novelas póstumas), Cartas e Esboços Literários, Poesias, Teatro Inédito (em três volumes, contendo peças por ordem cronológica de edição) e, finalmente, como «complemento indispensável» à edição das Obras Completas de Júlio Dinis, é incluída Júlio Dinis e a sua Obra. Assim, os nomes de Júlio Dinis e de Egas Moniz ficaram ligados para sempre, dando um bom exemplo da junção entre a ciência e a arte. Muitas edições se seguiram, com os dois nomes juntos.


D. JOÃO DE CASTRO E LUÍS DE CAMÕES

Meu artigo no mais recente As Artes entre as Letras:

Luís de Camões (C. 1524-1580) nasceu provavelmente no mesmo ano em que Vasco da Gama (1469-1534) viajou pela terceira vez para a Índia e morreu. É natural que falemos mais dos 500 anos do nascimento de Camões do que dos 500 anos da morte de Gama. Porém, não deixa de ser uma coincidência curiosa essa sobreposição de datas do nosso maior vate e do nosso maior descobridor.

Entre 1557 e 1570 (treze longos anos!) Camões viveu no Oriente, na maior parte do tempo na Índia, onde Gama tinha chegado em 1498. Essa experiência é muito posterior ao curto período em que Vasco da Gama foi vice-rei e governador da índia (1524) e ao período, esse maior, em que o seu filho D. Estêvão da Gama foi governador da Índia (1540-1542). E é também ulterior ao período em que D. João de Castro foi primeiro governador da Índia (1545-1548) e depois também vice-rei desse Estado (1548). Os Lusíadas, publicados originalmente em 1572, contam a história da viagem de Vasco da Gama e, ancorando-se nesta, a história de Portugal. Camões fala no canto I (estância 14) do «Castro forte» (acrescentando «e outros em quem poder não teve a morte») quando enumera alguns heróis que se notabilizaram na Índia. O poeta, para usar o adjectivo «forte», conhecia decerto a história do violento segundo cerco de Diu, ocorrido em 1546, para cujo desfecho a acção de D. João de Castro foi decisiva.

D. João de Castro (1500-1548) é mais conhecido como homem de Estado e chefe militar. Mas ele foi também um cientista: geógrafo e cartógrafo, mas acima de tudo, geofísico, podendo ser considerado o primeiro geofísico global. Fez duas viagens na carreira da Índia desde Lisboa até Goa e nelas efectuou medidas sistemáticas de meteorologia, de oceanografia e de magnetismo terrestre. Os seus estudos do magnetismo ajudaram a refutar a tese de que era possível conhecer a longitude através de medições com uma bússola. No Oriente, empreendeu o reconhecimento de costas do Mar Índico e do Mar Vermelho (na altura chamado Mar Roxo). 

Ele foi o autor de três roteiros com o seu nome que ficaram justamente famosos: Roteiro de Lisboa a Goa (1538), Roteiro de Goa a Diu (1538-1539) e Roteiro do Mar Roxo (1540-1541). Esses escritos permaneceram como manuscritos até ao século XIX, quando foram impressos e começaram a ser comentados. Onésimo Teotónio Almeida, no seu livro O Século dos Prodígios (Quetzal, 2018), chamou a atenção para a modernidade de D. João de Castro que está plasmada nesses roteiros (assim como nas outras suas obras), designadamente na sua atitude empírica que precedeu a criação da ciência moderna no final do século XVI e ao longo do século XVII. Logo a seguir a tratar a modernidade do geofísico quinhentista, Onésimo aborda a modernidade do autor de Os Lusíadas, que veio na linha da de D. João de Castro. 

Na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra conservam-se Tábuas dos Roteiros das Índia, de D. João de Castro, que contêm magníficos desenhos a cores de lugares daquelas costas, que são cópias de originais desaparecidos (são 29 tábuas no total, das quais 15 do segundo roteiro e 14 do terceiro). Essas imagens revelam observações muito cuidadosas. Constituem uma espécie de Google maps do século XVI, enriquecidos com pormenores artísticos que nos informam sobre a presença portuguesa desse tempo no Oriente. 

Uma das traves-mestras do método científico para além da observação e experimentação é a sua combinação com o raciocínio lógico. Repare-se como D. João de Castro chama a atenção para a necessidade desse elo, no Tratado da Esfera, um manuscrito que lhe é atribuído: «É necessário aqui o sentido obedecer ao entendimento, e como cego deixar-se guiar por ele, porque certo está que em muitas coisas nos enganaram os sentidos, se não fossem guiados e examinados pelo entendimento. Julgando somente pelo sentido, todos julgaríamos que o sol é pouco mais ou menos como uma roda de carro, e estas estrelas como umas laranjas, e ficaríamos nisso muito enganados, pois o entendimento tem demonstrado, e está nisso convencido, ser o sol e muitas estrelas muitas vezes maiores que toda a terra. Engana-se a cada passo o sentido dos brutos com as semelhanças das coisas, tendo-as por verdadeiras porque não é ajudado de algum entendimento.»

Luís de Camões, que é quase contemporâneo de D. João de Castro, partilha a atitude empírica deste assim como a mundividência que dela decorre. No canto V (estrofe 17), sobreleva a experiência dos homens do mar: «Os casos vi que os rudos marinheiros,/ Que têm por mestra a longa experiência,/ Contam por certos sempre e verdadeiros,/ Julgando as cousas só pela aparência,/ E que os que têm juízos mais inteiros,/ Que só por puro engenho e por ciência,/ Vêem do mundo os segredos escondidos,/ Julgam por falsos ou mal-entendidos.» E, mais à frente no mesmo canto V (estrofe 23), enfatiza as novidades que os Descobrimentos tinham trazido face ao saber antigo: «Se os antigos filósofos, que andaram/ Tantas terras, por ver segredos delas,/ As maravilhas que eu passei, passaram,/ A tão diversos ventos dando as velas,/ Que grandes escrituras que deixaram!/ Que influição de signos e de estrelas!/ Que estranhezas, que grandes qualidades!/ E tudo sem mentir, puras verdades.»

No volume IV das Obras Completas de D. João de Castro (eds. Armando Cortesão e Luís de Albuquerque, Academia Internacional da Cultura Portuguesa, 1982), o historiador holandês Reijer Hooykaas, no artigo em inglês inserido em apêndice «Science in Manueline Style», considera D. João de Castro o mais moderno de todos os autores do século XVI, por ter valorizado a observação, a experimentação e o raciocínio. Onésimo Almeida, que tem insistido sobre a relevância desse texto, faz, em O Século dos Prodígios, o paralelismo com Camões: este «experimentou e viu claramente visto, aprendeu num saber de experiência feito, naquela viagem de 1553, que o mundo estava em grande mudança e experimentá-lo era o primeiro passo para a sua compreensão.»

COMO PERDER AMIGOS RAPIDAMENTE

Meu prefácio ao livro Como Perder Amigos Rapidamente, de David Marçal (Gradiva):

Em 1936, saiu um dos livros mais influentes do século passado: Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas. Foi seu autor o self-made man norte-americano Dale Carnegie (de facto, chamava-se Carnegey, mas mudou o nome para ficar com o apelido do magnata e filantropo Andrew Carnegie). Warren Buffett, um dos homens mais ricos do mundo, diz que o leu com proveito aos 20 anos, ostentando no seu escritório o diploma do curso que fez no Carnegie Institute (o Carnegie é do autor do best-seller e não do filantropo). O livro enriqueceu o autor ao vender para cima de 30 milhões de exemplares em mais de 30 línguas. Há uma edição corrente em português, o que mostra a intemporalidade do género de autoajuda. De facto, as pessoas continuam a precisar de ajuda e muitas autoajudam-se, aumentando o pecúlio dos herdeiros do autor.

O título do David Marçal parece situar-se nos antípodas dos objectivos preconizados por Dale Carnegie. Mas é evidentemente irónico. De facto, há amigos e amigos. Uns podem-se perder sem prejuízo de maior e outros convém manter. Hoje, no tempo das redes sociais, a palavra «amigo» ganhou novos significados: eu, por exemplo, tenho 5000 amigos no Facebook e só não tenho mais porque essa rede não deixa. Vou perdendo alguns, lentamente, o que permite a entrada de quem está na fila de espera. Mas, embora esteja na lista dos 5000, o David é um amigo real e não virtual. Um amigo que não conto perder.

Conheci-o pouco depois de, há 20 anos, Mark Zuckenberg ter criado uma maneira inovadora de fazer amigos. Eu era membro do júri de um concurso do jornal Público que escolhia cientistas para trabalhar alguns meses na redacção da sua secção de ciência. A iniciativa, no tempo de José Mariano Gago (que falta nos faz!), visava aproximar a ciência do público, desenvolvendo a cultura científica. O David, na altura a doutorar-se em Bioquímica, era já um claro talento na divulgação científica. Distinguia-se não só pelo seu conhecimento das matérias e pelo raciocínio arguto, mas também pela sua originalidade e pelo seu sentido de humor. 

Uma marca dessa qualidade foi o seu projecto «Cientistas de Pé», no qual uma trupe de cientistas fazia comédia sobre temas de ciência: ver o livro Toda a Ciência (menos as partes chatas), que ele e os seus companheiros publicaram na Gradiva em 2013. Um assunto em que se especializou, com proveito para a cultura nacional, foi a pseudociência: a Fundação Francisco Manuel dos Santos publicou em 2014 um ensaio dele precisamente com esse título. Temos feito muitas coisas juntos, na divulgação científica e não só (já velejei no Tejo no seu barco com um nome estapafúrdio), incluindo quatro livros na Gradiva (o primeiro foi Darwin aos Tiros e Outras Histórias de Ciência, em 2011). E tem sido sempre uma festa trabalhar com ele. Quando o reencontro, há sempre uma observação criativa e, muitas vezes, uma piada nova. Criámos o podcast Mais Lento do que a Luz, hoje no Público, depois de termos feito no mesmo jornal um outro podcast chamado Assim Fala a Ciência, com o patrocínio da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Ainda no quadro desta Fundação, criámos o GPS - Global Portuguese Scientists, a rede de cientistas portugueses no mundo, e o Mês da Ciência e Educação.  

O David insistiu num meu prefácio para este livro. Ainda retorqui que os meus prefácios estavam algo desvalorizados pela relativa abundância, mas a um amigo nada se recusa. Num livro que fala da perda de amigos, quero esclarecer que, depois de o ler, não perdi esse amigo, bem pelo contrário: passei a admirá-lo mais. A obra que o leitor tem entre mãos é o David no seu melhor: sábio e corajoso. Estou convencido de que, contrariando o título, ele vai não só reforçar os muitos amigos que já tem, mas também fazer novos. Trata-se de uma análise o mais racional possível de um rol de desvarios do mundo actual. 

Vivemos tempos estranhos: por um lado a capacidade criativa do Homo sapiens permite-lhe viver melhor do que jamais viveu desde que há 300 000 anos começou, em África, a sua jornada na Terra. Mas, por outro lado, nunca foi tão ampla a aparição e tão rápido o espalhamento da irracionalidade. Todos temos dois lados – um racional e outro irracional, mas muitas pessoas esforçam-se alegremente por dar a conhecer o segundo. O paradoxo maior está em que a irracionalidade brota e corre através de meios de comunicação, criados precisamente pela moderna ciência e tecnologia que a nossa espécie desenvolveu nos últimos 300 anos. 

Não esqueçamos que as redes sociais, nas quais hoje podemos ser cancelados por dizer algo que não seja politicamente correcto, têm por base a ciência. Basta reparar que a World Wide Web foi criada há pouco mais de 30 anos no CERN, o laboratório europeu de Física de Partículas, porque os cientistas queriam partilhar os seus dados, para melhoria do conhecimento comum. No entanto, por essa rede global, passam hoje tanto a verdade como a mentira, sendo, nestes dias de explosão da inteligência artificial, difícil de distinguir entre as duas. Talvez passe mais mentira do que verdade.

Num acto de verdadeiro serviço público, David ajuda a distinguir quem tenha dúvidas. Assim, num certo sentido, este é um livro de autoajuda. Se alguém se sentir perdido na avalancha de palavras, sons e imagens que nos invadiu, o autor dá-lhe aqui um GPS para orientação. A ciência serve de modelo e é muito simples: observar a realidade (ou, quando é possível e conveniente, experimentar), apurar os factos e usar a lógica. E extrair as devidas conclusões. 

Se algumas das conclusões que o David fundamentadamente tira são polémicas, não há mal nenhum nisso. Pode haver uma discussão cordata, respeitando o outro, o que, infelizmente, nem sempre acontece. Espero que isso aconteça com este livro, até porque a discussão ajuda a desfazer eventuais erros. Claro que há assuntos que são mais de opinião do que de facto e, nesse caso, só há que respeitar, com tolerância, as opiniões de uns e de outros.  

Meus caros amigos, não se percam!

quinta-feira, 7 de novembro de 2024

ESTUQUE

Por A. Galopim de Carvalho
 
Uma das utilizações do gesso, a um tempo técnica e artística, vem de longe e materializa-se no estuque, produto usado em variados tipos de ornatos relevados, em tectos, paredes interiores e exteriores. 
 
Estuque do Palácio da Bolsa do Porto (imagem colhida na internet)
De uso milenar nas civilizações mediterrâneas, o estuque (do italiano stucchi, com o significando de relevo ornamental), na sua versão antiga ou tradicional, era constituído essencialmente pela junção de uma argamassa branca ou polícroma de gesso-de-Paris com uma de cal aérea, sendo esta usada como um aditivo retardador de uma secagem demasiadamente rápida.

Esclareça-se que a antiga expressão gesso-de-Paris, hoje obsoleta entre nós, refere o produto industrial, o pó branco com que no hospital se imobiliza um braço ou uma perna partida e que podemos comprar na drogaria para tapar uma irregularidade na parede. 
 
Diga-se que o eventual colorido das argamassas era obtido pela adição de pigmentos minerais (ocres, terra de Siena e outros) e recorde-se que o adjectivo aérea, colado à palavra cal, informa que o endurecimento desta tem lugar por efeito do dióxido de carbono do ar atmosférico, segundo a equação:
Ca(OH)2 + CO2 → CaCO3 + H2O.

O estuque, que integra os actuais produtos usados na construção civil, como revestimento em interiores, principalmente tectos e ornamentos executados em relevo, é uma argamassa branca ou polícroma (pela adição de pigmentos minerais) em cuja composição pode entrar gesso, cal, areia fina e pó de mármore.

Com notável desenvolvimento no passado, a estucagem, segundo os preceitos tradicionais, afirmou-se, em especial, no século XVIII, como um ramo artístico do sector da construção civil, associado à arquitectura.

O gesso foi a matéria-prima da argamassa mais antiga, aplicada como ligante, nas alvenarias, por babilónios e egípcios, há mais de 4000 anos. Uma argamassa, acrescente-se, própria de ambientes secos, como acontece em regiões marcadas pela aridez, uma vez que se deteriora, se exposta à humidade atmosférica. A estucagem de paredes interiores e a reprodução de máscaras funerárias, no Egipto antigo, testemunham o elevado nível dos estucadores de então. 
Daqui e ao longo da Antiguidade, a técnica alastrou aos gregos e romanos. A título de curiosidade, diga-se que, em Roma, o célebre arquitecto Marcus Vitruvius Pollio (século I a.C.), na sua monumental obra “De Arquitectura”, explicou o processo de obtenção do estuque. Também os árabes foram mestres na estucagem, aperfeiçoando-a no revestimento e decoração dos interiores dos edifícios mais nobres. Entre os séculos VIII e XV, desenvolveram na Península Ibérica uma arte de decorar grandes espaços, num complexo rendilhado de elementos geométricos e abstractos de que são exemplo os interiores e outros espaços do monumental Alhambra de Granada.

A estucagem esteve praticamente ausente na arquitectura religiosa e civil do Românico e do Gótico, na Idade Média europeia, tendo ressurgido timidamente no Renascimento italiano, com emolduração de pinturas a fresco, e atingindo o seu máximo esplendor em finais do Barroco, na segunda metade do século XVIII, com as minuciosas e aprimoradas ornamentações do Rococó. Já bem dentro do século XIX, o estuque acompanhou a maleabilidade do Romantismo, apelando a revivalismos mouriscos (estilo neoárabe). Com o advento do Neoclássico, esta arte ganhou grande desenvolvimento em sancas, molduras e adornos em relevo de complexos e delicados desenhos e, no final desse século, acompanhou as chamadas Arte Nova e Arte Déco, como meio de concretização da fantasia criadora do ser humano, testemunhando, uma vez mais, a aptidão decorativa desta argamassa.

No decorrer do século XX, o estuque perdeu definitivamente o papel de relevo que teve nas épocas do Barroco e do Rococó, restringindo-se a pequenas molduras e frisos decorativos, além das sempre utilizadas superfícies planas de paredes e tectos. A progressiva industrialização da construção civil marcou, por assim dizer, o fim do estuque ornamental. Porém, o estuque continua a servir na feitura de sancas e molduras, bem como no revestimento de paredes ou tectos, corrigindo imperfeições. Uma vez concluído o reboco, continua na ordem do dia, muitas vezes, a cargo dos pintores. Nos dias de hoje, a estucagem de paredes usa a técnica do chamado “estuque projectado”, à semelhança da tradicional pintura à pistola.

Entre os exemplos mais significativos da aplicação desta arte no nosso país, citam-se, no século XVI, os estuques da igreja do Espírito Santo e os da capela e refeitório da Universidade, em Évora. Após o terramoto de 1755, o Marquês de Pombal encarregou o jovem estucador italiano, João Gross (1715-1780), de proceder ao restauro e melhoramento do tecto da Igreja dos Mártires, no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa, e no palácio do Marquês de Pombal, em Oeiras. Acrescente-se que Gross foi professor da “Aula de Estuque e Desenho”, então criada, em 1764, na Fábrica das Sedas. Os estuques mouriscos dos palácios de Monserrate e da Pena, em Sintra, e os do salão nobre da Bolsa de Porto, todos do século XX, e do palácio Alverca, mais conhecido por Casa do Alentejo, em Lisboa, de começos do século XX (1919), são bons exemplos do Revivalismo em Portugal.

MANIFESTO PARA O ENSINO E APRENDIZAGEM EM TEMPO DE GenAI

  Por Maria Helena Damião e Cátia Delgado Assinado por académicos de diversos países do mundo, foi publicado no passado dia 29 de Novembro, ...