No texto A História sem passado assinalei a integração de uma nova disciplina de opção no currículo de todos os cursos do ensino secundário. A sua designação é "História, Culturas e Democracia".
Recordo que, nas palavras de um Secretário de Estado da Educação, ela decorreu do "diálogo" entre a tutela e os professores de História, constituindo "uma resposta à necessidade de valorização do conhecimento histórico e do património". Está certo: a História está entre as disciplinas que desaparecem do currículo do ensino básico e secundário.
O problema é que esta "História" submete-se às "finalidades" (que não são educativas) previstas no Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória, decalcadas de documentos que traduzem a influência nos sistemas de ensino de organizações que não têm vocação educativa, como é o caso do Banco Mundial (BM) ou da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) (ver por exemplo, aqui, aqui e aqui).
Adianta o Secretário de Estado que a disciplina visa "o desenvolvimento de espírito crítico e capacidade de interpretação da realidade sustentado em conhecimento”. Esta declaração, estando certa, quer para a História quer para qualquer outra disciplina, não poderia ser mais dissonante daquilo que se encontra legitimado no documento curricular designado por Aprendizagens Essenciais. Efectivamente, o que aí se encontra legitimado é um programa ideológico, cujo título inclui a palavra "História".
A História é, de resto, muito apetecível como campo de doutrinamento: em todos os tempos, em todos os regimes políticos isso se verifica. Lamentavelmente, as democracias contemporâneas não fogem à tentação. E, lamentavelmente também, nestes regimes, nem os académicos nem os professores se apresentam como vozes críticas, ou suficientemente críticas, para fazer valer o conhecimento histórico pelo inestimável valor que ele tem e que, eventualmente, se repercutirá na formação das pessoas, com efeitos na sociedade. Há excepções, é certo, e, por isso mesmo são notadas (ver aqui).
A melhor análise dos propósitos e conteúdos da nova disciplina a que tive acesso foi feita por alguém que, sendo "histórico socialista" (o mesmo partido do Governo) e não tendo, ao que sei, formação em Educação, consegue perceber, e muito bem, a diferença entre o ensino que a escola pública, do Estado, deve proporcionar e o doutrinamento que em circunstância alguma aí pode espreitar, quanto mais entrar. Refiro-me a Jaime Gama que também foi presidente da Assembleia da República e ministro dos Negócios Estrangeiros.
Numa entrevista, publicada com o título Que História querem ensinar nas nossas escolas? e que se pode ver aqui...
Recordo que, nas palavras de um Secretário de Estado da Educação, ela decorreu do "diálogo" entre a tutela e os professores de História, constituindo "uma resposta à necessidade de valorização do conhecimento histórico e do património". Está certo: a História está entre as disciplinas que desaparecem do currículo do ensino básico e secundário.
O problema é que esta "História" submete-se às "finalidades" (que não são educativas) previstas no Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória, decalcadas de documentos que traduzem a influência nos sistemas de ensino de organizações que não têm vocação educativa, como é o caso do Banco Mundial (BM) ou da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) (ver por exemplo, aqui, aqui e aqui).
Adianta o Secretário de Estado que a disciplina visa "o desenvolvimento de espírito crítico e capacidade de interpretação da realidade sustentado em conhecimento”. Esta declaração, estando certa, quer para a História quer para qualquer outra disciplina, não poderia ser mais dissonante daquilo que se encontra legitimado no documento curricular designado por Aprendizagens Essenciais. Efectivamente, o que aí se encontra legitimado é um programa ideológico, cujo título inclui a palavra "História".
A História é, de resto, muito apetecível como campo de doutrinamento: em todos os tempos, em todos os regimes políticos isso se verifica. Lamentavelmente, as democracias contemporâneas não fogem à tentação. E, lamentavelmente também, nestes regimes, nem os académicos nem os professores se apresentam como vozes críticas, ou suficientemente críticas, para fazer valer o conhecimento histórico pelo inestimável valor que ele tem e que, eventualmente, se repercutirá na formação das pessoas, com efeitos na sociedade. Há excepções, é certo, e, por isso mesmo são notadas (ver aqui).
A melhor análise dos propósitos e conteúdos da nova disciplina a que tive acesso foi feita por alguém que, sendo "histórico socialista" (o mesmo partido do Governo) e não tendo, ao que sei, formação em Educação, consegue perceber, e muito bem, a diferença entre o ensino que a escola pública, do Estado, deve proporcionar e o doutrinamento que em circunstância alguma aí pode espreitar, quanto mais entrar. Refiro-me a Jaime Gama que também foi presidente da Assembleia da República e ministro dos Negócios Estrangeiros.
Numa entrevista, publicada com o título Que História querem ensinar nas nossas escolas? e que se pode ver aqui...
... diz que a nova disciplina “serve-se da História” para cumprir “um objetivo, de certa forma, militante, não científico” [:] “estimular ativismo, cidadania, intervenção”,[veicula] também a ideia de que a História precisa de ser “desconstruída, relida, reinterpretada”.
O programa é virado para “a segmentação, a fratura, identidades minoritárias”, tendo “um abandono de tudo o que tem que ver com conjuntos, com integração, com coesão” (…).
É uma História “sem centralidade nacional”: “Não aparece Portugal, não aparece o Estado, não aparece a Nação, não aparece o Povo, tudo é segmentado”. Por exemplo, em relação à batalha de Aljubarrota (…) [o] objetivo não é explicar a batalha: “(…) é dizer que a batalha tem várias interpretações – ‘vejam as várias crónicas’” (…). Há “uma descontextualização de uma interpretação mais vasta, geopolítica, histórica da época (…).
Lamenta que o programa seja de “uma História que não aceita nenhum símbolo nacional, não aceita nenhum herói, não aceita nenhuma causa, não aceita nenhum objetivo estratégico do país, não aceita o país, sendo prefigurado por uma política de Estado – até na parte internacional”.
“O que está aqui em causa é cumprir um objetivo ideológico muito em voga, hoje, em certas culturas, sobretudo anglo-saxónicas, que é o de enfrentar-se com o passado” (…). “É, no fundo, receitada uma penitência a certos povos e países (…): ‘tens de te enfrentar com o passado, tens de ver a tua experiência dolorosa, confessar o teu pecado na experiência dolorosa, e só assim merecerás uma absolvição de politicamente correto, só assim poderás ser redimido na tua alma do que ainda há de empatia para com essa parte da História, autoflagelando-te, para poder ser um cidadão liberto'” face a “um passado de trevas”, ironiza.
“Outra noção muito perversa” (…) tem que ver com “a responsabilidade transgeracional”: não só há o confronto com o passado, como “‘tens de assumir a culpa e uma responsabilidade, quiçá indemnizatória, em relação a esse mesmo passado’”. (…) Pedagogia que visa “vencer as diferenças e os ‘handicaps’ das minorias”.
Objetivo? “Haver um momento em que as histórias das culturas minoritárias têm de se sobrepor às culturas maioritárias, para se estabelecer uma noção de equidade”. (…)
[Nota ainda que] a bibliografia “é muito irregular quanto à sua consistência científica e credibilidade de algumas instituições a que recorre”.
Nota: a mencionada entrevista foi realizada por José Manuel Fernandes e publicada no jornal Observador, 17 de Outubro de 2019.
2 comentários:
O eduquês mais obscuro ao serviço da infantalização do ensino da História.
Para que os alunos aprendam História é necessário que, nas escolas, os professores ensinem História!
Quando o ensino da História é capturado por especialistas em Ciências da Educação, nada mais há a esperar do que a glorificação do "bom selvagem", expressa numa linguagem absurdamente codificada, mas com força de norma burocrática que os professores-funcionários devem seguir à risca!
Esta "história", opcional para o 12.º Ano, não passa de uma Área Escola mal disfarçada, como lembrou Jaime Gama, ou de uma Área de Projeto sem futuro, como a original!
Caro Leitor Anónimo
Neste caso, os responsáveis não são só nem principalmente especialistas em Ciências da Educação. Lembro que quem redige as Aprendizagens Essenciais são professores, em sede de associações de professores. Isto é de, resto, reconhecido pelo secretário de estado. A responsabilidade tem, pois, de ser repartida.
Cordialmente,
MHDamião
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