sábado, 28 de fevereiro de 2009

A VIDA A ANDAR PARA TRÁS?



Minha crónica no "Sol" de hoje:


O filme “O Estranho Caso de Benjamin Button”, baseado num conto de Scott Fitzgerald, que acaba de ganhar três óscares da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas (melhor caracterização, melhores efeitos visuais e melhor direcção artística), mostra a vida de Benjamin Button a andar para trás. O personagem, interpretado por Brad Pitt, nasce velho e morre novo. Em vez de lhe aparecerem rugas desaparecem-lhe as rugas. Será isso possível na vida real? Será possível que a vida ande para trás?

A resposta a esta pergunta é “não” e é por isso que foram necessárias boas caracterizações, bons efeitos visuais e boa direcção artística. A lei da física que impede o rejuvenescimento natural é a Segunda Lei da Termodinâmica, cujo desconhecimento foi equiparado por Charles P. Snow há cinquenta anos (a sua conferência sobre “as duas culturas” foi proferida em Cambridge a 7 de Maio de 1959) ao desconhecimento da obra de Shakespeare. Essa famosa lei afirma a irreversibilidade dos processos naturais. Quer dizer, em todos os fenómenos reais – e não apenas nos fenómenos da vida – não se pode andar para trás. Tudo acontece do modo a respeitar a seta do tempo, caminhando do passado para o futuro e não no sentido contrário. O filme da vida de uma pessoa, mostrando a evolução dela ao longo do tempo, resultará, de facto, muito estranho se for corrido ao contrário. Mas o filme “O Estranho Caso de Benjamin Button”, se for corrido ao contrário, já mostrará uma evolução plausível de Button, embora implausível dos outros.

Os físicos criaram uma grandeza para distinguir o passado do futuro. Essa grandeza, a que chamaram “entropia”, é uma medida da desordem. De acordo com a Segunda Lei, a entropia cresce necessariamente nos sistemas isolados: a desordem é maior no futuro do que no passado. Trata-se, contudo, de uma lei estatística, o que significa que são hipoteticamente possíveis violações pequenas e por pouco tempo dessa lei. A vida de Button a andar para trás não é uma violação admissível, porque é grande e por muito tempo...

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

VLCD! do lugar onde estou já me fui embora

Informação recebida do Teatro Académica de Gil Vicente, Coimbra:

Dias 2 e 3 de Março`09, 21h30
VLCD! do lugar onde estou já me fui embora
Teatro Meridional
No âmbito da XI Semana Cultural da Universidade de Coimbra
Organização TAGV e Reitoria da UC

Sinopse

Desde que o Homem passou a medir o tempo este, inevitavelmente, também o mediu a si. VLCD! é um espectáculo que, através do humor e do absurdo, versa sobre a velocidade. A mesma que conduz nos tempos modernos o ser humano a um nível de vida material que se dissocia da sua própria felicidade. A mesma onde um olhar mais atento (quiçá mais lento...) podia também identificá-la como o verdadeiro truque de uma sociedade de consumo.

A ingenuidade das personagens e a acutilância que pode ter a irrisão são os pontos de partida deste novo desafio, que tem como base de interpretação a técnica de clown, o gesto e a criação colectiva.

VLCD! é igualmente uma nova estação desse já vasto, impermanente e misterioso percurso do Teatro Meridional no sentido de uma comunicação própria e íntima de um Teatro que, verdadeiramente, se afirma como a arte do presente e da presença.

Ficha Artística
Criação e Produção Teatro Meridional
Direcção cénica Nuno Pino Custódio
Interpretação Carla Maciel, Fernando Mota, Luciano Amarelo, Miguel Seabra

Teatro Académico de Gil Vicente _ Praça da República _ 3000-343 Coimbra
E-mail: s.artisticos@tagv.uc.pt(serviços artísticos)
Blog: http://blogtagv.blogspot.com/
Telefone: 239 855 630 _ Fax: 239 855 637
Bilheteira: 17h00-22h00 _ segunda a sábado _ telefone: 239 855 636

OS CAMINHOS DAS ESTRELAS

Informação recebida do programa Câmara Clara da RTP2 relativa à próxima emissão, no domingo à noite, 1 de Março, 22h30m (na foto a apresentadora do programa Paula Moura Pinheiro):
JOÃO FERNANDES E ROSA DORAN
Mais de 200 portugueses concorreram ao lugar de astronauta no primeiro concurso da Agência Espacial Europeia (European Space Agency) a que tiveram acesso. Os resultados só vão ser divulgados daqui a quatro meses, mas é sabido que Portugal conheceu, nos últimos anos, um boom de interesse e de competência em Astronomia. Dois cientistas, João Fernandes, o coordenador nacional do Ano Internacional da Astronomia, e Rosa Doran, presidente da NUCLIO, uma associação de astrónomos profissionais, amadores e professores, contam-nos em que ponto está a aventura terrestre da exploração espacial, falam-nos dos próximos destinos humanos no universo e de como será a vida extra-terrestre. Copérnico, Galileu, Newton, Einstein, Hans Bethe, Carl Sagan e muitos outros cientistas, alguns portugueses, que nos abriram o caminho das estrelas são lembrados ao lado de Van Gogh, Goethe, Holst, Kubrick e David Bowie, entre os muitos criadores que trabalharam sobre o confronto do homem com o espaço. Rosa Doran e João Fernandes declaram-se optimistas - e todos vão perceber porquê.

O Telescópio de Galileu em Portugal


Informação recebida do Observatório Astronómico de Lisboa, Centro de Astronomia e Astrofísica da Universidade de Lisboa da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa

O Observatório Astronómico de Lisboa (OAL) promove Palestras públicas mensais que têm lugar no Edifício Central, pelas 21h30 da última sexta-feira de cada mês.

A próxima sessão decorrerá no dia 27 de Fevereiro e terá como tema:

"O Telescópio de Galileu em Portugal
",
Doutor Henrique Leitão.
CIUHCT - Universidade de Lisboa

Celebra-se neste ano de 2009 o Ano Internacional da Astronomia, que toma como tema principal as observações telescópicas levadas a cabo por Galileu Galileu há quatro séculos, em 1609. As observações de Galileu, como se sabe, lançariam a Europa num profundo debate científico e cultural.

Nesta palestra mostraremos como estes assuntos foram seguidos em Portugal e que impacto tiveram entre nós. Curiosamente, como se mostrará, Portugal participou muito estreitamente nestes acontecimentos, tendo desempenhado um papel fundamental na divulgação do telescópio e das novidades celestes. Trata-se de uma página fascinante da história científica do nosso país que convém conhecer um pouco melhor.

VIDEODIFUSÃO DA PALESTRA PÚBLICA

Como vem sendo hábito anunciamos que o OAL fará a transmissão da sua Palestra Mensal através da Internet.

No dia 27 de Fevereiro a partir das 21h30 visite o seguinte endereço:
http://live.fccn.pt/oal/

A entrada na Tapada da Ajuda faz-se pelo portão da Calçada da Tapada, em frente ao Instituto Superior de Agronomia.

Para mais informações use o telefone 213616730, ou consulte:
http://www.oal.ul.pt/palestras

Paranóicos


Crónica do médico José Luís Pio de Abreu no "Destak" de hoje (na imagem, Hitler no filme "Valquíria"):

São trabalhadores incansáveis e minuciosos. Têm grandes ideias mas fraca vida. Vivem de acusar os outros, projectando neles as suas tendências indesejáveis e não assumidas. Não só os acusam como tecem uma rede que os faça comprometer. Se eles respondem e se defendem, é sinal de que reconhecem as acusações. Se não respondem, é sinal de que fogem ao assunto e, por isso, estão comprometidos. Uma acusação inventada será assim sempre provada.

Freud estudou a paranóia através do livro de memórias do Dr. Schreber, magistrado alemão e "homem de inteligência superior, entendimento singularmente agudo e precisos dotes de observação", tal como ele se descrevia. "Falava directamente com Deus" e achava que, uma vez transformado em mulher, iria redimir a humanidade. Antes, porém, quando internado numa clínica psiquiátrica, teria padecido "transformações corporais", acusando então o seu médico, Dr. Flechsig, de lhe provocar tais padecimentos para o transformar em mulher e abusar dele. Freud atribuiu a origem da paranóia à homossexualidade não assumida.

Os paranóicos convincentes são perigosos. Apesar do delírio, o Dr. Schreber convenceu a Justiça alemã a retirar-lhe a incapacitação e autorizar a publicação do livro onde expunha as suas ideias messiânicas. Estas eram fundadas num sistema religioso pseudocientífico que já vislumbrava a superioridade da raça ariana. Convenceu alguma gente. Outro paranóico, acedendo aos instrumentos de poder, convenceu muito mais: Hitler.

J.L. Pio Abreu

PREVISÕES MARXISTAS


Minha crónica no "Público" de hoje:

Neste tempo de rápido “corta-e-cola” de e na Net, tendo sido abandonada a verificação da fiabilidade das fontes, o disparate circula a uma velocidade muito grande, crescendo e multiplicando-se à medida que avança. Uma boa ilustração é a notícia que vem no El País de 22 de Fevereiro passado, sob o título “Marx não disse isso”. Cayo Laro, o líder da Esquerda Unida (força política, com origem no Partido Comunista, que nas eleições espanholas de 2008 obteve quase um milhão de votos), quis sublinhar a actualidade do pensamento de Karl Marx com a leitura, numa reunião do seu Conselho Político, de uma previsão do filósofo alemão que, embora fosse de 1867, parecia ajustar-se como uma luva à actual crise económica:
“Os proprietários do capital estimularão a classe trabalhadora para que comprem mais e mais bens, casas, tecnologia cara, empurrando-os a contrair dívidas cada vez maiores até que a dívida se torne insustentável. A dívida por pagar levará à bancarrota dos bancos, os quais terão que ser nacionalizados”.
A profecia batia demasiado certo. E, quando a esmola é grande, o pobre deve desconfiar. Mas Laro, talvez por excesso de voluntarismo, não desconfiou. Desconfiaram, isso sim, muitos leitores, alguns dos quais concluíram rapidamente que a citação era falsa e que se tinha vindo a propalar pela Net a partir de um jornal satírico norte-americano. Era como se alguém tivesse levado para a reunião cimeira de um partido um texto recortado do Inimigo Público. O sítio malaprensa.com, que aponta o dedo a erros da imprensa espanhola (bem poderia o sítio tornar-se ibérico!), publicou uma nota com o esclarecedor título “Marx não era Nostradamus”. E o dirigente viu-se obrigado a pedir desculpa pelo erro.

Errar é humano e as desculpas devem ser dadas a quem, contrito, as pede. Contudo, o mais extraordinário está a seguir na notícia do El País. Um outro dirigente da Esquerda Unida não se coibiu de comentar: “Pode ser que Marx não tenha dito isso, mas decerto que o pensou”. E, tendo analisado à lupa O Capital, encontrou algo vagamente parecido: “Num sistema de produção em que todo o processo produtivo se baseia no crédito, quanto este cessa de repente e só se admitem pagamentos a pronto, tem de haver imediatamente uma crise...” Mas Marx não disse que a história se repete, primeiro como comédia e depois como tragédia. Embora parecido, disse outra coisa.

Este episódio ensina-nos, pelo menos, duas coisas. Em primeiro lugar, o enorme perigo que corre quem se dedica ao corte-e-cola. Infelizmente, as nossas escolas não têm feito o suficiente para dissuadir os infantes dessa prática. O "Magalhães" vai ampliar o processo de imbecilização em curso, assente no corta-e-cola indiscriminado. Vão proliferar entre nós os textos apócrifos, como a crónica falsa de Eduardo Prado Coelho sobre o chico-espertismo nacional ou as fontes bastante originais de João César das Neves sobre a nossa economia (inventou há tempos uma fundação alemã e um relatório dela que tem sido citado). Em segundo lugar, ensina a facilidade com que uma forte vontade pode iludir a realidade. Se não é verdade podia muito bem ser... Num filme dos Irmãos Marx, os famosos comediantes americanos, um deles diz que um quadro está numa casa ao lado. E outro responde: “Mas aqui ao lado não há nenhuma casa!” Réplica do primeiro: “Não faz mal, nós podemos construir uma”.

A propósito dos Irmãos Marx, não resisto a colar aqui um texto de Groucho, que em 1963 também previu a crise. Invoco como atenuante o facto de não o ter copiado de fonte anónima da Net, mas sim do livro Memórias de um Pinga-Amor (Assírio e Alvim, 1980), cuja autenticidade confirmei:
“Nos velhos tempos, quando as pessoas eram pobres viviam pobres. Hoje vivem ricas. Já discuti isto com inúmeros assalariados de oito-a-dez-mil-dólares-por-ano e, na maior parte dos casos, admitem que quase tudo o que possuem não lhes pertence - os automóveis, as televisões, as casas, as mobílias. A filosofia deles parece ser: Que se lixe – podemos morrer amanhã!“
Fonte da Figura: http://mentesbrilhantes.files.wordpress.com/2008/09/bralds_marx-s-2.jpg

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Opinião de um encarregado de educação

O semanário Expresso de 22 de Novembro do ano passado, escolheu na rúbrica A carta da semana a Opinião de um encarregado de educação. Alberto Diamantino Costa, o encarregado de educação, de Seia, dizia o seguinte (página 38):

"Já que muitos jornalistas e comentadores defendem e compreendem o modelo proposto para a avaliação dos docentes, estranho que, por analogia, não o apliquem a outras profissões (médicos, enfermeiros, juízes, etc.).
Se é suposto compreenderem o que está em causa e as virtudes deste modelo, vamos imaginar a sua aplicação a uma outra profissão, os médicos.
A carreira seria dividida em duas: médico titular (a que apenas um terço dos profissionais podia aspirar) e médico.
A avaliação seria feito pelos seus pares e pelo director de serviços. Assim, o médico titular teria de assistir a três sessões de consultas, por ano, dos seus subordinados, verificar o diagnóstico, tratamento e prescrição de todos os pacientes observados.
Avaliaria também um portefólio com o registo de todos os doentes a cargo do médico a avaliar, com todos os planos de acção, tratamentos e respectiva análise relativa aos pacientes.
O médico teria de estabelecer, anualmente os seus objectivos: doentes a tratar, a curar, etc.
A morte de qualquer paciente, ainda que por razões alheias à acção médica, seria penalizadora para o clínico, bem como todos os casos de insucesso na cura, ainda que grande parte dos doentes sofresse de doença incurável, ou terminal. Seriam avaliados da mesma forma todos os clínicos, quer a sua especialidade fosse oncologia, nefrologia ou cirurgia estética…
Poder-se-ia estabelecer a analogia completa, mas penso que os nossos ‘especialistas’ na área da educação não terão dificuldade em levar o exercício até ao fim.
A questão é saber se consideram aceitável o modelo? Caso a resposta seja afirmativa, então porque não aplicar o mesmo, tão virtuoso, a todas as profissões? Será? Já agora… Poderiam começar a ‘experiência’ pela Assembleia da República e pelos (des)governantes…"

Acertou o autor da Carta; antecipou-se à divulgação pública do Ministério da Saúde, mas acertou: foi realmente noticiada nos últimos dias, a (nova) proposta avaliação do desempenho dos médicos, a qual deve obedecer ao Sistema Integrado de Avaliação do Desempenho da Administração Pública e, nessa medida, será muito parecida à avaliação do desempenho dos professores. Implicará o estabelecimento de objectivos individuais, a sua confrontação com os resultados obtidos, o uso de grelhas, etc.

Só me parece que Alberto Diamantino Costa se enganou numa coisa: não estou a ver este Sistema aplicado aos governantes. A outras profissões, sim, como refere; mas não à de ministro, secretário de estado...

Uma polémica científica oitocentista


Uma história da ciência portuguesa do século XIX contada por A. José Leonardo:

Em 6 de Abril de 1886 reunia-se a Academia Real das Ciências, sob a presidência do rei D. Luís, para assistir a uma conferência com o tema Memória sobre os infinitamente pequenos. Era a continuação de um estudo publicado dois anos antes por José Maria da Ponte e Horta (1824-92), oficial do exército, professor da Escola Politécnica de Lisboa e ex-governador de Macau, Cabo Verde e Angola. A julgar pelos méritos do conferencista, um sócio efectivo da Academia e par do reino, e pelo título da palestra estariam reunidas as premissas para que se cumprissem os ditames que presidiram à fundação dessa academia em 1779, por D. Maria I, nomeadamente a promoção da ciência e do ensino como motores do progresso da nação.

Mas, no volume 36 da revista O Instituto, publicação do Instituto de Coimbra (IC) – uma sociedade académica fundada em 1852- , saiu pouco depois o artigo As Conferências na Academia, assinado por Junio de Sousa, onde as “reflexões científicas” de Ponte e Horta eram fortemente contestadas. Junio de Sousa foi o pseudónimo usado pelo lente de Matemática da Universidade de Coimbra e sócio do IC António José Teixeira (1830-1900). Ele foi autor de dezenas de artigos n’O Instituto, que abordaram temas da história da Universidade, a instrução pública e a matemática. Assumiu algum relevo no panorama político nacional, ao desempenhar os cargos de conselheiro, director-geral das Alfândegas, deputado e governador de Braga.

A tese defendida por Horta baseava-se numa perspectiva mecânica do Universo em que toda a evolução universal, que culminou com o surgimento da vida e da civilização humana, poderia ser descrita com base na matéria em circulação, que desde o infinitamente pequeno até ao infinitamente grande estabelece o laço de continuidade entre toda a trama dos phenomenos do mundo. As primeiras palavras de Teixeira revelavam logo a crítica que se seguia, recheada de comentários sarcásticos. O escrito de Horta foi classificado como folhetim desprovido do mérito científico exigido a uma memória apresentada a tão dilecta associação. Foi censurada a forma pouco clara com que se tratavam conceitos como a matéria que, segundo Horta, se compunha de átomos e era infinita e eterna, e a energia, que se compunha de parcelas e era também infinita e eterna, sendo que as duas podiam ser combinadas e consubstanciadas através do movimento. A abordagem, baseada em supostos factos científicos, misturava imagens literárias e metafísica, resultando em trechos como o que se segue:

«E assim como a materia, a energia, quer seja na sua fórma cinética ou apparente, quer na sua fórma potencial ou occulta, terá tanta realidade objectiva, pelo facto do movimento, como a propria materia, a que anda associada. A energia não é um puro ser de razão, metaphysico e abstracto, senão uma realidade palpavel e concreta.»

A hipótese da circulação da matéria era aplicada por Horta à formação do nosso sistema planetário, concluindo este que “vivificada essa matéria primitiva pela attracção universal, lei do amor que prende em eterno laço os destinos da matéria; o cahos originário, como se fora compellido por instinctos de forma, lá se foi dispondo e coordenando em volta de um centro, que devia constituir o nosso futuro sol, em massas mais ou menos poderosas e definidas. Tal é, senhores, a lei genérica e incontrastavel da formação dos mundos.” Em face da clara alusão da teoria de Laplace, seguia-se a crítica de Teixeira à forma dogmática com que esta era apresentada, quando o próprio Laplace a apresentou como mera hipótese que não tinha “por base nem os dados da observação nem os resultados do cálculo”. No seu artigo, Teixeira descrevia a teoria cosmogónica que surgiu com base na observação de nebulosas, relatando também as objecções que foram sendo veiculadas que demonstravam a sua precariedade. Comparou também as semelhanças do discurso de Horta com as modificações propostas por Voizot à teoria de Laplace que, no entanto, previam a estabilidade do sistema planetário. Com efeito, José Horta contradizia esta possibilidade, defendendo o inevitável colapso do sistema solar e apontando como único argumento a impossibilidade de renovação da energia solar, que tem origem na “circulação da matéria entre o interior e o exterior do grande astro.” Assim, “o fogão da machina ir-se-há resfriando com o tempo; porque a sua alimentação não equivale ao seu dispêndio”, tratando-se de um processo “infallivel, e acha-se escrito nas ordens immutaveis da natureza physica”. O comentário de Teixeira a estas palavras foi: “Tenha caridade, sr. José Horta, com os tristes proletários da sciencia: demonstre-nos as suas arrojadas proposições.”

Para a Terra, descrita também como máquina térmica, Horta augurou um final surpreendente: “quando o Sol tiver dispersado, depois de correr immenso tempo, o seu calor e a sua luz na amplidão dos frios espaços, ficando extinctas as plantas e os animaes da Terra deserta, invadida pelas trevas da noite, então sob a influencia de qualquer choque exterior, talvez esse cadáver de um mundo se desagregue, e de seus elementos saia outra nebulosa, contendo em si a ressurreição de novos mundos.” Valeu o uso da palavra "talvez". Horta acertou, pelo menos, quando referiu que “o calor interno do globo podia ainda influir directa e efficazmente na lida evolutiva da sua economia”, considerando que “os deslocamentos a que essas camadas (superficiais) estão sujeitas pelas explosões do interior; a formação de novos e instáveis relevos por virtude d’essa causa”, em referência às ideias de Lyell.

A Lua também não escapou a Horta, despertando-lhe a veia poética, pois lhe chamou “pallida Diana (…) essa formosa deusa que tem feito scismar e enternecer tantas almas sensíveis; que tem estimulado o estro, e provocado o canto de tantos poetas sonhadores e elegiacos; que tem feito vibrar de amor tantos corações apaixonaveis; está a pique de agonisar, victima inconsciente dos fogos em que ardia.” Ao que respondeu Teixeira: “Coitadinha da Lua! Morre queimada!”

A parte seguinte do trabalho de Horta abordou as repercussões da sua teoria na história da arte, deixando de fora a dança, o que não deixou de causar estranheza a Teixeira. Mais ousada foi a aplicação que este fez da sua “lei” ao estudo da vida, comparando o nascimento de uma célula com a formação de um cristal pela justaposição ordenada de átomos, o que suscitou um rol de ironias de Teixeira, como: “que tristíssima agonia orgânica a do pobre cristal!” Teixeira concluiu a sua exposição reiterando a escassez de provas indicadas por Horta que suportassem as suas alegações. Num comentário final da conferência, afirmou que “a ciência verteu lágrimas, a literatura vestiu galas. Nada mais.”

A crítica de Teixeira revela duas perspectivas da ciência ao longo do século XIX. A primeira, preconizada por Horta é a do materialismo romântico, que teve a sua origem ainda no século XVIII mas que já era anacrónica no final do século XIX. Teixeira estava imbuído da visão moderna e positivista de ciência. A julgar por este episódio, o positivismo estaria pouco disseminada, valorizando-se mais os aspectos literários das memórias apresentadas na Academia em prejuízo do rigor científico o que, segundo Teixeira, era “sinal evidente da mais deplorável decadência.” Contudo, quer o trabalho de Horta quer a crítica de Teixeira mostram o conhecimento que havia então em Portugal das novas teorias cosmológicas, nomeadamente sobre a formação do sistema solar e a origem da energia solar.

A. José Leonardo

- SOUSA, Junio (1888). As Conferências da Academia. O Instituto. Vol. 36.º, ps. 17-25, 89-94, 131-136, 196-202, 282-289, 344-350

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

“Mas a lei muda-se de um dia para o outro...”


Novo post de Rui Baptista sobre educação, desta vez sobre as responsabilidades pelo descalabro educativo:

“A pior forma de desigualdade é tentar fazer duas coisas diferentes iguais” (Aristóteles).

Num comentário ao meu último post, assumindo a recusa em comungar do desalento do poeta do “Orpheu” – “Já nada me importo/ Até com o que amo ou creio amar./ Sou um navio que chegou a um porto/ E cujo movimento é ali estar” -, deixei a promessa de um novo texto sobre o sistema educativo. Aqui está.

No uso da licença e da liberdade de quem “não pede favor senão justiça”(Padre António Vieira), chegou a hora de se exigirem contas aos responsáveis pelo estado caótico a que chegou a educação em Portugal e a que não é estranho o Estatuto da Carreira Docente promulgado por Roberto Carneiro em grande clima de pressão sindical. Esse estado caótico foi reconhecido por António Guterres no início do seu consulado como primeiro-ministro ao eleger a educação como a sua grande paixão: “De repente, perante a obstinação dos que teimam em não acreditar na realidade, o Portugal novo-rico tornou-se no Portugal novo-pobre. Pobre porque pobre na qualificação das pessoas. Aí estão a comprová-lo os números terríveis do Estudo Nacional de Literacia recentemente publicados”.

Infelizmente essa paixão transformou-se no amor da símia que de tanto amar a sua cria a aperta de encontro ao peito até a asfixiar! Em finais de 98, a OCDE lançou um megainquérito em vários países sobre as competências dos alunos com 15 anos de idade no fim da escolaridade obrigatória. Mas Portugal não participou nesse inquérito! Era então secretária de Estado da Educação no governo de Guterres Ana Benavente. Foi essa governante que consentiu a promiscuidade docente de licenciados por universidades e por escolas superiores de educação no 2.º ciclo do ensino básico. Como alertei em tempo, existiam “quase 6000 professores formados pelas escolas superiores de educação a leccionarem no 2.º ciclo do ensino básico (numa altura em que se assiste a um decréscimo demográfico) não é número que se despreze por irrelevante” (Correio da Manhã, 17/07/96). E, segundo Valter Lemos, actual secretário de Estado da Educação, na altura docente da Escola Superior de Educação de Castelo Branco, os alunos licenciados por esta escola ascendiam então a 5810 (Público, 25/05/96). Mas quase não havia alunos a estudar para serem professores do 1º ciclo do ensino básico.

Pouco depois, como escrevi também, Ana Benavente, em descarte de responsabilidades, “numa reunião do Conselho Nacional de Educação, ‘salientando a importância do 1.º ciclo do ensino básico’, em vez de procurar um tratamento de choque para uma grave maleita que se avizinha, satisfaz-se em receitar a mezinha do apelo a este Conselho para que organize um colóquio sobre este nível de ensino, dando, segundo as suas próprias palavras, ‘um contributo muito importante’ para a sua valorização na sociedade. A um doente com uma grave pneumonia será suficiente receitar-lhe uma simples aspirina?” (Público, 30/05/96).

Os resultados da desastrosa medida de atribuir às escolas superiores de educação competência para licenciar professores do 2.º ciclo, descurando os bacharelatos para a docência do 1.º ciclo, não se fizeram esperar. Segundo um relatório das Caritas Europeia (referido no Jornal da SIC, 8/02/2001) “um em cada dois portugueses não percebe o que lê”. No dia seguinte, o jornal Público noticiava não menor escândalo: “Zero foi a pontuação obtida na realização de problemas matemáticos por 40% do 118 mil alunos, do 4.º e 6.º anos de escolaridade, que efectuaram provas de aferição, no ano lectivo de 2000/2001”.

Entretanto, quando constava estar a ser preparada legislação que viria a permitir aos licenciados pelas escolas superiores de educação leccionarem o 3.º ciclo do ensino básico, foi a direcção do Sindicato Nacional dos Professores Licenciados recebida por Ana Benavente. Foi-lhe posta a questão. Fazendo jus à proverbial ambiguidade dos políticos, fechou-se em copas, mas sem deixar de mostrar um ar agastado. Chamando-lhe eu a atenção para o facto de a Lei de Bases do Sistema Educativo contemplar, apenas e tão-só, essa docência a docentes licenciados por universidades, ela, sem se dar por achada, “bamboleando três vezes a cabeça como quem prefacia uma revelação ponderosa” (Camilo Castelo Branco), retorquiu: “Mas a lei muda-se de um dia para o outro…”

Um país que não preserva padrões de excelência, desrespeitando até direitos atribuídos às licenciaturas anteriores ao Processo de Bolonha e que sobrevaloriza as licenciaturas do ensino politécnico pondo-as ao serviço de poderosos "lobbies" de sindicatos que defendem os professores com menor habilitação académica, sofre de maleita grave, necessitando de uma terapia urgente que não se compadece com paninhos quentes. E a educação, porque é um assunto demasiado sério para servir de experimentação de reformas sem nexo, necessita de um tratamento de choque a cargo de médicos competentes e não de simples curandeiros.

"AFTER COURBET, L' ORIGIN DU MONDE"


- Tanja Ostojic. After Courbet, L´origin du Monde, 2004.

Fotografia da autoria da artista sérvia Tanja Ostojic que foi exposta (causando polémica) quando do início da presidência austríaca da União Europeia em 2005.

E AGORA EU SOU GALILEU


Informação recebida da Organização do Ano Internacional da Astronomia:

No âmbito do programa "E agora eu sou Galileu", que começa no fim da semana, o Ano Internacional de Astronomia mobiliza astrónomos profissionais e amadores para levar os portugueses a serem Galileu por um dia. Na sexta-feira (27) e no sábado (28), as ruas do país acolhem telescópios para recriar, 400 anos após as primeiras observações de Galileu Galilei, o trabalho do astrónomo. Destinada ao público em geral, a iniciativa visa sensibilizar para o impacto que essas observações tiveram para a ciência. "E agora eu sou Galileu" prolonga-se até ao fim do ano.

"Pedimos a todas as pessoas que têm um telescópio que apoiem a iniciativa, promovendo uma sessão de observação na sua localidade", explica a organização do "E Agora eu sou Galileu". Qual é a aparência da Lua? O que são as fases de Vénus? A resposta está ao alcance de todos no próximo fim-de-semana à noite, a partir das 18h30. Basta deslocar-se até um dos vários locais no país em que vão ser asseguradas gratuitamente sessões de observação (Lisboa, Porto, São Pedro do Estoril, Funchal, Bragança, Braga, Espinho, Coimbra, Constância, Aveiro, etc.).

As diferentes associações e instituições que, de Norte a Sul, colaboram neste momento ou vão colaborar com o Ano Internacional de Astronomia (AIA2009) procuram reproduzir as observações de Galileu, com meios técnicos mais actuais. No Terraço da Universidade da Madeira, frente ao Observatório Astronómico de Lisboa, frente ao planetário Calouste Gulbenkian ou ao planetário do Porto, no Centro de Interpretação Ambiental da Ponta do Sal em São Pedro de Estoril, no Centro Ciência Viva de Bragança e de Constância ou no Museu da Ciência da Universidade de Coimbra, entre outros, o público vai poder espreitar por uma luneta e, guiado por um caderno informativo especialmente criado para as observações, reviver os passos de um dos mais famosos astrónomos.

"O projecto "E agora eu sou Galileu" tem por objectivo levar até o público o conhecimento das observações que Galileu fez e fazer perceber a importância que essas observações tiveram para a ciência em geral e, em particular, para a astronomia", frisa José Afonso, do Observatório de Astronomia de Lisboa. O coordenador nacional da actividade sublinha ainda que se trata de informar e ensinar todos os públicos, jovens e adultos, e ajudá-los a interpretar as observações de Galileu à luz do que ele sabia e à luz do que se sabe hoje. "As observações de Galileu estão na base de uma revolução do conhecimento", lembra o responsável.

Cada sessão do "E agora eu sou Galileu" é subordinada a um tema, isto é, a uma das observações de Galileu: as fases de Vénus, as luas de Júpiter, os anéis de Saturno, a topologia da Lua ou as manchas solares estão, alternadamente, no centro das atenções, em função da sua visibilidade. Entre Fevereiro e Dezembro, já foram escolhidas 14 datas em que o público poderá participar nessa iniciativa original e aprender mais sobre o Universo.

Para mais informações, os interessados poderão consultar a página do Ano Internacional de Astronomia em que estará disponível toda a informação actualizada e o caderno de observações. Poderão ainda informar-se junto dos diferentes organismos locais associados ao evento (Observatório Astronómico de Lisboa, Centro de Astronomia da Universidade do Porto, NUCLIO, Universidade da Madeira, Centro Ciência Viva Bragança, Centro Ciência Viva Constância, Orion - Sociedade Científica de Astronomia do Minho, Associação Portuguesa de Astrónomos Amadores, Centro Multimeios de Espinho, Museu da Ciência da Universidade de Coimbra e Associação de Física da Universidade de Aveiro).

O Ano Internacional de Astronomia é organizado em Portugal pela Sociedade Portuguesa de Astronomia, com o apoio da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), da Fundação Calouste Gulbenkian, o Ciência Viva e a European Astronomical Society (EAS).

Datas previstas:
27 de Fevereiro (Sexta-feira) e 28 de Fevereiro (Sábado)
3 de Abril (Sexta-feira) e 4 de Abril (Sábado)
16 de Maio (Sábado)
29 de Maio (Sexta-feira) e 30 de Maio (Sábado)
19 de Junho (Sexta-feira) e 20 de Junho (Sábado)
11 de Julho (Sábado)
18 de Julho (Quarta-feira)
7 de Agosto (Sexta-feira) e 8 de Agosto (Sábado)
18 de Setembro (Sexta-feira) e 19 de Setembro (Sábado)
25 de Setembro (Sexta-feira) e 26 de Setembro (Sábado)
2 de Outubro (Sexta-feira) e 3 de Outubro (Sábado)
24 de Outubro (Sábado)
14 de Novembro (Sábado)
27 de Novembro (Sexta-feira) e 28 de Novembro (Sábado)

Associados "E Agora eu Sou Galileu"
Observatório Astronómico de Lisboa.
Centro de Astronomia da Universidade do Porto.
NUCLIO.
Universidade da Madeira.
Centro Ciência Viva Bragança.
Centro Ciência Viva Constância.
Orion - Sociedade Científica de Astronomia do Minho.
Associação Portuguesa de Astrónomos Amadores.
Centro Multimeios de Espinho
Museu da Ciência da Universidade de Coimbra
Associação de Física da Universidade de Aveiro

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Bacanal

Há noventa anos, em 1919, Manuel Bandeira publicou o seu segundo livro de poesia, a que deu o título Carnaval. Nesta obra, que teve, na altura, uma edição reduzidíssima, constam já, bem nítidos, os ingredientes do modernismo poético, muito naturalmente ligado às origens gregas e latinas da literatura.
No poema Bacanal, que abre o livro, celebra-se a liberdade (ou será a libertação?) de amarras racionais, sociais, artísticas... que todo o humano uma vez por outra ensaia…

Quero beber! cantar asneiras
No esto brutal das bebedeiras
Que tudo emborca e faz em caco...
Evoé Baco!

Lá se me parte a alma levada
No torvelim da mascarada.
A gargalhar em doudo assomo...
Evoé Momo!

Lacem-na toda, multicores
As serpentinas dos amores,
Cobras de lívidos venenos...
Evoé Vênus!

Se perguntarem: Que mais queres,
Além de versos e mulheres?...
- Vinhos!... o vinho que é meu fraco!...
Evoé Baco!

O alfanje rútilo da lua,
Por degolar a nuca nua
Que me alucina e que eu não domo!...
Evoé Momo!

A Lira etérea, a grande Lira!...
Por que eu extático desfira
Em seu louvor versos obscenos.
Evoé Vênus!


Imagem: Baco, de Caravaggio, 1598?

Recordar Carl Sagan no Ano Internacional da Astronomia


Novo post recebido de António Mota de Aguiar sobre o Ano Internacional da Astronomia:

Recordar Carl Sagan (1934-1996) é recordar o imaginário que recebemos dele durante a sua passagem pelo planeta Terra. Carl Sagan olhava o cosmos como uma criança maravilhada por tudo o que via, incutindo-nos a vontade de saber mais a respeito “de onde vimos e para onde vamos.

Quer falasse do cérebro do “homo sapiens”, espécie à qual ele reservava um futuro brilhante através da ciência, quer falasse dos milhões de milhões de estrelas, ou ainda da possível existência de civilizações extra-terrestres, fazia-o sempre com um entusiasmo contagiante. Era um prazer ouvi-lo falar no seu programa de televisão “Cosmos” (visto em 60 países, nos anos 80) da hipótese, baseada em premissas científicas, de haver vida noutro sítio do Universo, ainda que fosse de um tipo diferente da nossa...

No meio de cem biliões de estrelas, poderia haver, segundo os seus cálculos, até um milhão de civilizações! Mas, acrescentava ele, tratava-se apenas de uma hipótese, podia bem ser que a Terra fosse o único planeta com vida no Universo e, nesse acaso, aumentava a nossa responsabilidade de não nos destruirmos a nós próprios nem ao planeta que habitamos.

“L’homme qui marche”
(figura em cima), a famosa escultura de Alberto Giacometti de um andar decidido, com o olhar posto no horizonte, representa a caminhada do ser humano que avança em direcção à luz das estrelas. Carl Sagan completou a mensagem do escultor, atribuindo à espécie humana um futuro através da conquista do saber. “O nosso destino é o conhecimento” afirmava Carl Sagan.

Carl Sagan, doutor pela Universidade de Chicago e professor em Cornell, escreveu várias centenas de artigos científicos e muitos livros, entre eles “Cosmos.”, que esteve associado à série televisiva referida, e “Contacto”, uma obra de ficção científica adaptada ao cinema por Robert Zemeckis em 1997 e interpretada, no principal papel, pela actriz Jodie Foster. O filme conta-nos a recepção humana de uma hipotética primeira mensagem de rádio proveniente de uma civilização extra-terrestre, colocando problemas de natureza ética, social, moral, religiosa e outros, que seriam decerto prementes se esse acontecimento se produzisse de facto. O filme ainda hoje tem sucesso.

“Na imensidão do cosmos não haverá outras civilizações, mais antigas e mais avançadas que a nossa? Que desperdício de espaço se não houver. O ser humano conseguirá descobrir a origem e o destino do cosmos?” A estas e a outras perguntas Carl Sagan respondia: "afirmações extraordinárias necessitam de provas extraordinárias". Está tudo em aberto. É nossa obrigação continuar a sua obra.

Este Ano Internacional da Astronomia constitui uma ocasião para lembrarmos a obra de Sagan e reflectirmos sobre a enorme esperança na ciência que ele nos transmitiu ao longo da sua vida.

António Mota de Aguiar

A POLÍCIA DE BRAGA E O COURBET


A polícia de Braga, invocando a defesa da moral e dos costumes, apreendeu alguns livros que tinham na capa o famoso quadro de Courbet "A criação do mundo". Se em vez de "apreender" os polícias conjugassem o verbo "aprender" sempre poupavam uma letra. E poupavam-se estas também...

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

A FÍSICA EM COIMBRA NO SÉCULO XIX - 2


Segunda e última parte do artigo do historiador de ciência Décio Ruivo Martins sobre a Física em Coimbra ao longo do século XIX (na imagem o jornal que relatava as primeiras experiências de raios X feitas em Coimbra):

O Congresso de Electricidade de Paris, em 1881, no qual Portugal esteve representado por António dos Santos Viegas, visou a uniformização das unidades eléctricas. Para remediar a enorme confusão na nomenclatura e definição das unidades eléctricas foi estabelecido um sistema racional dessas unidades. Em Coimbra, o assunto mereceu a atenção dos professores de Física. Em Maio de 1884, sob a orientação de Santos Viegas, Henrique Teixeira Bastos apresentou uma dissertação sobre a definição de um sistema racional de unidades eléctricas e a definição de alguns padrões eléctricos.

Em 1885, Teixeira Bastos concluía a sua dissertação de concurso para docente na Faculdade de Philosophia sobre a Theoria Electromagnetica da Luz. Em 1886, foram aprovadas as teses e dissertação inaugural submetidas por Aarão Ferreira de Lacerda. A dissertação Equações Geraes da Thermodynamica foi defendida em 1886 perante um júri presidido por Santos Viegas e que incluía Júlio Henriques, Bernardino Machado e Henrique Teixeira Bastos.

A Geofísica mereceu o maior interesse dos professores do Gabinete de Física Experimental: o Geomagnetismo e a Meteorologia foram prioridades para António dos Santos Viegas e Jacinto António de Sousa a partir de 1864. Tendo efectuado vários estágios em escolas europeias estrangeiras, Santos Viegas especializou-se em técnicas experimentais de análise espectral. Neste domínio colaborou com o Observatório Astronómico de Coimbra, realizando observações magnéticas durante os eclipses. Desde a sua fundação, o Observatório Meteorológico e Magnético de Coimbra ficou integrado numa rede europeia de observatórios que estudavam o magnetismo terrestre. Também contribuiu para a formação científica e técnica de jovens. Por exemplo, em 1892, Bernardo Ayres concluiu a sua dissertação intitulada A Circulação Atmospherica e a Previsão do Tempo.

Em 1896 Teixeira Bastos publicou um artigo em O Instituto, onde anunciava as mais recentes descobertas relativas aos raios X. O Gabinete de Física Experimental de Coimbra acompanhou desde o início esses eventos. Em Fevereiro de 1896, pouco mais de um mês após a descoberta dos raios X, fizeram-se as primeiras experiências nesse Gabinete. No dia 1 de Março de 1896, o jornal O Século publicou na primeira página o artigo A Photographia atravez dos corpos opacos, onde se noticiavam as primeiras experiências feitas em Portugal. Desde o início da década de 1850 que as descargas eléctricas em gases e os espectros de emissão interessavam os professores de Coimbra e, por isso, os recursos técnicos para a realização das experiências estavam disponíveis. A quase totalidade do equipamento usado nas primeiras experiências dos raios X em 1896 tinha sido adquirida em 1872, isto é, 24 anos antes. Nos primeiros ensaios foram utilizados um dedo de um cadáver, uma mão viva, uma caixa de pesos e uma sardinha. Ainda durante o mês de Maio foram feitos ensaios de utilização dos raios X no diagnóstico clínico.

Em 1896 e 1897 intensificaram-se os estudos sobre os raios X no Gabinete de Física. Em Maio de 1897, Álvaro Silva Basto submeteu a dissertação inaugural para o doutoramento na Faculdade de Philosophia intitulada Os raios cathódicos e os raios X de Röntgen. Começava por se referir aos estudos experimentais de descargas eléctricas em gases para depois se referir às acções luminescentes, químicas e fotográficas, mecânicas, caloríficas e eléctricas dos raios catódicos. Estudou a influência sobre eles de campos eléctricos e magnéticos. A propagação no interior do tubo, a velocidade, a reflexão e a propagação fora do tubo também eram contemplados. Analisou as teorias da condução dos raios catódicos, da sua natureza material, etc. O estudo dos raios X iniciava-se com as suas propriedades ópticas, seguindo-se as acções luminescentes e fotográficas, acções eléctricas e a comparação com outras radiações como a de Becquerel. Depois de um capítulo sobre os modelos teóricos dos raios, analisava as suas técnicas de produção e de aplicação, mostrando sempre conhecimentos profundos do assunto. Entre a extensa bibliografia publicada na Europa e nos EUA, referida na tese, merecem destaque as comunicações na Academia das Ciências de Paris de Perrigot, a 20 de Abril, de Le Bon em 26 de Abril e de Becquerel em 10 de Maio de 1897. A última conferência foi apresentada cerca de 20 dias antes de Silva Basto concluir a sua tese!

O início do século XX ficou assinalado no Gabinete de Física de Coimbra pela introdução dos estudos sobre a constituição atómica da matéria. Em 1908 foi apresentada a dissertação doutoral Theoria dos Electrões na Faculdade de Philosophia por Egas Pinto Basto. No mesmo ano, este submeteu uma dissertação para o concurso ao magistério na Faculdade de Philosophia, que continuava os seus estudos sobre electrões. Este trabalho ilustra bem a actualidade com que alguns temas da Física Moderna eram tratados em Coimbra. Na 1ª parte, Pinto Basto referia-se ao estudo experimental dos raios catódicos, incluindo a sua produção e propriedades, natureza dos raios catódicos, determinação da velocidade desses raios e do valor de e/m. No capítulo dedicado ao estudo experimental da ionização dos gases discutia o efeito fotoeléctrico e a determinação da carga e massa dos iões. Um capítulo era dedicado às radiações das substâncias radioactivas (raios alfa, bata e gama). A 2ª parte do seu trabalho iniciava-se com o estudo do efeito Zeeman, constituição do átomo, teorias sobre a condutibilidade metálica, arranjo dos electrões no átomo de acordo com os resultados experimentais, referindo-se ao modelo de Nagaoka, do qual tomou conhecimento através de artigos publicados na Nature, em 1904. A maior parte do trabalho baseaca-se nos estudos mais recentes de J. J. Thomson e de Rutherford, analisando temas como a lei periódica, radioactividade, número de electrões num átomo e a sua distribuição em anéis segundo o modelo de Thomson, medida da esfera de electricidade positiva, origem da massa do átomo, etc.

No início do século XX, quando Santos Viegas concluía a sua actividade de mais de 50 anos no Gabinete de Física, novos estudos surgiam sobre os tópicos mais actuais. Em 1906, João de Magalhães apresentou a sua tese de licenciatura O Rádio e a Radioactividade... Sobre este assunto, esse licenciado viria a publicar, em 1906 e 1907, 11 artigos n’ O Instituto. António dos Santos Viegas morreu em 1914, com 79 anos. Tinha conseguido lançar as bases de pesquisas que tratavam as descobertas mais recentes da Física. Por exemplo, em 1915, Souza Nazareth submeteu ao concurso de 2º Assistente da Faculdade de Ciências (que sucedeu em 1911 à de Philosophia) a tese Ionisação dos gases em vaso fechado e, segundo Mário Silva, o seu antigo professor esteve muito próximo de descobrir o neutrão...

Décio Ruivo Martins

OS CARETOS DE PODENCE


Como é Carnaval, mostramos os Caretos, uma tradição carnavalesca muito antiga da aldeia de Podence, Macedo de Cavaleiros, Trás-os-Montes. O sítio oficial é aqui.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Português ou Língua Portuguesa?

Como é sabido, a última reestruturação do Ensino Básico data de 2001. No Decreto-Lei 6/2001, de 18 de Janeiro, e no Currículo Nacional do Ensino Básico (2001), consta uma área curricular disciplinar designada por Língua Portuguesa. Ora, na proposta de novos programas para esta área, que têm estado em consulta pública, a designação passa a ser Português, como acontece, aliás para o Ensino Secundário. Mas se consultarmos o Portal do Governo ficamos na dúvida se assim é. Lá podemos ler:

Programas de Português do Ensino Básico
O projecto de Programas de Língua Portuguesa para o Ensino Básico...

Não fará diferença usar uma ou outra designação!? Pode um programa ter uma designação diferente daquela que consta nos documentos legais que estabelecem o currículo e no próprio currículo!?

A actualidade do Darwinismo

O António Bracinha Vieira, um dos primeiros investigadores a procurar desenvolver o estudo das bases biológicas do comportamento entre nós, escreveu um belissimo texto de homenagem a Darwin para o Expresso. Publicamos no De Rerum Natura a versão integral, por gentileza do autor.

"No dia 24 de Novembro de 1859 foi lançada a primeira edição do livro de Charles Darwin A origem das espécies por selecção natural. Nele, Darwin formulava a teoria – chamada ‘darwinismo’ por Alfred Russel Wallace, que de modo independente também a descobrira – segundo a qual as espécies evoluem a partir de um antepassado comum por efeito da selecção exercida pelo ambiente favorecendo reprodutivamente os indivíduos melhor adaptados. Construíra esta teoria após longa e atenta reflexão, a partir de factos observados durante a sua viagem a bordo do Beagle. Grande parte da comunidade científica reconheceu desde logo os fundamentos sólidos do darwinismo e Darwin obteve a consagração em vida.


Hoje, os que se opõem à teoria da evolução não se baseiam em fundamentos científicos mas em preconceitos. O que mais fortifica a teoria selectiva é a sucessiva refutação de todas as teorias competidoras: mesmo os trabalhos de ilustres investigadores anti-evolucionistas (Pasteur, von Baer, von Uexküll, T.H. Morgan, entre outros) acabaram por lhe trazer firmes e renovados argumentos. Mas a posição do Homem na natureza sempre provocou um campo de forças deformante da realidade, propício a manipulações ideológicas e religiosas da ciência, suscitando assaltos premeditados à lógica da investigação e da interpretação dos dados. O sistema de crenças interfere então com o de provas, espalhando uma atmosfera de obscuridade. Na última página da Origem das espécies, Darwin escrevera: «Muita luz será lançada sobre a origem do Homem e a sua história». Esta frase foi suprimida na primeira edição alemã da obra!

Decorrido um século e meio sobre o aparecimento deste livro, o preconceito continua a guiar os que recusam a evolução. Posto que os argumentos inúmeros e convergentes que a comprovam lhe conferem o mesmo grau de credibilidade que à órbita heliocêntrica da Terra, só por ignorância ou má fé é possível hoje rejeitá-la. A evolução não é mais uma simples teoria, mas um imenso programa de investigação que unifica todas as disciplinas da biologia e ciências da natureza: geologia, tectónica de placas, paleoclimatologia, biogeografia, genética, sistemática, anatomia e fisiologia comparadas, embriologia, paleontologia, etologia, biologia molecular, recebem da perspectiva evolucionista justificação mútua dos seus saberes. Estas disciplinas, que tinham crescido em separado, encontraram na teoria sintética da evolução (assim chamada pelo seu poder integrador dos conhecimentos) um eixo organizador que as reuniu, como aos ramos de uma árvore, numa totalidade coerente. Desde Darwin, não houve em biologia nem ruptura nem crise científica (no sentido do célebre filósofo da ciência Thomas Kuhn), antes clarificação de uma imensa constelação de fenómenos através da mesma matriz disciplinar.

Supusera Leibniz que a manus emmendatrix (a mão providencial) de Deus resolvia os erros que surgissem na construção do mundo. Oposta é a natureza do processo evolutivo: a partir de erros de replicação genética chamados mutações aumenta a diversidade sobre a qual vai operar a selecção natural. O processo evolutivo joga-se em dois tempos: a recombinação genética, aleatória; e a triagem dos organismos (fenótipos) resultantes. A estes dois lances encadeados chamou Jacques Monod «o acaso e a necessidade». Do seu resultado, obtido em interacção com o meio, provêm os indivíduos, sempre diferentes, de cada espécie. A teoria sintética da evolução, proposta em 1942 por Julian Huxley, a que se seguiram os contributos de Mayr e Dobzhanski, incorporou a genética no processo evolutivo e clarificou vastos domínios de todas as ciências geográfico-naturais. Decerto que alguns importantes fenómenos permanecem em parte inexplicados (mas não inexplicáveis) pelo darwinismo e aguardam futura investigação: essa é a condição da ciência.


A biologia molecular, última das disciplinas biológicas a entrar em cena, completou a demonstração da homologia (origem a partir de um antepassado comum) de todos os seres vivos. Desde as formas mais elementares às mais complexas, todas têm um código genético nos mesmos moldes do dos vertebrados, provando a unidade da frondosa árvore dos seres viventes. A engenharia genética permitiu passar genes de uns organismos para outros, p. ex. genes humanos para bactérias de modo a que produzam insulina humana. E os níveis de homologia (incluindo os cérebros) de todos os vertebrados, mamíferos e, mais intimamente ainda, primatas, levam a que se ensaiem com eficácia os medicamentos destinados a seres humanos – incluindo os psicofármacos – em ratos e chimpanzés (hoje felizmente protegidos por legislação da UE), provando-se o que é óbvio: no primeiro caso, a estrutura semelhante e permutável dos genomas entre espécies tão distantes como homens e bactérias; no segundo, a semelhança biológica profunda entre os mamíferos.

No limite, é possível obter embriões híbridos, por exemplo humanos e não-humanos. Como, sendo assim, excluir uma comum matriz de origem? Encontramo-nos inseridos na radiação da vida, sendo parentes mais ou menos próximos de todos os seres vivos, actuais ou extintos. A nossa presença na biosfera é casual e recente, puro acidente decorrendo do ‘oportunismo insensível da evolução’ de que falava Dobzhanski. O ‘relógio molecular’, hoje minuciosamente calibrado, mostrou que a origem de Homo sapiens ascende a cerca de 200.000 anos, tempo breve em termos de idade geológica. Por isso, a espécie humana actual (porque houve outras que a precederam, hoje extintas) mantém grande homogeneidade genética, não tendo decorrido tempo suficiente para a formação de raças humanas, conceito hoje destituído de valor operacional em ciência (apesar das variações exteriores de aspecto fenotípico). Não temos o monopólio da inteligência, do uso intencional de ferramentas, nem sequer da linguagem.

O desenvolvimento embrionário, provou August Weismann, repete em traços gerais a história natural dos antepassados. Assim se retêm traços e características que perderam função mas, não sendo contra-adaptativos, persistem. É o caso da cauda, funcional em muitos primatas não-humanos e ausente nos antropóides, genética e evolutivamente muito afins conosco. Estes animais (gibões, siamang, orangotangos, gorila, chimpanzés, bonobo) e o Homem não têm cauda livre: mas as vértebras caudais fundiram-se num órgão residual, o cóccix, onde a configuração vertebral é bem visível. Pertence à categoria dos órgãos vestigiais que, persistindo por inércia filogenética, revelam estruturas do passado evolutivo. De longe em longe nascem mesmo crianças com cauda livre, rara e interessante anomalia reversiva que uma redundância genética actualiza. Também o núcleo inato do comportamento, que evolui por selecção natural, conserva traços arcaicos: um recém-nascido humano prematuro agarra-se firmemente com mãos e pés a um fio horizontal do qual pode suspender o peso do próprio corpo, num reflexo de preensão provindo de antepassados arborícolas.

Críticos mal avisados afirmaram não ser possível presenciar a selecção natural em acção. Enganam-se. Não poderão ver o que decorre nos tempos geológicos (como não verão o movimento dos ponteiros dos minutos e horas nos relógios, sem duvidarem de que se movem). Mas podem testemunhar, no tempo das suas vidas, efeitos selectivos. No caso da malária, grave doença humana, o vector (mosquito) transporta o agente (plasmódio) ao hospedeiro (Homem). Em cada um dos três vértices deste triângulo se exerce a selecção. Os plasmódios seleccionam sucessivamente estirpes resistentes aos novos anti-maláricos descobertos; os mosquitos seleccionam estirpes imunes a renovados insecticidas; e as populações humanas nas áreas endémicas seleccionam e fixam formas de hemoglobina (como a hemoglobina s, regida por um só par de alelos) que o plasmódio não digere e por isso protegem da doença. A área de distribuição da hemoglobina s coincide rigorosamente com a faixa de repartição da malária em África, na Ásia, Insulíndia e Américas Central e do Sul. Mas, sendo a heterozigose adaptativa nestas regiões, a homozigose comporta riscos, e nos EUA, país ao qual os descendentes de escravos negros levaram os genes mutantes, a percentagem destes reduz-se a cada geração, por não haver já malária e os custos da hemoglobina s serem ali superiores aos benefícios.

Enquanto os detractores religiosos do pensamento evolucionista tentam denegá-lo, voltando ao que parece inconcebível – um cenário criacionista para os seres vivos! – no domínio das ‘ideologias progressistas’ permanece uma nostalgia das ideias de Lamarck, de uma evolução orientada tendo o Homem por alvo e objectivo final e pressupondo a hereditariedade de traços adquiridos. Assim, através de endoutrinação as ‘vanguardas revolucionárias’ imprimiriam o seu cunho a um ‘processo histórico’, mudando a sociedade em poucas gerações e conduzindo-a a um destino optimista. Por seu lado, correntes cristãs de obediência papal tentam reabilitar modelos evolutivos vitalistas e finalistas, como o do jesuíta Teilhard de Chardin. Num hemiciclo imaginário onde as convicções ideológicas fossem cotejadas com as ideias sobre a origem das espécies, a extrema direita seria hoje ocupada por cristãos fundamentalistas de convicção fixista e neocriacionista, por um grupo menos radical de orientação vitalista, e também por alguns evolucionistas ateus, eventualmente racistas, defendendo um determinismo genético da evolução; enquanto a chamada ala esquerda se repartiria entre evolucionistas variacionais sem crença religiosa (darwinistas) e evolucionistas transformacionais (neo-lamarckistas) ligados ainda ao marxismo histórico.

Ideólogos e fanáticos religiosos procuram na natureza caução para os seus dogmas: por isso censuram, deformam ou manipulam a teoria da evolução. Num momento em que o preconceito se eleva como uma tempestade e uma vaga de irracionalidade desaba a contagiar a multidão, justifica-se um comentário sobre o alcance da obra de Darwin e suas consequências. Se nalguns países o ensino do darwinismo fosse nivelado com o de modelos obscurantistas (fixistas, neo-creacionistas, vitalistas), então a História seria uma aventura falhada, negando as ideias que lhe serviram de fundamento. E Homo sapiens, assim denominado por Carl von Linné (que ao arrumá-lo junto com os outros antropóides já acedia à ideia implícita de evolução), antes mereceria o nome específico de Homo stupidus (espécie conjectural proposta e assim denominada por Ernst Haeckel, poucos anos após o aparecimento da Origem das espécies).

Porque evoluem as formas vivas? Porque a Terra não é estática: o meio-ambiente está em modificação contínua – deriva continental, clima, solos, vegetação, recursos alimentares, predadores e presas, parasitas e simbiontes – e, sem evolução, a breve prazo os elementos de cada população de cada espécie estariam inadaptados. Assim, encontramos Darwin como a figura decisiva que divide a história da biologia em duas épocas e em duas vertentes, uma de sombra e outra de luz. Ernst Mayr, grande teórico da evolução, escreveu recentemente: «Os argumentos [contra o darwinismo] baseiam-se numa tal ignorância da biologia evolucionista que não vale sequer a pena referir os escritos que os contêm. (...) Os princípios básicos do darwinismo estão mais firmemente estabelecidos do que nunca.» Eis como a biologia, após a síntese evolucionista – e ao contrário da física, dividida ainda entre as teorias da relatividade geral e da mecânica quântica – se tornou numa ciência exemplar, integrada em torno de uma teoria central unificadora capaz de dirigir e aprofundar a investigação em todas as frentes. "

Como se deve responder a um criacionista

Nicholas Gotelli, da Universidade de Vermont, foi convidado para um debate por David Klinghoffer, um dos apóstolos do Discovery Institute. Vale a pena ler na íntegra a resposta simplesmente brilhante de Gotelli mas deixo alguns excertos relevantes:

Your invitation is quite surprising, given the sneering coverage of my recent newspaper editorial that you yourself posted on the Discovery Institute's website.

However, this kind of two-faced dishonesty is what the scientific community has come to expect from the creationists.

Academic debate on controversial topics is fine, but those topics need to have a basis in reality. I would not invite a creationist to a debate on campus for the same reason that I would not invite an alchemist, a flat-earther, an astrologer, a psychic, or a Holocaust revisionist. These ideas have no scientific support, and that is why they have all been discarded by credible scholars. Creationism is in the same category.

Instead of spending time on public debates, why aren't members of your institute publishing their ideas in prominent peer-reviewed journals such as Science, Nature, or the Proceedings of the National Academy of Sciences? If you want to be taken seriously by scientists and scholars, this is where you need to publish. Academic publishing is an intellectual free market, where ideas that have credible empirical support are carefully and thoroughly explored. Nothing could possibly be more exciting and electrifying to biology than scientific disproof of evolutionary theory or scientific proof of the existence of a god. That would be Nobel Prize winning work, and it would be eagerly published by any of the prominent mainstream journals. (...)

So, I hope you understand why I am declining your offer. I will wait patiently to read about the work of creationists in the pages of Nature and Science. But until it appears there, it isn't science and doesn't merit an invitation.

Ciência em referendo?

Um grupo de uma igreja do estado de Washington, liderado por uma jovem de 25 anos, está a reunir assinaturas para levar a referendo a proposta 1040 que «is about requiring our government to do its job, to protect our liberty, a liberty which has been endowed by our Creator, the one responsible for Blessing us, the Supreme Ruler of the Universe».

Mais concretamente a dita proposta pretende proibir a utilização de dinheiros ou terras públicos para alguém ou algo, em particular manuais escolares, ensino, ciência ou investigação científica, que negue a existência de um entre supremo. Kim Struiksma, a proponente, pretende com a medida, entre outras coisas, que deixe de ser ensinada nas escolas públicas a evolução que ameaça a sua fé baptista (texto completo da proposta 1040 em formato pdf:

Respecting no establishment of religion, yet with respect to the Supreme Ruler of the Universe, whose existence has been declared in the preamble to the Constitution of the state of Washington, the state shall make no appropriation for nor apply any public moneys or property in support of anything, specifically including, but not limited to, any display, exercise, instruction, textbook, scientific endeavor, circulated document, or research project which denies or attempts to refute the existence of the Supreme Ruler of the Universe.

A proposta define ainda o que sejam os tais «scientific endeavors», «any act, idea, theory, intervention, conference, organization, or individual having to do with science». Ou seja, pretende-se não só que sejam despedidos todos os cientistas que sejam ateus como banir financiamento público de toda a ciência «ateísta». Ou antes, de toda a ciência - que simplesmente considera desnecessários deuses e entes supremos -, se pensarmos nas críticas que mereceu o programa 60 minutos da CBS de 8 de Fevereiro, em que Katie Couric entrevistou o comandante Sully e a sua tripulação, por nenhum dos intervenientes sequer ter mencionado deuses muito menos ter explicado que se deve a Deus a fantástica amaragem que fizeram no rio Hudson.

Claro que a proposta só irá a votos se recolher até Julho as necessárias 241 153 assinaturas e podemos apenas esperar que não passe de mais uma tentativa tola de vitimização ou para carpir «perseguição» caso a proposta seja reconhecida como anti-constitucional ...

sábado, 21 de fevereiro de 2009

A INFINIDADE SEGUNDO EDGAR ALLAN POE


"Comecemos, então, com a mais simples das palavras: "infinidade". Esta, tal como "Deus", "espírito" e algumas outras expressões cujo equivalente existe em todas as línguas, não é de modo nenhum a expressão de uma ideia, mas do esforço de propor uma. Serve como uma possível tentativa de uma concepção impossível. O homem precisava de um termo com o qual indicasse a direcção desse esforço - a nuvem por detrás da qual se encontra, para sempre invisível, o objecto desta tentativa. Em suma, exigia-se uma palavra por meio da qual um ser humano pudesse relacionar-se de imediato com um outro ser humano e com uma certa tendência do intelecto humano. Desta exigência surgiu a palavra "infinidade" que não é senão a representação do pensamento de um pensamento."

- Edgar Allan Poe, Eureka, Coisas de Ler, Queluz, 2004, tradução de Jorge Pinheiro.

A Física em Coimbra no século XIX - 1


Post convidado do historiador de ciência Décio Ruivo Martins (na foto galvanómetro de Thomson, adquirido em 1858):

Entre 1808 e 1810 a invasão pelas tropas napoleónicas criou uma grande instabilidade na vida académica coimbrã. Vários estudantes e professores da Universidade de Coimbra ajudaram na defesa da cidade e da região. O Laboratório Químico desempenhou um papel essencial na resistência ao ser transformado numa fábrica munições. O seu director, Thomé Rodrigues Sobral (alcunhado pelos franceses como o "mestre pólvora") distinguiu-se na luta contra os exércitos de Junot e de de Massena. Sob a sua orientação, boa quantidade de pólvora e munições para a artilharia portuguesa foram fabricados no local onde hoje é o Museu da Ciência (um enorme almofariz de pedra usado nessa tarefa encontra-se em exposição no átrio). A casa de Sobral foi incendiada pelos soldados de Massena em retaliação. Vários instrumentos do Observatório Astronómico e do Gabinete de Física foram confiscados por Junot nunca tendo regressado. Após a ocupação francesa, a Guerra Civil (1828-1834) condicionou também o funcionamento da Universidade. Em parte devido a essas guerras, a ciência e o ensino em Portugal atrasaram-se em relação aos outros países europeus.

Contudo, na segunda metade do século XIX, foi reconhecida a necessidade de criar condições para que a Universidade pudesse acompanhar a evolução das ciências experimentais observada nos centros mais avançado. Os professores da Faculdade de Filosofia argumentaram que, quando as nações civilizadas davam a maior importância à ciências experimentais e quando se verificava um progresso tecnológico sem precedentes, a Universidade de Coimbra não podia ficar de fora. Assim, no final da década de 1850, começaram a dar-se passos para a criação nessa Faculdade de um centro dedicado ao geomagnetismo. Foram os professores de Física Jacinto António de Sousa e António dos Santos Viegas que mais se empenharam neste projecto. Em 1840, a Royal Society de Londres tinha incentivado a Academia das Ciências de Lisboa para que em Portugal fossem realizadas observações geomagnéticas tal como eram feitas na rede britânica. No Verão de 1857, após uma visita do astrónomo e físico germano-escocês Johann von Lamont, Portugal aderiu à Göttingen Magnetischer Verein, estabelecida em 1834-1836 por Gauss e Weber. A Universidade já tinha tradição de observações geomagnéticas pois que, desde o início do século XIX, eram, no Gabinete de Física, feitos registos de declinação e inclinação do campo magnético terrestre. As medições meteorológicas eram também feitas regularmente três vezes por dia, desde 1845, tendo os resultados sido publicados na revista O Instituto, iniciada em Coimbra desde 1852. Com o objectivo de criar um Observatório Meteorológico e Magnético (hoje o Instituto Geofísico) segundo os padrões internacionais, os professores de Física estabeleceram na década de 1860 contactos no estrangeiro para se familiarizarem com as mais recentes técnicas experimentais nessa área. Alguns professores visitaram os melhores observatórios geomagnéticos da Europa, tendo obtido a colaboração de eminentes cientistas como Jacques Adolphe Quetelet (fundador do Observatório Real da Bélgica), Edward Sabine (um dos promotores da Magnetic Crusade, exortando o governo britânico para criar observatórios magnéticos em todo o seu vasto império), e Balfour Stewart (director do Observatório de Kew). Para equipar o observatório de Coimbra foram seguidas as recomendações de uma das obras de referência da época: Magnetic Instructions for the use of Portable Instruments…; with forms for the registry of magnetic and meteorological observations, de Charles Riddell. Alguns dados do Observatório de Coimbra foram publicados nos Proceedings of the Royal Society em 1867 e em 1870.

Ao longo da segunda metade do século XIX, foram estabelecidos vários contactos internacionais por Santos Viegas, que durante mais de 50 anos se dedicou ao Gabinete de Física. Em 1876 participou nas conferências científicas realizadas no South Kensington Museum, em Londres, onde visitou a exposição de instrumentos científicos. Este museu continha muitas das peças que hoje estão no Museu da Ciência de Londres. Viegas foi o representante nacional na Conferência Internacional e Exposição de Electricidade que teve lugar em Paris, em 1881, reunindo cerca de 250 delegados de 28 países. Nesaa época, os cientistas e telegrafistas reconheciam a necessidade de fixar unidades de grandezas eléctricas e definir padrões de medida aceites internacionalmente, a fim de que todas as medidas fossem comparáveis. A Sociedade de Engenheiros Telégrafos tinha sido fundada em Maio de 1871, numa reunião realizada em Londres e Charles William Siemens tinha sido convidado para seu primeiro presidente. De acordo com Alexander Trotter, o termo "engenharia eléctrica" começou a ser usado na exposição de Paris. Em 1887 a Sociedade de Engenheiros Telégrafos passou a chamar-se Instituto de Engenheiros Eléctricos (hoje é conhecida como Instituto de Engenharia e Tecnologia).

Durante a sua estada em Paris, Viegas recebeu do governo francês a Legião de Honra. Em 1883 foi um dos fundadores da Sociedade Internacional de Electricistas, sedeada em Paris, que depois passou a designar-se Sociedade Francesa dos Electricistas. No mesmo ano Viegas foi membro da Comissão Científica da Conferência e Feira Internacional de Engenharia Eléctrica, realizada em Viena, cujo conselho foi presidido pelo famoso físico Jožef Stefan, director do Instituto de Física de Viena. Stefan orientou o doutoramento de outro grande físico: Ludwig Boltzmann. Ambos se tornaram célebres pelos seus estudos sobre a radiação do corpo negro e pela lei de Stefan-Boltzmann. Nas suas visitas a França, Bélgica, Grã-Bretanha, Alemanha, Áustria, Itália, etc, Santos Viegas conheceu e trabalhou com muitos cientistas de renome, como William Thomson (Lord Kelvin), Helmholtz e Kirchhoff. No Conservatoire des Arts et Métiers, de Paris, conheceu Alexandre Becquerel, pai de Henri Becquerel, o descobridor da radioactividade. Nos últimos anos da sua vida, Santos Viegas lançou uma nova área de estudos – a sismologia – tendo-se tornado membro da Sociedade Sismológica Italiana. Em Abril de 1903 instalou um pêndulo horizontal Milne no Observatório Meteorológico e Magnético de Coimbra. O seu último projecto científico consistiu na montagem de um sismógrafo Wiechert, que deixou inacabado.

O programa de ensino da Física Experimental da Universidade de Coimbra foi evoluindo ao longo do século XIX, revelando semelhanças com os das melhores escolas francesas, principalmente a Escola Politécnica. Sob a supervisão dos Santos Viegas a colecção de instrumentos do Gabinete de Física foi sendo actualizada. Existem hoje muitos instrumentos feitos por Duboscq e Pellín, Breguet, Bianchi, Koenig, Ruhmkorff, Muller-Unkel, Geissler, Siemens & Halske, etc., que muito enriquecem o património do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra.

Décio Ruivo Martins

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

O português e as ciências da educação

Na polémica sobre a língua portuguesa entre João Boavida e Desidério Murcho, chamo a atenção para o facto de a motivação do primeiro parecer residir simplesmente na sua discordância da classificação atribuída por um comité internacional de avaliadores nomeados pela Fundação para a Ciência e Tecnologia a alguns centros de investigação em ciências de educação.

Eu não trabalho nessa área e por essa e por outras razões não me pronuncio sobre os pareceres do dito comité. Mas parece-me que a promoção activa da internacionalização da actividade científica portuguesa em todas as áreas, incluindo as ciências da educação, é extremamente salutar. Posso criticar e tenho criticado o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior em muitas coisas (ainda recentemente me pronunciei contra o estrangulamento financeiro das universidades que conduziu, por exemplo, ao incrível pingar de água na sala de leitura da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, sem haver meios de poder fazer uma remodelação decente do velho edifício), mas não o critico por isso. Julgo que a comunidade das ciências da educação portuguesa, uma área pela qual me tenho interessado, publica numa proporção demasiadamente elevada em português, o que configura uma situação de endogamia que se me afigura contraprudecente e a prazo insustentável. E é tanto mais insustentável quanto as grandes questões do ensino da maior parte das matérias são essencialmente as mesmas em qualquer parte do mundo, estando escrita em inglês a maior parte da literatura sobre elas. Quando se trabalha em circuito fechado e quase exclusivamente se publica em revistas próprias ou do vizinho do lado, numa língua que a comunidade científica internacional não entende, corre-se maior risco de repetir o que outrem já disse e de errar sem se poder ser emendado.

Receio até que num país pequeno e com uma comunidade científica pequena em certas áreas, algumas ideias resistam mais facilmente à crítica dos pares do que num ambiente internacional, naturalmente mais aberto e competitivo. Só para dar um exemplo: têm sido recentemente publicadas em revistas internacionais de psicologia e de ciências de educação várias críticas bem fundamentadas, baseadas em estudos empíricos, ao chamado ensino não directivo (há quem lhe chame aprendizagem por descoberta). Mas raramente encontro em revistas portuguesas de pedagogia, pelo menos nas que costumo ver, críticas a tais doutrinas, doutrinas essas que encontram ampla consagração em textos oficiais do nosso Ministério da Educação e que não serão alheias aos pobres resultados obtidos pelos nossos alunos em confrontos internacionais. Fico com a ideia, porventura injusta, que, se quiser saber o que hoje em dia se passa de mais avançado em ciências de educação, tenho mesmo de me valer dos meus conhecimentos de inglês.

Portanto, eu que muito prezo a minha língua-mãe, que é de resto a única onde me consigo exprimir sem dar muitos erros, e que leio regularmente com bastante gosto as boas prosas que o meu colega João Boavida escreve nessa língua, penso que a comunidade nacional de ciências de educação e afinal todos nós ganharíamos se se passasse a publicar mais em revistas e livros da especialidade que sejam lidos à escala internacional. E se se procurasse publicar mais em revistas e livros de circulação global com avaliadores com maior grau de exigência. Não tenho nada contra que se publique em revistas e livros nacionais, mas porque não tentar que todos ou a maioria dos artigos nessas publicações sejam escritos numa língua franca, neste caso o inglês? Mesmo que as revistas e os livros sejam editadas aqui, a afixação dos respectivos conteúdos na Internet facilitaria a livre circulação pelo mundo e, evidentemente, aumentaria a probabilidade de crítica. Eu posso escrever artigos de ensino e divulgação de física em português, mas não ganharia nada, absolutamente nada, em escrever artigos científicos de física em português. Tenho hoje de o fazer em inglês e não me queixo. Sim, percebo que nas ciências humanas, em particular nalgumas ciências humanas, seja um bocadinho diferente. Mas porque é que há-de ser assim tão diferente?

A menos que se pense que certos conteúdos científicos só fazem sentido em certas línguas, um argumento que me parece carecer de demonstração. O físico austríaco Erwin Schroedinger, um dos criadores da teoria quântica, queixou-se um dia amargamente de um aluno estrangeiro de doutoramento que ele orientava: "Como é que ele vai aprender mecânica quântica se nem sequer sabe alemão?". A origem germânica da teoria quântica ainda hoje transparece em termos como "eigenvalues", valores próprios, que pertencem ao jargão técnico em inglês - o prefixo "eigen" é alemão e não inglês. Mas, de facto, pode-se aprender teoria quântica em qualquer língua culta, para adoptar a expressão do Desidério (ao contrário dele, acho que o português é uma língua culta, embora possa e deva ser mais cultivada). Contudo, se se quiser aplicar essa teoria de um modo que possa ser verificado e eventualmente refutado, ou se se quiser rebater essa teoria propondo uma outra em sua substituição, tem de se escrever hoje em inglês tal como no tempo de Schroedinger se tinha de escrever em alemão...

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...