segunda-feira, 30 de setembro de 2013

AUDIÇÃO DE MIGUEL SEABRA NA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

No passado dia 17 de Setembro, Miguel Seabra, actual presidente da Fundação para a Ciência e Tecnologia, foi ouvido na Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura, a propósito do financiamento da ciência e do concurso de bolsas individuais que recentemente encerrou. 

A audição, a pedido do grupo parlamentar do PCP, ocorreu na sequência de uma iniciativa da Associação de Bolseiros de Investigação Científica, uma petição que reuniu mais de 4000 assinaturas, pela resolução de vários problemas do concurso de bolsas individuais deste ano. Entre outros assuntos, como o atraso no concurso de bolsas, os painéis de avaliação e o financiamento da ciência em Portugal, foi abordada a questão da extinção da área de promoção e administração da ciência e tecnologia.

É uma longa audição, com intervenções dos deputados de todos os grupos parlamentares (à excepção dos Verdes, que não estão representados nesta comissão), mas penso que é esclarecedora. Fica aqui o registo áudio

domingo, 29 de setembro de 2013

Grandes conflitos da história da Europa

Um pouco por todo o mundo, os sistemas educativos, preocupados em demonstrar a sua eficácia em programas de avaliação internacional, reforçam progressivamente o ensino de disciplinas que dizem ser fundamentais, estruturantes, tendendo a relegar para segundo plano as áreas de saber que não são objecto dessa a avaliação.

A História está entre estas últimas. Sem relação directa com as preocupações sócio-económicas dominantes, sem parecer contribuir para a aquisição de competências úteis, como sejam, por exemplo, as de empreendedorismo, vê reduzir-se a sua importância educativa, bem patente na restrição de conteúdo e de tempo curricular.

João Gouveia Monteiro, professor da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, consciente desta circunstância, explica, em entrevista, o papel que o saber histórico tem na compreensão do presente e na construção do futuro:


Conforme o leitor percebeu, esta entrevista foi feita, no passado ano, na sequência da apresentação da obra: "Grandes Conflitos da História da Europa, de Alexandre Magno a Guilherme, O Conquistador", editada pela Imprensa da Universidade de Coimbra.

Trata-se de uma "obra que nos propõe uma viagem por cinco momentos decisivos da história do Velho Continente, ao longo de catorze séculos. A batalha de Gaugamela, travada entre Alexandre Magno (o mais brilhante general do Ocidente antigo) e Dario III (“Grande Rei” da Pérsia), em 331 a. C. A batalha de Canas, a mais pesada derrota da história do Império Romano, ferida em 216 a. C., no sul de Itália, no âmbito da guerra pelo domínio do Mediterrâneo que opunha Roma a Cartago (liderada pelo lendário comandante Aníbal Barca). A batalha de Adrianopla, que teve lugar na atual Turquia, em 378 d. C., entre o imperador romano do Oriente e uma coligação de povos bárbaros, anunciando o inevitável advento de uma nova Europa. A batalha de Poitiers, ocorrida na Gália, em 732 d. C., e em que Carlos Martel (avô de Carlos Magno) venceu o exército do governador árabe do al-Andalus e frustrou as ambições muçulmanas de domínio da Gália. E a batalha de Hastings, travada em 1066, no sul de Inglaterra, o combate mais espetacular da Idade Média e em que o duque da Normandia, Guilherme, matou o rei anglo-saxónico, Haroldo II Godwinson, provocando uma viragem no destino das duas maiores potências europeias de então. Trata-se de um livro cuidadosamente ilustrado, que se dirige a um público muito amplo e onde a história política e a história militar se iluminam mutuamente. A obra, evocativa de grandes figuras da história antiga e medieval europeias, é sustentada por uma leitura cuidadosa das melhores fontes escritas e iconográficas à disposição do historiador (como Arriano, Políbio, Marcelino, a Crónica de 754, Guilherme de Poitiers ou a fabulosa Tapeçaria de Bayeux, entre outras)."

sábado, 28 de setembro de 2013

"O amor incerto"

O "pacote" de canais de televisão que agora tenho dá-me acesso a programas inacreditáveis, verdadeiramente inacreditáveis.

Um deles é sobre concursos de beleza de meninas. Meninas muito pequenas, com quatro, cinco, seis anos... As suas mães, em geral, enormes, enraivecidas, apostam nas suas crianças, como quem aposta em cavalos, cães, ou galos... Admitem injectar-lhe botox, obrigá-la a dietas, manipulam-nas descaradamente, gritam umas com a outras, dão murros e pontapés onde calha, insultam o júri. Danadas por ganharem o prémio sujeitam as filhas a tudo. As filhas, pequeninas, procuram acolhimentos nos braços que as enxotam, algumas choram, outras reproduzem as palavras das mães.

Não é preciso ser-se especialmente sensível para se perceber que o instinto maternal é uma ficção e o amor de mãe é mais do que incerto. O espectáculo dá plena razão a Elisabeth Badinter.

Chantal Jouannotem (LIONEL BONAVENTURE/AFP) (Fotografia retirada da citada edição do jornal Público) 
Isto passa-se nesta década, num país que tem ascendente sobre a maior parte dos países do mundo, e também se passa noutros incluindo os da civilizada Europa. Podia passar-se em Portugal. Se alguém trouxesse esse "formato" para uma estação lusa, não faltariam mães-concorrentes, estrelas-júris, espectadores-gulosos, especialistas-que não vêem problema algum, escolas-a reproduzirem o modelo (já aconteceu mas, tanto quanto sei, as crianças eram mais velhas).

Mas, haja esperança! Recentemente, Chantal Jouanno, ex-ministra e actual senadora, conseguiu que o Senado de França se pronunciasse "a favor da interdição dos concursos de beleza para raparigas com menos de 16 anos". O resto da notícia pode ser lida aqui.

PEDRAS-TALHAS

Texto que nos foi enviado pelo Professor Galopim de Carvalho.

Pedras-Talhas, topónimo de raiz popular por que era conhecido o Cromleque dos Almendres.
Com mais três anos do que eu, o Henrique Leonor Pina, aos dezassete anos, quando o conheci, a meados dos anos 40, era um jovem adulto, pleno de entusiasmo e energia, nos seus oitenta a noventa quilos de ossos e músculos. Meu condiscípulo no Liceu Nacional André de Gouveia, em Évora, viera de Montemor para continuar os estudos no antigo 6.º ano (actual 10.º), entrara eu no 4.º. Nesse tempo, o Latim, associado à disciplina de Português, tinha lugar de relevo no ensino ao longo de três anos lectivos, entre os 4.º e 6.º anos.

Foi no começo das aulas, em Outubro, que nos conhecemos e tornámo-nos amigos. Fazíamos o mesmo percurso, por São Mamede e Buraco dos Colegiais, a caminho do liceu, ele vindo das Portas de Alconchel, eu dos arredores da Porta Nova. Nos meus verdes anos de adolescente, eu ainda mantinha o ar de rapaz miúdo ao lado de um adulto que já fazia a barba. Nesse contraste, ele via-me como aquilo mesmo que eu era e eu olhava-o como um crescido capaz de me ensinar coisas e dar protecção. Foi nesta medida que, numa das caminhadas matinais em demanda das aulas, ele, já então detentor de uma cultura invulgar num jovem da sua idade, muito bom aluno em todas as disciplinas, sabedor de tudo e mais alguma coisa, me perguntou:
- E o latim? Estás a gostar?
- Sinceramente, não. – Respondi, meio envergonhado – A professora é uma chata e as aulas são uma seca. A partir de então, os minutos da nossa caminhada conjunta passaram a ser as minhas verdadeiras e mais interessantes lições de latim.

Nas aulas, ocupadas com doses maciças de nominativo, acusativo, genitivo, dativo, ablativo e vocativo e um conjunto de textos incapazes de despertar o interesse dos alunos, a língua de Virgílio tornava-se intragável. Quase meio século depois, corria o ano de 1994, juntámo-nos de novo em Évora.

Eu estava ali como geólogo, orientando um grupo de alunos finalistas de Geologia, empenhados no trabalho de campo conducente à execução da folha n.º 40-A (Évora), da Carta Geológica de Portugal, na escala de 1:50 000, numa frutuosa colaboração da Faculdade de Ciências de Lisboa com os Serviços Geológicos de Portugal e a Junta Distrital de Évora.

O Henrique, como arqueólogo, dirigia um trabalho de escavação na Anta Grande do Zambujeiro, na vizinhança da herdade da Mitra (Valverde, freguesia de Nossa Senhora da Tourega), onde funcionava Escola de Regentes Agrícolas. Como amador que era, o Henrique fazia as suas campanhas arqueológicas por conta própria com o suporte da referida Junta Distrital, que assumia o pagamento das jornas da meia dúzia de homens e mulheres que, anos a fio, integraram o seu grupo de trabalho.

Trabalhadores rurais, inteligentes e hábeis no terreno, eram particularmente cuidadosos e interessados no trabalho, alegres e brejeiros no convívio, eles e elas, resistentes ao cansaço, ao sol e ao calor do estio. Num belo dia de Agosto, um pastor, homem de meia idade, conhecedor de tudo o que era terras em redor, passando por ali, esteve que tempos a observar o trabalho dos camaradas na dita escavação e, de vez em quando, a dar a sua opinião. Dirigindo-se ao Henrique, perguntou-lhe se já tinha visto as pedras do Alto das Pedra Talhas, na Serra de Monfurado, a poucos quilómetros dali, explicando que as ditas pedras tinham o tamanho e a forma ovóide dos grandes recipientes de barro em que, no Alentejo, se fermentava o mosto e guardava o vinho. Ofereceu-se para o conduzir até lá.

Monólito com gravuras
Particularmente sensível à perfeita e sugestiva descrição feita pelo pastor, o Pina aceitou, de imediato, a oferta e lá foram no dia seguinte, a caminho do então ainda desconhecido (para a ciência) recinto megalítico dos Almendres. Foi o deslumbramento! O sítio arqueológico que se guindou à condição de maior conjunto de menhires da Península Ibérica e um dos mais importantes da Europa, estava à vista de quem o quisesse ver, na freguesia de Nossa Senhora de Guadalupe, com fácil acesso a partir da estrada nacional de Évora para para Lisboa, ao km 10. Deste monumento restam 92 monólitos (desde pequenos blocos, pouco ou quase nada afeiçoados, a outros maiores lembrando as ditas talhas), num estado de conservação ainda muito bom, uns com pequenas covas centimétricas e outros decorados com gravuras.

Numa história recente, este local foi usado como pedreira de onde se retiraram e destruíram vários destes grandes blocos, todos eles de granito (de várias proveniências, alguns transportados de distâncias superiores a 2 km).

 Têm sido muitos e importantes os estudos realizados por diversos autores sobre esta relíquia neolítica, testemunho de várias idades, ao longo dos V e IV milénios antes de Cristo, aceitando-se hoje que “formaram dois recintos erguidos em épocas distintas, geminados e orientados segundo as direcções equinociais”.
Cromleque dos Almendres. Vista aérea dos dois conjuntos geminados
No dia seguinte, o Henrique levou-me a admirar este magnífico património que pôs o Alentejo e Portugal na rota de especialistas e de cidadãos interessados neste domínio do saber. Vi no pormenor e ouvi as primeiras explicações de um estudioso que, sendo amador, ficou na história ligado à descoberta de um dos mais importantes achados arqueológicos de Portugal.

A.Galopim de Carvalho

Novidades da "Classica Digitalia"

Informação chegada ao De Rerum Natura



O Conselho Editorial dos Classica Digitalia tem o gosto de anunciar duas novas publicações, de parceria com a Imprensa da Universidade de Coimbra.

Todos os volumes dos Classica Digitalia são editados em formato tradicional de papel e também na biblioteca digital. O eBook correspondente (cujo endereço direto é dado nesta mensagem) encontra-se disponível em acesso livre. O preço indicado diz respeito ao volume impresso.

Série “Varia” (Estudos)
Francisco de Oliveira (Coord.), Europatria (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, Classica Digitalia, 2013) 538 p. (Capa - imagem acima)
PVP:  20 € / Estudantes:  16 €

Série “Classica Instrumenta” (Estudos)
Rui MoraisMiguel Bandeira & Eliana Manuel Pinho, Itineraria Sacra. Bracara Augusta fidelis et antica (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, Classica Digitalia, 2013) 132 p. (a cores). 
PVP:  20 € / Estudantes:  16 €

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

AUTÁRQUICAS 2013

As eleições autárquicas de 2013 vão ser, quer se queira quer não, eleições nacionais. Esse fenómeno vai ser particularmente notório nas grandes cidades como Lisboa, Porto e Coimbra, mas também o será em muitas terras pequenas. Colocado pertante a possibilidade de expressar nas urnas a sua profunda insatisfação, mostrando um cartão vermelho a um governo que, com uma ou outra honrosa excepção, se tem revelado bastante incompetente, o eleitorado não hesitará. Resta só ver a intensidade do vermelho que vai ser mostrado. 

Coimbra é um pouco o espelho do país, pelo que o efeito nacional se vai sentir localmente. E assim o "dinossauro" que o PS apresenta vai provavelmente voltar, decerto mais por demérito do governo do país do que por mérito próprio.

PRIMEIRAS EDIÇÕES DA BIBLIOTECA DE COIMBRA NO NO PÚBLICO


A CIÊNCIA E OS DESCOBRIMENTOS


Texto que acaba de sair entre no jornal "As Artes entre as Letras":

Os Descobrimentos não estiveram associados a actividade científica e pedagógica desenvolvida pela Universidade portuguesa, tendo antes resultado do desejo da expansão do comércio e da religião, para além, naturalmente, da curiosidade humana. No final do século xv, após a chegada de Bartolomeu Dias ao Cabo da Boa Esperança em 1488, de Vasco de Gama à Índia em 1498 e de Pedro Álvares Cabral ao Brasil em 1500, as grandes viagens lusas de descoberta tinham atingido o seu auge. O português Fernão de Magalhães ainda haveria de empreender a sua viagem de circum-navegação de 1519 a 1522 ao serviço da coroa espanhola. Os navegadores lusos serviram-se de desenvolvimentos empíricos aprendidos, muitas vezes, à sua própria custa, com a prática porfiada de navegação, e não de conhecimentos de base científica ensinados numa escola, média ou superior. A escola de Sagres, ligada ao nome do Infante D. Henrique, não passa de um mito, embora o Infante tenha tido um papel decisivo no início dos Descobrimentos,  na preparação das primeiras expedições a África. Além disso, contribuiu para a Universidade: doou casas suas na zona de Alfama, em Lisboa, hoje já destruídas, à Universidade de Coimbra quando esta ainda estava em Lisboa. A Biblioteca da Universidade ocupou essas instalações, uma vez que há testemunhos da sua existência em 1513. Mas, em contraste com o frenesim da vida lisboeta, onde as novidades vindas de fora se sucediam, a universidade portuguesa vivia nessa urbe, no início do século xvi, tempos de grande sonolência.

No entanto, os navegadores portugueses foram precursores da Ciência Moderna, ao desenvolverem o saber empírico a níveis nunca até então atingidos. Viram novos lugares, novas gentes e novas espécies, animais e vegetais. E deixaram abundantes relatos do que encontraram. O famoso rinoceronte desenhado pelo pintor alemão Albrecht Dürer em 1515 teve como modelo original um animal proveniente  da Índia  que o rei D. Manuel I quis oferecer ao Papa (o barco que o transportava naufragou ao largo da costa italiana).

O notável espírito científico dos portugueses da época é narrado em versos do poeta Luís de Camões. É ele quem diz, por exemplo, que o saber deve ser de experiência feito, tendo demonstrado no Canto X d’Os Lusíadas (1572) bons conhecimentos dos céus:

Olha por outras partes a pintura
Que as Estrelas fulgentes vão fazendo:
Olha a Carreta, atenta a Cinosura,
Andrómeda e seu pai, e o Drago horrendo;
Vê de Cassiopeia a fermosura
E do Orionte o gesto turbulento;
Olha o Cisne morrendo que suspira,
A Lebre e os Cães, a Nau e a doce Lira.”

O poeta não só conhecia bem os céus do hemisfério Norte como os do hemisfério Sul, que ele viu com os seus próprios olhos, já que esteve vários anos na Índia, onde conheceu e foi amigo de Garcia de Orta, e em Macau. A sua visão do mundo, patente no poema épico, era ptolomaica, o que não admira pois apenas tinham decorrido apenas escassos anos após a morte de Copérnico, que se deu no mesmo ano e dia da publicação do seu livro Revolução dos Orbes Celestes (24 de Maio de 1543). De resto, a obra de Copérnico haveria de permanecer ignorada durante muitos anos.  .

Camões exibiu também no mesmo poema épico vastos conhecimentos botânicos. É curioso que os primeiros versos seus a serem impressos tenham aparecido em intróito ao Colóquio dos Simples (1543) de Orta, num poema dedicado ao Conde de Redondo, Vice-Rei da Índia:

“Favorecei a antigua
Sciencia que já Achiles estimou;
 Olhai que vos obrigua,
 Verdes que em vosso tempo se mostrou
 O fruto daquella Orta onde florecem
 Prantas novas, que os doutos não conhecem.
 Olhai que em vossos annos
 Produze huma Orta insigne varias ervas
 Nos campos lusitanos,
 As quaes, aquellas doutas protervas
 Medea e Circe nunca conheceram.
Posto que as leis da Magica excederam.”

Chama-se Ciência Moderna, ou apenas Ciência, o método observacional e experimental, assim como os conhecimentos adquiridos com a sua ajuda, que foram surgindo ao lomgo do século xvi, e que haveriam de atingir pontos altos no século xvii com a descrição do mundo físico empreendida por Galileu e Newton. Galileu defendeu de um modo claro a posição central do Sol no sistema do mundo, contrariando a visão aristotélico-ptolomaica que tinha sido associada à doutrina cristã pelos grandes mestres medievais (basta reparar que Deus enchia todo o espaço para além da sétima esfera). O sábio italiano, apesar da sua condenação pela Inquisição, conseguiu impor ao mundo cristão as concepções de Copérnico.

Em Coimbra o Metro é apenas uma unidade SI...


Como apoiante e candidato numa lista pelo Movimento dos Cidadãos por Coimbra (CpC) não pretendo usar este espaço de divulgação de Ciência para fazer campanha, mas este video do CpC, além de muito engraçado, é de óbvio interesse para as pessoas de Coimbra.


quinta-feira, 26 de setembro de 2013

LUÍS PORTELA E O SEU LIVRO SOBRE "CIÊNCIA E ESPIRITUALIDADE"

O jornal I noticiou o debate na Ordem dos Médicos em Lisboa sobre o livro de Luís Portela "Ser Espiritual". Na sexta-feira, pelas 18h30, o autor estará em diálogo com o professor da Universidade de Coimbra Arsélio Pato de Carvalho na FNAC de Coimbra, com a moderação de Carlos Fiolhais.

NEI 2013 - "O FUTURO DA CIÊNCIA"


O RÓMULO  -  Centro  Ciência  Viva  da  Universidade  de  Coimbra, centro de recursos de divulgação e educação científica da rede Ciência Viva,  promoverá  um debate sobre cultura científica na Noite Europeia dos Investigadores -  NEI  2013,  em 27 de Setembro, sexta-feira, nas suas instalações, no rés-do-chão do Departamento de Física da Universidade de Coimbra, entre 21.15h e as 23h30. 
 
O objectivo deste debate informal, que tem como título "O futuro da ciência", é o de juntar autores, editores e tradutores de bons livros de divulgação científica, e leitores, de modo a discutir a aproximação da ciência com o público em geral. 

Questões a debater:

- Como os livros de ciência podem levar um jovem a um futuro científico?
- Como vejo o futuro da minha ciência?
- Como vejo o futuro da ciência em Portugal?
- E sem comunicação de ciência, poderá a ciência ter futuro? 

Contaremos com a presença dos convidados:
 
- Alexandra Nobre, Prof. de Ciências da Vida na Universidade do Minho, tradutora de
"A Espiral da Vida" (Gradiva).
- Antonio Machiavelo, Prof. de Matemática na Universidade do Porto, editor e "43
miniaturas matemáticas" (Gradiva). 
- Cláudia Cavadas – Prof. Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra.
- Teresa Pena, Prof de Física no IST, autora de "Einstein... Albert Einstein" (Gradiva)  e
Presidente da Sociedade Portuguesa de Física.

O Director do Centro, Carlos Fiolhais, moderará o debate.

A entrada é livre.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

O PADRE ALFREDO DINIS E A RELIGIOSIDADE PANTEÍSTA DE EINSTEIN

O recente falecimento do Padre Alfredo Dinis, aqui justamente homenageado no post publicado ontem pelo Professor Carlos Fiolhais, traz-me à lembrança o meu atrevimento  em entrar pelo domínio de assuntos teológicos e, principalmente, a humildade de um espírito superior em responder a um meu comentário insito no meu post “Então e a alma?” (07/05/2010).

Transcrevo o meu comentário e a resposta do Padre Alfredo Dinis pela lição que dela colhi em proveito próprio e dos (im)prováveis leitores desse meu post  Assim:   

"Meu Caro Alfredo Dinis:

Começo por lhe agradecer todos os seus comentários que lustraram o meu post, dando-lhe uma dimensão que inicialmente julguei não ter ou pretendi, sequer, que tivesse.

Felizmente, encontrei em si um espírito clarificador de pontos que a minha não formação teológica possa ter deixado (ou deixou mesmo) na penumbra da minha ignorância. Embora sabedor do risco que corro da desacreditação do intuito que presidiu à redacção do meu post, declaro, desde já, que não pretendi ir além da sandália ao contrário do sapateiro que depois de criticar a fivela de um quadro do famoso pintor da antiguidade grega, Apeles, quis ir mais além censurando aspectos pictóricos e, com isso, dando azo, à expressão latina: “Ne sutor ultra crepidam [judicaret].”

Mas o “leitmotiv” do meu post foi a impressão em mim deixada por uma criança (com formação religiosa católica?) perante o facto de a neurofisiologia das “coisas” do cérebro lhe terem criado o pânico da denegação da alma. Se verificar,meu Caro Alfredo Dinis, mesmo em adultos se confunde o pensamento (com base biológica na matéria) com a incorporaleidade da alma.


Quando se discute a relação entre Religião e Ciência, sei que se deve deixar de parte a posição da Igreja medieval ao defender a teoria heliocêntrica que tinha a Terra a orbitar o Sol, o falar das profundezas do inferno e das terríficas penas ao pecadores ou o planeta que pisamos como o único planeta do universo habitável por seres pensantes, o Homem. Homem que, como escreveu o filósofo Blaise Pascal, “ é apenas uma palha, a coisa mais fraca na Natureza, mas é uma palha ‘pensante’”.A esta apreciação acrescento, uma vez mais, a de um cientista, Henri Poincaré: “O Homem representa apenas um pálido clarão na tempestade da vida, mas esse clarão è tudo”.


E aqui registo a opinião de Ian Barbour, físico e teólogo, quando nos diz: “Há mais complexidade na mente humana do que em mil galáxias ou planetas sem vida”, pressupondo, como tal, na sua condição de teólogo moderno haver vida para além daquela que conhecemos. Aliás, Shakespeare, no Hamlet, o deixou expresso: "Há mais coisas nos céus e na terra, Horácio, do que sonha a tua filosofia".

Este um facto incontroverso. Sempre que se fala de Einstein vem à baila a sua discutível crença religiosa respaldada nas muitas afirmações que fez tendo Deus como “personagem”. Quando Abraham Pais, da Universidade Rockfeller, foi entrevistado por Russel Stannard, autor do livro “Ciência e Religião”, à pergunta se este cientista “acreditava em Deus, um Deus pessoal, ou se era apenas uma maneira pitoresca de se referia às leis da natureza”, respondeu:

- “Quando Eistein tinha cerca de seis anos passou por um intenso período de sentimentos religiosos, sentimentos religiosos convencionais. Não comia carne de porco, coisas do género [aliás proibidas pelo judaísmo]. Isto durou um ano, e depois desapareceu; ele não acreditava num Deus pessoal, num Deus que castiga ou recompensa.”

Insistiu Russel Stannard: - “Então que queria ele dizer ao usar a palavra ‘Deus’ numa fase posterior?”

Esclareceu o interrogado: -“Oh, apenas um conceito abstracto. Significava que a natureza se manifesta de formas extremamente regulares; que há leis da natureza. E que estas leis têm que ser descobertas e reveladas, Era nesse sentido que ele utilizava a palavra, nem mais, nem menos. A parte essa breve fase na sua infância, nunca foi um homem religioso em toda a sua vida”.

Mas bastará este testemunho para clarificar o pensamento “religioso” de Einstein? Por seu lado, a própria Igreja, com a sua fé inabalável vai abrindo os braços às conquistas da Ciência que os próprios cientistas reconhecem não serem imutáveis pela refutabilidade que lhe atribui Karl Popper, e por eles próprios aceite com humildade. Como escrevi no meu post, a fé não é explicável nem pode de ser explicada. Afirma-o o próprio Santo Inácio de Loyola: “Para aqueles que crêem nenhuma explicação é necessária; para aqueles que não crêem nenhuma explicação é possível”.

Mas a questão fulcral parece-me agora residir no panteísmo de Einstein, que aceita um criador sem ser o Criador que criou o Céu e a Terra.Para melhor me situar, que espécie de panteísmo “encaixa” no pai da Relatividade, que revolucionou o mundo da Física, palavra empregue pela primeira vez, no século XVIII, por John Toland para designar aquilo que hoje se atribui “ao sistema filosófico que admite na natureza uma única substância, que é Deus e todos os seres modalidades particulares da substância divina”?

Panteísmo que mereceu a atenção de Platão, retomada, mais tarde, por João Escoto Erígeno em que a sua doutrina, embora fundada na revelação divina, é impregnada de espírito oriental , das ideias platónicas e da Astrologia. Sob o risco de errar, julgo enquadrar-se o panteísmo de Einstein em Giordamo Bruno, precursor de Espinosa, e do panteísmo moderno, ao opor a religião da natureza ao cristianismo, tendo Deus como o ser universal em que tudo subsiste, que se transforma em todas as coisas e com elas constitui uma única realidade.


Mas isto são questões que me transcendem pedindo-lhe, como tal, meu Caro Alfredo Dinis, o esclarecimento das dúvidas que a pessoa de Einstein me levantou, e levanta, possivelmente a muitos leitores, e a que eu me sinto incapaz de dar uma resposta que me satisfaça a mim próprio, e muito menos aos possíveis leitores deste meu comentário que eu tenho, de certo modo, atrevido.


Finalmente, conhecedor da obra do Padre Luís Archer (embora sem a profundidade que seria desejável), desconheço, em absoluto, a obra do Padre Lemaitre que cita no seu comentário. Seria atrevimento da minha parte pedir-lhe, que me desse a conhecer, com o espaço que um comentário comporta, mas se necessário dividido em duas partes, a teoria do big bang por ele intuída?"
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"Caro Rui Baptista,
Sobre a religiosidade panteísta de Einstein, não tenho nada a acrescentar. Uma vez que ele considerava inaceitável a existência de um Deus pessoal, a modalidade do seu panteísmo é talvez uma questão académica. No que se refere a Lemaître, deixo-lhe aqui uma passagem da Verbo, de natureza biográfica, e outra de uma das suas obras:

Georges Lemaître, astrofísico e matemático belga (Charleroi, 17.7.1894 - Lovaina, 20.6.1966) que, em 1927, «apresentou a sua hipótese cosmogónica, segundo a qual toda a matéria que constitui o Universo se encontrava originalmente fortemente condensada, a uma temperatura extremamente elevada, num átomo único com 100 milhões de quilómetros de diâmetro — o «átomo primitivo» — e que se teria desintegrado devido a uma violenta explosão, dispersando-se em todos os sentidos e dando origem aos diversos corpos celestes que actualmente o formam» (Enciclopédia Verbo-Edição Século XXI).

“Podemos comparar o espaço-tempo a uma taça cónica aberta… A base da taça é a origem da desintegração cósmica; é o primeiro instante na base do espaço-tempo, o hoje que não tem ontem porque ontem não havia espaço” (Georges LeMaitre, The Primeval Atom: An Essay on Cosmogony, Gonseth, 1950.

Cordiais saudações,

Alfredo Dinis”.

Mal sabia eu então que a personalidade que respondia aos meus comentários, com a simpatia de um tom coloquial, era o antigo director da Faculdade de Filosofia de Braga, "ipso facto", por mim  tratado com a familiaridade de "meu caro Alfredo Dinis, que descia da cátedra para me ministrar uma lição da qual tirei grande proveito  que ora ponho em devido e merecido destaque, fazendo sair da penumbra de simples e simpático comentário para proveito de quem dela tenha beneficiado no passado com leitura do meu post: “Então e a alma?” E dessa lição possa vir a beneficiar, hoje inquinada que não está pela leitura  desse meu irreverente texto que tive, como reconheci já então,  como o atrevimento de um sapateiro que vai além da chinela!

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

A QUEDA DOS LIBERAIS E A LIÇÃO DA ALEMANHA

Em 10 de Julho escrevi aqui e no Público num texto intitulado "Consciência e Poder" sobre o aumento desproporcionado da influência do CDS no governo português:
"Ao acumular a vice-presidência do Conselho de Ministros com a coordenação económico-financeira, a ligação à troika e a reforma do Estado, e ao conseguir para o CDS-PP a pasta da Economia, terá lugar uma perversão da democracia, pois dará a um partido que tem 11,7 por cento dos votos uma influência desmesurada no futuro do país. O fenómeno, apesar de exacerbado aqui e agora, não é inédito. Trata-se do problema que a ciência política designa por “poder desrazoável” do terceiro partido. Na Alemanha os liberais (FDP) foram sempre o terceiro partido entre 1949 e 1994, sem nunca terem alcançado uma votação superior a 12,8 por cento. Coligaram-se quer à direita, com o CDU-CSU, quer à esquerda, com o SPD. Na maior parte desse período, o ministro dos Negócios Estrangeiros alemão foi, por isso, sempre um liberal. No actual governo alemão, chefiado por Angela Merkel, o FDP, que teve uns anómalos 14,6 por cento nas eleições de 2009, detém as pastas de Vice Chanceler e Economia, Negócios Estrangeiros, Justiça, Saúde e Cooperação Económica. Contudo, envolto em profundas contradições, tem caído em desgraça, afundando-se em sucessivas eleições estaduais. As sondagens dão-lhe hoje menos de cinco por cento no país quando as eleições federais são já em 22 de Setembro. Abaixo dessa barreira nem sequer entram no Bundestag."
 Os resultados das eleições de ontem confirmam o previsto. O partido liberal (FDP), "muleta" de Angela Merkel ficou de fora no parlamento alemão. Os resultados foram aliás curiosíssimos, como que funcionando como um "ajuste fino": Nem liberais nem o novo partido defensor do abandono da Europa e do euro tiveram 5%, o mínimo constitucional para entrar no Bundestag. A CDU-CSU venceu mas sem maioria absoluta (embora por muito poucos lugares), sendo obrigada a coligar-se com o segundo partido, o SPD, uma coligação que será provavelmente boa para o projecto europeu. Há ainda a hipótese de de a CDU-CSU se coligar com os Verdes, mas eu  não acredito nesse casamento (e ainda menos numa coligação de contrários, como o CDU-CSU com os  Die Linke).

Em Portugal está tudo tão mal que talvez não fosse má ideia pensar-se uma grande coligação do PS e PSD, naturalmente com outros líderes num e noutro lado  (eventualmente António Costa e Rio Rio), deixando irrevogavelmente o CDS de fora.

HOMENAGEM A ALFREDO DINIS

Partiu ontem o padre Alfredo Dinis, estudioso da filosofia das ciências e leitor deste blogue. Em sua homenagem recuperamos aqui dois artigos que aqui publicou sobre as relações entre ciência e religião:

Primeiro artigo : Porquê Deus se tenho ciência? I

Segundo artigo : Porquê Deus se tenho ciência? II



ACIDENTE NO ESPAÇO


O FÍSICO MANUEL PAIVA SOBRE OS ASTRONAUTAS


O físico da Universidade Livre de Bruxelas Manuel Paiva, autor de "Como Respiram os Astronautas" (de que se aguarda uma segunda edição, com novo prefácio do autor), dá uma entrevista ao Falar Global sobre o treino e a vida dos astronautas.

António Ramos Rosa

Um poema de Ramos Rosa, que hoje partiu.


Não Posso Adiar o Amor

Não posso adiar o amor para outro século
não posso

ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas

Não posso adiar este abraço
que é uma arma de dois gumes
amor e ódio

Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação

Não posso adiar o coração

António Ramos Rosa
Poema constante na obra Viagem Através de uma Nebulosa

CONCORRER EM 2013 A UMA BOLSA É UM TIRO NO ESCURO

Transcrevo, com a devida vénia, o artigo de Nicolau Ferreira publicado hoje no Público, a propósito do concurso de bolsas individuais da Fundação para a Ciência e Tecnologia, cujo prazo termina hoje.


Os três meses de limbo começam a contar a partir de hoje. O prazo das candidaturas ao concurso de bolsas individuais da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) termina nesta segunda-feira, às 17 horas.

Os resultados só serão anunciados daqui a 90 dias. Até lá, Cristina Matos, Francisco Leitão, Ana Filipa Ferreira, e Carolina Bento, que concorreram a estas bolsas, vão ter de esperar para saber como vão ser os próximos quatro anos.

Anualmente, alguns milhares de candidatos com vontade de se especializarem — parte deles com a esperança numa carreira científica —, atravessam esta espera. Mas as hipóteses de se ganhar uma bolsa individual de doutoramento da FCT em 2013 parecem mais reduzidas.

"A FCT não anuncia quantas bolsas estão a concurso, tendo apenas ameaçado com mais cortes", diz ao PÚBLICO Francisco Leitão, 28 anos, candidato que quer fazer um doutoramento na Universidade de Cambridge, no Reino Unido, centrado na forma como a Europa olhava para a Península Ibérica no século XV, com base em relatos de viajantes. "Pretendo recriar as impressões, preconceitos ou choques sentidos por um europeu do século XV", explica. Mas o que espera do concurso? "Independentemente da qualidade do projecto ou do curriculum vitae [do candidato], qualquer prognóstico é um tiro no escuro." Há alguns dados que podem ajudar a decifrar a escala da redução das bolsas, temida pelos candidatos com quem falámos. No concurso de 2012 foram atribuídas 1198 bolsas individuais de doutoramento e 677 de pós-doutoramento, cujo prazo de candidatura este ano também termina hoje. Em 2007, no pico do financiamento da FCT, a relação foi de 2031 bolsas para 914. Desde aí, o número tem vindo a descer.

No final de Junho, a presidência da de bolsas individuais que serão concedidas, pois o orçamento para 2014 encontra-se em discussão", referiu ao PÚBLICO o gabinete de imprensa da FCT na sexta-feira, três dias depois do seu presidente, Miguel Seabra, dizer na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, na Assembleia da República, que a verba atribuída à fundação no Orçamento do Estado 2014 deverá aumentar, mas este aumento será para as despesas com novas competências da FCT.

Última oportunidade

O que se sabe é que as candidaturas tanto a bolsas individuais de doutoramento como às de pós-doutoramento têm subido. Em 2011, foram 5285 candidaturas, 3775 para doutoramentos. No ano seguinte o total passou para as 6490.

Para 2013, a FCT explica que só vai poder aferir esse número a partir de amanhã, quando o concurso ficar fechado e for possível "contabilizar as candidaturas lacradas". Mas a ABIC diz ter recebido um "fluxo semelhante aos outros anos de pedidos de reclamações e dúvidas para as candidaturas", conta-nos André Janeco, presidente desta associação.

Para Cristina Matos, 30 anos, esta é a terceira e "última oportunidade" para conseguir a bolsa de doutoramento. Pelo menos em Portugal. Cristina está a trabalhar no grupo de Química Organometálica e Bioorganometálica da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL). A jovem investigadora tem um percurso diferente dos outros candidatos com quem o PÚBLICO falou, já que começou por tirar a licenciatura em Física e Química na área do ensino na Universidade dos Açores, deu aulas e só mais tarde, em 2008, é que tirou o mestrado em Química Inorgânica e Biomédica. "Quando fui para a licenciatura sempre quis ir para a área de investigação", diz. A primeira vez que se candidatou para uma bolsa de doutoramento já tinha a tese de mestrado feita mas não tinha artigos publicados, o que desvalorizou o seu currículo. Em 2011 começou a trabalhar neste grupo da FCUL e no ano passado candidatouse de novo à bolsa sem conseguir.

Agora, voltou à carga. "Vou bem preparada. Mas nunca assumo que vou conseguir a bolsa porque nunca se sabe", confessa. No seu projecto de doutoramento vai investigar moléculas com elementos metálicos. "Estou à espera de desenvolver um composto mais próximo para aplicar na medicina", explica. Além disso, se ganhar a bolsa, quer aproveitar estes quatros anos para estabelecer contactos, fazer colaborações e avaliar quais as futuras oportunidades profissionais que terá.

Mas sente as limitações que a crise está a trazer à actividade científica. "Mesmo em relação a 2011, a sensação que me dá é que a burocracia cresceu. As pessoas que deveriam ter mais tempo para a investigação ficam mais presas a justificações orçamentais e a procurar por outras fontes de financiamento", exemplifica. Isto, já por si, pode limitar a capacidade de apoio que os orientadores dão aos alunos de doutoramento— que apesar de toda a experiência, estão ainda numa fase de aprendizagem da sua carreira —, mas Cristina Matos defende que estes problemas são ainda mais insidiosos nos peqquenos grupos de investigação.

"Os grupos maiores têm pessoas vocacionadas para fazerem propostas. Quando isso não há, torna-se complicado gerir tudo", explica, acrescentando que esses grupos "vão acumulando projectos e os mais pequenos não o conseguem, apesar da qualidade, por falta de dimensão."

A incerteza e a escassez do financiamento para o trabalho científico podem, para Helena Freitas, "acabar por condenar a própria investigação", defende a bióloga e professora da Universidade de Coimbra. "É inegável que a insatisfação da própria comunidade que acolhe os estudantes também começa a ser muito grande, até porque a carga lectiva dos docentes é cada vez maior", refere. Apesar disso, a bióloga considera que continua a valer a pena tirar o doutoramento em Portugal onde os grupos são globalmente competitivos.

A experiência de Maria Mota dá-nos um contexto da evolução portuguesa recente. "Enquanto em 1995, quando sai para Londres para fazer o meu doutoramento não havia grandes opções em Portugal, hoje os jovens têm uma grande gama de escolha com muitos laboratórios a serem referências internacionais", defende a especialista em malária e líder de uma equipa no Instituto de Medicina Molecular, em Lisboa. Mas avisa que "em tempos de crise, com menos acesso à obtenção de projectos por parte dos investigadores, o número de equipas de investigação nestas condições começa a reduzir".

Mas as duas investigadoras são peremptórias na necessidade dos doutorandos. "Não há ciência sem alunos de doutoramento. São eles a base de um sistema científico de sucesso", diz Maria Mota.

Condições piores

Há outros factores que pioram as condições de um doutoramento. Além da mensalidade das bolsas de 980 euros não ser actualizada há mais de dez anos, há uma série de mudanças que limitam as possibilidades de quem escolhe esta via.

No último ano lectivo, os alunos que ganharam uma bolsa mista e já tinham iniciado este tipo de doutoramento — feito a meias numa universidade portuguesa e noutra estrangeira —, viram as regras mudar. A FCT deixou de pagar as propinas de ambas as universidades, e passou a pagar só as da instituição que confere o grau. No final de Julho de 2013 haviam 2007 bolsas mistas em execução, 126 destas era a instituição estrangeira a conferir o grau.

A FCT cortou ainda o subsídio de execução gráfica da tese, que pode custar algumas centenas de euros e que, segundo André Janeco, também ajudava a pagar os emolumentos do final do doutoramento. Além disso, os 750 euros anuais que os alunos tinham direito para a apresentação de trabalhos em reuniões científicas — uma ajuda fundamental quando estas acontecem noutros países —, passaram a ser concedidos uma única vez nos quatro anos do grau.

Mas qual é a importância destas conferências? "Por um lado, vemos o que os outros países estão a fazer [no nosso tema] e podemos aprender com isso. Por outro, damos a conhecer aquilo que estamos a fazer aqui. É assim que a ciência evolui", responde-nos Ana Filipa Ferreira, 26 anos, que há quatro está a trabalhar no Centro de Oceanografia da FCUL e da Universidade de Évora.

Ana Filipa Ferreira é bióloga de formação e esteve nestes últimos quatro anos com bolsas de projectos científicos e fez ainda alguns trabalhos de monitorização ambiental encomendados por empresas ao centro. Agora candidatou-se a uma bolsa de doutoramento para um projecto que tem como objectivo a regulamentação da pesca nos estuários dos rios portugueses para "maximizar o lucro económico e a conservação das espécies de peixe", resume. "Espero poder contribuir para o país."

Se não conseguir a bolsa, as perspectivas não são muito boas. "O projecto onde estou acaba no final do ano e têm sido poucos os projectos aprovados. Apesar de trabalhar há quatro anos, os bolseiros não têm direito a qualquer subsídio de desemprego. Terei de voltar para casa dos meus pais", antecipa.

Alguns têm mais sorte. Carolina Bento, 25 anos, sente-se uma "felizarda". Se não ganhar a bolsa da FCT, pode contar com os seus pais. "Sei que muita gente não vai ter essa oportunidade."

A jovem tirou a licenciatura em Engenharia Informática no Instituto Superior Técnico. Fez aqui o mestrado onde estudou as ligações virtuais de "pessoas influentes" nas redes sociais. A Internet vai continuar a estar no centro no doutoramento. Desta vez, irá analisar redes sociais com localização geográfica como o Foursquare onde pode estudar "padrões de movimentos diários ou as pessoas que vão de férias".

Francisco Leitão já foi prejudicado pelo atraso do concurso das bolsas deste ano, que só abriu no final de Julho, um problema apontado desde logo pela ABIC. Por isso, vai ter de tomar a decisão de se candidatar ao doutoramento em Cambridge antes de saber se ganhou a bolsa. "Como muitos outros doutorandos, terei de começar a minha investigação já em Outubro com a necessidade de pagar imediatamente propinas", conta, acrescentando que as alternativas para se financiar serão contrair um empréstimo ou, "muito provavelmente" arranjar um trabalho.

O estrangeiro é uma opção tentadora. Cristina Matos refere que se não conseguir a bolsa, poderá virar-se lá para fora. Francisco Leitão aponta as condições da Universidade de Cambridge, que terá "mais medievalistas do que em todo o nosso país", além de bibliotecas com mais material para consultar sobre Portugal do que cá. E depois do doutoramento, vai voltar? "É provável que não. Nesta como noutras áreas, a tendência é para que se fechem portas, se limitem oportunidades e o país se torne mais deprimido."

Nicolau Ferreira
Público 23.09.2013

domingo, 22 de setembro de 2013

Porque não ensinamos as crianças a ser empreendedoras?

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ORDEM DOS MÉDICOS NA ORDEM DO DIA

Informação sobre um debate na Ordem dos Médicos no qual vou participar:

A Ordem dos Médicos dá continuidade à série de debates mensais sobre grandes temas da actualidade, de interesse quer para a Classe Médica, quer para o público em geral. O Senhor Bastonário, Prof Doutor José Manuel Silva, convida-o a para estar presente no próximo debate, a propósito da edição do livro do Dr. Luís Portela pela Gradiva Publicações, com o Tema: - Ser Espiritual: da Evidência à Ciência.

 O Debate realizar-se-á a 24/9/2013, pelas 21h15m, na Sede da Ordem dos Médicos em Lisboa. Painel de oradores: Drª Rita Bernardino, Padre José Tolentino de Mendonça, Prof. Doutor Carlos Fiolhais, Prof. Doutor Mário Simões e Doutor Luís Portela. Moderadora: Ana Sousa Dias (Jornalista).

 Depois de uma primeira exposição, seguir-se-á o debate com a plateia e concluiremos com uma nova ronda pelo painel de convidados. Para qualquer esclarecimento, contactar: n.º fixo: 218 427 115/218 427 115 e-mail: manuela.oliveira@omcne.pt ou rita.martinho@omcne.pt

SETE ANOS DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Três eventos de ciência que destaquei no número especial da revista "Tabu" dedicado aos sete anos do semanário "Sol":

2007
Começou a ser construído em Cadarache (Marselha, França) o ITER, o reactor internacional de fusão que visa criar na Terra as condições que existem no Sol para criar energia. A junção de núcleos de hidrogénio para dar hélio liberta uma enorme energia e a esperança humana é que daqui a algumas décadas, numa situação de esgotamento de outros combustíveis, seja possível recorrer a essa fonte de energia “limpa”.

2008
Foi lançado de Baikonur, Casaquistão, usando um foguete Soyuz, o segundo satélite do sistema Galileo, o projecto da União Europeia para concorrer com o GPS norte-americano. Ao contrário do GPS que teve origem militar e é hoje usado, com precisão, para fins militares, o Galileo é um projecto civil, que, além do mais, se destina a mostrar a independência tecnológica da Europa face a norte-americanos e russos.

2012
Foi anunciada no CERN (Genebra, Suíça) a descoberta do bosão de Higgs, partícula que faltava para a compreensão das partículas fundamentais do Universo: O Higgs, ao qual alguns chamam “partícula de Deus”, é responsável pela massa das outras partículas. O acelerador LHC do CERN, a maior máquina do mundo, tinha sido construído precisamente para a detectar.

sábado, 21 de setembro de 2013

A ÁGUA MOLHA


Por falar em insanidade, a FCT - Fundação para a  Ciência e Tecnologia, perante os protestos generalizados contra o fim da área da Promoção e Gestão da Ciência e Tecnologia, publicou, tarde e a más horas, esta tentaiva de  esclarecimento na forma de pergunta e resposta:
"A área “Promoção e Administração em Ciência e Tecnologia – PACT” não consta da lista de Domínios Científicos. Como devo proceder se o meu projeto se enquadra nesta área?

A comunicação e a gestão de ciência são áreas interdisciplinares, reunindo saberes e experiências de outras áreas científicas, incluídas neste concurso, nomeadamente: economia, gestão, sociologia, ciência política, ciências da educação, ciências da comunicação e da informação, filosofia, história, design e psicologia. Deve selecionar a área científica, e a sub-área, que melhor se adapta ao seu plano de trabalhos e objetivos de investigação. Conforme referido no Guião de Avaliação, no caso de candidaturas interdisciplinares, “sempre que necessário o coordenador do Painel de Avaliação deverá solicitar a colaboração de um elemento de outro Painel de Avaliação ou de um avaliador externo"
Ora isto é equivalente a dizer que a água molha. Dizer que se trata de áreas interdisciplinares é dizer o óbvio. Obrigado, mas já sabíamos. Mas a consequência lógica é que, por o serem, precisam de um tratamento interdisciplinar, isto é, a constituição à partida de júris interdisciplinares, que possam apreciar essas áreas em igualdade de circunstâncias. A FCT prepara-se para violar o princípio da igualdade, que julgávamos consagrado. Mas pode ser que o "esclarecimento" tenha sido posto por um funcionário zeloso mais desejoso de agradar às chefias, pois não acredito que um gestor de ciência culto e responsável acredite que essa emenda seja melhor do que o soneto. O poema era mau e com o verso acrescentado não se endireitou. Era um mau soneto e agora nem soneto é.

EINSTEIN ENTRA NA CAMPANHA




Um cartaz de um grupo de independentes que concorrem em Coimbra às Eleições Autárquicas (com o apoio do Bloco de Esquerda) pôs uma frase de Einstein num grande cartaz:

"Loucura é repetir a mesma coisa vezes sem conta  e esperar resultados diferentes".

O grafismo mostra uma curva de um rio - pode ser o Mondego - em que está marcada a alternância na Câmara Municipal de Coimbra entre o PSD e o PS.

De facto, o que Einstein disse (ou, pelo menos, que lhe é atribuído) foi:

"Insanity: doing the same thing over and over again and expecting different results."

e pode-se discutir se a melhor tradução de "insanity" é "loucura". Mas o cartaz é, decerto,  um dos mais originais da campanha,..




sexta-feira, 20 de setembro de 2013

I Am A Curious



Aparentemente, entre Fermi, Oppenheimer e um velho e cúpido professor de Física com o fémur partido, roçando os seios da jovem empregada de sua casa, não há nenhuma diferença.
Alberto Moravia é um dos grandes escritores italianos do século vinte. Romances como Os Indiferentes, O Conformista, O Desprezo, A Romana, La ciociara, A Desobediência e O Homem Que Olha tiveram êxito, e foram levados ao cinema por realizadores de méritos consagrados como Vittorio De Sica e Jean-Luc Godard.
O Homem Que Olha é uma reflexão sobre o voyeurismo e a curiosidade. O narrador é filho do professor de Física e repreende, pelo diálogo, a curiosidade sem limites e a perversão do pai:
«Eu digo-lhe: «Não te vou pedir informações científicas; as minhas perguntas referem-se aos aspectos, como dizer, humanos.»
«Humanos?»
«Quer dizer refere-se às pessoas que levaram a cabo as experiências a que devemos as armas nucleares.»
A minha maneira de começar a discussão, directa e pessoalizada, surpreende o meu pai, que evidentemente esperava uma abordagem diferente. Respondeu-me com uma agressividade irónica: «Que te fizeram essas pessoas? Há pouco a dizer a seu respeito: todos eram gente de bem, acreditavam no que estavam a fazer e faziam aquilo em que acreditavam.»
Digo com precaução: «Não duvido de que, realmente, como dizes, fossem pessoas de bem. O que me interessa é antes o facto de, embora sendo pessoas tão diferentes umas das outras (por exemplo, que diferença maior do que a existente entre Fermi e Oppenheimer?), terem todas um traço comum.»
«Creio que sim, eram homens de ciência.»
Corrijo: Não estou a falar das suas características profissionais; mas de um traço, por assim dizer, psicológico.»
O meu pai desdobra novamente o jornal, talvez num gesto demonstrativo de que, embora não recuse o diálogo, o tema não o interessa. Diz depois, distraidamente, percorrendo os títulos: «Que traço?»
«Não sei como lhe hei-de chamar. Curiosidade é muito pouco, indiscrição é inexacta, profanação é demais. Digamos, talvez, ardente curiosidade.»
«Porquê ardente?»
«Porque dir-se-ia tratar-se de um fogo devorador, inextinguível, destruidor?»
O meu pai rectifica: «Estavas a falar de curiosidade, mas de que curiosidade?»
«A curiosidade que se encontra na origem das experiências.»
Meu pai acaba por pôr de lado o jornal e pergunta: «Porque chamar-lhe curiosidade e não, por exemplo, sede de saber?»
«Porque sede de saber é uma expressão figurada, de tipo retórico. A sede é uma sensação física; usa-se para indicar uma necessidade impulsiva: o nosso corpo por meio da sede dá-se conta de que não pode sobreviver sem uma certa quantidade de água…digamos, sem olhar através do buraco da fechadura um casal que está a fazer amor.»
Com esta frase, naturalmente, penso na poesia de Mallarmé, no imaginário rapaz de boa família que espreita pela fechadura da porta a «concha pálida e rosa».
Mas, ao meu pai, que ignora todas as leituras, a comparação deve parecer pelo menos desajustada. Vejo-o soerguer as sobrancelhas: «O que é que o buraco da fechadura tem a ver com isto?»
«É para definir um género de curiosidade – como hei-de dizer? – libidinosa.»
O meu pai não tarda a dar-se conta do que estou a querer dizer. Exclama numa voz curiosamente alterada: «De acordo contigo, os que levaram a cabo a experiência da cisão do átomo eram curiosos como os que espreitam pelo buraco da fechadura um casal que faz amor?»
Começo a rir, satisfeito por sentir-me compreendido: «No fundo, lá bem no fundo, acho que sim.»
Ele retorque, com convicção: «Não eram curiosos, analisavam.»
«Mas, apesar de tudo, sempre com curiosidade.»
O meu pai diz, cansado: «Não estou a perceber bem onde queres chegar.»
«A parte nenhuma. Só quero dizer que a curiosidade, atingindo um certo grau de ardor, é sempre sinal de desorientação, de cegueira. O homem curioso é um homem muito, muito comum. E o facto de ser, justamente, curioso, demonstra-o.»
Vejo-o bocejar ostensivamente em sinal de saciedade: «Agora só te falta descobrir que a curiosidade é a mãe da ciência.»
Agarro na objecção com ferocidade: «É claro, trata-se de um lugar-comum, mas, neste caso, vivam os lugares-comuns.»
O meu pai cala-se, descontente.
Eu acrescento, com mais seriedade: «Gostava de insistir no facto de que as pessoas que tu dizes que analisavam eram homens comuns, ou seja, medíocres, justamente porque “apenas” analisavam.»
«Bah!»
«É tão verdade que não previram os efeitos da curiosidade e foram apanhados a contrapé pelas suas próprias descobertas. Sabes o que disse Fermi a propósito da cisão do átomo?»
O meu pai fica calado. É claro que o tom persecutório da minha voz lhe provoca um fastio enorme. Mas eu cito lentamente: «Deus, nos seus imperscrutáveis desígnios, tornou-nos cegos perante o fenómeno da cisão do átomo.»
A bomba atómica beija o seio da Terra. Lábios sequiosos e abertos beijam o néctar nuclear. Entretanto permaneço curioso, dentro dos limites, em relação ao futuro do meu país. As livrarias estão a abarrotar de livros escritos por génios ( de preferência funcionários de editoras) , as livrarias estão vazias. O senhor Paulo Portas é tão curioso que vê  o que ninguém vê e chega  aonde ninguém  chega. O ano escolar arrancou bem em todas as escolas e o número de alunos no ensino secundário decresceu drasticamente, porque os pais não têm dinheiro. As câmaras estão endividadas e continuam a gastar... assim andamos.

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...