domingo, 29 de julho de 2007

BREVE HISTÓRIA DAS ACADEMIAS CIENTÍFICAS

Escrito em colaboração com António José Leonardo:

O desenvolvimento da ciência e da filosofia esteve sempre relacionado com a existência de instituições que promovessem a criação e comunicação de saberes. Na Antiguidade a instrução estava associada à religião, ocorrendo sobretudo em templos. Foi na Grécia antiga que surgiram as primeiras instituição seculares dedicadas ao ensino, como a Academia de Platão ou o Lycaeum de Aristóteles. As escolas e universidades fundadas na Idade Média tiveram como função principal a transmissão de conhecimentos. Os conteúdos ensinados baseavam-se nos escritos antigos que eram destilados com escasso espírito crítico.

A academia como sociedade de sábios com o objectivo de promover a pesquisa científica, estimulando a discussão entre pares, é uma das instituições criadas logo no início da ciência moderna, sendo ela própria parte do método científico. Uma teoria científica, para se afirmar, necessitava de ser comunicada a um conjunto de sábios que a podiam criticar livremente.

As primeiras academias resumiam-se a encontros informais, em princípio regulares, na casa de um nobre ou mecenas, onde um grupo de eruditos debatiam temas que iam da poesia à matemática, passando pela astrologia / astronomia, filosofia e medicina. Um exemplo foi a casa dos Medici, em Florença, no século XV. Estes grupos evoluíram para sociedades, mais ou menos organizadas, das quais a mais famosa foi a Accademia dei Lincei (o nome revela a pouca modéstia dos seus membros, que se julgavam possuidores de uma perspicácia de lince!), fundada por quatro jovens aristocratas em 1603, entre os quais o Príncipe Federico Cesi. Galileu foi membro desta academia e nela divulgou as suas descobertas astronómicas. O nome “telescópio” foi mesmo proposto num banquete dos “linces” em honra de Galileu. Foi através desta academia que Galileu publicou o seu opúsculo em que anunciava a descoberta das manchas solares e onde já defendia o sistema de Copérnico.

A primeira sociedade científica a receber uma autorização oficial da Igreja Católica foi, porém, a Accademia del Cimento (isto é, academia da experimentação), fundada em Florença, em 1657, por dois pupilos de Galileu. Contou com o patrocínio do Príncipe Leopoldo de Medici, irmão do Grão-Duque Fernando II, que conseguiu reunir a maior colecção de equipamento científico da época ao longo dos seus dez anos de existência. Estas sociedades satisfaziam os caprichos dos seus patronos, dos quais dependiam economicamente, sem posuírem uma estrutura coerente de pesquisa científica. Nos “Ensaios das Experiências Naturais” da Accademia del Cimento publicados em 1667 destacam-se as mais variadas experiências nas áreas da pneumática, som, magnetismo, movimento, etc. realizadas com os instrumentos da academia.

O papel da Itália como centro da “nova ciência” terminou com a extinção da Accademia del Cimento e com a assumpção, por parte da Igreja, de uma postura repressiva de novas ideias que contrariassem os escritos de Aristóteles e Ptolomeu. A Inglaterra herdou o legado italiano, ao criar a Royal Society. Desde 1645 que um grupo de cientistas, na altura designados “filósofos naturais”, se reunia em Londres, com alguma regularidade, para discutir novas ideias e comunicar resultados obtidos individualmente. Tratava-se de um conjunto de personalidades bem informadas que mantinham correspondência com os principais cientistas europeus. Em 1662, este grupo tornou-se na Royal Society, formalizada por Carta Régia de D. Carlos II (no mesmo ano em que este se casou com Catarina de Bragança, filha do rei de Portugal D. João IV). Não tinha quaisquer obrigações para com o governo e o próprio D. Carlos II nunca a levou muito a sério (chamava aos membros os "meus bobos"). Apesar de o rei ser o patrono no papel, ele nunca lhe atribuiu qualquer subsídio (concedeu apenas algumas benesses como o envio da correspondência externa pela mala diplomática). A Royal Society tinha membros estrangeiros notáveis, como o holandês Christiaan Huyghens. Apesar da dedicação de muitos dos seus associados, a Royal Society não se tornou um verdadeiro instituto de ciência nas décadas que se seguiram à sua fundação, funcionando sem programa e ao sabor do impulso das reuniões.


Com um cariz governamental surgiu em Paris, quatro anos após a Royal Society, o seu equivalente francês – a Académie des Sciences. Após a morte do Cardeal Mazarino, em 1661, e a ascensão ao trono do jovem Luís XIV, estavam criadas as condições para um reforço da importância da investigação científica francesa. Ao contrário da corte inglesa, o rei francês decidiu criar a Academia das Ciências não só como uma forma de afirmação da coroa francesa na Europa mas também para alimentar as suas pretensões ao nível de inovações aplicadas à guerra, à navegação, à arquitectura e engenharia. Desta forma, e por Carta Régia de 1666, providenciou aos cientistas fundos e instalações adequadas. Em troca, os cientistas reconheciam certas obrigações perante o estado francês. A selecção dos académicos esteve a cargo do ministro francês Jean-Baptiste Colbert, que não se esqueceu de incluir Huyghens na sua lista.

Por iniciativa do filósofo e matemático Gottfried Wilhelm Leibniz, surgiu em 1700 em Berlim a Akademie der Wissenschaften. Seguindo o exemplo francês, a academia berlinense teve como primeiro patrono o futuro rei de Brandeburgo-Prússia, Frederico I.

A divulgação das ideias era sustentada pela publicação de livros, normalmente escritos na língua franca da ciência – o latim -, e pela correspondência trocada. Era, porém, necessário compilar os novos conhecimentos de forma a extrair deles uma “verdadeira filosofia da natureza.” Uma preocupação das academias científicas foi, portanto, que os seus membros e colaboradores publicassem os seus trabalhos sob a forma de livro, o que nem sempre era possível em virtude de dificuldades financeiras (essas obras não tinham grande procura por parte do público!). Uma forma de despertar o interesse e o apoio do público ao trabalho realizado nas sociedades científicas foi então a publicação periódica dos conteúdos das reuniões. O primeiro exemplo deste tipo de publicações surgiu em França em 1665, com o nome de “Journal des Savants”. Abrangia todos os campos do conhecimento e incluía documentos entregues por membros da Academia das Ciências francesa. Mas esse jornal durou apenas três meses.

Talvez estimulado pelo exemplo francês, o secretário da Royal Society, Henry Oldenburg, põs ainda em 1665 em circulação em Londres as “Phylosophical Transactions”. Este periódico mensal fazia a divulgação da actividade científica da sociedade e incluía alguma correspondência e a lista de livros recebidos do estrangeiro. Tinha também por objectivo concitar a curiosidade do público mais informado. A selecção dos conteúdos esteve a cargo de Oldenburg, na qualidade de editor e proprietário, revertendo parte dos lucros para a Royal Society. Oldenbourg contava com adjuntos científicos e matemáticos, como Robert Boyle e John Collins, que o apoiavam na selecção e tradução dos textos. As “Actas Filosóficas” ganharam grande notoriedade, sendo muito procuradas no estrangeiro. Foram traduzidas para latim e para várias línguas europeias, multiplicando-se o número dos autores que enviavam artigos para publicação. Estava criado o periódico científico – o veículo da divulgação dos documentos científicos a toda a comunidade de investigadores e também ao público em geral. Este tipo de revista científica foi imitada noutros locais: por exemplo, o “Giornale dei Letterati”, em Roma, as “Acta Eruditorum”, em Leipzig (fundadas por Leibniz) e as “Mémoires de l’ Académie des Sciences”, em Paris. Se bem que a revista científica foi vital para o desenvolvimento da ciência, o livro científico conservou o seu alto estatuto, nomeadamente na transmissão de conteúdos mais abrangentes e com maior impacto.

Em Portugal, a primeira academia dedicada ao cultivo da ciência foi fundada pela rainha D. Maria I em 24 de Dezembro de 1779, com o nome de Academia Real das Ciências de Lisboa. Como membros fundadores destacam-se o Duque de Lafões, seu primeiro Presidente, e Domingos Vandelli, seu primeiro secretário, o Abade Correira da Serra e o Padre Teodoro de Almeida. Os seus fundadores afirmaram que a Academia “é consagrada à glória e felicidade pública, para adiantamento da Instrução Nacional, perfeição das Ciências e das Artes e aumento da Indústria Popular”. Provavelmente por influência francesa, a Academia Real das Ciências de Lisboa iniciou a publicação do seu periódico científico, as “Memórias”.

1 comentário:

Cláudia S. Tomazi disse...

Entre odes que desfilaram e simbolizam para a história!
De visitas tam ilustres, entre muitas, a vez memória
quer afagar o simples, de gosto per feição e posto,
que travara pelas Ciências, eis na academia um rosto!

São sentenças que singular fortuna, tal conhecimento,
desbravara em conquista, sedendo pista o elemento!
Foram de químicas o amálgama e reserva no laboral
elevadas da causa científica, aleitaram da visão em aval.

As Academias que nascidas do entusiasmo,
fizeram-se aguerridas! Respeitadas e evoluídas,
seguindo e tratando em respostas o bem comum!

Que dos feitos por efeito, citaria a Erasmo,
o primeiro entre outros humanistas,
e retumba, representando o álbum.

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