domingo, 7 de setembro de 2014

PEDRAS DISTO, DAQUILO E DE MAIS ALGUMA COISA (3)

(Texto em continuação de dois que podem ser encontrados aqui).


Diamantes 
Conhecidas de um tempo antigo, em que, como se disse atrás, não se distinguiam os minerais das rochas, as pedras preciosas (diamante, safira, rubi, esmeralda e a pérola) e as que, comparativa e popularmente, se designavam por pedras semipreciosas (turmalinas, granadas, ametista, topázio e muitíssimas outras), são hoje, todas elas, referidas por pedras preciosas ou gemas. Gema é um termo que, na Antiguidade latina, Plínio, o Velho (23-79 d.C.) usou no mesmo sentido e que Camões lhe alude, no canto VII dos Lusíadas, sendo, ao que se julga, a primeira vez que, entre nós, a palavra foi usada neste contexto.

No domínio gemológico são várias as expressões comerciais.

A pedra-da-lua é uma variedade de adulária, cujo brilho característico ou (adularescência), em tons de branco, é devido a interferências da luz causadas pela geminação própria deste feldspato potássico.
A pedra-do-sol é uma variedade de oligoclase (plagioclase) com aventurescência, nome do efeito óptico de reflexão provocado, nesta pedra, por inúmeras e pequenas inclusões de mica.

A pedra-canela é uma hessonite, uma variedade de grossulária (granada) de cor laranja.

Pedra-do-céu e pedra-das-estrelas são dois nomes comerciais da aventurina, uma variedade de quartzito com inclusões de minúsculas palhetas de fuchsite (uma mica que lhe confere cor verde) ou de hematite, responsável pela variedade vermelhada. Tal profusão é a causa da citada aventurescência, característica destas pedras.

A pedra de aspargus é uma variedade de apatite fibrosa, verde, oriunda da província de Múrcia (Espanha), usada na manufactura de objectos decorativos.

A pedra-paisagem refere a generalidade de materiais gemológicos (certas variedades de ágata, mármore e arenito fino) cuja textura lembra uma paisagem.

A pedra-zebra é uma rocha bandada, branca e negra, essencialmente composta por anfíbola e feldspato, procedente do Arizona (EUA);é ainda, uma outra rocha, igualmente bandada, vermelho-escura e branca, essencialmente composta por quartzo, sericite (mica) e hematite procedente de Kimberley, na África do Sul.

No jargão gemológico, todas estas gemas são consideradas pedras naturais ou pedras genuínas, dado que resultam de processos geológicos ou biológicos naturais, sem qualquer intervenção do Homem. Para alguns, são ainda pedras finas. Estas expressões sinónimas abarcam as chamadas pedras duras, designação dada à rochas e aos minerais usados no talhe de objectos decorativos. Dizem-se naturais para as distinguir das pedras artificiais e das pedras sintéticas, obtidas em laboratório e industrialmente.

As artificiais são produtos cristalinos, sem correspondente natural, ou seja, cujas composição química e estrutura não se sobrepõem às das gemas naturais conhecidas. São exemplos de pedras artificiais a “granada de gadolínio e gálio” (GGG) e a “granada de ítrio e alumínio” (YAG). As sintéticas são, igualmente, produtos artificiais, mas com a mesma composição química e a mesma estrutura das gemas naturais correspondentes.

É hoje comum o fabrico, entre outras, de diamantes, esmeraldas, rubis e safiras. Ainda no jargão gemológico, fala-se de pedras tratadas, expressão genérica que qualifica quaisquer gemas sujeitas a melhoramento da sua aparência, via de regra, em termos de cor, transparência, brilho e textura. Os gemólogos usam ainda a expressão pedras de cor com que distinguem todas as gemas, com excepção dos diamantes e dos materiais orgânicos.

No domínio da mineralogia ainda se fala de pedra-ume, como sinónimo de alúmen, o sulfato duplo de alumínio e potássio, de fórmula KAl(SO4)2. Dizia-se pedra-íman para referir a magnetite, o óxido de ferro (Fe3O4), com propriedades magnéticas e pedra infernal continua a ser o nome popular do nitrato de prata (AgNo3), usado como cauterizador na eliminação de verrugas e outras tumorações da pele.

Entre os navegadores, ao tempo dos descobrimentos, friccionavam-se as agulhas de ferro com magnetite, para as tornar magnéticas, operação conhecida por "cevar", razão pela qual este mineral tinha o nome de pedra de cevar e era tido por amuleto de boa sorte e pedra de cura de algumas mazelas. No domínio da Pré-história, pedra lascada é a antiga expressão alusiva ao Paleolítico, relacionada com o tipo de indústria lítica iniciada há cerca de 2,5 milhões de anos por lascagem de sílex e outras pedras com fractura conchoidal.

Na mesma nomenclatura, pedra polida aludia ao Neolítico, surgido há pouco mais de 10 000 anos. Esta outra relaciona-se com um tipo de indústria lítica, no qual a pedra era desgastada por abrasão e polida. Paleolítico e Neolítico são as duas idades que integram a chamada Idade da Pedra, a que se seguiu, entre 6000 e 2500 anos a. C., a Idade dos Metais.

Muitos dos achados pré-históricos eram referidos ente as populações portuguesas com pedras de raio ou pedras de trovão e eram colocadas sobre o telhado ou dentro de casa para as defender dos raios durante as trovoadas. Às peças mais pequenas, como pontas de seta e buris, davam o nome de pedra de corisco. As mesmas expressões foram usadas para designar os meteoritos, num tempo em que se desconhecia a origem destas pedras do espaço.

Em termos de saúde humana, o dentista designa por tártaro a popular pedra nos dentes e os médicos falam de litíases biliar e renal quando se referem às enfermidades vulgarmente conhecidas por pedras no fígado e pedras no rim.

Nos cafés e restaurantes põem-se pedras de gelo nos whiskys e nos refrigerantes e, anos atrás, foi costume usar pedras de açúcar, em “quadradinhos”, como adoçante.

Pedra de isqueiro é uma liga de ferro-cério, que solta faíscas quando atritada e pedra de linho é o peso de oito arráteis (um arrátel corresponde a 0,459 kg) de linho espadelado, isto é, batido em cima de um cortiço com uma espadela (espécie de cutelo largo de madeira), de modo a eliminar tudo o que não seja a fibra desejada.

Pedra de tropeço, em sentido real é a pedra do caminho que nos pode fazer cair e, em sentido figurado, é o obstáculo que nos dificulta ou impede a concretização de um projecto ou de uma obra.

Na Igreja Católica a pedra de ara, colocada no centro do altar, serve de base à patena e ao cálice da celebração, a que se juntavam relíquias dos mártires. Pedra do lar era a parte do chão da lareira da cozinha onde se fazia o lume, se cozinhava e em torno da qual se convivia em família e pedra argueireira, hoje uma memória, era uma minúscula pedrinha muito polida, com a qual se procurava retirar um cisco do olho, de entre a córnea e a pálpebra.

Pedra a pedra ou com pedra sobre pedra se edifica uma muralha, ou, em sentido figurado, qualquer obra material ou do intelecto, construída por junção sucessivas dos seus elementos constituintes.

Diz-se pedra assente uma qualquer decisão tomada, põe-se uma pedra sobre o assunto que se pretende esquecer, atira a primeira pedra aquele que pretende dar inicio ao que quer que seja e lança uma pedra no charco aquele que pretende denunciar uma situação menos correcta. Pode-se ser firme como uma pedra ou insensível como uma pedra.

Tem uma pedra no sapato aquele que sofre de um qualquer incómodo ou que tem um problema por resolver, dorme como uma pedra o justo, que tem a consciência tranquila e fala com sete pedras na mão quem tem educação ou motivos para isso.

Sopa de pedra é a história do frade que deu origem à conhecida e apreciada confecção culinária sediada em Almeirim.

Pelos jardins deste nosso país, são muitos os reformados ainda capazes de serem úteis à sociedade, mas que perdem o tempo “comendo” e “perdendo” pedras no tabuleiro das damas ou acertando as pintas das pedras do dominó, enquanto em suas casas, as mulheres, trabalhadoras que nunca gozaram férias e nunca se reformam, de pedras só conhecem a pedra de sabão sempre em uso no tanque da roupa, a pedra-lioz do lava-loiça, as do chão da cozinha e as dos degraus das escadas que varrem e lavam todos os dias.
Galopim de Carvalho

1 comentário:

Como é que se pode ser persa?... disse...

Muito admiro a sua excepcional e erudita intervenção! Leio-o sempre com prazer.

RACIONALISMO, HUMANISMO, ILUMINISMO E DESPOTISMO ILUMINADO,

Por A. Galopim de Carvalho Em poucas palavras, para gente com pressa. Os avanços da ciência, levados a cabo, no Renascimento, por Da Vinci ...