Mais uma excelente análise, da autoria do investigador anónimo, mas identificado pelos autores do blogue.
Nos posts
anteriores vimos que a avaliação em curso sofre de problemas muito
graves, parte dos quais tem na sua origem uma imposição artificial
por parte da FCT sobre o número de unidades a passar à segunda fase
[1,2,4,6]. Uma descrição dos
vários aspectos da avaliação, em inglês, que contextualiza a
situação para quem não esteja familiarizado com o sistema
português, foi feita em [11].
De facto, a razão pela qual a suspensão da avaliação
já foi pedida por várias entidades pode ser resumida numa linha:
Esta avaliação não
contém “erros grosseiros”; é ela própria um “erro
grosseiro”.
No presente post
iremos, para além de apresentar um resumo do que sabemos até agora,
reforçado por resultados com base nas classificações dos
relatórios de 40% das unidades em avaliação, efectuar uma análise
que mostra que nunca teria sido possível concretizar a visão da FCT
de eliminar 50% das unidades sem cometer erros e transfomar a
passagem à segunda fase para uma número muito significativo de
unidades num processo aleatório que de avaliação contém muito
pouco.
A razão principal para
esta impossibilidade é, na nossa opinião, muito simples: a actual
direcção da FCT tem um desconhecimento notável da qualidade da
investigação que se faz em Portugal nas diferentes áreas. Actuou,
além disso, como se essa qualidade fosse uniforme e transversal a
todas as disciplinas.
Para além de ter como
consequência injustiças gritantes, pensamos que as irregularidades
resultantes já identificadas põem em risco, de uma forma
irresponsável, a evolução da investigação em várias áreas em
Portugal, sem que se vislumbrem ganhos significativos.
Estes riscos tinham já
sido apontados por várias entidades e instituições aquando da
discussão das regras de avaliação em 2013 [12-15], pelo que a FCT
não pode sequer ficar surpreendida pela tempestade que se abateu
sobre si após a divulgação dos resultados.
Uma breve história
das irregularidades
Esta avaliação
partiu do princípio que faria sentido (e seria possível) eliminar
50% das unidades. Em relação a isto, afirma a FCT que a única
razão pela qual o número de centros a passar à segunda fase é
mencionado no contrato com a ESF se prendia com a necessidade de
obter uma estimativa para o orçamento. Tudo o resto foi obra os
avaliadores, que seguiram o guião (oficial) da avaliação.
Nunca a FCT explicou por
que razão no anexo ao contrato relativo aos procedimentos do painel,
sem relação nenhuma com o orçamento, era mencionado que o
resultado da primeira fase devia produzir uma shortlist com
50% das unidades a concurso [4].
Para além disso, a FCT
justifica esse número de 50% como sendo o número correspondente ao
da avaliação anterior. Não só estamos a falar de escalas
diferentes, mas a FCT nem sequer fez bem as contas, uma vez que não
considerou os laboratórios associados [6,7] – a percentagem
correcta, se é que se pode chamar assim quando se está a comparar
coisas que não são comparáveis, seria de 58%.
Esta avaliação não
é por pares porque os peritos nos painéis não cobriam as
sub-áreas suficientes para poderem emitir julgamentos fiáveis sobre
o que estavam a avaliar. Foi-lhes, no entanto, pedido que elaborassem
um dos três relatórios iniciais sobre todos os centros da sua área
científica e, nalguns casos, mesmo sobre áreas diferentes. Afirma o
coro FCT/ESF que essas lacunas eram colmatadas pelo recurso a
árbitros externos. No entanto, quando foi necessário cumprir a
missão de impor as quotas, na maioria dos casos em que os árbitros
internos e os dois externos discordaram, foram as opiniões dos
primeiros que prevaleceram, mesmo quando não eram da área em causa.
Este ponto já foi ilustrado em [2], e será reforçado abaixo.
Esta avaliação não
é robusta pois uma permutação entre os peritos dos painéis e
os árbitros anónimos produziria uma outra lista de centros a passar
à segunda fase – isto admitindo que os árbitros anónimos, se
estivessem na posição de membros do painel, também não teriam
problemas em substituir a sua opinião à dos peritos que tinham sido
consultados. Vimos também que uma das condições para uma avaliação
robusta, nas próprias palavras do Secretário de Estado do Ensino
Superior, necessitaria um conjunto de relatórios de pelo menos 5-6
especialistas. Aliás, 5 era o número máximo de peritos
considerados no regulamento da avaliação que foi publicado pela FCT
após a (muito breve) discussão pública e que estava em vigor
aquando da submissão das propostas [2,5].
Esta avaliação não
é séria, uma vez que a FCT alterou as regras do processo de
avaliação quando este já decorria, tendo classificado
eufemisticamente como “Additional information” um documento
enviado às unidades já em Abril deste ano, no qual modificou o
número de árbitros remotos a considerar e retirou da discussão do
relatório final o árbitro indicado pelas unidades [5]. Não só uma
alteração das regras é completamente inaceitável na altura em que
ocorreu, como é evidente que sem essa alteração não teria sido
possível sequer produzir os relatórios finais que foram produzidos.
Esta avaliação tem
aspectos bizarros porque não se espera que a este nível haja um
coordenador de um painel que tenha uma contribuição continuada nos
últimos 12 anos com um dos centros que esse painel vai avaliar. Ou a
unidade em causa é passada à segunda fase, com todas as suspeitas
que isso poderá levantar, ou a unidade não passa, como foi o caso,
e levanta dúvidas sobre a qualidade da investigação do coordenador
do painel. Principalmente quando este tem um melhor registo
bibliométrico das publicações em conjunto com os elementos da
unidade portuguesa do que no complementar dessas publicações no
mesmo período [3]. Aliás, duas das quatro publicações
selecionadas por esse coordenador para o exercício de avaliação no
Reino Unido em 2008 (RAE) são em co-autoria com membros dessa
unidade.
Esta avaliação está
em contradição com toda uma série de indicadores que incluem
não só os resultados das avaliações anteriores como os próprios
índices bibliométricos do estudo encomendado pela FCT e o Academic
Ranking of World Universities de 2014 [8]. Pode argumentar-se que
os índices bibliométricos são o que são e os rankings valem o que
valem. Mas quando todos vão no mesmo sentido devemos parar para
pensar.
Esta avaliação teria
sido condenada de forma impiedosa caso tivesse tido lugar nestas
condições num dos países que passamos a vida a dizer que devemos
imitar. Vimos que os argumentos utilizados para a defender são
semelhantes aos que foram mencionados pelo Ministro Britânico do
Comércio, Vince Cable, em Setembro de 2010, os quais foram alvo de
críticas arrasadoras por parte de cientistas e comentadores
britânicos [9].
Tudo o que sabemos até
agora já é mais do que suficiente para percebermos que a
implementação da visão da direcção da FCT foi catastrófica, e
está para além de qualquer recuperação possível – alguém pode
pensar que é possível levar a sério um processo de avaliação
que, para além de tudo o que foi apontado acima, está, na segunda
fase, a repetir os erros graves que teve até agora (painéis
reduzidos de não-especialistas que não foram instruídos sobre o
funcionamento administrativo das unidades de investigação e sobre a
sua integração nas universidades, os quais irão agora visitar
centros durante umas escassas horas, possivelmente mais quotas,
etc.)?
Mas, para além deste
processo de avaliação correr o risco de se tornar dos piores de que
há registo (não estamos apenas a pensar a nível nacional), podemos
ainda questionarmo-nos se, com um pouco mais de cuidado, teria sido
possível ter uma implementação menos incompetente que pudesse ter
levado a visão da FCT até ao fim?
Ou seja, será que o
problema esteve apenas na implementação, e de facto teria sido
possível efectuar um corte de cerca de 50% das unidades de
investigação financiadas pela FCT que, na prática, ocorreu, sem
que todo o processo se tivesse transformado num circo?
O casino FCT (I): a
primeira fase
Se é verdade que a
implementação da avaliação foi completamente condicionada à
partida pela decisão de impor quotas, e que o modo como tudo se
processou foi consequência disso, não foi por essas quotas terem
sido escondidas que as coisas correram mal – esse foi apenas um dos
vários passos na quebra de confiança que deveria existir entre a
FCT e as unidades de investigação.
O que é fundamental
percebermos é que, nas condições estabelecidas pela FCT, não
havia possibilidade de a avaliação cumprir a sua finalidade sem
cometer erros grosseiros com consequências negativas para um número
elevado de unidades cuja qualidade não está, para além de toda a
dúvida razoável, abaixo de outras que passaram à segunda fase.
Para compreendermos
melhor porquê, iremos utilizar o único índice bibliométrico
disponível que dá uma indicação do impacto da investigação
realizada de forma transversal a todas as áreas, permitindo uma
comparação entre as várias unidades: o Field Weighted Citations
(FWC). Este índice corresponde ao quociente entre o número de
citações recebidas e o número médio de citações recebidas para
publicações semelhantes. Um FWC igual a 1, indica que o conjunto de
publicações tem uma performance em citações que
corresponde à da média global na disciplina. Um FWC de 1,48,
corresponde a uma performance que é superior à média em 48%, tal
como um de 0,91 indica que teve menos 9% de citações que o esperado
– ver [17] para mais pormenores.
Aqui convém ainda não
esquecer que o factor de impacto (IF) é um dos índices utilizados
por pessoas como António Coutinho para referir o que chamam o fraco
impacto real de alguma da investigação portuguesa a nível
internacional – mas o que se deve utilizar é o FWC e não o IF,
não é Doutor Coutinho?
Chamamos à atenção que
não estamos a afirmar que este índice deva ser utilizado para
seriar unidades numa avaliação. A utilidade de índices deste tipo
é servir como auxiliar para complementar a experiência dos
avaliadores e permitir confirmar (ou não) os seus julgamentos.
Mas claramente o FWC
contém informação relevante – estamos a falar de um número
considerável de publicações e de unidades – e será usado como
uma métrica para vermos que o ponto de corte indicado pela FCT não
podia ter sido escolhido de pior forma.
Mais precisamente, o que
iremos mostrar é que ao forçar uma separação dramática num ponto
onde há o maior número possível de unidades, fez-se uma escolha
arbitrária que se revelou ser a pior possível e a qual transformou
o que devia ser uma avaliação num jogo de azar.
Comecemos por examinar o
histograma com o número de unidades com um dado FWC – ver Figura
1.
O FWC ao qual corresponde
um maior número de unidades é à volta de 1, ou seja, em torno de
unidades que estão na média internacional da sua disciplina no que
respeita ao impacto das citações.
Uma pergunta óbvia é
sabermos porque é que se quereria eliminar as unidades nessas
condições. Embora esse seja um ponto que permitiria uma discussão
interessante, somos da opinião que a direcção da FCT não fazia a
mínima ideia do que estava a fazer quando escolheu o número de 50%,
tendo-se baseado não na realidade da investigação em Portugal mas
na sua percepção dessa realidade que, pelo que se está a
verificar, parece ser algo deficiente.
O número de unidades em
torno dessa média é 59, tendo 132 unidades à sua esquerda (pior
performance neste índice) e 130 à sua direita (melhor performance
neste índice). Ou seja, é precisamente onde há mais unidades
semelhantes de acordo com o FWC que foi decidido fazer o corte.
Especificamente, se
tivéssemos utilizado o FWC para fazer a seriação, teríamos agora
de escolher 33 das 59 unidades que se encontram em torno do valor de
FWC igual a 1 para obter uma passagem de 50%, deixando as restantes
26 de fora. Tendo em conta o ruído subjacente a esta métrica (ou
outra qualquer, incluindo a resultante das opiniões de um painel), o
resultado de insistir numa separação neste ponto terá forçosamente
de cometer erros no que diz respeito aos critérios de qualidade que,
supostamente, estariam em jogo para a determinação de quais as
unidades a passar à segunda fase.
Vejamos ainda este mesmo
aspecto de uma outra perspectiva. Na Figura 2 indicamos as unidades
ordenadas por ordem crescente do FWC. Podemos ver que o ponto com FWC
próximo de 1 corresponde a uma das zonas com menor declive do
gráfico. O rectângulo a azul contém as 42 unidades com um FWC
entre 0,903 e 1,102.
Fazer uma diferenciação
entre unidades nesta zona corresponde a um processo aleatório.
Obviamente que, se um painel for obrigado a fazê-lo, conseguirá
fazê-lo, tal como qualquer um de nós. Mas os resultados deixarão
sempre muito a desejar e certamente não poderão nunca ser
robustos.
Vejamos agora qual foi o
resultado da selecção, na perspectiva de dois índices,
designadamente a dimensão das unidades e o FWC. Seria de esperar
que, a haver alguma correlação entre a passagem à segunda fase e
algum destes índices, isso sucederia no caso do FWC. Ou seja, seria
de esperar que as unidades que passaram à segunda fase tivessem uma
probabilidade de ter um FWC mais elevado.
Nas Figuras 3 e 4
representámos as curvas correspondentes à ordenação por número
de membros integrados e por FWC, indicando a azul e na parte superior
do gráfico as unidades que passaram à segunda fase, e a vermelho e
na parte inferior as unidades que não passaram à segunda fase.
Vemos que o que sucede é
exactamente o oposto do que seria expectável. Enquanto no caso da
dimensão das unidades, há muito poucas barras a vermelho do lado
direito do gráfico – a que surge isolada no fim corresponde ao
caso do Instituto de Telecomunicações - IT –, no caso do FWC não
há um padrão discernível, e vemos várias unidades com um alto
valor deste índice a vermelho.
Uma forma de quantificar
este aspecto é determinar a densidade de unidades que
passaram à segunda fase em vizinhanças de cada ponto. Mais
precisamente, para cada unidade consideremos as 10 unidades à sua
direita e as 10 à sua esquerda (os resultados são semelhantes se
considerarmos outras vizinhanças), e façamos uma média
considerando 1 para uma passagem à segunda fase e zero caso
contrário.
Os gráficos
correspondentes (Figuras 5 e 6) mostram que embora haja um
crescimento das densidades em ambos os casos à medida que se vai
aumentando o valor dos índices correspondentes, esse aumento é
maior no caso da ordenação por Integrated Members (IM) do
que por FWC. Em particular, próximo dos valores mais altos de cada
índice, as densidades são próximas de 0,85 e 0,6, para a ordenação
por IM e por FWC, respectivamente.
Passemos finalmente à
decisão da FCT de limitar o número de árbitros a apenas três
(dois externos e um interno), por oposição ao que estava nas regras
à data da submissão das candidaturas, que permitia um máximo de
cinco, e à comparação entre as notas atribuídas pelos diferentes
árbitros.
Como os resultados
parciais não foram disponibilizados pela FCT, a nossa análise está
dependente do número de dados que foi possível obter. Queremos
deixar aqui os nossos agradecimentos a todos os que participaram
activamente nesse processo, permitindo ter os dados correspondentes
às notas parciais de 129 das unidades de investigação ou seja, 40%
das que estão em avaliação.
Um dos pontos que já foi
aqui levantado [2] foi o facto de, se por um lado os árbitros
internos não eram especialistas em várias das áreas que avaliaram,
por outro foram eles que tiveram de cumprir a missão de eliminar os
centros até que só sobrassem 50%. Interessa, portanto, ver o que
sucedeu às notas dos dois árbitros externos, do interno e,
finalmente, do painel.
Comecemos por ver que as
variações entre notas não foram desprezáveis. Na Figura 7
indicámos o número de centros com uma dada variação entre as
notas máxima e mínima atribuídas pelos três árbitros.
Verificamos que em mais de 50% dos casos houve variações superiores
ou iguais a 5 pontos (em 17). Uma análise mais cuidada permite
concluir que, em cerca de 50% dos casos, há dois árbitros que
discordam na decisão de a unidade passar ou não à segunda fase –
nos casos disponíveis, apenas duas unidades tiveram como notas mais
alta e mais baixa 20 e 15; curiosamente, em ambos os casos a terceira
nota foi 18 e, ainda mais curiosamente, uma passou à segunda fase
e a outra não.
Os problemas associados a
este tipo de situação não se poriam se houvesse 5 árbitros, pois
aí seria, na grande maioria dos casos, relativamente fácil
determinar qual o outlier.
Mas os pontos
interessantes da comparação entre as notas do par de árbitros
externos, do árbitro interno, e do relatório dito de consenso não
ficam por aqui. Em [2] demos alguns exemplos onde a nota do árbitro
interno foi a que determinou a passagem ou não à segunda fase em
situações onde havia discrepâncias entre as notas neste ponto.
Será que esses exemplos eram significativos ou representavam, como
pretende a FCT, apenas alguns casos esporádicos?
Para apresentar essa
comparação de forma sistemática no caso da amostra disponível,
iremos comparar a média das notas do par dos árbitros externos com
a do árbitro do painel, e ver depois o resultado final – ver [2]
para saber como identificar os diferentes árbitros.
Concordância
entre notas
|
Discordância
entre notas: decisão sobre a segunda fase ditada pelos árbitros
externos
|
Discordância
entre notas: decisão sobre a segunda fase ditada pelo árbitro
interno
|
57,4%
|
13,2%
|
24,0%
|
Dos dados apresentados na
tabela torna-se claro que em quase 2/3 dos casos onde houve dúvidas,
os quais correspondem a 48 dos centros desta amostra, foi a nota do
árbitro interno que prevaleceu.
Isto é completamente
inaceitável principalmente se tivermos em conta que os árbitros
externos eram, por definição, especialistas da área da unidade em
consideração, ao passo que, tendo em conta o número reduzido de
especialistas em cada área em cada painel, na maior parte dos casos
os internos não o podiam ser.
Terão certamente notado
que as percentagens acima apenas somam 94,6%. A razão é porque há
ainda uma quarta categoria com 7 casos na qual a média das notas do
par de árbitros externos e a nota do árbitro interno apontam ambas
para uma passagem à segunda fase, mas em que isso não sucedeu. Se é
verdade que há alguns casos que se pode aceitar que seriam menos
claros uma vez que uma das notas de um dos árbitros externos é um
14, por exemplo, há três casos em que claramente o painel se
sobrepôs às notas dos três árbitros (18-16-17, 18-16-20 e
15-20-18).
Notemos finalmente que,
nesta amostra representativa, a percentagem de centros que passaram à
segunda fase foi de cerca de 62%, o que está dez pontos percentuais
acima do valor real. Seria certamente interessante ter os resultados
de mais centros por forma a obter dados algo mais equilibrados.
O casino FCT (II): a
segunda fase
Com o início da segunda
fase, recomeçaram também as irregularidades. Por exemplo, algumas
das visitas têm sido efectuadas com apenas três avaliadores,
quando na página 15 do regulamento original está especificado que
Each evaluation panel will be composed by 4
or 5 specialists of
internationally recognized merit and competence. The constitution of
the evaluation panels will take into consideration the number of
applications for each scientific area, a good gender balance as well
as a fair geographic and institutional distribution of evaluators.
The composition of the evaluation panels will be published in the FCT
website.
Sublinhamos que não é
apenas uma questão do número. Dificilmente os três avaliadores que
compareceram à avaliação podem ser apelidados de especialistas,
uma vez que tivemos, por exemplo, unidades de Matemática a ser
avaliadas por um grupo chefiado por alguém da área de física
molecular. Sendo os restantes dois elementos de duas áreas
específicas, como dificilmente podia deixar de ser, é difícil
imaginar como é que podem estar aptos a avaliar de forma séria
todas as unidades que visitaram. Tivemos também uma unidade de
Física de Partículas sem nenhum investigador desta área no painel
correspondente, e por aí fora, continuando o desfile de aberrações
a que esta avaliação já nos habituou.
Até agora, e tanto
quanto nos é possível perceber, a FCT não indicou a composição
dos painéis no seu site, embora desconfiemos que sejam apenas
diferentes permutações dos elementos dos painéis já conhecidos,
os quais não têm a mínima capacidade para avaliar algumas das
unidades a concurso. Estamos, portanto, assumidamente com um cenário
próximo do caso surrealista já mencionado em [2].
Antes de prosseguirmos,
não conseguimos resistir a mencionar aqui uma outra incapacidade que
os painéis terão, caso estejamos no cenário provável das
permutações mencionado acima. Em dois dos casos (painéis 1 e 2)
será completamente impossível cumprir a condição indicada
relativa ao “good gender balance”. Esta verificação não se
reduz apenas a uma curiosidade sem importância. Este ponto, menor
por comparação com tudo o resto, é simbólico do fosso que separa
a avaliação que foi apresentada pela dupla ESF/FCT e a que de facto
está a ter lugar. O que se verifica é que o que está descrito na
versão original das regras de avaliação não corresponde de forma
nenhuma ao que foi feito.
Voltemos agora a aspectos
mais preocupantes da segunda fase.
Exceptuando
(possivelmente) a direcção da FCT, há alguém que possa indicar
como é que se procederá à distribuição do financiamento no final
na segunda fase? Essa é uma das muitas peculiaridades desta
avaliação, e mais uma para a qual foi chamada a atenção da FCT
aquando da discussão do regulamento: quais são os critérios que
irão reger a afectação do financiamento em função dos resultados
da avaliação? [12-15]
Isto, combinado com o
facto de não ter havido limite no que uma unidade poderia pedir, faz
com que esta avaliação se pareça cada vez mais com um jogo de
casino do que com uma avaliação científica.
Não é provável que o
total pedido por todas as unidades que passaram à segunda fase seja
igual ao orçamento disponível – pelo contrário, se tivermos em
conta a tendência para exagerar nos orçamentos em situações
semelhantes, é de esperar que o montante total seja, de facto,
várias vezes esse orçamento.
Tendo em conta o que já
sabemos, não será de todo improvável sejam introduzidas novamente
quotas ou um outro processo dúbio qualquer, por forma a que a
distribuição dos fundos se adapte à visão a priori da
direcção da FCT.
Aestimatio Interrupta
(receberemos de bom grado
correções de um latinista a esta tradução do Google Translate!)
A lista de
irregularidades associadas ao processo em curso é, como temos visto,
bastante longa e inclui vários aspectos inaceitáveis.
A lista das críticas,
que teve início muito antes de serem conhecidos os resultados da
primeira fase, mas que ganhou proporções wagnerianas após a
publicação dos resultados, é também enorme e engloba a comunidade
das Ciências Sociais, várias sociedades científicas, a Comissão
Nacional de Matemática - CIM, o Conselho dos Laboratórios
Associados – CLA [16], o Conselho de Reitores - CRUP, o Reitor da
Universidade de Lisboa, etc.
Por outro lado, para além
dos seus responsáveis e dos infelizes comentários de António
Coutinho que já receberam resposta em [10,9], não houve até agora
mais ninguém que defendesse publicamente este processo.
Tendo tudo isto em conta,
há uma pergunta evidente a colocar à direcção da FCT e ao
ministro:
Que condições é que uma avaliação teria de satisfazer para
ser suspensa?
Mas já sabemos, pelo menos desde os tempos dos episódios de “Yes,
Minister”, que o melhor modo de convencer um político a não
avançar com uma medida é convencê-lo que se trata de uma acção
corajosa, que seria de facto o que seria necessário neste momento.
Por outro lado, uma grande parte das unidades está à espera para
ver o que é que lhes calha neste jogo, com a esperança que possam
ter mais ou menos o mesmo que até agora ou, particularmente no caso
das que têm informação privilegiada, mais do que tiveram
anteriormente. Ou que venha uma nova direcção para a FCT após as
próximas eleições, que desfaça alguns destes equívocos à custa
de remendos.
Como
consequência, há uma outra pergunta evidente para a qual não temos
resposta, mas, desta vez, ela terá de ser colocada às unidades de
investigação:
Numa avaliação como esta, que condições é que as unidades de
investigação estariam dispostas a aguentar até decidirem
recusar-se, em bloco, a participar na segunda fase?
Se as coisas continuarem
como estão, pensamos que só desta forma é que a comunidade
científica portuguesa pode sair deste processo de cabeça erguida e
com uma dose considerável de respeito próprio.
Caso contrário,
estaremos a falar de um aglomerado de unidades e de ex-unidades, cada
uma por si, com todas as consequências que isso irá acarretar para
a evolução da ciência em Portugal.
Estaremos a falar de
unidades que aceitam que um processo cheio de irregularidades
significativas dite o que se vai passar no financiamento da ciência
em Portugal nos próximos anos.
Estaremos a falar de unidades que estão disponíveis a deixar-se avaliar por não-especialistas e por uma gestão que parece estar a querer submeter a investigação no país a um conjunto de ideias pré-concebidas, faltando-lhe algumas competências e sensibilidades para cumprir a missão fundamental de que foi incumbida.
Estaremos a falar daquilo
que faz com que seja difícil à ciência progredir de forma
continuada num país que passa o tempo a cometer erros originais
quando tenta copiar os exemplos de fora.
Referências
[1] O
mistério da
avaliação da FCT, De Rerum Natura, 11 de
Julho de 2014.
[2] A
já-não-tão-misteriosa avaliação da FCT,
De Rerum Natura, 21 de Julho de 2014.
[3] Uma
irregularidade e um paradoxo, De Rerum
Natura, 24 de Julho de 2014.
[4] A
self-fulfilling prophecy, De Rerum Natura,
28 de Julho de 2014.
[5] O
mistério dos árbitros desaparecidos, De
Rerum Natura, 30 de Julho de 2014.
[7] Soluções
do passatempo
de
Verão FCT,
De Rerum Natura, 9 de Agosto de 2014.
[8] A
avaliação segundo Shanghai, De Rerum
Natura, 17 de Agosto de 2014.
[9] Our
mutual friends: sobre
a mediocridade e a falta de originalidade,
De Rerum Natura, 26 de Agosto de 2014.
[10] Carlos Fiolhais, O
Grande Podador: Os erros de António Coutinho,
De Rerum Natura, 12 de Agosto de 2014.
[11] Carlos Fiolhais et al., Facts
about the FCT/ESF science evaluation: the story so far,
De Rerum Natura, 29 de Agosto de 2014.
[12] Comunicação
do Conselho dos Laboratórios Associados (CLA) à FCT sobre avaliação
das Instituições de Investigação,
Março de 2013.
[13] Resposta
da FCT enviada ao CLA, 11 de Março de
2013.
[14] Reacção
do CLA à resposta da FCT, 17 de Março de
2013.
[15] Avaliação e
financiamento de unidades de investigação, Contributo da
Universidade de Coimbra, 13 de Março de 2013.
[16] Comunicado
do CLA
relativo ao processo de avaliação em curso pela FCT das Unidades de
Investigação, 25 de Julho de 2014;
tradução para inglês disponível aqui.
[17] Snowball
Metrics Recipe
Book, Junho de 2014.
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