Meu artigo recente no As Artes entre as Letras:
A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) declarou em 2009 que o
dia 5 de Maio passaria a ser o Dia da Língua e da Cultura Portuguesas. Passados
dez anos, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (UNESCO) proclamou esse dia como Dia Mundial da Língua Portuguesa. Foi
relevante para esse alargamento o papel do então embaixador português na UNESCO,
António Sampaio da Novoa.
Qual é o lugar da língua portuguesa no mundo? Na Wikipédia em português,
Portugal aparece em quinto lugar na tabela da entrada “Lista de línguas por
número total de falantes”, que contabiliza o número de falantes não só de
língua materna, mas também de segunda língua. Segundo a fonte usada, o
Ethnologue de 2021, 293 milhões de pessoas usam o português, 258 pessoas como
primeira língua e 35 milhões como segunda. À frente do português estão o inglês (1,4 mil
milhões de falantes, dos quais 370 milhões falantes de língua materna), o mandarim
(1,1 mil milhões, dos quais 921 milhões como língua materna), o hindi (600 milhões,
dos quais 342 milhões como língua materna) e o espanhol (543 milhões, dos quais
471 milhões como língua materna). Em todos os casos estão excluídas línguas
crioulas.
Se, porém, consultarmos a mesma página em inglês, encontramos dados já atualizados
de acordo com o Ethnologue de 2025. A língua portuguesa encontra-se no 8.º
lugar, com um total de 267 milhões de falantes, ultrapassada pelo árabe padrão
moderno (335 milhões) o francês (312 milhões) e o bengali (284 milhões). O
russo está perto do português, com 253 milhões de falantes. Na versão em
francês e em alemão da mesma página da Wikipédia, baseadas ambas no Ethnologue
de 2022, o russo está à frente do português. Podemos concluir que os falantes
de língua portuguesa que editam a Wikipédia (que são principalmente brasileiros)
não actualizam rapidamente a informação.
Sobre este assunto, pode-se consultar o Novo Atlas da Língua Portuguesa
(bilingue em português e inglês) da autoria de Luís Antero Reto, Fernando Luís
Machado e José Paulo Esperança, publicado pela Imprensa Nacional em 2016 com o
apoio do Instituto Camões e o patrocínio do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Aí, para além dos dados disponíveis na altura do Ethnologue, apresenta-se uma
estimativa própria dos falantes da língua portuguesa. O total, não contando,
com a diáspora dos países de língua portuguesa, é de 263 milhões. A base do cálculo
é 100% dos residentes em Portugal e Brasil, 80% dos residentes em Angola, Cabo Verde,
Guiné-Bissau. Moçambique, São Tomé e Príncipe, e Timor-Leste (estes são os países
da CPLP). É discutível se 100% dos residentes em Brasil em Portugal e Brasil falam
português, mas o número apurado está perto do da Wikipédia em inglês. O mesmo
livro avalia em 5,3 milhões o número de luso falantes na diáspora, dos quais
2,3 milhões são portugueses.
É curioso saber a evolução futura dos falantes. O referido atlas informa
que, no ano 2100, a população dos países da CPLP vai passar dos actuais 276 milhões
para 487 milhões. Este crescimento deve-se sobretudo ao aumento demográfico dos
países africanos. O Brasil vai ter em 2100 apenas 200 milhões de habitantes, um
pouco menos do que os 208 milhões de hoje, mas África vai ter um aumento notável
de 56 milhões para 276 milhões. Isto é, o centro da língua portuguesa de gravidade
da língua portuguesa vai estar não no Brasil, mas em África. O atlas também informa
que a língua que mais se expandiu desde 1500 foi precisamente a portuguesa. Em Portugal
havia nessa altura um milhão de pessoas a falar português e, se hoje há cerca
de 265 milhões, o crescimento foi de 1,2% ao ano. O inglês, embora hoje tenha
muitos mais falantes, só cresceu 0,93%, ao passo que o espanhol cresceu 0,8%.
O Novo Atlas da Língua Portuguesa é um repositório de dados interessantes
sobre a presença do português no mundo. Por exemplo, há dados sobre a presença
da língua portuguesa na Internet, em 2015: a primeira língua é o inglês, com
873 milhões de utilizadores, seguindo-se o mandarim, o espanhol, o árabe, e o
português, com132 milhões. Era, portanto, a quinta língua mais usada na Internet.
Nessa data, o Brasil era o quarto país do mundo com mais utilizadores da
Internet, só ficando atrás da China, da Índia e dos Estados Unidos.
O português é uma língua de ciência, embora o possa ser muito mais. Hoje, a língua de ciência global é, de longe,
o inglês. A língua portuguesa tem conhecido alguma afirmação no ciberespaço através
do portal SciELO - Scientific Electronic Library Online, um repositório
em acesso aberto de artigos científicos não apenas do Brasil, mas também de países
latino-americanos, como Espanha e Portugal (Portugal tem uma presença reduzida
nesse repositório, até porque tem muito menos investigadores que o Brasil).
Pelo seu tamanho populacional, o Brasil tem muito mais investigadores científicos
do que Portugal, mas existe um portal de acesso aberto em Portugal, o RCAAP - Repositório
Científico de Acesso Aberto de Portugal, que tinha, em 2016, 315 mil documentos.
Na minha opinião, uma das maneiras de alargar a presença da língua portuguesa
do mundo - mais do que apostar num grande modelo de linguagem com patrocínio governamental
– é a promoção da publicação em acesso aberto de artigos em português (ou
traduzidos do português para inglês, o que hoje a inteligência artificial
permite fazer facilmente). E, também, a digitalização de mais artigos do vasto
património cultural em língua portuguesa, que não tenham direitos de autor.
Orgulho-me de ter contribuído para isso através da criação do Alma Mater,
biblioteca digital de livro antigo da Universidade de Coimbra. Mas muito mais
pode ser feito neste domínio…
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