sexta-feira, 4 de junho de 2010

SÓ E MAL ACOMPANHADO


Minha crónica no "Público" de hoje:

Nunca José Sócrates esteve tão só. E há boas razões para ter sido votado ao abandono pelo eleitorado, como é manifesto nos números de sondagens recentes. Nós demos-lhe, nas últimas eleições legislativas, o benefício da dúvida. E ele, à semelhança aliás do que aconteceu em eleições anteriores com outros primeiros-ministros, deu-nos, em troca, o malefício da dívida. Não, o país, há muito endividado e sem força anímica, não mudou. E a governação do país também não. Ainda está para nascer um político que, nas vésperas de ir a votos, nos fale a verdade. E nos fale dos juros verdadeiros em vez de nos encher de juras falsas.

O primeiro-ministro japonês, Yukio Hatoyama, acaba de anunciar a sua demissão, ao fim de oito meses de governação, alegando que as pessoas “deixaram de o ouvir”. Entre nós é notória uma quebra de confiança com contornos semelhantes, que vem agravar os nossos males tanto externos como internos. Quando ouvimos o nosso primeiro-ministro dizer – e foi há muito pouco tempo - que não ia subir os impostos e hoje o vemos faltar à palavra dada, ainda por cima com efeitos retroactivos, ficamos na dúvida se amanhã não vai ser pior. No Parlamento ou noutro sítio raramente tem apresentado argumentos seguindo uma linha coerente, antes se limitando a invectivar os adversários (uma táctica que obviamente não resulta quando não se tem a maioria absoluta). Da última vez não esteve sequer a defender o agravamento fiscal, deixando só o ministro das Finanças. Em clara fuga à solidão doméstica, entrou num ziguezague no estrangeiro. Não é apenas penoso ouvi-lo falar portunhol em Madrid, também o é vê-lo, mais uma vez, em Caracas, a vender computadores Magalhães ao seu amigo Hugo Chávez. No Rio de Janeiro, primeiro pediu um cafézinho e um bate-papo a Chico Buarque (podia ter mandado uma mensagem: “Meu caro amigo me perdoe, por favor / Se eu não lhe faço uma visita / Mas como agora apareceu um portador / Mando notícias nessa fita (...) Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta.”) e depois retirou um convite para jantar a Caetano Veloso. E quem se anima por sabê-lo em Marraquexe a exportar para Marrocos o TGV que não temos nem vamos ter tão cedo, porque a Espanha deve entretanto adiar o projecto?

Hatoyama saiu por causa da manutenção de uma base militar, que ele na campanha eleitoral tinha prometido transferir, e por causa de casos indecorosos que abalaram correligionários seus. Uma questão de honra, portanto. Mas, por aqui, nem falsas promessas nem escândalos fazem cair governos. O primeiro-ministro português está só, divorciado do país por causa das falsas promessas. Mas está também mal acompanhado, como transparece dos vários escândalos que o atingem. Uma das suas companhias é um deputado que, qual vulgar carteirista, surripiou gravadores a jornalistas em pleno Parlamento sem ser alvo de qualquer censura por parte dos seus pares. Outra das suas companhias é um ex-bancário e agora banqueiro que o informava por SMS, em tempo real, das saídas dos locutores numa televisão privada. Outra ainda das suas companhias é o secretário de estado do Emprego, que, formado nas mentiras do “eduquês”, não aceita as estatísticas da União Europeia sobre o desemprego, negando a aflitiva realidade dos cada vez mais portugueses sem trabalho. Os três, apesar dos escândalos, mantêm os seus chorudos empregos (o informador continua a receber um salário de truz, apesar de o banco o ter suspenso de funções). Poderá dizer-se que são pequenas ofensas aos bons costumes comparadas com as dos japoneses. Há-as, porém, aqui bem maiores, algumas com afloramentos nos casos apontados.

Sócrates encontrou lenitivo para a sua solidão no “tango” com o novo líder da oposição. Estará, desta vez, em boa companhia? O que sucederá no fim da dança? Muitos eleitores, conhecedores do comum tirocínio nas juventudes partidárias e da comum licenciatura em universidades privadas, receiam que o futuro primeiro-ministro não seja muito diferente do actual. Oxalá estejam enganados.

15 comentários:

José Batista da Ascenção disse...

E que dizer de tribunais que aceitam objectos roubados como elementos de processos desencadeados pelos próprios larápios? Alguém me explica que leis o permitem? Já não falo da ética...
A minha impressão é que Portugal é um país eternamente inviável, por predominarem nele os aldrabões, perante a indiferença de quase todos os restantes, com particular destaque para os agentes da (in)justiça.
Foi assim. É assim.
Mas precisamos que deixe de ser assim. Como?

Anónimo disse...

Efectivamente, "dize-me com quem andas e dir-te-ei quem és"! JCN

margarida disse...

...esta foto é um nadinha sinistra...
Brrrrrrr...

O quanto ao resto (que é quase tudo), que fazer?
Começa a não sobrar nada, a não ser a alienação.
-Mais? - dir-se-á.
Mais.
Porque sobre 'revoluções' estamos conversados.

Fartinho da Silva disse...

Houve quem tivesse dito a verdade e o resultado foi o país ter dado guarida ao vendedor de magalhães, de populismo, de facilitismos, de dívida, etc..

Julgo que uma boa parte do país se revê na personalidade do primeiro ministro, que em boa verdade não ganharia eleições em nenhum outro país da zona euro e talvez ganhasse apenas na América Latina.

Infelizmente estou certo que a alternativa a este inacreditável primeiro ministro é o seu clone...

Anónimo disse...

josé baptista
votar em branco massivamente, já que desenterrar o buiça não valerá de nada

Abundância no Presépio

platero disse...

para JNC
que me pedia uma quadra popular
:
ou passamos em primeira
por cima do raio da crise
ou faz ela de nós esteira
cilindrando-nos em "prise"

Krazny disse...

Atendendo à totalidade do seu capital humano temo concluir que Portugal é inviável.

Isto porque a maioria da sociedade venera o facilitismo e impera entre nós o culto da estupidez.
Porque Portugal é o culminar civilizacional de tráfico de influências e corrupção, deve ser o único ponto de excelência que temos.
E finalmente porque alguém honesto e trabalhador vê-se diluído e impotente face à situação envolvente.

O problema de Portugal advém da falta de valores da maior parte da sua população, da sua indiferença e conformismo. A irresponsável e triste governação é o espelho da nossa sociedade em última análise.

Resolução?

Reformas profundas, construir do zero um sistema que funcione e bem pensado, sem poleiros e claro está pôr muita gente na gaiola...
Porque para mim Portugal é um doente com cancro terminal e estamos só a prolongar-lhe o sofrimento com mezinhas

Anónimo disse...

Estou fartinho do argumento "isto só em Portugal, noutros países não poderia acontecer". Quanto à mentira, vejamos. Bush mentiu conscientemente a respeito das armas de destruição massiva. Iniciou com esse argumento uma guerra em que morreram mais americanos inocentes do que nas torres e quanto a iraquianos nem se fala. Não foi demitido por isso, foi reeleito. Durão Barroso viu as provas...em consequência a Europa promoveu-o a Presidente. O argumento de isto só em Portugal é muito utilizado por intelectuais convencidos de que eles é que sabem mas os eleitores, coitados, não sabem votar e, pior, deixam-se manipular e frequentam as manisfestações que não devem. A realidade é que está torta, eis uma atitude nada científica. Quanto a Sócrates. Não é uma figura das minhas simpatias políticas mas tenho de reconhecer que o seu desgaste se deve principalmente a uma campanha dos media que descobrem coisas em que ele anda metido mas nunca se prova nada. E quem não gosta dele (ou parte dos que não gostam dele, eu não uso esse argumento) acaba por dizer: se tanto se diz, algo é verdade, faltam é as provas.

Anónimo disse...

Os tribunais aceitam objectos toubados!!!!!Portugal eternamente inviável.
Gosto deste blogue pelas suas tiradas humorísticas.
Predominam nele os aldrabões!!!! Quem o diz lá sabe. Incidentalmente eu conheço alguns mas poucos. Mas que os há, há.

Anónimo disse...

"é um deputado qual vulgar carteirista...". Quem escreveu isto sabe muito bem que não é verdade. Pode não se aprovar pode-se condenar o que ele fez mas a comparação com um vulgar carteirista não merece comentários porque não tem nada a ver com arealidade. A não ser que o autor não saiba o que é um carteirista. Mais as afirmações dos media estão a ser tomadas como realidades...(as informações de Vara, etc. as conversas privadas).
É óbvio que não há seriedade e só se pretende dar continuidade à falta de rigor que abunda na imprensa e etc. Com este método a Física não seria uma Ciência mas somente um catálogo de insultos dirigidos à natureza por não se conformar com o que eu penso...

Anónimo disse...

Só mesmo em Portigasl é que se vêem disparates como os defendidos pelo anónimo das 17:44. Por isso é um país subdesenvolvido.

Anónimo disse...

Eu não gramo o Sócrates mas este post é completamente ridículo num blogue dedicado à divulgação de ciência. Porque isto é propaganda política e isso não devia ser, aqui, permitido. Ou a intenção de voto já é regida por alguma ciência?!
Ainda por cima é um post de propaganda mas da fraca, e eu nem me vou cansar a rebater algumas coisas ridículas que estão no post, apesar de, como já disse, não gramar o Sócrates.
Ó Carlos, com estas modas que há em Portugal (em que qualquer pessoa com um bocadinho de exposição nos média acha que já é um craque em tudo, um maioral), qualquer dia estás a escrever crónicas de bola para o Record! Vê lá se não te olhas tanto ao espelho.
luis

Anónimo disse...

Para PLATERO... em reciprocidade:

A sua quadra que, atento,
me dedicou sem tardar
tem muitíssimo talento
que me é grato destacar!

JCN

Anónimo disse...

Anónimo das 00:40
O problema é que o Carlos depois de dar nas vistas pretende agora uma carreira política sem ter de suibir num partido das bases até ao cimo. E começa a debitar opiniões na área política...veremos o resultado.

joão boaventura disse...

Em 1883 Oliveira Martins escrevia:

"Ora eu desafio quem quer que seja a provar-me o nosso progresso intelectual e moral. Eu vejo - não vêem todos? - uma decadência no carácter e uma desnacionalização na cultura."

Em 2883 Portugal festejará o milenário desafio de Oliveira Martins, que não terá tido quem lhe tivesse provado o contrário.

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