terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

UMA REFLEXÃO EM TORNO DA POESIA

Por Galopim de Carvalho
 
Dei por mim, há dias, a folhear uma antologia com obras dos mais distintos poetas portugueses deparei-me, com este “Entre os teus lábios” de Eugénio de Andrade, figura maior da poesia portuguesa contemporânea, de entre os mais lidos e traduzidos, de entre os mais premiados, mas, ignorância minha, não a sei apreciar. Que me desculpem os entendidos. Não me diz nada. Eis o poema que li:
Entre os teus lábios
é que a loucura acode,
desce à garganta,
invade a água.
No teu peito
é que o pólen do fogo
se junta à nascente,
alastra na sombra.
Nos teus flancos
é que a fonte começa
a ser rio de abelhas,
rumor de tigre.
Da cintura aos joelhos
é que a areia queima,
o sol é secreto,
cego o silêncio.
Deita-te comigo.
Ilumina meus vidros.
Entre lábios e lábios
toda a música é minha.
Li, depois, ”Em todos os jardins”, da grande Sophia de Mello Breyner, outra figura maior da poesia portuguesa contemporânea e, não obstante, a minha atrás confessada ignorância, digo que é desta poesia que realmente gosto. Não me permito qualificar, digo apenas que esta me diz muito, que me enche a alma, enquanto que a outra pouco ou nada me diz. Eis o poema de Sofia.
Em todos os jardins hei de florir,
Em todos beberei a lua cheia,
Quando enfim no meu fim eu possuir
Todas as praias onde o mar ondeia.
Um dia serei eu o mar e a areia,
A tudo quanto existe me hei de unir,
E o meu sangue arrasta em cada veia
Esse abraço que um dia se há de abrir.
Então receberei no meu desejo
Todo o fogo que habita na floresta
Conhecido por mim como num beijo.
Então serei o ritmo das paisagens,
A secreta abundância dessa festa
Que eu via prometida nas imagens.
Comecemos, então, por dizer que a palava “poesia”, com raiz no termo grego poíesis, alude à acção de fazer alguma coisa, nos chegou através do italiano, poesia. Na minha ignorância sobre tão importante e delicado tema, atrevo-me a dizer que aprecio, sobretudo, a poesia entendida como um género literário caracterizado pela composição em versos estruturados de forma harmoniosa, que eu diria, musical.
 
À falta de competência para caracterizar a poesia de que estou a falar, exemplifico com a de Camões, de Bocage, a de muitos poetas do século XIX, como Cesário, Antero e Garret, e alguns do século que passou, como Torga, Gedeão, Florbela, Aleixo e Ary. Estas e muitas outras que ficam por citar, são, para o meu gosto, manifestações de beleza e estética, criadas com palavras.

É a que mais fácil e belamente entra na minha sensibilidade. Fiquei amarrado a um tipo de poesia marcada por elementos formais, como a rima, o ritmo, em versos e estrofes que lhe definem a métrica. É, porque a entendo, a susceptível de me despertar os mais variados sentimentos.

Ao longo da História, a poesia, seja ela a que, na minha ignorância, chamarei de antiga, seja a que se diz moderna, que não me atrai, tem sido usada como uma forma literária de expressar os mais variados sentimentos, como o amor, a felicidade, a dor, a solidão, a tristeza, a saudade, entre muitos outros. 

Não acompanhei o desenvolvimento ou, melhor dizendo, a transformação da poesia ao longo do século XX. Fala-se de poesia moderna, na qual, se destacam elementos do modernismo e do chamado pós-modernismo. Trata-se de uma matéria que não domino. Só sei que, na poesia, o autor tem liberdade para definir o seu próprio ritmo e criar as suas próprias normas. Só sei que nela os versos não têm de ter rima obrigatória, nem seguem nenhuma métrica. 

É senso geral que só se gosta daquilo que se conhece e é, talvez, só por isso que a não sei apreciar. 
 
Galopim de Carvalho

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