Por Maria Helena Damião e Isaltina Martins
You go to school, you go to learn, you go to create those
friendships,
you go to speak to people and socialise and you go to get
educated –
you don’t go to sit on your mobile phone or to send messages
whilst you could actually talk to somebody.
Gillian Keegan, Secretária de Estado da Educação (aqui)
Em traços gerais, as notícias dizem que o Reino Unido irá legislar a restrição de telemóveis nas escolas do país, tanto por parte de alunos como por parte de professores. O principal argumento é que a escola precisa de se concentrar nas suas funções educativas, as quais requerem a comunicação interpessoal e presencial. Nada de novo, nem de revolucionário, apenas sensibilidade a conhecimento digno de crédito, e bom-senso.
A restrição, que pode chegar à proibição, já está, de resto, em vigor num número significativo de escolas inglesas por iniciativas destas. O mesmo acontece em diversos países do continente europeu, incluindo Portugal.
E, em casos urgentes? Usam-se os meios de comunicação disponíveis na escola, incluindo os telefones que lá existam. As escolas não ficam, portanto, isoladas do mundo.
2 comentários:
O uso exagerado e despropositado dos telemóveis, em contexto de sala de aula, mas também intra e extramuros das escolas, é um dos sintomas mais graves da doença que corrói a educação em Portugal, no meio de projetos delirantes e indisciplinas geradoras de grande violência.
O Secretário-geral do Partido Socialista, Doutor Pedro Nuno Santos, concordando com o Presidente do Partido Social Democrata, Doutor Luís Montenegro, de que as provas de aferição são o meio mais eficiente e fidedigno de sabermos como vão "as melhorias das aprendizagens" em Portugal, atirando com os exames nacionais para o caixote do lixo da história, é de opinião de que o exército de mais do que 120 000 professores e educadores de infância não chega para dar de mão beijada a escolaridade obrigatória, do ensino minimalista das aprendizagens essenciais, a todos, todos, todos os cidadãos, assim que completem os dezoito anos de idade. A receita inovadora, em sede de recrutamento de professores, é atrair com estágios remunerados, com se fazia há mais de quarenta anos, novos profissionais, e obrigar os velhos, com mais de 60 anos, a permanecer, em contexto de sala de aula, no meio dos telemóveis a apitar, até aos 70 anos... Até ver!
Entendamo-nos, se querem um ensino levezinho não são necessárias tantas disciplinas, nem tantos professores.
Já para um ensino sem professores, só com Animadores Culturais e Inteligência Artificial, haver um, ou mais telemóveis, por cada aluno, em contexto de sala de aula, parece-me adequado.
O problema dos telemóveis, faz parte do problema mais geral da indisciplina e violência em contexto escolar. Enquanto não houver coragem política para enfrentar, primeiro, e começar a resolver, depois, o problema gravíssimo da indisciplina , os telemóveis continuarão a tocar alto dentro das salas de aula.
Há dois dias, a 20 de fevereiro de 2024, saiu uma notícia no jornal Público intitulada “Reino Unido vai proibir telemóveis nas escolas. Em Portugal, decisão está nas mãos dos directores”. O subtítulo referia “Directores concordam que é preciso impor regras à utilização dos telemóveis — e reconhecer que estão a causar problemas de aprendizagem e socialização —, mas ninguém é a favor de uma medida nacional”
Não entendi. Os diretores reconhecem que os telemóveis estão a causar problemas de aprendizagem e socialização, mas recusam uma medida determinada em todo o país? Existirão circunstâncias e ou contextos onde isso não se verifique? Se existem Filinto Lima e Manuel Pereira não os revelaram. “…, o Ministério da Educação português não deve optar por uma «regra universal», dando antes às escolas aquilo que estas tanto reclamam: autonomia. A melhor opção será a sensibilização, o diálogo com os alunos”. Primeiro, para Filinto Lima a importância da adoção da medida é menos relevante do que a autonomia das escolas. Para este, conceder autonomia às escolas deve sobrepor-se ao critério pedagógico. Fazendo jus à sua circunstância de político, Filinto Lima entende, ainda, que os alunos deverão ser consultados. Se fosse pedagogo não teria qualquer problema em assumir a proibição. “Proibição: ato autêntico que protege a criança dos perigos, para ela ainda desconhecidos. (…) Não há nada pior para uma criança do que o facto de não ter limites. A ausência de limites assemelha-se a maus-tratos” (i).
Na mesma notícia Manuel Pereira salienta que “proibindo ou permitindo, é preciso regular a utilização dos telemóveis nos espaços escolares”. Como se proibindo fizesse algum sentido regular a sua utilização. Mais à frente o diretor refere que na escola que dirige “a utilização dos telemóveis não é permitida, sendo que os alunos continuam a poder trazer estes dispositivos para o recinto escolar – regra que tem sido cumprida pela maioria dos estudantes”. Para fraseando Delaroche, “Quando a proibição formulada é equívoca ou ambígua, as crianças e os jovens têm dificuldade em perceber a convicção de quem a decretou. Qualquer afastamento entre o que é dito e o que é feito torna-se fonte de confusão e está na origem de uma verdadeira perturbação nas crianças e jovens. Uma proibição que não faz prova da sua realidade desqualifica-se e torna-se rapidamente, e de forma absoluta, ineficaz”.
Ainda mais à frente na notícia ficámos a saber que numa escola dos Açores, “a interdição não se aplica aos professores e auxiliares, embora a associação entenda que os docentes devem ser os primeiros a dar o exemplo”. Ora, sobre este assunto recorro novamente aos ensinamentos de Delaroche: “É difícil obter de outrem aquilo que não se impõe a si próprio (servir de exemplo). Mas esta observação é perigosa. A sua extensão a outros comportamentos pode ser mesmo catastrófica, pois nega simplesmente a diferença de idade e perverte o princípio da educação. Na verdade, já não há educação se reinar a igualdade democrática entre neófitos e adultos na escola”.
Concluindo, “a proibição, que não deve ser confundida com punição, é essencial na educação (não há educação sem proibição), na escola e na vida em sociedade” (i). “As crianças e jovens têm uma percepção do risco diferente dos adultos, com tendência a minimizá-lo. O papel do adulto responsável será o de alertar sem estigma, o de criar proximidade sem receio de definir limites” (ii).
(i) Delaroche, P. (1996). Aprender a dizer não. (M. M. Laura, & J. M. Silva, Trads.) Paris: Éditions Albin Michel.
(ii) Sampaio, D. (2009). Porque Sim. Editorial Caminho. Lisboa (2ª Edição).
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