quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

A mágoa de Guerra Junqueiro


Em 1904, Guerra Junqueiro confessou a Raul Brandão que entrevira a dissociação dos átomos e a radiação universal. Esta passagem está nas memórias do escritor de Húmus.
«– As últimas descobertas modificaram completamente a ciência. Foi um terramoto. E eu entrevi isto mesmo: há anos que chegara ao seguinte resultado: – radiação universal e dissociação dos átomos. Fiz experiências que me deram resultados incompletos, procurei homens de ciência que não me quiseram atender. Um dia vim de propósito a Lisboa falar a Sousa Martins e expus-lhe as minhas teorias. Ouviu-me… Quando me fui embora encolheu decerto os ombros. E, no entanto, passados anos, vejo confirmado experimentalmente tudo o que previra… Que quer?... Faltava-me, como compreende, meios de verificação. Precisava de factos.»
Guerra Junqueiro, como é óbvio, referia-se à descoberta dos raios X por W. C. Röntgen; à descoberta do eletrão por J.J Thomson; à verificação da emissão de uma nova radiação pelo átomo de urânio nos cristais de sulfato duplo de potássio e uranila, por A. H. Becquerel; à confirmação de Marie Curie da nova radiação não só no urânio mas também no tório, comportamento ao qual chamara de radioatividade; à descoberta da radiação β e da radiação α por Ernest Rutherford; à descoberta da   radiação ɣ  por Paul Villard e à fórmula de Max Planck para a emissão de energia de um corpo negro.
Desconheço os trabalhos científicos de G. Junqueiro para provar a sua ideia de que toda a matéria se reduzia a luz, a estados de energia, e que está bem presente na Oração à luz.

Oração à luz (fragmentos)
(…)
O mundo, ó luz, te absorve e te devora,
Mas revives no mundo mais intensa,
Mais próxima de Deus a cada hora,
Nas vidas todas d’ esta vida imensa,
Vidas sem fim, almas sem fim,
Que o segredo do amor junta e condensa,
Por meus olhos magnéticos, em mim!

Lampejam no meu corpo, humanizadas,
Mortas constelações e mortas alvoradas.

Desde que a vida me gerou em dor,
E fui éter, estrela, água, montanha e flor.
(…)
Todo o meu corpo é luz esplendorosa,
Sou um hino de luz religiosa,
Gravitando na orbita de Deus…
Milhões d’ auroras riem do meu canto,
Ondas d’ estrelas brilham no meu pranto,
Pélagos de luas há nos olhos meus!…
Esta carne, este sangue, esta miséria,
E este ideal imortal que me conduz,
Já foram brasas na amplidão etérea,
Por isso exultam devorando a luz…

1 comentário:

Cláudia da Silva Tomazi disse...

Um homem desta envergadura (bandeira ao vento) prova a dimensão o saber.

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