domingo, 12 de abril de 2020

MELANCOLIA VIRAL EM DECASSÍLABOS MURCHOS

Novo poema de Eugénio Lisboa: 

"Beijo na face
Pede-se e dá-se"
(João de Deus)

… isto é, dava-se e não só na face:
desorbitado, às vezes, desviava-se
p’ra outras paragens, nova sintaxe,
outras sondagens – e rebobinava-se
com ímpeto renovado. Mas agora,
em tempo de peste que nos assola,
só pensa o desgraçado em dar o fora:
o vírus malvado empata e isola!
Campo de flores, dizia o poeta
João de Deus: nem flores nem amores,
que o vírus não deixa e só a dieta
nos pode salvar de outros horrores.
Beijo na face pedia-se e dava-se:
agora, menino, o desejo trava-se!

Eugénio Lisboa,


Que pede desculpa ao grande poeta do
Campo de Flores, por esta humílima sequela
a um seu célebre poema.

1 comentário:

Carlos Ricardo Soares disse...

A melancolia é a história que não se pode contar, que não se é capaz de contar, que nenhum poeta ainda foi capaz de contar, mas que um dia, acreditamos, será possível que deus nos conte, para salvação e conforto dos vivos.
O historiador não precisa da melancolia para nada, nem o físico, nem o matemático...
Até devem isentar-se dela.
Os protagonistas da história (a história tem os seus protagonistas) morrem dela, da solidão dela. Vasco da Gama? Aposto. Pedro Álvares Cabral? Ainda aposto mais. Camões? Morreu dela, muito antes de morrer.
Ainda (ou também por isso) que ele tenha nascido no ano em que Vasco da Gama morreu, na Índia...
Esta peste é o quê?, comparada, por exemplo, com a que grassava em Lisboa, que protelou o desembarque de Camões, regressado da Índia, após longa ausência de dezasseis(?) anos, desgraçado, embora com um poema muito trabalhoso, heróico, debaixo do braço, como penhor de uma vida sacrificada ao ideal, como caução do infortúnio luso/português, personificando a derrota de ganhar o céu descendo aos infernos sem conceder o incrível vigor e heroísmo com que relegou Deus e o Diabo do mérito e da grandeza dos feitos dos portugueses. Não obstante, Deus e o Diabo trocaram palavras de amor e riram com indiferença.

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