quinta-feira, 23 de abril de 2020

AMOR VIRTUAL - II - VARIAÇÕES SOBRE UM SONETO CAMONIANO

Mais um poema do meu amigo Eugénio Lisboa:



Amor é fogo que arde só ao longe
É ferida que dói e que se sente.
É um contentamento só de monge
É promessa doce que logo mente!


É um querer igual a não querer
É um comer que come sem comer
É um contentar-se em não colher
É um cuidar que se ganha sem arder!


É querer não estar preso e solitário
É sonhar que é sonhando que se tem
É só saber aguentar o fadário


Na esperança de o vírus acabar
É amar com as regras ao contrário
É cuidar que se frui sem se roçar!



Eugénio Lisboa,

pedindo desculpa ao grande Vate, por se apropriar

de um seu soneto justamente célebre, para fins medi-

cinais, muito necessários neste momento de grande solidão.

2 comentários:

Carlos Ricardo Soares disse...

Sem deslustro para o Eugénio Lisboa, que escreve como um grande artista que é, e porque estes tempos não animam, recordo o isolamento, nas maiores dificuldades, de Camões, naquele espaço de Macau, um bocado de deserto e talvez uma gruta, com a Índia tão longe e, talvez, compadecendo-se daqueles que, sobrevivendo com Vasco da Gama, se demoraram mais de quatro meses pelo Índico, numa viagem de regresso que, à ida, demorou apenas 23 dias. Os que não sobreviveram ao escorbuto e à loucura, tiveram uma viagem mais curta. Mas não é a duração, nem o espaço da viagem que dá mais razão à esperança ou à ilusão. O ânimo não está tanto na perspectiva da continuidade quanto na da mudança para melhor. E outra não era a perspectiva de que estavam animados os navegadores, com Vasco da Gama, à cabeça.
Camões tinha a noção vívida de que a história do seu tempo, por não ser uma história de desgraças e de indivíduos sobreviventes, seria a melhor forma de os exaltar.

Ena, tanta cópia! disse...

Amor não é fogo, mas arde ardente
Não é ferida que dói, mas sente-se a dor
É um contentamento permanente
Num descontentamento ainda maior

É um querer ir sem estar nem ser
É ter medo de chegar e logo partir
É um sentimento de querer pertencer
Um não pertencer, nem querer sentir

É sonhar sem tempo, lugar ou fim
Querer ser no outro, o outro de mim
Alguém que possa ser eu e não ser

Amor é eterno se não acontecer
Vislumbre de paraíso a renascer
Num infinito vazio e ficar assim

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 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...