sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

O Naufrágio do Serviço Nacional de Saúde

Meu artigo de opinião publicado hoje no "Diário as Beiras": 

“Tudo o que sucede, sucede por alguma razão” 
(Gabriel Garcia Marquez). 

Lia-se, há dias, no "Observador": "O presidente da União de Misericórdias deixa um aviso: Se o Governo não aumentar as comparticipações por utente já em Janeiro há unidades em risco de fechar". No que respeita à prestação dos cuidados de saúde prestados pelas Misericórdias aos deserdados da fortuna (vulgo, pobres), tem ela raízes profundas no Estado Novo. Sei do que falo, meu sogro médico e outros colegas prestavam essa assistência “pro bono”, isto é, como se diz na gíria, “de borla”!

Esta notícia do “Observador” é uma gota de água no "mare magnum" de notícias que circulam nos media sobre a morbidez do SNS e uma prova do egoísmo nacional para quem os problemas da saúde só interessam quando a doença bate à porta de um ilustre cidadão com todo o cortejo de infortúnio que traz. 

Qual a moral, portanto, em o Governo Socialista “chorar lágrimas de crocodilo” despreocupado, que está, com o estado de saúde de todos os portugueses deixando correr o marfim de um “elefante branco” que conta com o sacrifício de uns tantos médicos e enfermeiros do SNS em doação a quem sofre.

Num mundo de egoísmo, será que o Governo pensa com o seu apertar da bolsa ao SNS encontrar em cada canto um médico alemão, Albert Schweitzer, que foi para o Gabão para se entregar de alma e coração aos seus leproso? Ou deparar-se em cada esquina com uma enfermeira inglesa, Florence Nighingale, que na Guerra da Crimeia tratava de soldados vítimas de cólera, doença que ceifava vidas sem conta e altamente contagiosa? 

Passa-se isto num país em que os escândalos que impendem sobre a administração dos dinheiros do erário público, destinados ao SNS e à Saúde Convencionada, passam ao largo de um navio que se afunda levando consigo no porão doentes que gritam por SOS sem que ninguém os ouça. Muito menos, os acuda!

E neste naufrágio, sem simples boias para náufragos, conhece o SNS ondas alterosas do tipo da Nazaré por continuarem a serem assinadas convenções com grandes grupos económicos em modalidades convencionadas por pequenas clínicas mesmo que chegam para as encomendas, correndo, “ipso facto”, o risco de desaparecerem por passar a vigorar a lei do mais forte, em que os tubarões engolem os peixes mais pequenos.

Então os médicos que trabalham em clínicas sobreviventes passarão a ser pagos com honorários semelhantes aos do SNS, mas com a exigência que o “patrão", ditar. Só então o SNS sairá do estado de coma com médicos sem ser em fuga porque mal pagos em instalações hospitalares carenciadas de tudo e mais alguma coisa!

Trata-se esta minha intervenção, mais do que uma crítica ao correr da pena, de um SOS para que os pobres e remediados não continuem a esperar anos e anos por uma simples consulta da especialidade no SNS ou já tenham morrido quando finalmente chega um ofício a anunciar não a ansiada operação cirúrgica, mas uma espécie de segunda certidão de óbito!

2 comentários:

Rui Baptista disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Rui Baptista disse...

Com a devida vénia, transcrevo o parágrafo final de um artigo do médico Nuno Parente, no "Observador". Declaro que só hoje dele tomei conhecimento por encontrar semelhança entre certidão de óbito e marcha fúnebre do SNS.Ou seja essa semelhança é pura coincidência!

"O descrédito da população, a precariedade do público (porque não seguir o exemplo das recompensas na magistratura?), os convites do privado, a desertificação local na assistência, a falta de compromisso e cooperação entre os diferentes níveis de cuidados de saúde são algumas das notas que tocam a marcha fúnebre do SNS".

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