segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

"As novas tiranias"

Na continuação de textos anteriores (aqui e aqui) reproduzo um extracto do livro de Adela Cortina - Hacer reforma. La ética de la sociedad civil (1997), páginas 123-125 - muito esclarecedor acerca das opções axiológicas que temos vindo a tomar no respeitante à educação dos mais jovens.

Passados vinte anos (a primeira edição do livro é de 1994), as palavras desta filósofa espanhola não se desactualizaram nem, de modo muito particular, a recomendação que faz aos educadores: "é conveniente ponderar bem a «lista de valores» em que vamos basear a educação."

"Educar tem sido sempre uma tarefa partilhada e é-o cada vez mais. Não é apenas a escola que educa, mas também a família, o grupo de amigos e os meios de comunicação. Neste conjunto importa reconhecer (…) que a família e escola vão perdendo influência por comparação com o grupo de amigos e, claro, por comparação com os meios de comunicação.

Este dado é da maior importância para qualquer intento de educar as pessoas em autonomia e em solidariedade porque podemos estar a esforçar-nos para que, pouco a pouco, as crianças se comportem de forma autónoma em relação aos seus pais e professores, e se submetem à tirania do grupo de amigos e dos meios de comunicação.

Porque (...) há diferentes modos de tirania, e pode muito bem acontecer que uma criança acolha melhor o que ouve na televisão ou aos seus amigos do que os conselhos dos pais ou dos professores. Assim, não conseguimos autonomia que pretendíamos para ela. 

Por outro lado, os amigos funcionam em muitas ocasiões como correia de transmissão de publicidade e, evidentemente, da moda. Como a criança quer ser aceite no grupo, porque é uma das tendências básicas do todo o ser humano, estabelece-se uma curiosa relação de tirania: para ter a aprovação do grupo comporta-se de acordo com os modelos transmitidos pela televisão, através de anúncios e programas. Tem de usar as calças e os sapatos das marcas prestigiadas, beber as bebidas prescritas e sair às onze da noite, ainda que, de modo algum, lhe apeteça. [Isto] mandado por alguém que nunca dá a cara. E sentir-se-á muito autónomo porque crê que está a fazer o que deseja.

É muito curioso observar como, nos nossos dias, se reclama  (...) o «direito à diferença» e se critica até ao infinito a razão moderna, atribuindo-lhes a ânsia desmedida de universalização e de homogeneização, proclamando-se, com entusiasmo que a pós-modernidade veicula uma nova sensibilidade face às diferenças, uma capacidade para viver com a diferença e respeitá-la. Porém, todos os jovens dos mais diversos países querem usar as mesmas marcas e roupa ou de calçado, todos querem beber o mesmo, todos querem fazer praticamente as mesmas coisas.

Na realidade quem tem ganho a batalha são as grandes multinacionais, que estendem as suas redes por países ricos e pobres (...)

Não convém, pois, na hora de educar esquecer as novas tiranias e, sobretudo, estar bem consciente de que o único antídoto contra qualquer tipo de tirania é encorajar uma cultura de personalismo activo e a participação responsável e solidária face a uma cultura de individualismo e de gregarismo passivo".

10 comentários:

Anónimo disse...

A família educa, a Escola ensina. Nada de misturar as coisas, e abaixo as inovações pedagógicas, a Educação não é uma ciência é um excelente curso a extinguir.

Helena Damião disse...

Prezado leitor anónimo
Concordo com a distinção que faz dos papéis educativos da família e da escola. Por isso se usa, em Pedagogia, a expressão "instrução" para designar o papel específico da escola. Nos países do sul da Europa é pouco usada, tendo, até, adquirido uma conotação negativa, mas nos países anglófonos isso não acontece.
Já não concordo quando diz que a Educação (Pedagogia?) não é uma ciência. Explico-me: o estatuto epistemológico da Pedagogia é discutido e discutível (e ainda bem, pois isso todas as disciplinas o fazem) entre outras razões porque no seu campo são convocados conhecimentos filosóficos, éticos, sociológicos, biológicos, psicológicos, ergonómicos... e pedagógicos propriamente ditos. Certos conhecimentos são, pois, mais de ordem teorética, outros mais de ordem científica. Como a medicina, a arquitectura ou as engenharias…
Quando diz: a “Educação não é uma ciência, é um excelente curso a extinguir”, quererá dizer que todos os cursos que não são científicos (no sentido da ciência pura e dura, se é que tal existe) devem ser extintos? Pense, então, com o que ficamos… Com a tecnologia assente em pés de barro e com os dias contados. Ou seja, ficamos sem nada!
Lamentavelmente, é para aí que tendemos a caminhar. Não está só, caro leitor.
Cordialmente
Maria Helena Damião

Anónimo disse...

A Pedagogia não é sinónimo de Educação, a Pedagogia é uma técnica e não uma ciência, porque abarca coisas que não são redutíveis a nenhum princípio comum, aliás, esteve de acordo com isso quando refere que, e cito-a:

" no seu campo são convocados conhecimentos filosóficos, éticos, sociológicos, biológicos, psicológicos, ergonómicos... e pedagógicos propriamente ditos. "

O problema começa é quando se agarra da Pedagogia e se tenta criar uma ciência, a chamada "Educação". Os resultados estão à vista quando a ideilogia no meio, aqui temos novamente o problema do descartar do ensino da caligrafia, a coisa é realmente muito grave:

How keyboards kill creativity: Handwriting dies out in US schools
https://www.youtube.com/watch?v=LaTr5Wr1b_k

Helena Damião disse...

Prezado leitor anónimo
Não faço ideia qual é a sua formação, mas a segurança com que escreve "a Pedagogia não é sinónimo de Educação, a Pedagogia é uma técnica e não uma ciência" impressiona-me. Em geral, quem pensou (bem) no assunto é menos taxativo. As razões são diversas, uma delas e que, no campo da instrução, não se devem aplicar técnicas que não sejam apoiadas em conhecimento científico e numa reflexão filosófica... pelo menos isso, caso contrário estamos perante uma técnica cega.
Não percebo o que quer dizer quando diz: a Pedagogia não é uma ciência "porque abarca coisas que não são redutíveis a nenhum princípio comum" nem quando diz que "se agarra na Pedagogia e se tenta criar uma ciência, a chamada "Educação".
E muito menos percebo a mistura que faz da Pedagogia com ideologia. Reconheço que se quer passar muitas vezes (vezes de mais) ideologias e diversa natureza por conhecimento pedagógico, mas isso não significa que seja uma e a mesma coisa.
No caso da escrita a que se refere (deixar de se ensinar caligrafia para se passar a ensinar a escrever em teclados), sim isso é ideologia: não há na pedagogia investigação que sustente tal substituição e percebem-se os interesses que se infiltram nas decisões de quem tal decide.
Talvez não fosse mau que quem percebe erros destes no ensino, interrogasse os verdadeiros autores e não a (desgraçada) da Pedagogia. Assim sendo, atiramos fora a criança com a água do banho.
Cumprimentos
MHD

Anónimo disse...

Minha formação é variada e vai desde a arte às ciências biomédicas. Reafirmo o que disse, o conteúdo da profissionalização de professores que eu pude experimentar foi chocante e eu recusei-o liminarmente. O condicionamento da ciência pela ideologia é uma realidade tão impregnada, que ela nem é mais eudoutrinamento. Abordar a chamada "Educação" ignorando testemunhos como o de Charlotte Iserbyt é discutir o sexo dos anjos, ela explica ao detalhe em "The Secret History of Western Education & Scientific Destruction of Minds" e noutros vídeos no You Tube, qual a origem e natureza da Agenda por detrás do trajecto da Pedagogia no séc. XX, munido desse pressuposto, nenhum dos acontecimentos ou trajectórias causa admiração. Se ainda não ouviu estes 10 minutos do prof. Olavo de Carvalho, verá que também valerá a pena ouvi-lo, concordo em absoluto com o que ele diz e o com o que eu vivi na prática:

Olavo de Carvalho fala sobre Educação e Método Sócio-Construtivista
https://www.youtube.com/watch?v=kmoD05q64AE

Helena Damião disse...

Prezado leitor anónimo
A corrente construtivista (e, em especial, a sub-categoria socio-constritivismo) não se pode confundir com a Pedagogia. É uma corrente, não é a Pedagogia. Felizmente a Pedagogia abriga outras correntes, entre as quais a Cognitivista. valeria a pena dar-lhe alguma atenção.
Cordialmente,
MHD

Anónimo disse...

O conteúdo da profissionalização de professores foi factualmente muito explícito, podem lá meter todas as correntes que quiserem, se no fim tudo servir para humilhar-nos, garanto-lhe que para mim não serve. Mais uma vez lhe recomendo dois minutos do Olavo de Carvalho sobre a (nova) Economia comunista e o actual estado das coisas políticas:
https://www.youtube.com/watch?v=9a8axWVb-2E

Anónimo disse...

February 04, 2015 - Jeff Rense & Charlotte Iserbyt - The Deliberate Dumbing Down Of America
https://www.youtube.com/watch?v=Bw3oDtFGjH4

Anónimo disse...

Municipalização da educação: quietinhos, não respirem, já está!
http://www.publico.pt/sociedade/noticia/municipalizacao-da-educacao-quietinhos-nao-respirem-ja-esta-1685669

Transferência da Educação para as câmaras gera preocupação e indignação
http://www.publico.pt/sociedade/noticia/transferencia-da-educacao-para-as-camaras-gera-preocupacao-e-indignacao-1685989?page=-1

Anónimo disse...

From health care to food and everything else in life, government and technology will be the provider. Ready for that?

This is why former SunMicrosystems CEO Bill Joy stated that the Future Doesn’t Need Us, quoting from Ted Kaczynski’s manifesto on the human condition under technology:

"Due to improved techniques the elite will have greater control over the masses; and because human work will no longer be necessary the masses will be superfluous, a useless burden on the system.

If the elite is ruthless they may simply decide to exterminate the mass of humanity. If they are humane they may use propaganda or other psychological or biological techniques to reduce the birth rate until the mass of humanity becomes extinct, leaving the world to the elite.

Or, if the elite consists of soft-hearted liberals, they may decide to play the role of good shepherds to the rest of the human race. They will see to it that everyone’s physical needs are satisfied, that all children are raised under psychologically hygienic conditions, that everyone has a wholesome hobby to keep him busy, and that anyone who may become dissatisfied undergoes “treatment” to cure his “problem.” Of course, life will be so purposeless that people will have to be biologically or psychologically engineered either to remove their need for the power process or make them “sublimate” their drive for power into some harmless hobby. These engineered human beings may be happy in such a society, but they will most certainly not be free. They will have been reduced to the status of domestic animals."

http://www.infowars.com/in-the-robotic-near-future-most-will-live-off-government-provided-income/

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...