Durante a meteorização, as interacções da litosfera com a atmosfera, a hidrosfera e a biosfera ou, por outras palavras, as interacções das rochas com o ar, a água e os seres vivos conduzem à formação de: (1) minerais residuais, mais ou menos modificados, que se comportam como detritos e, portanto, susceptíveis de serem deslocados no seio de um fluido (água ou ar); (2) substâncias dissolvidas nas águas naturais. Em simultâneo, a biosfera é fonte de restos esqueléticos, entre conchas, carapaças, ossos, dentes e outros.
São estes, com efeito, os três tipos de materiais que entram na constituição das rochas sedimentares, podendo afirmar-se que a meteorização e a actividade biológica são parte essencial da génese das rochas sedimentares (sedimentogénese) e dos solos (pedogénese). A energia radiante oriunda do Sol está estimada em cerca de 1,4 x 1021 Kcal/ano. Cerca de metade desta energia é reflectida para o cosmos, mas a outra metade é absorvida pela atmosfera, pela hidrosfera, pela biosfera e pela litosfera na sua capa mais superficial. É esta energia, dita externa [1], que alimenta a supergénese [2].
A zonalidade climática do globo, a circulação das massas de ar na atmosfera e, portanto, os ventos, a evaporação da água dos oceanos, que os ventos transportam e descarregam sobre os continentes, a erosão, a fotossíntese elaborada pelos vegetais e a vida, em geral, constituem alguns exemplos da importância capital da energia solar no comportamento e evolução da superfície do nosso planeta. A meteorização das rochas, entendida como um dos mecanismos principais desta evolução, é, além de outros factores intrínsecos à natureza das rochas, também consequência (directa e/ou indirecta) desta energia externa.
Podemos, assim, considerar a meteorização das rochas como função de duas variáveis: a capacidade de serem menos ou mais afectadas por esse processo e a intensidade do mesmo. A capacidade está ligada a factores próprios à natureza das rochas, como sejam a composição mineralógica, a textura, a porosidade [3], a permeabilidade [4] e a estrutura à escala macroscópica. Um qualquer afloramento rochoso exposto aos agentes meteóricos não é, em geral, um corpo homogéneo e contínuo. Apresenta descontinuidades ao longo de certos planos estruturais, com destaque para as juntas de estratificação [5] e as diaclases [6].
Porosidade, permeabilidade e os referidos planos estruturais representam fragilidades face aos agentes meteóricos, uma vez que condicionam a drenagem interna e o tempo de permanência da solução de ataque (sempre aquosa) no seio da rocha. A disjunção em blocos, tão comum em rochas maciças, como os granitos, é uma consequência deste tipo de agressão ao longo das diaclases. As arestas e, sobretudo, os vértices dos “paralelepípedos” (definidos pelos três planos principais de diaclases característicos destas rochas) são mais rapidamente alterados [7], conduzindo, no geral, à formação de blocos mais ou menos arredondados.
Por seu turno, a intensidade reúne o conjunto de factores externos, tais como temperatura, humidade (quantidade de água), potenciais hidrogeniónico (pH) e de oxi-redução (Eh) do meio, actividade biológica (cujos parâmetros assumem valores próprios nas diferentes zonas climáticas do globo) e relevo que controla não só a temperatura ambiente e a drenagem das águas, mas também o balanço alteração versus erosão.
Se à capacidade e à intensidade se juntar o tempo durante o qual actuaram os factores com que se definiu a intensidade, obtém-se a noção de grau de meteorização. Assim, esta outra variável é função da natureza litológica, dos agentes externos e do tempo durante o qual se exerceu a sua actuação. Pode, então, afirmar-se que o grau de meteorização das rochas depende:
(1) - da natureza das mesmas;
(2) - das condições morfoclimáticas sob as quais se processa;
(3) - do tempo durante o qual se exerce.
A meteorização traduz-se na conversão de certa espessura da capa externa das rochas num material alterado, o rególito [8], também referido por alterito ou saprólito [9], cujos constituintes são susceptíveis de serem mobilizados e evacuados pelos agentes de erosão.
Ao longo das vertentes com declive mais acentuado, esta capa ou manto de alteração [10] tem tendência a descer por reptação [11], de que resulta um depósito de vertente, lavado pelas águas de infiltração ao longo do declive, designado por eluvião ou elúvio [12]. Esta capa, de equilíbrio instável, desce e imobiliza-se na base, originando o depósito de sopé já considerado um colúvio [13]. Se as condições climáticas e topográficas o permitirem, o saprólito tende a transformar-se num solo.
A meteorização resulta de acções múltiplas que, por questões de arrumo, se consideram ou essencialmente mecânicas ou predominantemente químicas. Assim, consoante os casos, falamos de alteração mecânica, no primeiro, e de alteração química no segundo. Acontece que, praticamente, a alteração química das rochas é sempre acompanhada pela acção de seres vivos (micro e macroorganismos), quer através da sua actividade fisiológica, quer por efeito dos produtos da sua decomposição post mortem. Poderá, nalguns casos, falar-se de alteração essencialmente química, mas o mais comum é a sobreposição desta actividade à dos mecanismos bióticos e, portanto, ter maior realidade a que pode designar-se por alteração bioquímica ou bioquimiogénica.
(continua)
NOTAS:
[1] Em oposição à energia interna armazenada no interior da Terra.
[2] Conjunto de processos geodinâmicos externos, cuja fonte de energia é o Sol.
[3] Relação entre o volume dos poros de uma porção de rocha e o volume total dessa mesma porção.
[4] Medida da facilidade que um corpo oferece ao deixar-se atravessar por um fluido.
[5] Planos de separação entre as camadas de rochas sedimentares
[6] Ou juntas de tensão. Durante a ascensão e consequente deformação, mais ou menos visível, esboçam-se ou abrem-se fissuras que dividem os corpos rochosos em blocos, variáveis em dimensão e na forma, em função da sua natureza.
[7] Nos “vértices” e nas “arestas” destes “paralelepípedos”, para um dado volume de rocha, a área exposta aos agentes meteóricos é maior do que nas “faces”.
[8] Do grego rhegos, cobertura e lithos, pedra.
[9] Do grego sapros, podre, e lithos, pedra.
[10] Capa de meteorização, zona de epimorfismo, zona de epigénese são outras expressões usadas pelos vários autores com o mesmo sentido.
[11] Ou creeping. Descida gravítica, muito lenta, do solo ou do rególito, ao longo das vertentes.
[12] Ou elluvium, do latim eluere, lavar, uma vez que estes materiais são lavados e drenados pelas águas de percolação, isto é, as que circulam por gravidade entre os seus poros.
[13] Do latim colluvium, que alude à mistura de materiais, própria de um transporte tão curto, que não permite a sua lavagem e selecção por calibres. O mesmo que depósito coluvial ou coluvião.
A. Galopim de Carvalho
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