terça-feira, 23 de novembro de 2010

POEMA DO CORAÇÃO


Poema de António Gedeão que abre o seu livro "Linhas de Força" de 1967 e que vou dizer no próximo dia 25 no Centro Ciência Viva Rómulo de Carvalho, em Coimbra:

"Eu queria que o Amor estivesse realmente no coração,
e também a Bondade,
e a Sinceridade,
e tudo, e tudo o mais, tudo estivesse realmente no coração
Então poderia dizer-vos:
"Meus amados irmãos,
falo-vos do coração",
ou então:
"com o coração nas mãos".

Mas o meu coração é como o dos compêndios
Tem duas válvulas (a tricúspide e a mitral)
e os seus compartimentos (duas aurículas e dois ventrículos).
O sangue a circular contrai-os e distende-os
segundo a obrigação das leis dos movimentos.

Por vezes acontece
ver-se um homem, sem querer, com os lábios apertados
e uma lâmina baça e agreste, que endurece
a luz nos olhos em bisel cortados.
Parece então que o coração estremece.
Mas não.
Sabe-se, e muito bem, com fundamento prático,
que esse vento que sopra e ateia os incêndios,
é coisa do simpático.
Vem tudo nos compêndios.

Então meninos!
Vamos à lição!
Em quantas partes se divide o coração?"

António Gedeão

7 comentários:

Anónimo disse...

Na minha opinião,
meu caro Gedeão,
o coração
não tem compartimentos
sempre estão
meramente em questão
os nossos sentimentos,
a respeito dos quais
não dizem coisa alguma os manuais!

JCN

Anónimo disse...

Corrijo o 5º verso que, por gralha, saiu truncado, passando a ser:

sempre que estão

JCN

Anónimo disse...

Ao meu jeito:

O coração
não é senão
um pedaço de músculo em acção,
mas lá por dentro,
bem no centro,
reside toda a nossa emoção,
quer queiramos ou não!

JCN

joão boaventura disse...

Meu Coração é um Enorme Estrado

Conclusão a sucata !... Fiz o cálculo,
Saiu-me certo, fui elogiado...
Meu coração é um enorme estrado
Onde se expõe um pequeno animálculo...

A microscópio de desilusões
Findei, prolixo nas minúcias fúteis...
Minhas conclusões práticas, inúteis...
Minhas conclusões teóricas, confusões...

Que teorias há para quem sente
O cérebro quebrar-se, como um dente
Dum pente de mendigo que emigrou ?

Fecho o caderno dos apontamentos
E faço riscos moles e cinzentos
Nas costas do envelope do que sou...

Álvaro de Campos,
in "Poemas"
Heterónimo de Fernando Pessoa

Anónimo disse...

Temos de concodar que há coisas piores... na sucata! JCN

Anónimo disse...

O coração de Pombal,
quando lhe foi retirado
para ser embalsamado,
além de descomunal,
tina dentro, por sinal,
sem lá fazerem barulho,
trinta e nove matacões
de pequenas dimensões,
o que deu a sensação
de não ser um coração,
mas um grande pedregulho!

JCN

Anónimo disse...

O coração tem dois quartos:
ali moram, sem se ver,
num a Dor, noutro o Prazer.
Quando o Prazer, num dos quartos,
acorda cheio de ardor,
adormece no outro a Dor...
Cuidado, Prazer, cautela!
Canta e ri, mas devagar...
não vás a Dor acordar!

Friedrich Ruckert, em tradução de Antero de Quental, aqui melhorada. JCN
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