terça-feira, 23 de novembro de 2010
Ciência e Técnica: a todo o vapor
Crónica elaborada para a Associação Viver a Ciência, no âmbito da Semana Nacional da Ciência e da Tecnologia.
Observar, Interagir e modificar o ambiente envolvente para melhor sobreviver e resistir às fúrias dos elementos, é uma constante, essência própria da vida.
A complexidade, progressivamente crescente, da organização dos seres vivos, no seu diálogo íntimo com o Universo, apresenta hoje sistemas biológicos com linguagens e arquitecturas diversas.
A evolução dotou o cérebro com estruturas funcionais, cuja base é comum a muitos animais, e permitiu aos nossos antepassados longínquos utilizar e manipular objectos, para facilitar o garante da sobrevivência.
Milhões de anos passaram entre esse momento mágico, revoada de espanto numa sinapse recompensadora, em que um ramo vegetal na mão de um hominídeo, descreveu um arco e facilitou a obtenção de alimento, e este premir o polegar oponível num botão para controlar, à distância, um tecnológico braço robótico, mais ou menos antropomórfico, para reparar uma antena na Estação Espacial Internacional a cerca de 350 km da superfície da Terra, e à velocidade média de 27 000 km/h.
Nessa janela de tempo, o homem inventou a roda e as velas dos moinhos, construiu caravelas, aviões e foguetões, inventou bolhas de vidro contendo vácuo e iluminou as noites com tungsténio incandescente, descobriu como transformar materiais e inventou o transístor, descobriu a intimidade atómica e inventou a internet. Continuamos a utilizar o olhar, outros sentires e as mãos, mas somos substancialmente diferentes.
A observação atenta de como as coisas acontecem na natureza, integrada cerebralmente por sucessivas gerações de homens e mulheres, forjou a cultura humana com o conhecimento necessário para realizar obras úteis, a todos.
A ciência permite o conhecimento, explica o espanto, dissolve a aparência das coisas e desvenda os fundamentos dos fenómenos que nos intrigam.
A aplicação do conhecimento científico em coisas concretas e definidas permite a técnica. Por sua vez, a tecnologia explica e compreende os fenómenos técnicos. Com as ferramentas e o conhecimento a jusante da técnica, o Homem descobre novos mundos para explorar, e alimenta a ciência a montante.
De facto, assistimos ao longo da história da humanidade a um diálogo incessante entre ciência e técnica, entre técnica e ciência. Por vezes em monólogos aparentes, antecâmaras de rupturas de paradigmas, por vezes indistinguíveis num esforço conjunto para resolver problemas concretos.
Por exemplo, a técnica de saber fazer pão, a partir de um conhecimento empírico, explicada progressivamente pela ciência de saber como as leveduras, seres vivos unicelulares e microscópicos, transformam os açúcares da farinha dos cereais.
Por exemplo, a descoberta do efeito fotoeléctrico por Hertz, explicado mais tarde por Einstein, e a sua tecnológica aplicação posterior em materiais semicondutores emissores de luz, fototransístores, LEDs, utilizados nos monitores modernos e que permitem ver a ilusão tridimensional.
Se a água líquida é uma constante da vida, o conhecimento de como domesticar o vapor de água, para dele retirar trabalho útil, mudou radicalmente a sociedade e vida humanas.
A máquina a vapor, engenho técnico, galvanizou e permitiu a revolução industrial, em meados do séc. XVIII. Entre suor e copos de água, a relação entre as pessoas mudou e uma nova forma de organização social emergiu, com a ciência e a técnica como denominadores comuns, imprescindíveis.
De facto, hoje vivemos numa sociedade baseada na tecnologia e na ciência. Mais do que nunca, impõe-se a aprendizagem e a divulgação dos conhecimentos que nos permitem entender e descodificar como é que a ciência nos ajuda a tornar seres mais humanos, mais íntegros e verdadeiros, como é que podemos usufruir das potencialidades tecnológicas para melhorar a nossa qualidade de vida.
Ciência e técnica celebram-se e vivem-se hoje em simultâneo. São a realização maior da capacidade neuronal em percepcionar o mundo envolvente e integrar as diversas observações sentidas numa solução.
E não esqueçamos que a consciência emocional modelou esta empresa científico-tecnológica desde o primeiro instante. A humanidade é científica e tecnológica desde o primeiro espanto, que é observar o mundo e tentar perceber um porquê, um como e o que é. E é com emoção que recebemos a compreensão do que não conseguíamos explicar antes.
E se antes um relâmpago nos inundava de receio e iluminava a galeria das divindades primevas, hoje o maravilhamento da compreensão do seu fenómeno é sossegado por um pára-raios concreto, ainda que instalado na torre sinaleira de um templo qualquer.
António Piedade, Coimbra, 23 de Novembro de 2010
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
AINDA AS TERRAS RARAS
Por. A. Galopim de Carvalho Em finais do século XVIII, quer para os químicos como para os mineralogistas, os óxidos da maioria dos metais ...

-
Perguntaram-me da revista Visão Júnior: "Porque é que o lume é azul? Gostava mesmo de saber porque, quando a minha mãe está a cozinh...
-
Não Entres Docilmente Nessa Noite Escura de Dylan Thomas (tradução de Fernando Guimarães) Não entres docilmente nessa noite seren...
-
Depoimento de Verão que dei ao Correio da Manhã: No Verão do ano passado, viajei, com amigos, num veleiro pelos mares do Sul da Turquia. ...
7 comentários:
Excelente, António!!! Já sei quem terá de ler esta crónica como exercício, eheheh. :))) Se me permite que a use nas aulas, claro.
A ciência, meu caro e admirado Dr. António Piedade, não faz santos; faz sábios. JCN
Quando na ponta de um pau
pôs o homem um calhau,
a guerra principiou
e nunca mais terminou!
JCN
AJUSTE DE CONTAS
Conforme nos foi dito ou nós supomos,
o ser humano, o bicho que nós somos,
desde que Deus o expulsou do paraíso
por mal se comportar
não pára de dar voltas ao juízo
para encontrar
uma forma qualquer de no porvir
se ressarcir
do prejuízo.
Que fulano!
Então não é
que para atravessar o oceano
ou simples rio sem molhar o pé
achou maneira
de construir um barco
juntando uma porção
de pranchas de madeira
sem mastro nem bandeira
indicativa de nação
e, não contente,
de um pau dobrado em meia-lua,
que viu na sua frente,
veio-lhe à mente
a formação do arco,
raiz da guerra
que ainda continua
a devastar a terra,
sua prisão
sem grades nem portão?!
Dessa arma elementar
a ideia tirou do foguetão
que sem necessitar
de remos nem de velas
um dia o levará de sopetão
ao mundo das estrelas!
E deste jeito,
segundo reza o mito,
o tal sujeito
a Deus fez um manguito!
Brinca, brincando,
veremos até quando!
JOÃO DE CASTRO NUNES
Aplicada capacidade.
Plenamente de acordo.
Enviar um comentário