quinta-feira, 29 de novembro de 2018

DEZ ANOS DO RÓMULO


Meu artigo no número da revista  "As Artes entre as Letras" que acaba de sair:


O RÓMULO é o nome do Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra que foi fundado há dez anos, no dia 24 de Novembro de 2008, em homenagem a Rómulo de Carvalho, o professor de Física e Química, pedagogo, historiador e divulgador de ciência e também poeta, contista e dramaturgo, sob o pseudónimo de António Gedeão, que nasceu nesse mesmo dia mas do ano de 1906. Aquele dia, por proposta de José Mariano Gago, é o Dia Nacional da Cultura Científica e Tecnológica, sendo a respectiva semana a semana da ciência e da tecnologia em todo o país.

Tentando merecer o seu patrono, o RÓMULO é um moderno centro de recursos para ensino e divulgação da ciência e tecnologia – integrando uma biblioteca, uma mediateca e uma hemeroteca – que faz parte da rede de centros Ciência Viva espalhada pelo território nacional, uma rede estabelecida por José Mariano Gago com vista a promover a cultura científica.  No espaço situado no rés-do-chão do Departamento de Física, em cuja entrada oscila incessantemente um pêndulo de Foucault que prova a rotação do nosso planeta, abre-se uma biblioteca de cultura científica aberta a todos.

Nela se realizaram, nos últimos dez anos, inúmeras actividades culturais de todo o tipo: conferências, debates, apresentações de livros, projecções de filmes, teatros, feiras, oficinas, demonstrações, etc. Associações juvenis e outras usaram o espaço, enchendo-o de vida, para as suas iniciativas. Muitas escolas, de diferentes graus de ensino, visitaram o Centro, escutando palestras ou ouvindo trechos literários de algum modo relacionados com a ciência (o que não é raro, pois a ciência está mais omnipresente do que normalmente se julga). Grandes nomes da ciência, da cultura, das artes, da religião e da política nacionais marcaram presença no RÓMULO como José Mariano Gago, João Lobo Antunes (estes dois últimos infelizmente já falecidos), Adriano Moreira, Galopim de Carvalho, Tolentino de Mendonça, Sérgio Godinho, Jorge Paiva, Manuel Sobrinho Simões, Alexandre Quintanilha, Guilherme Valente, Maria Mota, Henrique Leitão, etc.

 Muitas doações têm feito crescer significativamente as colecções de livros: destacam-se as ofertas da Gradiva (é merecida uma palavra especial de reconhecimento ao editor da Gradiva, Guilherme Valente, grande inovador decano entre nós das edições de divulgação científica), da Fundação Calouste Gulbenkian, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, do Conselho Nacional de Educação, do Instituto de  Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, etc. Muitas doações vieram de particulares, como a recente doação de Emílio Queiroz Lopes, antigo estudante da Universidade de Coimbra professor de Matemática que foi durante muitos anos director do Colégio do Machico, na ilha da Madeira, e de José Teixeira Dias, ex-professor de Química da Universidade de Coimbra e professor jubilado da Universidade de Aveiro. Eu próprio tenho entregue parte da minha biblioteca de ciência ao RÓMULO, certo de que os livros são eternos e, podem, nas mãos e nas cabeças de outras pessoas, fazerem novos caminhos. A minha entrada na ciência deu-se, quando era jovem, pela porta dos livros de divulgação científica, alguns dos quais de Rómulo de Carvalho, e a eles devo muito do que sou.

O RÓMULO é um espaço de partilha, pelo que continua aberta a doações de livros, revistas, filmes e materiais multimédia que ilustrem as ricas e diversificadas relações, por vezes insuspeitas, que existem entre ciência e sociedade.

No dia de aniversário do RÓMULO realizou-se um colóquio sobre a comunicação de ciência em Portugal, intitulado “Ciência para todos”, numa organização conjunta com a rede dos comunicadores de ciência SciCom, liderada por Joana Lobo Antunes. Num tempo marcado pelo crescimento global da irracionalidade, interessava debater o papel da ciência e da cultura científica. Sendo certo que a ciência e a cultura científica não chegam para determinar o futuro do mundo, o certo é que o planeta – todos nós – não terá futuro sem ciência, uma ciência  que tem cada vez mais de dialogar com outras dimensões humanas, como tão bem fez António Gedeão. A ciência é humana, mas é preciso que o seja cada vez mais.

 Várias iniciativas inovadoras começaram nos dez anos do RÓMULO. Foi formalmente inaugurada a “Escola Ciência Viva” da Universidade de Coimbra, uma escola realizada em colaboração com o município de Cantanhede, que é um programa de imersão na Universidade de Coimbra durante uma semana para todas as crianças do quarto ano daquele conselho, o que inclui, para além de experiências nos laboratórios de Física, visitas a outros sítios da Universidade, como o Museu da Ciência, o Centro de Neurociências, o Jardim Botânico, e ao vizinho Museu Nacional de Machado de Castro. Foi aberto o “RÓMULO Digital”, um repositório on-line sobre a história da ciência e tecnologia e da cultura científica, que ampliou extraordinariamente o já de si grande fundo antigo que está no Alma Mater, que é uma das várias manifestações de uma universidade sem paredes. 

Uma contribuição importante para esse repositório são os fundos da biblioteca do extinto Museu Nacional da Ciência e da Técnica, fundada por Mário Silva, que o RÓMULO acolheu. E, finalmente, vai abrir, no corredor de acesso ao Rómulo, entre o pêndulo e a biblioteca, a exposição “Feynman 100 anos”, dedicada ao grande físico norte-americano Richard Feynman, prémio Nobel da Física em 1965 e autor de divertidos livros auto-biográficos como Está a brincar Sr. Feynman ou Nem sempre a brincar Sr. Feynman (publicados entre nós pela Gradiva). Essa exposição poderá ir, em itinerância, a outros locais do país.

O RÓMULO entrou nos seus segundos dez anos, como uma criança que começa a ser adolescente e tem a vida toda pela frente. Como todas as bibliotecas vivas continuará a crescer, sendo necessário pensar na extensão do espaço, eventualmente para além do espaço actual generosamente fornecido pelo Departamento de Física da Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade de Coimbra. E, como todos os centros de ciência, continuará a multiplicar as suas actividades, mostrando que a ciência está por todo o lado nas nossas vidas. E que ainda bem que é assim.

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