A comunicação social continua a dar destaque à violência na escola, e ainda bem que assim é, pois há problemas graves, respeitantes a todos, que (só?) são encarados quando se transformam em objecto de atenção de jornalistas, fenómeno que torna estes sujeitos, além de observadores, actores de relevo nas situações que pretendem dar a conhecer.
Evidentemente que isto não está certo, mas é assim que acontece. No caso, ao solicitarem as devidas instâncias educativas a pronunciarem-se, colocam-nas numa posição de não poder deixar de dizer… alguma coisa. E o que elas dizem é muito preocupante, tão preocupante como aquilo que omitem, ou que, não querendo dizer, se consegue distinguir nas entrelinhas.
Solicitam os pais e encarregados de educação, bem como as associações que os representam, e percebe-se que estes fazem parte do problema, pela omissão de educar, pelas contas que pedem à escola, pela culpa declarada que imputam a todos menos a si próprios. Solicitam as escolas e percebe-se que nelas reside outra parte do problema, pela atitude de tolerantismo que se lhe impõe e que, mesmo discordando, aceitam, pela falta de cultura e/ou de força institucional para identificar, analisar e resolver problemas, pela necessidade de apresentarem uma imagem sem mácula que favoreça a sua avaliação. Solicitam as instâncias de apoio (protecção de menores, polícia, equipas técnicas, etc.) e percebe-se que são uma terceira parte do problema, porquanto a sua existência, bem vistas as coisas, não vai muito além do virtual. Solicitam o Ministério da Educação, que tudo pretende tutelar, mas que, ao contrário de dar uma resposta esclarecida e segura, que permita sustentar medidas eficazes “no terreno”, apresenta um discurso ambíguo, evasivo e burocrático.
Acresce que cada uma destas instâncias remete as mais diversas responsabilidades para as outras, todas responsabilizando a sociedade, essa entidade difusa nos envolve e absolve.
Ora, tais instâncias deveriam perceber, antes de mais e de modo absolutamente claro, sem margem para quaisquer dúvidas, que o que está em causa é a educação das novas gerações, e que isso é um dever inalienável das gerações mais velhas, dado que as crianças e os jovens não se educam a si próprios, precisam de quem as eduque.
Não assumindo esse dever ou não estabelecendo ideias condutoras para o exercer, a violência emerge e instala-se na escola. E essa é apenas uma das gravíssimas consequências dessa opção negligente, que não se fica pela escola.
Tem sido esta a inquietação evidenciada pelos jornalistas, mas, quando a sua atenção se desviar para outros assuntos, como é normal, o mais provável é que na escola tudo continue exactamente como antes.
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9 comentários:
Assim tem sido e, pelos indicadores, assim vai continuar a ser.
Na escola, como na sociedade, costumamos não resolver os problemas. Procuramos sempre entidades para onde endossar a responsabilidade, sem assumpção da que, por obrigação, nos cabe. Ressalve-se, porém, que a escola é uma instituição legalmente atada de mãos e pés, pelo menos no que diz respeito às condições e exigências da nobreza da acção docente.
E não é por acaso que se vai ouvindo com tanta frequência a expressão: "estou de consciência tranquila".
O que significará para nós o conceito de "consciência"?
Cara Helena Damião,
Não podia estar mais de acordo consigo.
Eu, pessoalmente, não tenho qualquer dúvida que se vai mexer aqui e ali para que tudo fique na mesma.
Como diz um antigo colega meu, "enquanto os filhos dos políticos e dos jornalistas frequentarem os colégios privados, a escola pública não mudará"! E, acrescento eu, não mudará porque para que uns e outros percebam MESMO a gravidade daquilo que REALMENTE se passa nas salas de aula, tinham que ter um contacto muito próximo com essa realidade.
A globalização não tem fronteiras nem limites porque, nesta matéria, talvez não estejamos na cauda.
Alguns dos muitos exemplos elucidam-nos que De plus en plus de professeurs se déclarent menacés, que Gros coup de déprime pour les chefs d’établissement, que demonstra haver também em França Violence en milieu scolaire: 161 agressions à Strasbourg, e igualmente visionar-se a Agression dans un bus scolaire américain.
Donde se conclui que além de sermos responsáveis pelo aquecimento da casa em que vivemos e do degelo dos pólos, também perdemos, pais e professores, políticos e polícia, o controlo das novas gerações.
Teremos transmitido e traduzido o signo democracia ou a expressão Estado de Direito, às novas gerações ? Não. Deixámos que elas fizessem a tradução livre.
Só temos que nos culparmos. Como disse Óscar Wilde, “Deus, ao fazer o homem, sobrestimou-o demasiado.”
Só avaliamos os estragos quando eles tomam o tamanho do nosso temor.
Mas o que é que "a educação das novas gerações" implica?
O que é que faz parte do papel e do dever das "gerações mais velhas"?
Caro Carlos Pires
Quando Deus fez o Paraíso e nele colocou Adão e Eva, pensou que tinha criado dois génios impolutos, éticos, generosos, virtuosos..., incapazes de arrancar a maçã tentadora.
Enganou-se, e como somos feitos à imagem dele, também nos etamos a enganar constantemente, ou a nós próprios ou aos outros. Deixou-nos cheios de macieiras.
Então, como nada é perfeito, só lhe restou transmitir que quem peca deve ser castigado. Se bem o pensou, melhor o fez. Quando Abel e Caim nasceram, por sorteio aleatório, programou Caim para homicida do irmão, querendo assim demonstrar a Adão e Eva que:
1.º O Paraíso acabou
2.º A vida acaba na morte
3.º A sorte dá muito trabalho
Os exórdios bíblicos tocam-nos todos os dias, mas todos os dias são cada vez mais difíceis, e todos os dias Deus investiga o que é que terá corrido mal na programação dos humanos e quais as soluções, porque lhe parece mal apoiar-se no errare deum est, e não como adocicou S. Jerónimo errare humanum est (Ep., 57, 11), porqu Deus acha que persistir no erro é loucura.
Chegados a este ponto, e como investigar é pesquisar, é procurar, é auscultar, é ouvir, ler, ver, observar, papeis, livros, manuscritos, e achando Deus que papeis era pouco, criou um pandemónio de instrumentos chamados inovações tecnológicas, aumentando assim as suas fontes de consulta, para um melhor ajuizamento da obra em movimento a que vai assistindo.
Assim nós, tal como Deus, aumentamos o acervo, mas atamo-nos às investigações, encontramos as soluções mas logo somos assaltados por novos instrumentos que alteram o nosso comportamento, a nossa mentalidade, a nossa forma de vida. E toca a investigar de novo porque as soluções já não se adequam aos novos tempos.
Finalmente como epílogo desta epístola talvez a melhor resposta a possa encontrar nesta interrogação que Antero de Quental faz, uma interrogação similar à que Carlos Pires me faz, ínsita na conferência do autor no casino Lisbonense com o título Causas da decadência dos povos peninsulares nos últimos três séculos., nestes termos:
“Mas, se não reconhecermos e confessarmos francamente os nossos erros passados, como poderemos aspirar a uma emenda sincera e definitiva?”.
Mas o nosso Ministério da Educação anda demasiadamente preocupado e ocupado com as coisas menores pelo que o tempo se esvai e já não resta tempo sequer para saber quais as coisas maiores e mais preocupantes. Tantas são elas.
Poder-se-á resumir tudo, de uma forma simplista, na formulação do sociólogo finlandês Paavo Sepanen: “Enquanto os católicos esperam pela ajuda de Deus, os protestantes colaboram com a obra de Deus”.
Mas se Deus também errou, nada nos inibe de não lhe seguirmos o exemplo.
Car
João Boaventura:
Gostei particularmente da citação de Paavo Sepanen.
O escritor Stephen King num dos seus romances pôs alguém a dizer algo equivalente: "Deus ajuda quem se ajuda a si próprio".
(É óbvio que em ambos os casos as referências religiosas são secundárias e as afirmações fazem sentido mesmo para quem é ateu.)
Em relação a corrigir os erros passados. Esse é um problema: não é consensual quais foram os erros do passado, não é consensual o que é que precisa de ser corrigido e o que está bem.
Algumas pessoas consideram que dos erros do passado fazem parte coisas como: reprovar os alunos por faltas, reprovar os alunos por falta de conhecimentos, expulsar da escola alunos que cometam infracções muito graves (como agredir colegas, professores e funcionários), efectuar exames nacionais exigentes e credíveis, centrar o ensino nos conhecimentos e não no aluno, etc.
Pela minha parte considero que não são erros e que o erro está nas tentativas (promovidas pela "pedagogia romântica", na expressão de Nuno Crato) de os "corrigir".
Erros do passado (e do presente) são os programas demasiado extensos e mal organizados, os manuais confusos e pouco rigorosos, a mania pedagógica das competências desligadas dos conteúdos e a desvalorização destes, o ensino acrítico e dogmático, a multiplicidade de funções e tarefas não docentes que são impostas aos professores, etc., etc.
Erro é também considerar - como fazem os arautos da "pedagogia romântica" - que ensino acrítico e dogmático é sinónimo de aula expositivo e antónimo de trabalho de projecto e coisas semelhantes. Como se os alunos não pudessem ser levados a reflectir e a debater com uma exposição clara e rigorosa do professor e metodologias como o trabalho de projecto e similares assegurassem por si só uma atitude activa por parte dos alunos e estes não pudessem limitar-se a fazer copy paste.
Face ao que disse, julgo que as minhas questões não foram realmente respondidas.
Com os melhores cumprimentos.
E, além do mais, porque somos assim.
Também sou professor e é realmente grave o que se passa e durante vários anos todo o nosso País vai sofre com a incompetência e arrogância da anterior tutela do Ministério da Educação: encheu-nos de tarefas inúteis que nos roubam tempo para ser felizes, virou-nos um contra os outros e principalmente colocou a sociedade contra nós. E agora como é fazemos sentir a nossa autoridade dentro de uma sala de aulas, em que os alunos sabem todos os mecanismos usados são inúteis? Mas que corja. Temos alguma esperança na nova ministra.
Caro Carlos Pires
Congratulo-me por demonstrar que sabe quais são os erros. Como sabe que quem deveria saneá-los não o faz.
De resto a história das sucessivas reformas e regulações no sistema de ensino, tem pecado por terem sido pensadas e realizadas por génios incompreendidos, o último dos quais incidiu na Prof.ª Dr.ª Maria de Lurdes Rodrigues.
Não se refaz aqui o historial da delapidação conseguida da estrutura do sistema de ensino, pela anterior Ministra, por demasiadamente conhecida e revisitada, mas talvez encontremos alguma explicação na exposição feita pela escritora nigeriana Chimamanda Adichie, a que deu o título: "O perigo da história única".
O Perigo da história única, tem a sua sede na visão unilateral dos interlocutores, e consequente falta de diálogo, ou horror ao diálogo, ou fobia à comunicabilidade, criando um efeito pernicioso e vicioso de fixação.
Dito de outra forma, e no trilho de Chimamanda, estaríamos perante duas “histórias únicas”:
1 - a história do Ministério que, pela sua posição no vértice, se desenvolveria no quadro de quem vê de cima para baixo e se recusa, ou por vício de autoridade, ou por desconhecimento da vivência escolar, olhar para a base, criando um muro, mas vomitando regulações e ordens de serviço;
2 – a história do mundo escolar, dos professores e dos alunos, com a sua envolvência própria, experiência diária, e prática específica, mundo de luta pela educação, pela instrução, pela cultura, um mundo sui generis, operacional, conhecedor do seu terreno, das suas necessidades, das suas dificuldades, e de combate permanente à indisciplina, e à agressão, não apenas dos alunos ou dos pais, mas também do próprio Ministério, como se cada escola fosse um quartel com as suas casernas, sujeitos à aleivosia do Quartel-General da 5 de Outubro.
Aqui estão as duas “histórias únicas”, onde a primeira tem o poder e o domínio, sujeitando a segunda à servidão, porque impossibilitada de ter uma instituição que possibilite dar a conhecer a sua “história única” à “história única” do Ministério, já que o sindicalismo mantém a sua estrutura passadiça e caduca dos século XVIII, XIX e XX, passando por uma crise de identidade, e sem representatividade, resultantes da afirmação política partidária.
Cordialmente
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